VIII CONGRESSO DA
SOCIEDADE PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO
Palavra do Presidente

A vossa iniciativa incidirá sobre temáticas a que venho dedicando a maior atenção ao longo dos meus mandatos e que tenho, reiteradamente, considerado de importância vital para o desenvolvimento da sociedade portuguesa.
Num tempo de tantas mudanças e num mundo cada vez mais competitivo, a aposta na educação é o grande desafio estratégico. Porque é através da educação e da formação que podemos caminhar no sentido de diminuir os processos de exclusão, dar voz às aspirações das pessoas, modernizar a economia, a cultura e a sociedade.
A educação enfrenta no nosso país, problemas que se prendem nomeadamente com a dificuldade de concretização efectiva de uma escolaridade longa e de qualidade para todos e, também, com as baixas qualificações dos portugueses. Apesar dos progressos realizados neste domínio pelo regime democrático as estatísticas mostram que temos um longo percurso a realizar ainda.
Tenho contactado, ao longo dos anos, com processos de exclusão educativa que me marcaram pelo seu dramatismo. É preciso que essas situações sejam melhor estudadas e compreendidas porque apresentam em geral grande complexidade.
Existem, felizmente, muitas situações positivas que nos permitem ter esperança. Encontrei ao longo dos anos equipas docentes e redes de trabalho que mostram, através de projectos que realizam, que temos capacidade de resolver os problemas da educação e da formação.
A solidez dessas situações requer uma maior cultura de avaliação e de acompanhamento da mudança.
O vosso contributo é muito importante quer para o estudo dos problemas educativos concretos do nosso país quer para a definição e acompanhamento de estratégias para a sua solução.
Conto com o vosso empenho e com o vosso conhecimento para que Portugal ganhe a mais decisiva batalha da nossa democracia: a batalha da educação.
Com as melhores saudações.

Jorge Sampaio
Lisboa, 7 de Abril de 2005
JOSÉ AUGUSTO PACHECO,
PRESIDENTE DA SPCE
A educação não
está em crise

A arquitectura curricular rígida, fortemente centralizada no Ministério da Educação, deve ser flexibilizada rapidamente, mas de uma forma diferente da que foi desenvolvida nos últimos seis anos. Ao mesmo tempo, é necessário alterar os conteúdos, transportando para o interior da escola os conhecimentos do quotidiano, de modo a que os alunos saibam relacionar o que aprendem com aquilo que precisam de saber para a sua integração na sociedade do conhecimento.
A opinião é de José Augusto Pacheco, o presidente da Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação, segundo o qual é por aqui, e não através da realização de mais exames, que será possível alterar os processos de aprendizagem e, consequentemente, os resultados finais dessa aprendizagem. Algo que permitirá que o país passe a figurar de modo mais positivo nos estudos internacionais. Em entrevista ao Ensino Magazine, aquele responsável refere ainda que é necessário reorganizar a rede de formação de professores, mas nunca suspender a formação.
Fala-se hoje muito numa crise das ciências da educação, sobretudo devido aos problemas da formação de professores. Concorda com essa leitura?
A ideia de uma crise talvez não se justifique porque, nos últimos anos, tem havido uma produção científica muito significativa. A questão é que neste momento, em Portugal, as comunidades científicas têm muitas dificuldades em se afirmarem em termos de especialização, de passagem de mensagem, em passarem, para a sociedade o conhecimento que cultivam no seu interior. Neste caso, a crise hipotética das ciências da educação será idêntica à crise que todas as comunidades científicas atravessam neste momento.
Podemos falar numa falta de divulgação da produção científica na área das ciências da educação?
Há uma falta de divulgação, mas não só. Acontece que as questões educativas são, cada vez mais, analisadas pelo senso comum, sem o recurso a especialistas das ciências da educação. Nos debates que temos nos meios de comunicação social, com particular relevo para a televisão, não vemos a presença contínua de especialistas da educação. Esses debates estão sobretudo centrados em fazedores de opinião, que têm da educação uma perspectiva de senso comum.
É então necessário chamar os especialistas em ciências da educação aos grandes debates nacionais…
Seria necessário que as questões educativas incorporassem também especialistas do campo da educação.
O secretário de Estado da Educação recordou no Congresso os fracos desempenhos de Portugal nos diferentes índices educativos em termos europeus. Como é que analisa esses resultados?
A questão que se coloca, ao nível de dados da OCDE e do PISA; está centrada essencialmente nos resultados comparativos em termos internacionais. Trata-se de algo que as ciências da educação vêem com preocupação, pois todos temos de reconhecer que há debilidades no sistema educativo e que, porventura, os resultados são a face mais visível dessas debilidades.
Antevê alguma solução para alterar a posição de Portugal nesses estudos?
A solução não está na realização de mais exames, mas encontra-se na procura da melhoria dos processos de aprendizagem. Os resultados são e devem ser uma preocupação de todas as pessoas ligadas à educação, desde pais, professores e outros intervenientes. Mas essa preocupação deve ser alargada à questão do conhecimento e dos conteúdos escolares. Não poderemos melhorar resultados de aprendizagem se não alterarmos os conteúdos escolares, se não alterarmos a arquitectura curricular, que está baseada em planos e conteúdos escolares. Os governos preocupam-se com a questão dos resultados, mas não poderão atingir outros patamares se, entretanto, não alterarem essas questões.
Essas alterações passarão por flexibilizar a arquitectura curricular e apostar em conteúdos que levem mais mundo para dentro da escola?
O caso concreto da Irlanda é apresentado hoje como o modelo dos resultados escolares, mas é preciso dizer que, num primeiro estudo, esse país apresentou resultados muito inferiores à média. A evolução aconteceu devido a uma alteração significativa dos conteúdos. Em Portugal não. A arquitectura curricular é muito centralizada no Ministério da Educação. A experiência de flexibilização curricular dos últimos seis anos não conduziu aos efeitos desejadas, pois trata-se de algo muito rígido, em que tudo é administrativamente controlado. Por outro lado, os conteúdos continuam a ser muito académicos. Não integram, como você disse, essa perspectiva real do mundo, da vida.
Como é que os conteúdos mais ligados ao mundo podem ser implementados na escola portuguesa?
Os conteúdos que fazem partes dos testes que servem de base aos rankings internacionais são aqueles que fazem parte do quotidiano das pessoas. Por exemplo, em Matemática é preciso saber consultar o horário dos caminhos-de-ferro, utilizar equações necessárias para tomas decisões. Para que estes conteúdos sejam implementados, falta que a escola transporte para o seu interior o quotidiano das pessoas em termos de conhecimento. É que tem havido um grande desfasamento entre aquilo que a escola veicula em termos de conhecimento especializado, e aquilo que o aluno necessita saber para a integração numa sociedade que exige cada vez mais conhecimento, mas um conhecimento contextualizado.
Outro problema das ciências da educação está relacionado com a suspensão continuada de cursos de formação de professores. Pensa que essas suspensões poderão criar problemas no futuro?
Essa situação já aconteceu quando o Ministério da Educação decretou o encerramento dos cursos de professores do 1º Ciclo nas instituições de ensino público. Na altura surgiram os cursos de complemento de formação, através dos quais os professores do 1º Ciclo puderam optar pelo 2º Ciclo, verificando-se falta de professores no 1º. A questão que se coloca neste momento não será por isso a de encerrar cursos, mas a de os redimensionar em termos de instituições, seja no ensino público, seja no privado. Hoje necessitamos de menos professores no sistema, mas não podemos terminar a formação de professores, pois ela será sempre necessária.

VALTER LEMOS, SECRETÁRIO
DE ESTADO DA EDUCAÇÃO
Portugal mais
qualificado

Valter Lemos, secretário de Estado da Educação, considera que “o maior desafio que se coloca a Portugal é aumentar a qualificação da população, o que deve ser feito de forma rápida, de modo a tirar o nosso país da cauda da Europa”. No entender daquele responsável, não é “intenção do Ministério da Educação fazer uma revolução na educação, nem a altura para anunciar grandes reformas. O objectivo que nos move é o de promover melhorias sensíveis e visíveis nas aprendizagens, na organização e na avaliação do sistema escolar”.
Para o Secretário de Estado da Educação, há metas claras, que passam pela “melhoria dos resultados escolares e pelo aumento da qualificação dos portugueses, pois há 1,8 milhões de portugueses sem qualificação ou com níveis muito baixos de qualificação e este índice atira Portugal para a cauda dos 25 países da União Europeia”.
Valter Lemos falou ao Ensino Magazine, em Castelo Branco, durante a abertura do VIII Congresso da Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação. Para o governante, “é importante inverter essa situação, pelo que o aumento da qualificação dos portugueses deve ser feita rapidamente”.
O secretário de Estado da Educação lembrou que “todos temos lutado pela melhoria das aprendizagens e das condições em que elas se realizam”. De acordo com Valter Lemos há outro aspecto que deve ser tido em conta e que passa pela melhoria dos resultados alcançados pelos alunos portugueses no âmbito internacional. “Por isso devem adoptar-se medidas bem centradas, nalguns casos cirúrgicas”.
TEMPOS. Uma das medidas anunciadas por Valter Lemos passa pelo aproveitamento pleno dos tempos escolares. A ideia do Governo passa por evitar que os alunos, quando, por qualquer motivo ficam sem aulas durante um período de tempo, fiquem sem actividades lectivas. “Por vezes os alunos ficam libertos das actividades lectivas, o que cria prejuízos à aprendizagem. Por isso, o Ministério da Educação vai fazer com que esses estudantes desempenham outras actividades”.
Aquela medida será implementada com “o aproveitamento correcto dos recursos existentes nas escolas. Os nossos estabelecimentos de ensino dispõem de recursos humanos e materiais significativos, pelo que importa, através de um conjunto de medidas, possam ser mais rentabilizados. Isto para que os estudantes, enquanto estiverem na escola estejam em actividades de aprendizagem dirigida, evitando que fiquem entregues a si próprios quando tiverem um «feriado»”.
O Secretário de Estado da Educação sublinha que o tempo, na aprendizagem, é o maior “recurso que existe, pelo que desperdiçá-lo é um erro grave em termos de resultados escolares. Há um conjunto de estruturas e actividades nas escolas que articuladas vão dar resposta ao nosso objectivo”.
Outra das novidades divulgadas por Valter Lemos passa por introduzir a aprendizagem da língua inglesa no 1º Ciclo do Ensino Básico. “Essa medida está relacionada com os objectivos de formação dos portugueses no mundo moderno. Mas é também uma medida que pretende melhoria do ensino e dos currículos do 1º ciclo. É importante intervencionar a este nível de escolaridade, pelo que o Ministério irá tomar um conjunto de medidas como esta já no próximo ano escolar”.
De acordo com o Secretário de Estado, “o objectivo é que a medida seja generalizada a todas as crianças portuguesas do 1º ciclo ao longo dos próximos anos, mas em 2005/2006 queremos ter já muitos alunos abrangidos”. A medida será, no entanto extra-curricular.
EXAMES. A manutenção dos exames no 9º, que se realizarão pela primeira vez, também é dada como certa por Valter Lemos. “O pressuposto que era possível mexer nesta matéria está errado. Os exames estavam previstos e vão ser feitos nessas condições. Muitos milhares de professores e alunos têm estado a trabalhar para isso, pelo que seria injusto e insensato não os fazer”.
Contudo, o governante lembra que há excepções, casos dos alunos com necessidades educativas especiais, com currículos alternativos ou para estrangeiros que estejam há menos de dois anos no sistema de ensino português. “Estas excepções são decretadas por razões técnicas, pois esses alunos precisariam de provas diferentes e adaptadas. Como o tempo útil não nos permite fazer isso são excepcionados. No entanto, as escolas que o entenderem poderão fazer exames de escola”.
LIVROS. A reutilização dos manuais escolares por parte dos alunos é também rejeitada pelo Secretário de Estado da Educação português. “Por razões técnicas era impossível implementar essa medida. Como se sabe os manuais escolares são interactivos, ou seja as crianças escrevem neles, pelo que só por um lapso é que se pode partir do pressuposto que esses livros pudessem ser passados a outros alunos”, justifica.
Dadas as circunstâncias, Valter Lemos refere que “o Ministério vai definir uma política de avaliação de garantia da qualidade dos manuais escolares, que será anunciada em Outubro”.

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