Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano III    Nº29    Julho 2000

 

Investigação

PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

O rumo de uma obra

A acção de rua do padre Américo terá estado na origem de toda uma obra que assumiu depois quatro dimensões fundamentais. Tudo terá começado, porém, numa das suas muitas viagens pelos bairros pobres de Coimbra. Uma criança solicitou-lhe que ajudasse o pai que estava doente.

Américo subiu as escadas íngremes e estreitas do velho prédio e deparou com um homem à beira da morte, o qual lhe pediu que tratasse dos filhos, que já não tinham mãe. Aqui nasce o desejo, fruto da necessidade, de poder alojar as crianças.

Esta necessidade resulta de um humanismo social notável “que, de certa maneira, algumas encíclicas da Igreja já tinham referido, mas que, depois, fundamentalmente o Vaticano II dirá de uma maior participação dos padres em termos de pastoral social. É aí que o Padre Américo se adianta, bem como na filosofia personalista, porque valoriza a pessoa humana”.

E esta valorização ocorre a quatro níveis fundamentais. A primeira e mais conhecida diz respeito à vertente socio-pedagógica, de carácter comunitário e de grande valor pedagógico, mais do que simplesmente educativo. Foi desenvolvida nas casas do gaiato. Existem ainda os lares citadinos, para aqueles que terminavam a escola, mas queriam trabalhar e estudar podiam ficar alojados nesses lares, na cidade.

O primeiro nasceu em 1945, no Porto. Só depois são fundados os lares de Coimbra e de São João da Madeira, este último que funcionou apenas durante cinco anos, e que estava voltado para a muita indústria ali existente. Mais tarde seria a vez de Lisboa e Setúbal.

As casas do Gaiato existiram em maior número. A primeira, que o próprio padre Américo comprou, em finais de 39, é a de Miranda do Corvo. “Abriu com cinco rapazes em Janeiro de 1940”. A de Paço de Sousa é a segunda, em 1943, a qual é considerada um modelo, porque é uma aldeia. “É uma aldeia, num espaço doado pelos beneditinos, com casas em granito, de arquitectura semelhante”.

DESERTIFICAÇÃO. A segunda dimensão, a ambiental-habitacional, ainda se mantém hoje e diz respeito ao Património dos Pobres, criado em 1952. Então, o Padre Horácio, que faleceu recentemente, chegara à obra há pouco tempo. E foi pelas suas palavras que Ernesto Candeias Martins conheceu melhor esta dimensão.

Diz aquele professor que o padre Horácio assiste a um episódio em Fátima que se seguiu após um período em que o padre Américo afirmava que iria dizer uma coisa estrondosa em relação aos problemas habitacionais. Porque muitas famílias vivam com os filhos no mesmo quarto, algumas pessoas viviam em vãos de escada.

Em Fátima não era para intervir na homilia. Mas à última da hora, como habitualmente, fala de improviso e recorre à linguagem incisiva que o caracterizava. É então que diz que “cada freguesia deve cuidar dos seus pobres” e explicou porquê, referindo que “toda a gente tem direito a uma habitação digna, o que tem de começar pelas freguesias”.

Por isso, referiu que seria preciso travar “um certo deslocamento, a mobilidade das pessoas para a cidade, porque as cidades não têm estrutura para as receber. Os operários estão desempregados e andam a pedir para sustentar a família, pelo que vivem miseravelmente em barracas. Isso não pode ser, não dignifica a pessoa humana”.

Pedia então a mobilização dos padres nas aldeias e até dos padres das cidades, para que se fossem criados bairros, muitos deles ainda com o nome do Padre Américo. E só num ano fizeram mais de três mil e 500 moradias em todo o País. Bairros feitos com dinheiro do povo, a dar às famílias, que passavam aos filhos até a situação económica melhorar.

SERVIR. A terceira dimensão começa em 1931, um ano antes de ser ordenado sacerdote. Então dá aulas de português, mas aproveita e contacta muito a realidade de Coimbra, as zonas degradadas. Em 32 é ordenado e o Bispo envia-o para a paróquia de São Paulo de Frades, onde nunca chegou a ir.

“Ele não se via numa paróquia. Isso era cortar-lhe as suas pernas. Ele próprio dizia aos gaiatos «tu tens pernas para andar, tens que andar». Era o sentido de responsabilidade”. Por isso diz ao Bispo que não serve para aquilo e pede para ficar junto dos pobres. A Sopa dos Pobres estava a ser criada na altura e o Bispo coloca-o responsável por isso.

É aí que inicia a sua actividade de “trabalhador social”. Fica na Sopa até 1937, altura em que passa para a tutela das Criaditas dos Pobres e se chamará Cozinha Económica. O Padre Américo entra como assistente religioso das tutorias de menores. Seguem-se as colónias e depois a obra.

Além desta função assistencial e caritativa, seguida hoje pelos gaiatos nas conferências vicentinas, surge a dimensão mais terapêutica da obra da rua. “Terapêutica porque tinha uma dedicação muito especial a um tipo de deficientes que não tinham família”. Nasce então a obra do Calvário, em Paredes.

Os deficientes que não tinham família ou que tinham sido abandonados, eram recolhidos ali e funcionavam numa lógica de auto-governo, onde os que estão acamados são tratados pelos que são mais autónomos. “Esta obra tem um grande valor humano e muitas vezes algumas pessoas necessitam de ir a estes lugares”.

 

 

 

ATACAR AS CAUSAS DA POBREZA

A obra da rua

 

CANDEIAS MARTINS

Américo: Padre!

 

A RAZÃO DE SER PADRE

Tendência desde cedo

 

JOSÉ CRISANTO, PROFESSOR NA FIGUEIRA DA FOZ

Da Casa do Gaiato para a vida

 


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