Director Fundador: João Ruivo    Director: João Carrega    Publicação Mensal    Ano XIII    Nº152   Outubro 2010

Entrevista

RIBEIRO CRISTÓVÃO, JORNALISTA E EX-DEPUTADO

"Não há uma política desportiva no nosso País"

Ribeiro Cristóvão foi o rosto e a voz de programas desportivos de referência na televisão e na rádio portuguesa. O jornalista afirma que não há política para o desporto no nosso país, com o interior a ser sucessivamente esquecido, e que os campeões que surgem ocasionalmente, são estrelas de geração espontânea. Ribeiro Cristóvão acredita que o FC Porto vai recuperar o título e está convencido que o seleccionador Paulo Bento pode ficar mais de dois anos no comando da selecção das quinas se «conseguir passar o “Rubicão”». O antigo deputado eleito pelo círculo de Castelo Branco entende ainda que a opinião pública exagera nas críticas depreciativas que tece aos parlamentares com assento em S. Bento.

Em 1980 fundou, juntamente com Artur Agostinho, o departamento de desporto da Rádio Renascença (RR). Deu origem a programas de referência como «Bola Branca» e «Frente Desportiva», que ainda se mantêm no ar. Como explica essa longevidade de três décadas?

Lembro-me que quando criámos a «Bola Branca» não havia nada atractivo no panorama da informação desportiva nacional. Quisemos ser uma alternativa aos jornais. Nessa altura, a rádio era um bom meio para chegar às pessoas. Começámos logo com uma equipa muito profissional e competente, que desde o início, procurou produzir uma informação rigorosa, séria e actualizada. Foram estes três vectores que nos permitiram fidelizar um determinado mercado ao longo de 30 anos.

Neste momento a «Bola Branca» é o programa mais antigo da rádio portuguesa e uma referência no panorama desportivo, com 8 edições ao longo do dia, das 7h30 às 22h30.

A equipa da Renascença auto-denominou-se durante muito tempo a «super equipa desportiva». Porquê?

Porque contávamos com nomes muito populares da rádio, sobretudo dois expoentes máximos da informação: o Artur Agostinho e o Alves dos Santos, que também ficou conhecido por «o comentador que o país inteiro consagrou». Para além de mim, estava também o Romeu Correia, ou seja, pessoas que tinham conquistado algum bom nome junto da comunidade ouvinte.

Como é que lidaram com o aparecimento das rádios locais e regionais?

Sofremos uma forte concorrência com o surgimento desses novos órgãos de informação, mas isso só contribuiu para espevitar o nosso trabalho de forma a ficarmos atentos. Ainda hoje conservamos a liderança radiofónica da informação desportiva nacional.

Qual foi o trabalho da sua carreira que mais o marcou?

Provavelmente o relato que fiz da final da Taça dos Campeões, em 1987, em que o FC Porto venceu o Bayern de Munique, em Viena. Nunca tinha estado numa final com tamanha importância e ainda para mais quando se verificou uma vitória de uma equipa portuguesa. Quando se ganha as recordações ficam-nos mais vivas na memória. Foi o momento mais marcante da minha carreira na rádio. Mas não esqueço os vários europeus de futebol (1984, 1996, 2000, 2004 e 2008) e os mundiais (1986 e 2006) onde marquei presença e onde se escreveram páginas indeléveis para o nosso país. No ciclismo fiz também mais de 20 voltas a Portugal em bicicleta. Sendo uma prova que se disputa anualmente em Agosto, era um escape ao frenesim do futebol, permitindo-nos viajar diariamente de terra em terra, conhecendo pessoas, gostos, gastronomias e hábitos diferentes.

Como lidou com a exposição televisiva derivada da apresentação que fez do «Domingo Desportivo» nos anos 80?

Foi uma exposição diferente da radiofónica, necessariamente mais agressiva e responsabilizada. Entrei na televisão, em 1982, a convite do Adriano Cerqueira e do José Eduardo Moniz. Sem experiência alguma, fiz um pequeno teste e alguns dias depois estava a fazer o «Troféu», um programa com 4 horas de duração. Um mês depois comecei a apresentar o «Domingo Desportivo» ; que foi durante muito tempo o programa mais marcante da televisão portuguesa. Era o único que transmitia os resumos dos jogos do campeonato de futebol e as restantes modalidades. Não havia mais nada. Ainda hoje as pessoas quando me encontram na rua falam do «Domingo Desportivo». Não escondo o enorme orgulho que tive por ter sido o seu apresentador. Também fiz o «Remate», que era uma espécie de «Bola Branca» na televisão, que ia para o ar por volta da meia-noite, onde se fazia uma súmula da informação desportiva do dia. Saía das instalações da RR no Chiado e ia para os estúdios da RTP no Lumiar fazer o «Remate».

Lembro-me que o «Domingo Desportivo» era transmitido a horas tardias devido a autênticas aventuras com as filmagens dos jogos, numa altura em que não havia o envio de imagens por satélite. Quer explicar-nos essa odisseia semanal?

Havia dificuldades com certas reportagens de jogos realizados em Chaves, Portimão, Elvas e cujas cassetes chegavam aos estúdios de Lisboa já depois do jantar, devido às deficientes acessibilidades que o país então possuía. Muitas vinham de mota a uma velocidade desabrida, especialmente quando «O Elvas» estava na primeira divisão. Nos estúdios do Lumiar era preciso improvisar em directo, à espera que fosse ultimada a montagem do resumo do jogo. Para aumentar as dificuldades, nos anos 80 existiam duas fitas, a do som e da imagem, e era preciso sincronizar ambas para completar o resumo. Eram outros tempos, com histórias inesquecíveis. Agora tudo mudou, com os satélites e com os canais de desporto que transmitem tudo em directo.

É sportinguista assumido. Vai fazer 55 anos de associado em Novembro. Existe preconceito por parte dos jornalistas em divulgarem a sua cor clubística?

Agora menos, porque também há mais jornalistas desportivos. Mas no meu tempo isso era um assunto que preocupava as pessoas. Entendi sempre que não devia fugir daquilo que era. Disse sempre qual era a minha cor partidária e qual o meu clube preferido. Nunca me envergonhei por isso. Fui sempre crítico do Sporting, quando devia ser, como o fui do FC Porto e do Benfica. Posso garantir que consegui, sempre de consciência tranquila, ser imparcial e honesto.

Partilha da opinião que a imprensa desportiva é demasiado benevolente e macia na denuncia de certos casos menos claros e opacos que afectam o futebol português, cabendo esse papel aos meios de comunicação social generalistas?

A imprensa desportiva nacional é pouco agressiva. Deu sempre a sensação de estar conotada com alguns clubes. Se compararmos com a imprensa desportiva espanhola constata-se que a do país vizinho é mais incisiva, o que obriga os leitores e a opinião pública em geral, a manterem uma vigilância permanente.

Em Espanha os jornais desportivos não sendo órgãos oficiais de clubes, são, pelo menos, oficiosamente. Advoga que o mesmo se passasse em Portugal?

Há uma tendência visível de veicular determinadas mensagens de certos clubes, mas que não é anunciada e assumida. Admito que esta aparente dependência traga alguns dividendos monetários, mas no reverso da medalha, é provável que a margem de manobra de quem escreve seja menor. Acredito que actualmente existem questões comerciais subjacentes que obrigam a percorrer caminhos que há alguns anos atrás não seriam os mesmos. Mas veja também que o mercado é muito maior em Espanha. A «Marca» pode chegar a vender 700 mil exemplares por dia, enquanto cá dificilmente qualquer um dos nossos desportivos supera os 100 mil jornais.

Os jornalistas especializados em futebol são menos independentes do que os seus colegas de outras secções?

Não. No jornalismo político há profissionais muito menos independentes do que no desporto. As pessoas têm mais dificuldade em tornar públicas as suas opções. Não tenho a mínima dúvida isso, tendo-o testemunhado nos 7 anos em que fui deputado.

Tem sido convidado recentemente para comentar as últimas “novelas” do futebol português. Desde o regresso da selecção do mundial da África do Sul não tem havido paz. Como explica que a turbulência em torno da selecção só se tenha resolvido na segunda quinzena de Setembro com a entrada de Paulo Bento?

Não se fez o que se devia ter feito, ou seja, no dia seguinte à eliminação com a Espanha a FPF devia ter encetado conversações com Carlos Queiroz com vista à rescisão do seu contrato. Durante os dois anos em que foi seleccionador, Queiroz demonstrou não ter condições para abraçar um projecto tão grandioso e responsável. Primeiro porque se desligou completamente das camadas jovens. Estou em completo desacordo quando se anda a dizer que Queiroz é o construtor do edifício do futebol português. Ele ostracizou completamente o futebol juvenil, tendo concentrado a sua atenção unicamente na selecção principal.

O percurso de qualificação para o mundial foi penoso, com o apuramento a surgir no jogo de repescagem. Na África do Sul fomos eliminados nos oitavos de final pela selecção que se viria a sagrar campeã do mundo. Que principais erros aponta ao seleccionador?

Foram vários, desde a fase de qualificação, até à escolha dos jogadores que estiveram na África do Sul. Foi incrível e inenarrável a escolha de 50 jogadores para estágio da Covilhã, depois de 39, depois 23, posteriormente mais 6. Revelou muita incompetência, tanto do ponto de vista técnico como comportamental. No fundo, foi esse o principal argumento que me levou a manifestar a minha oposição à continuidade de Queiroz.

O caso do controlo anti-doping da Covilhã acaba por ser um episódio desagradável?

É um “fait-divers”, mas não deixa de ser grave. Uma equipa médica que se dirige a um estágio de uma selecção, seja ela qual for, cumprir o seu trabalho não pode ser recebida como o foi por Queiroz. A partir daí geraram-se conflitos intermináveis.

Para si colhe o argumento da politização do caso?

O secretário de Estado do Desporto tinha que intervir. A Autoridade anti-dopagem de Portugal (ADoP) está directamente dependente do governo, os seus elementos foram tratados de forma desagradável e seria no mínimo surpreendente que Laurentino Dias nada fizesse. Admito que tivesse exagerado ao dizer na praça pública que estava de acordo com os castigos, mas no essencial cumpriu o seu papel. Aos que invocam que os políticos se imiscuem nas questões do futebol, aconselho-os a recuarem até 1986, a Saltillo, onde houve verdadeiramente politização do futebol. Estive lá durante dois meses a acompanhar os momentos que antecederam o mundial do México e recordo-me de tudo o que aconteceu e posso garantir que aconteceu política.

Quer ser mais concreto?

Existia um bloco de jogadores, claramente conotados com partidos de esquerda, nomeadamente com o PCP, e que desenvolviam toda a guerra e difundiam os comunicados, apoiados, a partir de Portugal, por pessoas que suportavam publicamente as suas tomadas de posição. Não tenho dúvidas que aconteceu mais política em Saltillo do que na África do Sul.

Justificava-se a viagem-relâmpago de Gilberto Madaíl a Madrid para obter o sonho impossível de contratar José Mourinho para seleccionador em part-time?

De vez em quando o futebol português presenteia-nos com episódios tristes. A operação protagonizada por Madaíl foi ridícula. Era evidente que José Mourinho não podia aceitar este convite. E há favores que não podemos pedir, sobretudo quando as pessoas a quem os pedimos não nos podem dizer que não. Mourinho disse em tempos que o seu grande sonho, para final de carreira, era treinar Portugal, e perante um convite desta natureza ele não podia recusar. Mas seria sempre um sim condicionado.

O processo foi mal gerido?

Mal gerido e liderado por um presidente que está em final de mandato, Gilberto Madaíl, e por um ex-presidente do mesmo organismo federativo, João Rodrigues, que quero recordar foi expulso da FPF e que não apresentou as contas do Mundial de juniores de 1991 organizado no nosso país. E é este o nosso grande «embaixador» junto de importantes entidades internacionais! É lamentável. O desfecho não podia ser outro. Só lamento que isto possa ter consequências para a carreira de José Mourinho no Real Madrid. Pelo acompanhamento que faço na imprensa desportiva espanhola constato que as posições que Mourinho sobre este assunto não colheram propriamente reacções de simpatia. Temo que a partir daqui a sua vida em Madrid se torne menos pacífica. Basta apenas que os resultados não apareçam. Mourinho é o melhor treinador do mundo, tendo roubado o protagonismo inclusive ao próprio Cristiano Ronaldo, e pode manter-se neste patamar durante muito tempo, mas há que reconhecer que deu um passo em falso.

Pensa que Paulo Bento é uma boa solução ou é a solução possível?

Paulo Bento é a melhor solução do momento, e depois de José Mourinho ter deixado de ser hipótese, ainda que transitória. Como já vimos, o ex-treinador do Sporting reúne o consenso de praticamente todos os agentes do futebol, dispondo por isso da possibilidade de trabalhar com tranquilidade. A tarefa que o espera reveste-se de enormes dificuldades, mas se conseguir passar o “Rubicão” são muitas as hipóteses de ir além dos dois anos previstos no actual contrato.

Mourinho e Cristiano Ronaldo são duas referências nacionais. É importante que os dois portugueses mais falados do Planeta sejam afectos ao mundo do futebol ou seria mais desejável que fossem referências noutros domínios, como a literatura, a ciência ou a arte?

Já tivemos dois prémios Nobel, um da medicina e outra da literatura. Para além do futebol, temos pessoas importantes. Estou a lembrar-me do médico neurologista, António Damásio, a viver nos Estados Unidos. Só que o futebol tem um mediatismo extraordinário e sem paralelo que permite galgar fronteiras e estar mais próximo das pessoas, estejam elas onde estiverem. Veja o caso do pequeno Martunis, um sobrevivente do tsunami na Indonésia, que apareceu junto dos escombros com uma camisola da selecção nacional vestida. O futebol está em todo o lado e as grandes tecnologias deram um importante empurrão a esta projecção.

Pese embora existir Mourinho e Ronaldo estamos longe de ser uma potência desportiva. Mais sucesso têm tido os nossos vizinhos espanhóis que ergueram uma autêntica fábrica de campeões. Como foi possível?

Os espanhóis seguiram uma política desportiva, iniciada com vista aos Jogos ; Olímpicos de Barcelona, em 1992, que nós, manifestamente, nunca tivemos. Portugal não tem condições, nem vocação. Existimos enquanto povo para ser sempre completamente contraditórios. Raramente conseguimos estar todos do mesmo lado. Está no nosso ADN. Apenas durante o «consulado» de Scolari à frente da selecção é que vi o país quase todo a puxar por um objectivo, exceptuando os «dissidentes» do projecto, descontentes com a exclusão de Vítor Baia dos convocados.

Não está estafado o argumento da falta de apoios e de estruturas?

O desporto está litoralizado. Para além de Coimbra não há desporto. Na Beira Interior não existe ou é praticado a retalho. Tivemos a iminência de ter um estádio em Viseu, aquando do Euro 2004, mas a candidatura do estádio de Aveiro acabou por sair vitoriosa. Então, um homem que diz que é da Beira, o actual Primeiro-Ministro e que detinha a pasta do desporto, optou por Aveiro, mesmo sabendo que o projecto de Viseu apresentava melhores condições.

Como explica os fenómenos isolados de grandes desportistas que ainda vamos tendo, por exemplo, no atletismo?

Os fenómenos Carlos Lopes, Rosa Mota, Fernando Mamede e Nélson Évora são excepções. Eu chamo-lhes estrelas de geração espontânea, que têm o seu período de vida e quando desaparecem não deixam sucessores. É este o nosso triste panorama.

Porquê essa falta de sequência?

Isso deve-se à inexistência de uma política de desporto em Portugal. Termos muitos pavilhões construídos pelas autarquias, espalhados um pouco pelo país, mas que não permitem a prática de muitas modalidades e são pouco utilizados. Lembro-me que há alguns anos estive numa pequena cidade galega, Orense, durante uma prova de ciclismo e o pavilhão desportivo desta localidade não tem comparação com nenhum outro do nosso país. Está preparado para todas as modalidades e tem uma dimensão enorme.

Após as primeiras jornadas o FC Porto surge destacado na liderança do campeonato. Estava à espera?

Foi um começo atípico. O FC Porto está a demonstrar uma grande pujança, mas aguardava um melhor Benfica e um muito melhor Sporting. O campeão em título quebrou com as baixas de Di Maria e Ramirez. Tem vindo a melhorar, mas ainda não é suficiente. O Sporting tem sido uma desilusão e acredito que vai existir contestação ao treinador, que se estenderá à direcção do clube. O FC Porto, não podendo ainda encomendar as faixas, está com grandes possibilidades de recuperar o título de campeão perdido na época transacta para o seu rival de Lisboa.

E o Braga continuará a ser um outsider?

Não acredito. A participação na Liga dos Campeões vai passar factura como já se está a ver.

Assumiu funções de deputado em 2003, depois da saída de Maria Elisa. Como foi a experiência numa altura em que se critica tanto a performance dos nossos parlamentares. É só uma questão de má imagem?

Exagera-se muito nas apreciações que se fazem dos deputados da nação. Temos um Parlamento de acordo com o nosso ordenamento territorial. Creio que haveria necessidade de redistribuir algumas funções. Os deputados, tal como hoje são eleitos, têm menos possibilidades de ser solicitados para determinadas tarefas, sobretudo quando os grupos parlamentares são maiores. Recordo-me que durante a minha passagem pelo Parlamento, enquanto eleito por Castelo Branco, estive no meu distrito no primeiro mandato ajudado por um colega, e no segundo estive completamente sozinho. Tinha de acorrer a todas as frentes no distrito e acumular essas solicitações com as obrigações em S. Bento, nomeadamente nas comissões parlamentares e em tudo o que se relacionasse com as temáticas do desporto.

Que acção concreta teve no distrito de Castelo Branco?

Durante a minha passagem pelo Parlamento fiz cerca de 500 requerimentos relacionados com o distrito de Castelo Branco, sobre estradas, escolas degradadas ou em risco de encerramento, maternidades, hospitais, forças de segurança, equipamentos culturais, etc. Muitas vezes não obtive resposta de um governo maioritário e com tiques ditatoriais.

A sua participação na Comissão Parlamentar de Educação permitiu-lhe conhecer de perto os problemas do sector. O que é que o chocou mais?

Fiquei com má impressão da ministra de Educação de então, Maria de Lurdes Rodrigues, que fazia sempre prevalecer as suas determinações e pontos de vista. O Estatuto do Aluno continha aspectos inaceitáveis, que só seriam emendados pelo governo socialista seguinte. Aprendi muito sobre este sector, visitando muitas escolas, senti de perto os problemas dos professores e acompanhei com proximidade a iniciativa «Parlamento dos jovens».

A reorganização do parque escolar tem levantado grande celeuma. Aceita que seja o factor racionalização a prevalecer?

Aceito que havia necessidade de reorganizar o parque escolar, encerrando alguns estabelecimentos. Aliás, o próprio PSD já o tinha feito em executivos anteriores. Creio é que se foi longe demais e exagerou-se, cortando-se vínculos difíceis de reatar, criando uma ruptura na relação escolar entre quem manda e quem está por baixo, dificilmente reversível. Com a particularidade de as autarquias não terem sido ouvidas e quererem agora atirar-lhes com o ónus das despesas dos transportes escolares. Lamento que as autarquias, uma peça fundamental na nossa organização democrática, não sejam ouvidas em assuntos fulcrais.

No que diz respeito às saídas profissionais na área do jornalismo é sabido que as redacções dificilmente absorvem mais recursos humanos. Aparecem muitos jovens que querem tentar a sua sorte na redacção da RR?

A procura é muito grande e as redacções estão cheias, integrando, não raro, pessoas com menos valor do que seria desejável. Aqui na Renascença quando abrimos concursos aparecem largas centenas de candidatos. Abriram-se para os jovens ilusões que não eram realizáveis, sobretudo quando surgiram as televisões privadas. Construíram-se sonhos que podiam ser «estrelas» na televisão, nos jornais e na rádio. Paralelamente, deu-se cobertura à criação dos mais variados cursos de Comunicação Social, sabendo-se de antemão que o mercado não daria vazão, na área estrita do jornalismo, a tanta gente. Perante isto, os licenciados começaram a reorientar as suas saídas para outras áreas, umas mais próximas e outras mais distanciadas da sua escolha inicial.

O nível qualitativo da Comunicação Social ressente-se desta competição desenfreada?

Como não podia deixar de ser. São admitidas pessoas com menos qualidade o que contribui para degradar a qualidade de muitos órgãos de comunicação social. Encontramos nos jornais e nos rodapés das televisões erros ortográficos verdadeiramente inaceitáveis. Talvez a solução a curto prazo seja encerrar cursos que não têm razão de existir e que se limitam a formar pessoas, sem existir qualquer perspectiva ou garantia de as colocar no mercado.

A entrada dos grupos económicos no negócio dos «media» condicionou a qualidade?

Sem dúvida. Não pode ser dissociável essa ligação. Os grupos económicos ameaçam quase diariamente com despedimentos, redução de quadros, etc. Eles não estão para perder dinheiro e como a sua actividade abarca múltiplas áreas, se perdem num determinado lado querem recuperar rapidamente noutro. Esta lógica atinge a Comunicação Social, com a agravante de o mercado publicitário hoje estar muito mais reduzido e sobretudo mais dividido. A consequência disso é a baixa das receitas, que sentimos aqui na RR. Os reajustamentos nos quadros é normalmente feito em prejuízo dos jornalistas. Com tantos constrangimentos, é natural que o produto final seja beliscado.

A massificação do acesso à internet também prejudicou a Comunicação Social em termos de modelo de negócio instalado?

Hoje é possível ler os jornais de todo o mundo através do ecrã de um computador e ouvir as emissões radiofónicas. Quando estive em África adquiri o hábito de ouvir rádios brasileiras, e agora, muitos anos depois, já em Portugal, recuperei essa tradição. Todos os fins-de-semana dispenso algumas horas a ouvir as emissões de rádios brasileiras. Ontem à noite estive madrugada dentro a seguir pela internet o relato da Rádio Globo do clássico dos clássicos entre o Fluminense e o Flamengo, narrado pelo José Carlos Araújo, um profissional muito competente, do qual sou muito amigo.

Nuno Dias da Silva
Direitos Reservados

 


Cara da Notícia
 

Ribeiro Cristóvão nasceu em Proença-a-Nova a 7 de Julho de 1939. Iniciou em Angola a sua carreira jornalística na Rádio Clube do México. Foi para o Rádio Clube do Huambo e ficou lá até Setembro de 1975. Trabalhou durante 12 anos na empresa cervejeira Cuca, tendo sido o responsável pelo Departamento de relações públicas da Fábrica Nova Lisboa. Regressado a Portugal, ingressou na Rádio Renascença, em Fevereiro de 1976. Na emissora católica portuguesa foi chefe de redacção durante vários anos. Participou em diversas reportagens de grande envergadura, das quais se destacam visitas papais. Foi repórter na Assembleia da República, durante quatro anos, entre 1977 e 1981. Foi um dos fundadores do Departamento Desportivo da Rádio Renascença onde foi responsável pela criação dos programas “Bola Branca” e “Frente Desportiva”. Desempenhou funções de Director do Departamento de desporto.

Na televisão, entrou, como colaborador, para a RTP, em 1982, ficando ali até 1994. Apresentou os programas “Troféu”, na sua fórmula inicial, “Girabola” e “Domingo Desportivo” Foi ainda responsável pela edição diária e apresentação do programa “Remate” durante vários anos.

Colaborou na RTP Internacional e RTP África, editando e apresentando programas como “Primeira Mão” e “Bancada Aberta”, destinados especialmente às comunidades portuguesas radicadas no estrangeiro. De 2001 até 2005 foi presidente da Assembleia Municipal de Proença-a-Nova. Como deputado do PSD, eleito pelo círculo de Castelo Branco (2003-2009), cargo que ocupou após substituir a jornalista Maria Elisa, pertenceu à Comissão de Educação, Ciência e Cultura e à Comissão do Euro 2004. Actualmente reformado, é assessor e colaborador permanente da RR, sem funções executivas, mas com uma ligação «continuadamente profunda», como se orgulha de dizer, à emissora católica portuguesa. É também colaborador regular da SIC-Notícias em comentários sobre futebol.

Do seu currículo consta ainda uma Medalha de Mérito Desportivo.
 

seguinte >>>


© 2002-2010    RVJ Editores, Lda.