MANUEL SERRÃO, FIGURA
MEDIÁTICA E EMPRESÁRIO
Faltam cadeiras
práticas nos cursos

Manuel Serrão, a popular figura da televisão e também vice-presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários defende que os cursos superiores devem ter nos seus currículos mais cadeiras práticas.
Em entrevista em exclusivo ao Ensino Magazine, salientou que os empresários lusitanos estão relutantes a admitir licenciados, porque demoram um ano ou mais a aprender no local de trabalho e têm de ser pagos nesse período.
Sobre o excesso de cursos de certas áreas, Manuel Serrão é peremptório: tem faltado coragem para alterar a situação.
As instituições de ensino superior estão a formar bons profissionais para as empresas?
É sempre complicado referirmo-nos a essa questão em termos muito genéricos, porque, naturalmente, existe uma grande quantidade de recém diplomados que se conseguem integrar adequadamente no mercado de trabalho e impor-se no meio laboral. Mas, é notório que uma grande parte dos licenciados inicia a sua actividade nas empresas, revelando dificuldades de vulto no contacto diário e concreto com as suas funções.
Com frequência, estão um ano ou mais nessa situação, no fundo, a aprenderem. É tempo em que estão a ser remunerados, muitas vezes, sem darem a contrapartida em termos de trabalho prestado que seria de esperar. É algo de preocupante e que leva um número significativo de empresários a estarem de pé atrás e um pouco receosos sobre os resultados reais da admissão de diplomados nas universidades.
Não é bom que tal suceda; importa criar condições para ultrapassar de vez os receios. Estes não estão comprovados por elementos numéricos concretos, mas a minha sensibilidade do meio empresarial e o conhecimento que detenho do mesmo permitem-me concluir que há estrangulamentos na ligação da universidade à vida activa que ainda não foram resolvidos.
O que falta, então, para que os licenciados se integrem mais facilmente no mundo laboral?
Na minha perspectiva, falta, essencialmente, que os cursos tenham mais cadeiras práticas em que os alunos tenham oportunidade de contactarem com as múltiplas questões práticas que o quotidiano do seu trabalho lhes irá exigir. Dessa forma, a adaptação que lhes será requerida torna-se mais fácil e célere, o que trará vantagens para si próprios, para os empresários e as unidades em que se irão inserir.
As instituições de ensino superior não se podem fechar ao mundo exterior. Ao contrário, devem abrir-se ao mundo e compreender que os seus formados trabalharão em empresas concretas e em funções específicas.
Gostaria também de salientar que, por outro lado, nem todas as teorias que são ministradas se conseguem aplicar nas empresas. Os alunos devem ter consciência disso, mas muitas vezes, não têm.
É preciso que as escolas de ensino superior se relacionem, de forma bastante mais próxima, com os empresários. A ideia de mundos separados e completamente estanques tem de ser rapidamente eliminada. É da inter-relação de sectores e agentes que poderão nascer vantagens mútuas. A valorização das empresas passa por pessoal qualificado e este também é valorizado se trabalhar em empresas bem organizadas e que lhes dêem as devidas condições. Não são meios antagónicos, mas antes complementares e
intrinsecamente relacionados.
O que falta fazer para estreitar essa relação?
Não sei dizer ao certo o que é necessário. Mas, a verdade é que universidades e empresas, desde há muito tempo, que têm estado de costas voltadas. É uma situação que não beneficia em nada umas e outras e prejudica, em última análise, o desenvolvimento do próprio país.
A Associação Nacional de jovens Empresários têm dado o seu contributo para se inverter este rumo de acontecimentos. Temos realizado acções constantes junto das instituições de ensino superior no sentido de sensibilizar os meios académicos para a importância crescente de adequarem a formação que aí é ministrada às características e realidades do mundo do trabalho, estimulando a ligação entre ambos os domínios. Ao mesmo tempo, temos procurado alertar os alunos para as dificuldades específicas da passagem da escola para a empresa, fornecendo-lhes elementos, em termos de conhecimento, para que efectuem tal mudança com a menor perturbação possível. A associação considera que é um esforço que vale a pena, por isso, estamos empenhados em prossegui-lo. Contudo, a missão não pode ser apenas nossa, mas de todos os agentes educativos e empresariais.
Os empresários portugueses estão reticentes quanto à admissão de recém-formados?
Existe, pelo menos, alguma relutância, é certo... Repare que, actualmente, já não se analisa o perfil de um candidato a um trabalho unicamente pelo seu currículo académico. Se uma pessoa tem trinta e poucos anos, possui vastas habilitações universitárias mas nunca trabalhou, o empresário desconfia das suas capacidades práticas para exercer as funções.
Antigamente, era corrente os licenciados frequentarem “masters” ou pós-graduações logo a seguir a terminarem as suas licenciaturas. Nada mais errado, porque deveria haver um período entre os dois cursos que fosse dedicado ao exercício de funções laborais concretas, para que se tome contacto com a actividade real das empresas. Hoje, esta ideia começa a ganhar alicerces fortes. Os empresários olham não só para os currículos académicos, mas também para a experiência profissional dos candidatos aos postos de trabalho. A avaliação é global e mais abrangente do que sucedia há tempos atrás. Houve uma evolução, a este nível, que temos de ter em conta. O modo como o empresariado vê os seus funcionários já não é o mesmo de antigamente. E o candidato a uma vaga tem de aliar os conhecimentos teórico-académicos que possui a experiências de tipo concreto para estar totalmente apto a cumprir as suas funções.
Na sua óptica, como se deve resolver o problema de excesso de cursos e de formados em certas áreas, como Direito, por exemplo?
Falta coragem ao Governo para resolver o problema que é grave e tem de ser solucionado rapidamente. O Executivo – o actual e os anteriores – sabem que existe um claro excesso de licenciados em determinadas áreas, mas, ao longo dos últimos anos, não tem havido coragem para alterar a situação vigente. A consequência desta inacção é que há jovens com vidas despedaçadas, porque apostaram tudo num curso, investiram fortemente nessa formação, fizeram grandes sacrifícios, depositaram elevadas expectativas e, no final, depois de tanto estudo, esforço e dedicação, só sobra a desilusão e a frustração.
É preciso ter em consideração que estão em causa pessoas com sonhos, anseios e perspectivas que ficam completamente ceifados porque o mercado de trabalho não possui capacidade para os absorver.
O país deve conhecer, com rigor, as suas necessidades de formação, as quais não podem ser ignoradas pelas instituições de Ensino Superior.
Essa avaliação ainda está por fazer, infelizmente, e cada dia que passa se torna mais prioritário e urgente fazê-la. A situação tem se vindo a arrastar ao longo dos tempos, sem que se tomem medidas adequadas à sua resolução. Aliás, continua a
agravar-se...

Jorge Azevedo
ENTREVISTA À ÚNICA
MONJA BUDISTA PORTUGUESA
A morte não existe

O budismo está em voga e Portugal não é excepção. Mas, por ora, existe apenas uma única monja tibetana portuguesa, Tsering Poldran - autora da obra «A Arte da Vida» -, com quem conversámos.
Tentando perceber o que é semelhante no budismo e noutras confissões religiosas, Deus e a Mente Divina são o mesmo?
Não tenho dúvidas nenhumas de que se um cristão, ou uma pessoa de uma religião teísta, viver a experiência de uma comunhão integral com Deus, não estará, com certeza, a viver uma coisa muito diferente daquilo que um budista experimenta quando medita. À concepção dessa transcendência, como sendo uma entidade criadora (ou, no caso do Budismo, como sendo um Absoluto Transcendente, um Potencial, uma Plenitude) é que podem ser dados vários nomes.
Os caminhos são diversos...
Os caminhos são diversos e têm que ser!
As religiões oficiais, por exemplo, aceitam as imagens, as flores, as catedrais…O Budismo terá no mundo a sua “ igreja”, com um tecto de “céu”?
Sim, claro! Mas também há templos, velas, flores.
São elementos que auxiliam as pessoas a se redescobrirem...
Exactamente. As pessoas vão a Fátima de joelhos, mas as peregrinações tibetanas faziam-se com prosternações ao longo do caminho. Eu acho que é muito parecido, francamente!
Podemos entender que a descoberta do karma corresponde à descoberta do “pecado”?
A noção do pecado existe em todas as tradições, só que nós, budistas, já chegámos numa cultura em que há uma forte reacção contra essa palavra e evitamos utilizá-la. Até porque, se calhar, a nossa noção também não tem, exactamente, a mesma conotação do pecado. Mas, para o Budismo existe uma ética de vida, com acções positivas e negativas.
Mas o que é, de facto, o karma?
O karma é a marca que uma acção deixa em nós...
Em “nós” alma ou consciência?
Consciência, eu diria. Para um budista não existe uma alma, ou seja uma entidade. Esse é justamente o ponto fulcral no Budismo: a não existência de uma entidade constante e sólida. Mas, por outro lado, existe um nível de consciência que é constante, mas não dual. Ou seja, não há separações. Por exemplo, quando se interrogam pessoas que tiveram experiências de quase morte, todas elas contam que, em determinado momento, se encontraram numa luz extraordinária e que não sentiram nenhuma divisão entre si e o resto. Para o Budismo, este é o nível de consciência último. Se quiser, poderia ser aquilo a que se chama alma, só que não é individual, no sentido de algo que está separado dos outros. Portanto, é uma consciência única.
Em que consiste a teoria morfogenética que aborda no seu livro?
A teoria foi formulada por um cientista britânico moderno, Rupert Sheldrake, teólogo, que se interessou, desde novo, pela génese das formas.
Essa teoria veio justificar o quê?
No fundo, é uma espécie de formulação científica da teoria do karma, segundo a qual todas as formas aparecem por repetição. Cada vez que uma determinada forma surge, tem a tendência para se repetir, criando uma espécie de “marca” a que Sheldrake chama “campo morfogenético” que grava experiências. Portanto, todas as formas que vierem a seguir terão a tendência para se aproximar daquela “marca” para criar um campo, no qual, necessariamente, haverá um condicionamento para que novas formas se aproximem.
Formas com vidas e com experiências anteriores independentes... Podemos mudar os condicionamentos?
Exactamente. A minha ideia é que temos uma espécie de herança kármica, que é o resultado das nossas experiências anteriores. Mas essa herança é um condicionamento. É evidente que nós podemos mudá-lo. Estamos sempre a fazê-lo!
Falar de karma implica falar de reencarnação ou de renascimento?
Preferimos dizer “renascimento”. Na reencarnação temos a noção de que o espírito passa de um corpo para o outro. No Budismo, dizemos que há, efectivamente, uma continuidade, mas no sentido causal. Preferimos falar de renascimento, para demarcar a noção de que se trata da mesma entidade que renasce. O ser que renasce não é o mesmo que morreu, mas o seu resultado.
Modificar o ADN altera o karma de uma espécie?
A manipulação genética é bastante assustadora e perigosa. Uma vez que os genes também são a manifestação do karma, manipulá-los produz, certamente, alterações kármicas. O problema, penso eu, é sobretudo não sabermos o que vai provocar a longo prazo. Colocará a humanidade perante um grande desafio e, se calhar, face a um enorme perigo.
A morte existe?
Em termos físicos, existe. Do ponto de vista do budismo, a consciência continua. Como fim a morte não existe, porque o corpo desintegra-se mas os átomos continuam.
Tsering, para que serve o seu livro?
(Risos) A minha esperança é que ele possa servir para que qualquer pessoa, de qualquer tradição religiosa, ou mesmo sem religião nenhuma, enriqueça a sua própria visão do mundo e desenvolva mais bondade, que é o que mais falta neste
mundo...

Helena Maria / Nazaré Tocha
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