RIBEIRO CRISTÓVÃO,
JORNALISTA E EX-DEPUTADO
"Não há uma
política desportiva no nosso País"
Ribeiro Cristóvão foi o rosto e a voz de
programas desportivos de referência na televisão e na rádio portuguesa.
O jornalista afirma que não há política para o desporto no nosso país,
com o interior a ser sucessivamente esquecido, e que os campeões que
surgem ocasionalmente, são estrelas de geração espontânea. Ribeiro
Cristóvão acredita que o FC Porto vai recuperar o título e está
convencido que o seleccionador Paulo Bento pode ficar mais de dois anos
no comando da selecção das quinas se «conseguir passar o “Rubicão”». O
antigo deputado eleito pelo círculo de Castelo Branco entende ainda que
a opinião pública exagera nas críticas depreciativas que tece aos
parlamentares com assento em S. Bento.
Em 1980 fundou, juntamente com Artur Agostinho, o departamento de
desporto da Rádio Renascença (RR). Deu origem a programas de referência
como «Bola Branca» e «Frente Desportiva», que ainda se mantêm no ar.
Como explica essa longevidade de três décadas?
Lembro-me que quando criámos a «Bola Branca» não havia nada atractivo no
panorama da informação desportiva nacional. Quisemos ser uma alternativa
aos jornais. Nessa altura, a rádio era um bom meio para chegar às
pessoas. Começámos logo com uma equipa muito profissional e competente,
que desde o início, procurou produzir uma informação rigorosa, séria e
actualizada. Foram estes três vectores que nos permitiram fidelizar um
determinado mercado ao longo de 30 anos.
Neste momento a «Bola Branca» é o programa mais antigo da rádio
portuguesa e uma referência no panorama desportivo, com 8 edições ao
longo do dia, das 7h30 às 22h30.
A equipa da Renascença auto-denominou-se durante muito tempo a «super
equipa desportiva». Porquê?
Porque contávamos com nomes muito populares da rádio, sobretudo dois
expoentes máximos da informação: o Artur Agostinho e o Alves dos Santos,
que também ficou conhecido por «o comentador que o país inteiro
consagrou». Para além de mim, estava também o Romeu Correia, ou seja,
pessoas que tinham conquistado algum bom nome junto da comunidade
ouvinte.
Como é que lidaram com o aparecimento das rádios locais e regionais?
Sofremos uma forte concorrência com o surgimento desses novos órgãos de
informação, mas isso só contribuiu para espevitar o nosso trabalho de
forma a ficarmos atentos. Ainda hoje conservamos a liderança radiofónica
da informação desportiva nacional.
Qual foi o trabalho da sua carreira que mais o marcou?
Provavelmente o relato que fiz da final da Taça dos Campeões, em 1987,
em que o FC Porto venceu o Bayern de Munique, em Viena. Nunca tinha
estado numa final com tamanha importância e ainda para mais quando se
verificou uma vitória de uma equipa portuguesa. Quando se ganha as
recordações ficam-nos mais vivas na memória. Foi o momento mais marcante
da minha carreira na rádio. Mas não esqueço os vários europeus de
futebol (1984, 1996, 2000, 2004 e 2008) e os mundiais (1986 e 2006) onde
marquei presença e onde se escreveram páginas indeléveis para o nosso
país. No ciclismo fiz também mais de 20 voltas a Portugal em bicicleta.
Sendo uma prova que se disputa anualmente em Agosto, era um escape ao
frenesim do futebol, permitindo-nos viajar diariamente de terra em
terra, conhecendo pessoas, gostos, gastronomias e hábitos diferentes.
Como lidou com a exposição televisiva derivada da apresentação que
fez do «Domingo Desportivo» nos anos 80?
Foi uma exposição diferente da radiofónica, necessariamente mais
agressiva e responsabilizada. Entrei na televisão, em 1982, a convite do
Adriano Cerqueira e do José Eduardo Moniz. Sem experiência alguma, fiz
um pequeno teste e alguns dias depois estava a fazer o «Troféu», um
programa com 4 horas de duração. Um mês depois comecei a apresentar o
«Domingo Desportivo» ; que foi durante muito tempo o programa mais
marcante da televisão portuguesa. Era o único que transmitia os resumos
dos jogos do campeonato de futebol e as restantes modalidades. Não havia
mais nada. Ainda hoje as pessoas quando me encontram na rua falam do
«Domingo Desportivo». Não escondo o enorme orgulho que tive por ter sido
o seu apresentador. Também fiz o «Remate», que era uma espécie de «Bola
Branca» na televisão, que ia para o ar por volta da meia-noite, onde se
fazia uma súmula da informação desportiva do dia. Saía das instalações
da RR no Chiado e ia para os estúdios da RTP no Lumiar fazer o «Remate».
Lembro-me que o «Domingo Desportivo» era transmitido a horas tardias
devido a autênticas aventuras com as filmagens dos jogos, numa altura em
que não havia o envio de imagens por satélite. Quer explicar-nos essa
odisseia semanal?
Havia dificuldades com certas reportagens de jogos realizados em Chaves,
Portimão, Elvas e cujas cassetes chegavam aos estúdios de Lisboa já
depois do jantar, devido às deficientes acessibilidades que o país então
possuía. Muitas vinham de mota a uma velocidade desabrida, especialmente
quando «O Elvas» estava na primeira divisão. Nos estúdios do Lumiar era
preciso improvisar em directo, à espera que fosse ultimada a montagem do
resumo do jogo. Para aumentar as dificuldades, nos anos 80 existiam duas
fitas, a do som e da imagem, e era preciso sincronizar ambas para
completar o resumo. Eram outros tempos, com histórias inesquecíveis.
Agora tudo mudou, com os satélites e com os canais de desporto que
transmitem tudo em directo.
É sportinguista assumido. Vai fazer 55 anos de associado em Novembro.
Existe preconceito por parte dos jornalistas em divulgarem a sua cor
clubística?
Agora menos, porque também há mais jornalistas desportivos. Mas no meu
tempo isso era um assunto que preocupava as pessoas. Entendi sempre que
não devia fugir daquilo que era. Disse sempre qual era a minha cor
partidária e qual o meu clube preferido. Nunca me envergonhei por isso.
Fui sempre crítico do Sporting, quando devia ser, como o fui do FC Porto
e do Benfica. Posso garantir que consegui, sempre de consciência
tranquila, ser imparcial e honesto.
Partilha da opinião que a imprensa desportiva é demasiado benevolente
e macia na denuncia de certos casos menos claros e opacos que afectam o
futebol português, cabendo esse papel aos meios de comunicação social
generalistas?
A imprensa desportiva nacional é pouco agressiva. Deu sempre a sensação
de estar conotada com alguns clubes. Se compararmos com a imprensa
desportiva espanhola constata-se que a do país vizinho é mais incisiva,
o que obriga os leitores e a opinião pública em geral, a manterem uma
vigilância permanente.
Em Espanha os jornais desportivos não sendo órgãos oficiais de
clubes, são, pelo menos, oficiosamente. Advoga que o mesmo se passasse
em Portugal?
Há uma tendência visível de veicular determinadas mensagens de certos
clubes, mas que não é anunciada e assumida. Admito que esta aparente
dependência traga alguns dividendos monetários, mas no reverso da
medalha, é provável que a margem de manobra de quem escreve seja menor.
Acredito que actualmente existem questões comerciais subjacentes que
obrigam a percorrer caminhos que há alguns anos atrás não seriam os
mesmos. Mas veja também que o mercado é muito maior em Espanha. A
«Marca» pode chegar a vender 700 mil exemplares por dia, enquanto cá
dificilmente qualquer um dos nossos desportivos supera os 100 mil
jornais.
Os jornalistas especializados em futebol são menos independentes do
que os seus colegas de outras secções?
Não. No jornalismo político há profissionais muito menos independentes
do que no desporto. As pessoas têm mais dificuldade em tornar públicas
as suas opções. Não tenho a mínima dúvida isso, tendo-o testemunhado nos
7 anos em que fui deputado.
Tem sido convidado recentemente para comentar as últimas “novelas” do
futebol português. Desde o regresso da selecção do mundial da África do
Sul não tem havido paz. Como explica que a turbulência em torno da
selecção só se tenha resolvido na segunda quinzena de Setembro com a
entrada de Paulo Bento?
Não se fez o que se devia ter feito, ou seja, no dia seguinte à
eliminação com a Espanha a FPF devia ter encetado conversações com
Carlos Queiroz com vista à rescisão do seu contrato. Durante os dois
anos em que foi seleccionador, Queiroz demonstrou não ter condições para
abraçar um projecto tão grandioso e responsável. Primeiro porque se
desligou completamente das camadas jovens. Estou em completo desacordo
quando se anda a dizer que Queiroz é o construtor do edifício do futebol
português. Ele ostracizou completamente o futebol juvenil, tendo
concentrado a sua atenção unicamente na selecção principal.
O percurso de qualificação para o mundial foi penoso, com o
apuramento a surgir no jogo de repescagem. Na África do Sul fomos
eliminados nos oitavos de final pela selecção que se viria a sagrar
campeã do mundo. Que principais erros aponta ao seleccionador?
Foram vários, desde a fase de qualificação, até à escolha dos jogadores
que estiveram na África do Sul. Foi incrível e inenarrável a escolha de
50 jogadores para estágio da Covilhã, depois de 39, depois 23,
posteriormente mais 6. Revelou muita incompetência, tanto do ponto de
vista técnico como comportamental. No fundo, foi esse o principal
argumento que me levou a manifestar a minha oposição à continuidade de
Queiroz.
O caso do controlo anti-doping da Covilhã acaba por ser um episódio
desagradável?
É um “fait-divers”, mas não deixa de ser grave. Uma equipa médica que se
dirige a um estágio de uma selecção, seja ela qual for, cumprir o seu
trabalho não pode ser recebida como o foi por Queiroz. A partir daí
geraram-se conflitos intermináveis.
Para si colhe o argumento da politização do caso?
O secretário de Estado do Desporto tinha que intervir. A Autoridade
anti-dopagem de Portugal (ADoP) está directamente dependente do governo,
os seus elementos foram tratados de forma desagradável e seria no mínimo
surpreendente que Laurentino Dias nada fizesse. Admito que tivesse
exagerado ao dizer na praça pública que estava de acordo com os
castigos, mas no essencial cumpriu o seu papel. Aos que invocam que os
políticos se imiscuem nas questões do futebol, aconselho-os a recuarem
até 1986, a Saltillo, onde houve verdadeiramente politização do futebol.
Estive lá durante dois meses a acompanhar os momentos que antecederam o
mundial do México e recordo-me de tudo o que aconteceu e posso garantir
que aconteceu política.
Quer ser mais concreto?
Existia um bloco de jogadores, claramente conotados com partidos de
esquerda, nomeadamente com o PCP, e que desenvolviam toda a guerra e
difundiam os comunicados, apoiados, a partir de Portugal, por pessoas
que suportavam publicamente as suas tomadas de posição. Não tenho
dúvidas que aconteceu mais política em Saltillo do que na África do Sul.
Justificava-se a viagem-relâmpago de Gilberto Madaíl a Madrid para
obter o sonho impossível de contratar José Mourinho para seleccionador
em part-time?
De vez em quando o futebol português presenteia-nos com episódios
tristes. A operação protagonizada por Madaíl foi ridícula. Era evidente
que José Mourinho não podia aceitar este convite. E há favores que não
podemos pedir, sobretudo quando as pessoas a quem os pedimos não nos
podem dizer que não. Mourinho disse em tempos que o seu grande sonho,
para final de carreira, era treinar Portugal, e perante um convite desta
natureza ele não podia recusar. Mas seria sempre um sim condicionado.
O processo foi mal gerido?
Mal gerido e liderado por um presidente que está em final de mandato,
Gilberto Madaíl, e por um ex-presidente do mesmo organismo federativo,
João Rodrigues, que quero recordar foi expulso da FPF e que não
apresentou as contas do Mundial de juniores de 1991 organizado no nosso
país. E é este o nosso grande «embaixador» junto de importantes
entidades internacionais! É lamentável. O desfecho não podia ser outro.
Só lamento que isto possa ter consequências para a carreira de José
Mourinho no Real Madrid. Pelo acompanhamento que faço na imprensa
desportiva espanhola constato que as posições que Mourinho sobre este
assunto não colheram propriamente reacções de simpatia. Temo que a
partir daqui a sua vida em Madrid se torne menos pacífica. Basta apenas
que os resultados não apareçam. Mourinho é o melhor treinador do mundo,
tendo roubado o protagonismo inclusive ao próprio Cristiano Ronaldo, e
pode manter-se neste patamar durante muito tempo, mas há que reconhecer
que deu um passo em falso.
Pensa que Paulo Bento é uma boa solução ou é a solução possível?
Paulo Bento é a melhor solução do momento, e depois de José Mourinho ter
deixado de ser hipótese, ainda que transitória. Como já vimos, o
ex-treinador do Sporting reúne o consenso de praticamente todos os
agentes do futebol, dispondo por isso da possibilidade de trabalhar com
tranquilidade. A tarefa que o espera reveste-se de enormes dificuldades,
mas se conseguir passar o “Rubicão” são muitas as hipóteses de ir além
dos dois anos previstos no actual contrato.
Mourinho e Cristiano Ronaldo são duas referências nacionais. É
importante que os dois portugueses mais falados do Planeta sejam afectos
ao mundo do futebol ou seria mais desejável que fossem referências
noutros domínios, como a literatura, a ciência ou a arte?
Já tivemos dois prémios Nobel, um da medicina e outra da literatura.
Para além do futebol, temos pessoas importantes. Estou a lembrar-me do
médico neurologista, António Damásio, a viver nos Estados Unidos. Só que
o futebol tem um mediatismo extraordinário e sem paralelo que permite
galgar fronteiras e estar mais próximo das pessoas, estejam elas onde
estiverem. Veja o caso do pequeno Martunis, um sobrevivente do tsunami
na Indonésia, que apareceu junto dos escombros com uma camisola da
selecção nacional vestida. O futebol está em todo o lado e as grandes
tecnologias deram um importante empurrão a esta projecção.
Pese embora existir Mourinho e Ronaldo estamos longe de ser uma
potência desportiva. Mais sucesso têm tido os nossos vizinhos espanhóis
que ergueram uma autêntica fábrica de campeões. Como foi possível?
Os espanhóis seguiram uma política desportiva, iniciada com vista aos
Jogos ; Olímpicos de Barcelona, em 1992, que nós, manifestamente, nunca
tivemos. Portugal não tem condições, nem vocação. Existimos enquanto
povo para ser sempre completamente contraditórios. Raramente conseguimos
estar todos do mesmo lado. Está no nosso ADN. Apenas durante o
«consulado» de Scolari à frente da selecção é que vi o país quase todo a
puxar por um objectivo, exceptuando os «dissidentes» do projecto,
descontentes com a exclusão de Vítor Baia dos convocados.
Não está estafado o argumento da falta de apoios e de estruturas?
O desporto está litoralizado. Para além de Coimbra não há desporto. Na
Beira Interior não existe ou é praticado a retalho. Tivemos a iminência
de ter um estádio em Viseu, aquando do Euro 2004, mas a candidatura do
estádio de Aveiro acabou por sair vitoriosa. Então, um homem que diz que
é da Beira, o actual Primeiro-Ministro e que detinha a pasta do
desporto, optou por Aveiro, mesmo sabendo que o projecto de Viseu
apresentava melhores condições.
Como explica os fenómenos isolados de grandes desportistas que ainda
vamos tendo, por exemplo, no atletismo?
Os fenómenos Carlos Lopes, Rosa Mota, Fernando Mamede e Nélson Évora são
excepções. Eu chamo-lhes estrelas de geração espontânea, que têm o seu
período de vida e quando desaparecem não deixam sucessores. É este o
nosso triste panorama.
Porquê essa falta de sequência?
Isso deve-se à inexistência de uma política de desporto em Portugal.
Termos muitos pavilhões construídos pelas autarquias, espalhados um
pouco pelo país, mas que não permitem a prática de muitas modalidades e
são pouco utilizados. Lembro-me que há alguns anos estive numa pequena
cidade galega, Orense, durante uma prova de ciclismo e o pavilhão
desportivo desta localidade não tem comparação com nenhum outro do nosso
país. Está preparado para todas as modalidades e tem uma dimensão
enorme.
Após as primeiras jornadas o FC Porto surge destacado na liderança do
campeonato. Estava à espera?
Foi um começo atípico. O FC Porto está a demonstrar uma grande pujança,
mas aguardava um melhor Benfica e um muito melhor Sporting. O campeão em
título quebrou com as baixas de Di Maria e Ramirez. Tem vindo a
melhorar, mas ainda não é suficiente. O Sporting tem sido uma desilusão
e acredito que vai existir contestação ao treinador, que se estenderá à
direcção do clube. O FC Porto, não podendo ainda encomendar as faixas,
está com grandes possibilidades de recuperar o título de campeão perdido
na época transacta para o seu rival de Lisboa.
E o Braga continuará a ser um outsider?
Não acredito. A participação na Liga dos Campeões vai passar factura
como já se está a ver.
Assumiu funções de deputado em 2003, depois da saída de Maria Elisa.
Como foi a experiência numa altura em que se critica tanto a performance
dos nossos parlamentares. É só uma questão de má imagem?
Exagera-se muito nas apreciações que se fazem dos deputados da nação.
Temos um Parlamento de acordo com o nosso ordenamento territorial. Creio
que haveria necessidade de redistribuir algumas funções. Os deputados,
tal como hoje são eleitos, têm menos possibilidades de ser solicitados
para determinadas tarefas, sobretudo quando os grupos parlamentares são
maiores. Recordo-me que durante a minha passagem pelo Parlamento,
enquanto eleito por Castelo Branco, estive no meu distrito no primeiro
mandato ajudado por um colega, e no segundo estive completamente
sozinho. Tinha de acorrer a todas as frentes no distrito e acumular
essas solicitações com as obrigações em S. Bento, nomeadamente nas
comissões parlamentares e em tudo o que se relacionasse com as temáticas
do desporto.
Que acção concreta teve no distrito de Castelo Branco?
Durante a minha passagem pelo Parlamento fiz cerca de 500 requerimentos
relacionados com o distrito de Castelo Branco, sobre estradas, escolas
degradadas ou em risco de encerramento, maternidades, hospitais, forças
de segurança, equipamentos culturais, etc. Muitas vezes não obtive
resposta de um governo maioritário e com tiques ditatoriais.
A sua participação na Comissão Parlamentar de Educação permitiu-lhe
conhecer de perto os problemas do sector. O que é que o chocou mais?
Fiquei com má impressão da ministra de Educação de então, Maria de
Lurdes Rodrigues, que fazia sempre prevalecer as suas determinações e
pontos de vista. O Estatuto do Aluno continha aspectos inaceitáveis, que
só seriam emendados pelo governo socialista seguinte. Aprendi muito
sobre este sector, visitando muitas escolas, senti de perto os problemas
dos professores e acompanhei com proximidade a iniciativa «Parlamento
dos jovens».
A reorganização do parque escolar tem levantado grande celeuma.
Aceita que seja o factor racionalização a prevalecer?
Aceito que havia necessidade de reorganizar o parque escolar, encerrando
alguns estabelecimentos. Aliás, o próprio PSD já o tinha feito em
executivos anteriores. Creio é que se foi longe demais e exagerou-se,
cortando-se vínculos difíceis de reatar, criando uma ruptura na relação
escolar entre quem manda e quem está por baixo, dificilmente reversível.
Com a particularidade de as autarquias não terem sido ouvidas e quererem
agora atirar-lhes com o ónus das despesas dos transportes escolares.
Lamento que as autarquias, uma peça fundamental na nossa organização
democrática, não sejam ouvidas em assuntos fulcrais.
No que diz respeito às saídas profissionais na área do jornalismo é
sabido que as redacções dificilmente absorvem mais recursos humanos.
Aparecem muitos jovens que querem tentar a sua sorte na redacção da RR?
A procura é muito grande e as redacções estão cheias, integrando, não
raro, pessoas com menos valor do que seria desejável. Aqui na Renascença
quando abrimos concursos aparecem largas centenas de candidatos.
Abriram-se para os jovens ilusões que não eram realizáveis, sobretudo
quando surgiram as televisões privadas. Construíram-se sonhos que podiam
ser «estrelas» na televisão, nos jornais e na rádio. Paralelamente,
deu-se cobertura à criação dos mais variados cursos de Comunicação
Social, sabendo-se de antemão que o mercado não daria vazão, na área
estrita do jornalismo, a tanta gente. Perante isto, os licenciados
começaram a reorientar as suas saídas para outras áreas, umas mais
próximas e outras mais distanciadas da sua escolha inicial.
O nível qualitativo da Comunicação Social ressente-se desta
competição desenfreada?
Como não podia deixar de ser. São admitidas pessoas com menos qualidade
o que contribui para degradar a qualidade de muitos órgãos de
comunicação social. Encontramos nos jornais e nos rodapés das televisões
erros ortográficos verdadeiramente inaceitáveis. Talvez a solução a
curto prazo seja encerrar cursos que não têm razão de existir e que se
limitam a formar pessoas, sem existir qualquer perspectiva ou garantia
de as colocar no mercado.
A entrada dos grupos económicos no negócio dos «media» condicionou a
qualidade?
Sem dúvida. Não pode ser dissociável essa ligação. Os grupos económicos
ameaçam quase diariamente com despedimentos, redução de quadros, etc.
Eles não estão para perder dinheiro e como a sua actividade abarca
múltiplas áreas, se perdem num determinado lado querem recuperar
rapidamente noutro. Esta lógica atinge a Comunicação Social, com a
agravante de o mercado publicitário hoje estar muito mais reduzido e
sobretudo mais dividido. A consequência disso é a baixa das receitas,
que sentimos aqui na RR. Os reajustamentos nos quadros é normalmente
feito em prejuízo dos jornalistas. Com tantos constrangimentos, é
natural que o produto final seja beliscado.
A massificação do acesso à internet também prejudicou a Comunicação
Social em termos de modelo de negócio instalado?
Hoje é possível ler os jornais de todo o mundo através do ecrã de um
computador e ouvir as emissões radiofónicas. Quando estive em África
adquiri o hábito de ouvir rádios brasileiras, e agora, muitos anos
depois, já em Portugal, recuperei essa tradição. Todos os fins-de-semana
dispenso algumas horas a ouvir as emissões de rádios brasileiras. Ontem
à noite estive madrugada dentro a seguir pela internet o relato da Rádio
Globo do clássico dos clássicos entre o Fluminense e o Flamengo, narrado
pelo José Carlos Araújo, um profissional muito competente, do qual sou
muito amigo.
Nuno Dias da Silva
Direitos Reservados
Cara da Notícia
Ribeiro Cristóvão
nasceu em Proença-a-Nova a 7 de Julho de 1939. Iniciou em Angola a
sua carreira jornalística na Rádio Clube do México. Foi para o Rádio
Clube do Huambo e ficou lá até Setembro de 1975. Trabalhou durante
12 anos na empresa cervejeira Cuca, tendo sido o responsável pelo
Departamento de relações públicas da Fábrica Nova Lisboa. Regressado
a Portugal, ingressou na Rádio Renascença, em Fevereiro de 1976. Na
emissora católica portuguesa foi chefe de redacção durante vários
anos. Participou em diversas reportagens de grande envergadura, das
quais se destacam visitas papais. Foi repórter na Assembleia da
República, durante quatro anos, entre 1977 e 1981. Foi um dos
fundadores do Departamento Desportivo da Rádio Renascença onde foi
responsável pela criação dos programas “Bola Branca” e “Frente
Desportiva”. Desempenhou funções de Director do Departamento de
desporto.
Na televisão, entrou, como colaborador, para a RTP, em 1982, ficando
ali até 1994. Apresentou os programas “Troféu”, na sua fórmula
inicial, “Girabola” e “Domingo Desportivo” Foi ainda responsável
pela edição diária e apresentação do programa “Remate” durante
vários anos.
Colaborou na RTP Internacional e RTP África, editando e apresentando
programas como “Primeira Mão” e “Bancada Aberta”, destinados
especialmente às comunidades portuguesas radicadas no estrangeiro.
De 2001 até 2005 foi presidente da Assembleia Municipal de
Proença-a-Nova. Como deputado do PSD, eleito pelo círculo de Castelo
Branco (2003-2009), cargo que ocupou após substituir a jornalista
Maria Elisa, pertenceu à Comissão de Educação, Ciência e Cultura e à
Comissão do Euro 2004. Actualmente reformado, é assessor e
colaborador permanente da RR, sem funções executivas, mas com uma
ligação «continuadamente profunda», como se orgulha de dizer, à
emissora católica portuguesa. É também colaborador regular da
SIC-Notícias em comentários sobre futebol.
Do seu currículo consta ainda uma Medalha de Mérito Desportivo.
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