PROFESSORAS BEIRÃS EM
TIMOR
Voltar, só mais tarde
Pedro Sequeira, 46 anos, é professor do ensino superior, na Escola Superior Agrária de Castelo Branco. É timorense, natural de Dili, assessor do presidente do partido União Democrática Timorense, João Carrascalão, e foi um dos docentes que ensinou tetum (a língua timorense) aos professores que foram ensinar português para Timor Leste. Hoje, um ano depois do referendo que constituiu o primeiro grande passo para a independência daquele território, acredita que a democracia vai ser instalada em Timor Leste. Em entrevista ao Ensino Magazine, explica porque é que a presença da UNTAET (organismo responsável pela gestão do território nesta fase transitória) é um mal necessário. “Não há alternativa, pelo que Xanana Gusmão tem que pressionar aqueles responsáveis para a construção de infra-estruturas”, considera.
Licenciado pelo Instituto Superior de Agronomia, em Lisboa, pós-graduado em informática e mestre em produção florestal, Pedro Sequeira fala de Timor com uma certa nostalgia e alguma revolta pelo sofrimento a que os seus compatriotas foram votados. 24 anos depois de partir de Timor Leste regressou de férias, em 1997. Ele que, desde o início dos estudos em Portugal, apenas por uma vez visitou o território, em 1973. “Na altura o Estado Português, de dois em dois anos, pagava umas férias a quem tirava as melhores notas. Foi a última vez que fui ao território, antes da invasão indonésia”, diz.
Quando, em 1997, voltou a Timor Leste sentiu um clima bem pior que aquele que os portugueses viveram durante a ditadura. “Até mesmo com a família e com os amigos tínhamos que ter cuidado nas palavras utilizadas”, lembra. Mas pior que isso foi o choque “de ver destruídos todos os locais que marcaram a minha infância. Todos os sítios de referência desapareceram. Dili cresceu de uma forma anárquica!”.
A autorização para entrar em Timor Leste, surgiu da dupla nacionalidade que possui, pois, entre 1983 e 1990 viveu na Austrália. “Fui a Timor com a desculpa de ir tirar o luto pelos familiares desaparecidos. Trata-se de uma tradição do nosso povo, que termina com uma grande festa. Valeu-me a dupla nacionalidade, caso contrário dificilmente conseguiria entrar em Timor”, explica, enquanto adianta: “comi o pão que o Diabo amassou. Em 1983, quando decidi, com a minha esposa, ir para perto da minha família, que entretanto tinha fugido ao regime indonésio para a Austrália, não sabia das dificuldades que nos esperavam. Os nossos cursos não eram reconhecidos, e tive que tirar outra licenciatura, na Universidade de
Melbourn”.
CONTACTOS. Pedro Sequeira veio para Portugal com 17 anos, depois de ter concluído o antigo sétimo ano, no Liceu de Dili. “Consegui uma bolsa de estudo e vim para Lisboa”, diz. Na altura ainda Timor vivia dias calmos, até que a Indonésia decidiu invadir o pequeno território português. As notícias de Timor chegavam a Portugal pela Casa Timor, em Lisboa. “Um espaço onde se juntavam estudantes timorenses, e de onde saíram muitos revolucionários, que viriam a formar a Fretilin”.
Os anos foram passando, e mesmo depois de ter casado, com a actual deputada do Partido Socialista, Maria do Carmo Sequeira, os contactos com as comunidades timorenses em Portugal e na Austrália mantiveram-se. “Em 1978 decidimos ir viver para o Fratel. Éramos o único casal jovem da freguesia, mas como já tinha um familiar em Segura, senti o Distrito chamar por mim”, esclarece. Mas a estadia no Distrito durou menos de 10 anos. “Em 1982 fui responsável pela Divisão de Solos, Hidráulica e Engenharia Agrícola da Direcção Regional de Agricultura da Beira Interior. Mas, em 83 decidimos ir para perto da minha família na Austrália”.
O regresso a Portugal deu-se em 1990, quando a sua esposa aceita candidatar-se ao cargo de vereadora da Câmara de Vila Velha de Ródão, que viria a desempenhar nessa legislatura. “Desde esse ano que estou na Escola Superior Agrária. Primeiro como assistente, agora como professor adjunto”. Já com a vida organizada em Portugal e depois da experiência vivida Timor, durante as curtas férias, em 1997, Pedro Sequeira decide dar uma ajuda ao Partido da União Democrática Timorense (UDT), do qual é assessor do actual presidente, João Carrascalão. “Fui fazer campanha de esclarecimento para o referendo, no ano passado. Estive lá entre 14 e 25 de Agosto, e vim votar a Portugal”, explica.
Nove dias bastaram a Pedro Sequeira para perceber que a independência do povo timorense iria vencer. “A minha ida a Timor, como a de outros timorenses que vivem cá foi de mostrar aos nossos irmãos que estávamos do lado deles. Em nenhum momento tive dúvidas que a independência iria vencer”, esclarece. Para o assessor de João Carrascalão na UDT, o sentimento do povo timorense, na altura do referendo, era “de receio, mas de confiança. As pessoas já estavam à espera das retaliações e do clima de terror que se seguiu após a divulgação dos resultados.
Pedro Sequeira lembra que quando fez campanha em Timor não entrou em contacto com a família, por uma questão de segurança. “Fui viver com um responsável da Fretilin, o que demonstra que ali não havia interesses políticos dos partidos. Nessa altura já as milícias andavam nas ruas, intimidavam e matavam. Por vezes senti medo, sobretudo quando tive tempo para pensar. Aí lembrei-me da minha família, dos meus amigos”. Apesar do medo generalizado, Pedro Sequeira nunca chegou “a temer que os timorenses não votassem pela independência. Para mim estava claro que iríamos ganhar o referendo, não com 78 por cento, mas com mais de 90 por cento. Mas, em termos internacionais essa seria uma humilhação muito grande para o povo indonésio”.
O clima vivido pelos timorenses nos dias que antecederam as eleições e nas semanas que se seguiram foram de terror. “Lembro-me que quando me despedi da minha tia, antes de regressar a Portugal, ela disse que nunca mais me iria ver. As palavras comoveram-me até porque com os seus 83 anos, já tinha assistido a três invasões, numa das quais aterrou-lhe um pára-quedista no quintal. Felizmente ainda está
viva!”.
PEDRO SEQUEIRA EM
ENTREVISTA
Timor
no coração
PORTUGUÊS
A
língua oficial
PROFESSORES DA UBI EM
TIMOR
O
país das incongruências
|