JOÃO PEDRO DE BARROS,
PRESIDENTE DO POLITÉCNICO DE VISEU
Acabou o tempo dos
doutores

O Instituto Politécnico de Viseu tem cerca de sete mil alunos. É a instituição de ensino superior com mais peso e influência naquele distrito da zona centro do País. João Pedro Barros, o seu presidente, em entrevista ao Ensino Magazine, que marca também o início da distribuição do nosso jornal naquela Região, conta como tem sido o desenvolvimento do Politécnico a que preside. Fala dos seus projectos para o futuro, da abertura de novas escolas, como a de artes e de Saúde. Da construção do Campus Politécnico, que ficará situado junto às novas instalações da Escola Superior de Tecnologia.
João Pedro de Barros acredita que o futuro de País passa, necessariamente pelo Ensino Superior Politécnico. Como salienta, dentro de cinco anos Portugal vai perceber isso. O presidente do Politécnico de Viseu acredita que cada vez mais as pessoas valem pelo que fazem, e não pelo que dizem que são. “Um diploma hoje não dá rigorosamente nada. Os doutores acabaram. Nós hoje temos que ter profissões que possam ser exercidas com o máximo de dignidade e que atribuam às pessoas capacidade económica para que elas próprias se insiram na sociedade, não pelo diploma, mas por aquilo que sabem fazer”.
Como é que retrata o desenvolvimento do Instituto Politécnico de Viseu?
Foi um desenvolvimento rápido, mas tendo sempre em atenção a qualidade que nós exigimos a uma instituição de ensino superior. Desde o seu nascimento, há 20 anos, até hoje, houve um salto qualitativo que poderíamos enquadrar de Freud a Damásio. Ou seja um salto voltado para a qualidade. Há 20 anos tínhamos 3 bacharelatos, agora temos 31 licenciaturas. Não tínhamos nenhuma pós-graduação, hoje temos um doutoramento, em economia, em colaboração com a Universidade de Salamanca. Apresentamos ainda um mestrado, em colaboração com o Iscte, e em Janeiro vão começar vários mestrados relacionados com as ciências sociais, entre outros, que poderão vir a ser desenvolvidos com a Universidade de Aveiro.
As expectativas dos alunos foram, pelo que afirma, satisfeitas?
Foram, não só no que respeita ao nível dos graus ministrados, mas também ao número de cursos que tem vindo a aumentar, num ritmo que consideramos razoável. Isto, naturalmente, tendo sempre em atenção a constituição de um corpo docente com qualidade. Quando começámos tínhamos dois professores com mestrados não reconhecidos, na altura. Hoje temos 400 docentes, 106, até ao final do ano, vão concluir o seu doutoramento, e ficaremos com 184 mestres. Outro dado importante é que em 1983 começámos a funcionar com 11 alunos, e hoje temos sete mil, seis mil em formação inicial e os restantes noutras formações. Facto que significa que fizemos um
"upgrade" muito grande, que foi passar de 11 alunos para sete mil, com a carência que há nessa matéria prima.
O Politécnico cresceu no número de alunos, no número de docentes, e nos espaços físicos?
Também evoluímos. E desta escola superior de educação, onde foram investidos cerca de 300 mil contos, avançámos para a Escola Superior de Tecnologia, moderna, situada junto ao Quartel do Exército, onde foram gastos muitas centenas de milhares de contos. Será nesse local que ficará instalado o campus politécnico. Já a partir de Novembro ficará concluído o edifício dos serviços centrais. A própria Escola Superior Agrária vai ver melhoradas as suas condições. Temos uma quinta agrária, em frente ao Palácio do gelo, onde irá nascer o novo edifício da escola, cujo orçamento rondará os 970 mil contos. A Escola Superior de Educação vai deixar o actual edifício, que ficará para mestrados e doutoramentos, e vai ser instalada num novo espaço, no campus politécnico. Além disso, o Politécnico possui duas residências, que são dois hotéis de cinco estrelas, e vamos passar a ter quatro. Na área desportiva apresentamos espaços desportivos que dificilmente se encontram noutros pontos do País, com um campo de futebol relvado, vários courts de ténis e agora um campo de mini golf. Vamos também construir uma capela, para o culto que abrangerá todas as religião. Ou seja, temos uma instituição pensada, meditava e reflectida, que teve à nascença um plano estratégico que estamos a desenvolver.
Com 31 licenciaturas a funcionar, a aposta do Politécnico de Viseu passa pela criação de mais cursos e novas escolas?
Estamos a aguardar a criação da Escola de Saúde, prometida pelo Governo em 1999, propusemos a criação de uma Escola de Comunicação e Artes, em 1998, pelo que aguardamos a sua criação. Propusemos ainda a abertura de curso de engenharia florestal. Brevemente iremos colocar a funcionar a Escola de Gestão, em Lamego. Ou seja continuamos a ter um determinado ritmo de crescimento, que eu espero não venha a ser prejudicado com a anunciada falha de dinheiro a nível nacional. É que nos foram cortados 50 por cento do Piddac e 10 por cento do Orçamento de Estado para despesas correntes. Faço votos para que esta desgraça anunciada não venha por em causa o crescimento, não só da instituição, como de todo o Interior do País. Não faz sentido que uma percentagem enormíssima seja apenas canalizada para o litoral, para o Portugal real, que vai de Guimarães a Setúbal, numa profundidade de 20 quilómetros para o interior. Ora se nos cortam as verbas e não conseguimos criar mais alternativas e melhorar a qualidade de vida dos nossos cidadãos, então alguma coisa está mal.
Como é que o Politécnico tem acompanhado a saída dos jovens licenciados para o mundo do trabalho?
Nós temos um observatório do emprego que acompanha o caminho que os alunos seguem. Ainda não conseguimos criar um organismo que faça regressar os alunos, anualmente, para que eles possam receber novos conhecimentos. Temos também uma Unidade de Inserção na Vida Activa (Univa), que acompanham a colocação dos nosso alunos. Os resultados são animadoras, já que 90 por cento dos alunos das tecnologias, por exemplo, estão bem colocados. Na educação o problema é mais grave, pois toda a gente forma professores. São lançados no mercado milhares de jovens, sem que haja um planeamento nacional. Deixam-se sair milhares de jovens que qualquer dia têm o diploma em casa. Há áreas científicas que estão esgotadas nos próximos 25 anos.
Dentro de dez anos, o número de alunos no ensino superior vai diminuir. O futuro do Politécnico de Viseu passa também pela formação ao longo da vida?
Está anunciada uma perda de alunos, até ao ano 2005, da ordem dos 100 a 120 mil alunos. O estudo que eu tenho na mão aponta para uma diminuição, já no próximo ano, de 6400 alunos, pelo que todas as instituições de ensino superior se vão ressentir. Nós continuamos a ter a esperança de não ter uma quebra do número de estudantes, mas teremos que rapidamente criar alternativas à formação inicial, através da formação contínua, pós-graduações, ensino à distância,
internacionalização, mobilidade. Factores importantes para que uma instituição como a nossa não sofra quebras acentuadas.
No caso concreto das pós-graduações, os Politécnicos não podem, por si só, atribuir esses graus...
A lei de Bases do Sistema Educativo prevê que existam acordos com universidades. Mas a actual lei orgânica apresentada na Assembleia da República prevê que as escolas politécnicas possam ter escolas universitárias, como as universidades podem ter escolas politécnicas. Nós entendemos, que com base nessa possibilidade nós podemos a vir a reivindicar escolas universitárias a funcionar junto dos nossos institutos. A ser assim, não percebo porque é que não teremos a possibilidade de atribuirmos os mesmo graus que as universidades. Por isso, estou convencido que o actual ministério da Educação irá anunciar, a curto prazo, que nós possamos atribuir, para já os graus de mestre, que eu próprio solicitei ao anterior Ministro da Educação, Marçal Grilo, que a Lei de Bases a aprovar pudesse conter a possibilidade dos politécnicos atribuírem graus de bacharelato, licenciatura,
mestrado e doutoramentos, desde que conseguissem reunirem determinadas condições.
E qual foi a resposta do Ministro?
Respondeu-me, e com razão, que a Assembleia da República não estava sensibilizada para isso. Facto que eu lamentei, pois a Assembleia da República deve ser um órgão que acompanhe a evolução das coisas que acontecem pelo mundo fora. A declaração de Bolonha, realizada no ano passado, aponta para um aumento de credibilidade dos institutos politécnicos a nível da Europa. Isso já está a acontecer em todos os países, menos em Portugal. O que quer dizer que a nossa presença em Bolonha foi inconsequente. É preciso que se diga com clareza, que quem hoje interpreta a sinfonia do desenvolvimento científico a nível da Europa, são os politécnicos. É importante que nosso Governo entenda isto, para que possamos estar ao lado das instituições universitárias, sempre numa posição de colaboração institucional. Nós temos cerca de cinco mil doutores em Portugal, deveríamos ter 15 mil, para nos aproximarmos dos valores médios da Europa. Portanto, Politécnicos e Universidades não podem estar de costas voltadas.
E porque é que isso ainda acontece?
Porque em Portugal há um défice de evolução social muito grande. As pessoas ainda medem o valor dos diplomas, pelo facto de serem tirados numa universidade ou num instituto. Há exemplos de pessoas que vivem no Algarve ou no Alentejo que têm lá belíssimos cursos a funcionar, como acontece em Portalegre, que depois vêm para Viseu, para a Universidade Católica, tirar esses mesmos cursos. Ou seja, em Portugal as pessoas agarram-se ao diploma, como algo que se projecta na sociedade. O que não é verdade, pois essa realidade está afastada da Europa. As pessoas valem pelo que fazem, e não pelo que dizem que são. Um diploma hoje não dá rigorosamente nada. Os doutores acabaram. Nós hoje temos que ter profissões que possam ser exercidas com o máximo de dignidade e que atribuam às pessoas capacidade económica para que elas próprias se insiram na sociedade, não pelo diploma, mas por aquilo que sabem fazer. Estou convencido que dentro de cinco anos, nada mais vai ser como era. Porque os alunos que vão sair destas casas, vão ser a guarda avançada daquilo que vai ser a nossa publicidade institucional. Se ainda há alguma barreira para se perceber isto, está nas pessoas que têm mais de 45 anos, pois a única referência que tiveram foi a universidade. E se alguém interromper este ciclo de credibilidade dos Politécnicos, os Governos vão ser penalizados a curto prazo. Pois são os homens e as mulheres que saem destas instituições que amanhã vão estar no poder. E vão-lhes dizer que eles prestaram um mau serviço ao País.
O Politécnico tem sete mil alunos. No entanto, quando Viseu movimentou esforços para que a Faculdade de Medicina viesse para esta cidade, alguém, com responsabilidades, disse que Viseu não tinha ensino superior público...
É uma visão canhestra que algumas pessoas dão a conhecer. Mas não é por mal, é por desconhecimento. Porque quando alguns responsáveis afirmam que em Viseu não há ensino superior público, eu só poderia aceitar essas declarações como má fé, ou como desconhecimento. E eu não acredito que tivesse havido má fé. As pessoas pensam que o ensino superior público é apenas o universitário. Quando as pessoas compreenderem que o sub-sistemas politécnico e universitários são as duas faces da mesma moeda, esses problemas acabam por desaparecer. Ainda em relação à Faculdade de Medicina, continuamos a entender que Viseu teria todo direito em ter essa faculdade. Isso não foi conseguido, mas penso há cursos que podem ser contemplados na Covilhã e que outros possam funcionar no Hospital de Viseu. Tem é que haver bom senso e as coisas não podem ser resolvidas por interesses políticos.
UMA NECESSIDADE SEGUNDO
MARCELO
O
filho da nacção

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