Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano IV    Nº45    Novembro 2001

Universidade

SANTOS SILVA, REITOR DA UBI

É preciso repensar o ensino

Uma semana após a visita do presidente da República, Jorge Sampaio, à Universidade da Beira Interior, Santos Silva, reitor daquele organismo, explica ao Ensino Magazine algumas das linhas que orientam o plano de desenvolvimento da UBI para os próximos anos. Com o curso de medicina a funcionar, no seu primeiro ano, Santos Silva revela que ainda há muito por fazer. No futuro, novas infra-estruturas deverão ser construídas, como o espaço definitivo para a Faculdade de Ciências da Saúde, um novo auditório central, o edifício de artes e letras, uma cantina no pólo IV e uma piscina coberta. Na área da formação, a UBI poderá procurar novos mercados, através de cursos profissionalizantes, sem título académico.


As instalações da nova Biblioteca Central já foram inauguradas, mas para quando a entrada em funcionamento daquele espaço?

Houve algum atraso no fornecimento do mobiliário, que neste momento está a ser instalado. Ainda assim, entendemos, que para não prejudicar o acesso dos alunos à bibliografia que temos, a transferência dos livros será feita no período do Natal, numa altura em que não haverá aulas. Por isso acredito que em Janeiro esse espaço esteja a funcionar e que vai contribuir para a melhoria da qualidade de ensino ministrada na UBI, até porque é uma biblioteca moderna, ligada às novas tecnologias de informação e que vai estar aberta até tarde.


No seu discurso, na cerimónia de recepção ao Presidente da República, referiu que os cortes orçamentais anunciados pelo Governo para o ensino superior, poderiam levar ao caos administrativo das instituições. Na UBI o que é que vai ser afectado?

Os orçamentos de que dispomos para funcionamento estão muito longe do orçamento padrão, que nos é dado pela fórmula de financiamento. Se as universidades portuguesas tivessem o orçamento que lhes deveria ser dado pela fórmula, nem esta, nem nenhuma universidade teria dificuldades. Nós compreendemos que a fórmula foi desenhada para um período de expansão do ensino superior, mas hoje estamos numa fase de consolidação do sistema, onde há mais vagas do que candidatos.


Isso significa que a fórmula deveria ser revista?

A fórmula de financiamento deveria ser modificada, de modo a ter em atenção esta nova fase do ensino superior, e sobretudo a melhoria da qualidade do ensino superior. É evidente que a fórmula existente não é má, mas ela nunca foi cumprida. Mas admitimos que num período de restrição haja outros factores que devem ser considerados e que permitam descriminar, pela positiva, diversos aspectos. Por exemplo, nós estamos no interior do País, numa zona com um clima difícil, e haverá outras universidades que terão outros problemas. Mas há outra situação que convém salientar, é que nós estamos numa fase de qualificação do nosso corpo docente, e a aquilo que nós recebemos para aumentos salariais não é suficiente.


E corre-se o risco das verbas das propinas serem canalizadas para o pagamento de vencimentos?

As verbas das propinas fazem parte da universidade, e penso que essa é uma questão que deve ser afastada de uma vez por todas. Trata-se de uma questão política. A propina é uma fonte de financiamento da universidade, mas no nosso caso concreto as propinas não pagam salários. Tudo depende da afectação de verbas. 94 por cento do orçamento do Estado para a Universidade é aplicado em pessoal. Por isso ninguém me pode acusar de estar a pagar salários com verbas das propinas. Mas temos que considerar que as propinas vão contribuir para a melhoria do ensino. E de que forma? Por exemplo na aquisição de reagentes para os laboratórios, novos equipamentos, obras de melhoramentos, aquisição de equipamento informático etc.


O Presidente da República, Jorge Sampaio referiu que o futuro passava também pelas instituições de ensino superior funcionarem também com as receitas próprias. Concorda com a ideia?

Concordo plenamente, porque nós vivemos num período complicado em termos financeiros e as instituições de ensino superior terão que rentabilizar ao máximo os investimentos públicos que foram feitas nelas. Aliás, nós temos que prestar serviços à comunidade que nos envolve, e se prestamos determinados serviços, teremos que procurar receitas por essa via. Portanto, penso que as universidades têm que procurar outras fontes de financiamento, que nos ajudem, não só a criar saber, através de investigação, mas também a progredir na qualidade de ensino. Repare que na nossa instituição não há quase cursos de papel e lápis, por isso é necessário um grande investimento em novos equipamentos. A título de exemplo só este ano estamos a investir cerca 150 mil contos em equipamento informático e 100 mil contos em bibliografia. Investimentos que servem precisamente para a melhoria do ensino.


A Faculdade de Ciências da Saúde já está a funcionar, mas em instalações provisórias. Para quando as definitivas?

O que está previsto é que a Faculdade funcione em instalações provisórias até ao terceiro ano do curso, de forma a que o novo edifício seja construído. A construção está prevista iniciar-se durante o próximo ano lectivo, e a obra deverá estar concluída 18 meses depois. Trata-se de um investimento de quatro milhões de contos, num edifício de 16 mil metros quadrados que poderá ficar ligado ao Centro Hospitalar da Cova da Beira.


Além dessa estrutura, há outras que poderão avançar?

A Universidade possui boas instalações de suporte às ciências exactas e às engenharias, mas temos as ciências sociais e humanas e as letras em situação de ruptura em termos de espaço. Por isso é necessário recuperar um edifício que temos no Pólo da Carpinteira, o mesmo sucede com a cantina para esse pólo, pois os cerca de 2500 alunos estão a ser servidos por um snak bar, o que é insuficiente. Isto não significa que a UBI não tem cantinas, acontece é que esse pólo fica no outro lado da cidade, pelo que à hora de almoço é impossível os alunos deslocarem-se ao Pólo II, onde estão instaladas as cantinas. Penso que o Ministério da Educação vai compreender essa situação. Já para a área da Saúde, está também prevista a construção de uma residência para estudantes e de uma cantina. Isto além da piscina aquecida, que vai ser útil à Faculdade de Ciências da Saúde e aos cursos de Desporto. Uma estrutura que candidatámos de novo ao Prodep.


No plano de desenvolvimento da Universidade está expressa a intenção de se criarem novos cursos na área das ciências da Saúde. Que cursos são esses?

O nosso plano ainda não foi discutido com os actuais membros do ministério da educação. A Faculdade de Ciências da Saúde foi criada por uma resolução do Conselho de Ministros que diz claramente que ministrará a medicina e outros cursos. Na nossa candidatura que fizemos, em 1996, considerámos que a faculdade teria um departamento de ciências médicas, responsável pela medicina, e um departamento de saúde pública e enfermagem, onde poderiam surgir cursos de gestão e administração das unidades de saúde – o que já está a ser feito através de um mestrado. Tínhamos também decidido que não iríamos avançar para cursos de enfermagem, pois já existem escolas na Guarda e em Castelo Branco, mas que essas escolas e a universidade se poderiam articular. Além disso, o plano apontava para avançarmos na área das ciências farmacêuticas e nas tecnologias da saúde. Na altura o Ministério considerou a nossa candidatura e através de uma resolução do Conselho de Ministros foi dito que faríamos a medicina e outras cursos na área da saúde.


E outros cursos na Universidade?

Neste momento não estamos num período de expansão do ensino superior, mas sim num período de consolidação. Temos que ter muito cuidado com novos cursos a abrir, pelo que terão que ser muito bem ponderados. Há muitas pessoas que dizem que a Universidade não tem que se preocupar com o emprego, mas eu julgo que tem. Quando estamos a formar, e sendo nós uma instituição pública, temos cursos pagos pelos cidadãos, pelo que nos devemos preocupar com a aplicação dos dinheiros públicos, fazendo as formações que o País mais necessita. Hoje existe uma grande confusão no ensino superior, há as universidades públicas e privadas, os politécnicos públicos e privados, pelo que se exige que haja uma ponderação e uma análise do que é o sistema de ensino. Não podem continuar a existir proliferação de instituições e de cursos, pelo que compete ao Governo exercer o papel regulador dos sistema. E quando digo isto, não refiro que as universidades devem perder autonomia, antes pelo contrário, julgo que elas devem ganhar mais autonomia, mas tem que haver um papel efectivo regulador do sistema. É necessário estabelecer-se outras condições de funcionamento das instituição e até outras regras de financiamento.


Numa altura em que há mais vagas que candidatos ao ensino superior, a UBI vai também procurar novos públicos?

As universidades têm que ganhar novos públicos, temos que nos virar para a formação contínua, para a formação ao longo da vida e, provavelmente, temos que também fazer cursos profissionalizantes. Hoje as universidades e os politécnicos têm laboratórios muito bem equipados, corpo docente qualificado e nalguns casos estes recursos estão mal aproveitados.


E em que áreas poderão surgir esses cursos profissionalizantes?

Todos os cursos de ordem tecnológica, por exemplo. O País está muito carenciado de quadros médios nessa área. Então porque não fazer esses cursos, de um ou dois anos, que depois atribuem aos formados, não um grau académico, mas um diploma. Provavelmente há professores universitários que não estarão de acordo com esta forma de encarar o problema, mas é assim que eu a encaro, e é deste modo que também poderemos rentabilizar a instituição e arranjar novas fontes de financiamento.


Curiosamente, a área das engenharias, foi uma das menos procuradas pelos alunos no acesso ao ensino superior. Este fenómeno deve-se a quê, sabendo que depois do curso o mercado de trabalho absorve quase a totalidade dos diplomados?

Este não é um problema nacional, é mundial e nos Estados Unidos isso também se verifica. Os cursos de engenharia exigem uma formação muito boa em matemática e física. Aquilo que se verifica é que já no básico e secundário os alunos se afastam dessas áreas. Mas o problema tem que ser visto globalmente, a Alemanha está a importar engenheiros da Índia, em grandes quantidades, o mesmo sucede com os Estados Unidos, que importa engenheiros do Oriente. Perante estes dados, temos que fazer tudo o que está ao nosso alcance para que esta situação seja ultrapassada, através de uma articulação entre os diferentes graus de ensino. Todos em conjunto temos que pensar como melhorar o sucesso educativo. Um País como o nosso não pode desperdiçar tanto dinheiro. Os Países ditos ricos tem taxas de sucesso bem maiores e não admitem taxas de insucesso elevadas.

 

seguinte >>>


Visualização 800x600 - Internet Explorer 5.0 ou superior

©2001 RVJ Editores, Lda.  -  webmaster@rvj.pt