MÁRIO RAPOSO,
VICE-PRESIDENTE DA UBI
Alunos têm de criar
empresas

Os alunos que terminam o curso na Universidade da Beira Interior têm de estar preparados e alertados para formarem as suas próprias empresas. Porque não podem apenas em pensar no trabalho por conta de outrem numa sociedade que está em constante mudança.
A opinião é de Mário Raposo, vice-reitor da UBI, com pós-graduação na área de entreprenorship e também responsável pelo centro de Inovação Empresarial da Beira Interior, onde nasceram já algumas empresas detidas por ex-alunos da
UBI.
Mas esse número tem de aumentar e Mário Raposo diz que os cursos, nomeadamente os de gestão e o novo curso de Design, vão passar a ter disciplinas relacionadas com os passos para a criação de novas empresas. As engenharia poderão passar a ter essas cadeiras numa próxima restruturação. Além disso, não está excluída a hipótese de ser feitos cursos de pós-graduação, mais curtos obviamente que os de mestrado ou de doutoramento, mas que formem nesta área.
Aquele responsável diz ainda que a UBI tem sido pioneira nesta área e que é preciso que as instituições de crédito disponibilizem capital de risco para que a economia possa receber um novo fôlego. Ainda mais numa altura em que nasce um Parque Tecnológico, onde poderão ser desenvolvidos muitos artigos que possam estar na base da criação de novas empresas.
Ao mesmo tempo, Mário Raposo afirma que os alunos da Universidade precisavam de um melhor acompanhamento. Por isso, já este ano entrou em funcionamento a figura do tutor. Para cada ano de cada curso existe uma pessoa que pode dar orientação aos alunos desse ano. Se ao nível de estudos, seja ao nível de orientação dentro da Universidade, entre outros.
Mário Raposo é o tutor do primeiro ano do Curso de Gestão e apesar de ainda ser cedo para comunicar resultados. Ao contrário, no gabinete de Estágios, do qual é responsável, resultados é o que não falta. Ao ponto de haver dificuldade em satisfazer os pedidos das empresas. Uma questão que terá de ser alterada, mas que passa por uma mudança de mentalidades dos alunos do Secundário.
ESTÁGIOS. “O número de oferta de estágios das empresas tem vindo a aumentar de ano para ano. De tal modo que, na maior parte dos cursos, não há respostas imediatas a esses pedidos. Há assim uma relação dinâmica entre a Universidade e as empresas por ligação ao Gabinete de Estágios, da Univa, mas também pela actividade dos núcleos de alunos”, refere.
Muitos desses estágios acabam por gerar o emprego do aluno. E se nem sempre fica no lugar que mais gostaria, não será um factor de importância fundamental porque a ideia do emprego para toda a vida mudou. “No fim do estágio, os alunos acabam por ficar nas empresas. E se não fica, adquire uma experiência tal que encontra colocação noutro lado com alguma facilidade”.
Mas se em termos gerais é assim, ao nível das engenharias a situação é diferente. “Para cada aluno que sai há uma grande quantidade de ofertas de emprego, que se nota muito no sector têxtil. Há muita oferta de emprego e não há alunos, porque o curso tem poucos alunos”. Um problema porque a ideia do têxtil ser um sector em crise continua a passar.
Mário Raposo, no entanto, diz que a realidade é precisamente o contrário. “O sector têxtil será talvez o maior sector industrial do País, o que emprega mais gente, o que gera mais valor acrescentado, o que tem maior número de empresas, maior volume de produção e um grande peso nas exportações portuguesas. O que alterou é que se tornou um sector mais de capital intensivo e menos de mão-de-obra intensiva. O vestuário é que se manteve de mão-de-obra intensiva”.
Além disso, explica que o sector mudou e a oferta também. “Hoje em dia, além das empresas têxteis, também as grandes cadeias de comércio a retalho estão a admitir engenheiros têxteis para escolher as colecções, pois têm de analisar a qualidade dos tecidos. Há um leque que alarga. Por isso criámos este ano o curso de Design Têxtil e do Vestuário, que passa pela associação de materiais da Engenharia Têxtil com o design de tecidos e de peças de roupa”.
Aquele responsável espera que o curso tenha uma boa adesão e que ajude a captar mais alunos. Ainda assim, é preciso fazer mais do que isso para que os alunos adiram. “O papel cabe à Universidade mas não só. Temos os meios e os recursos humanos e capacidade de formação. Mas a indústria devem mostrar que precisa de recursos humanos nessa área. E por esse meio podem criar apetência nos alunos do Secundário para que, ao escolherem um curso superior escolham um na área do sector têxtil”.
EMPEENDEDORES. O vice-reitor não esquece que muitas empresas têxteis faliram, mas outras abriram em seu lugar, o que considera próprio da dinâmica do sector, mas também de outros sectores. A verdade é que há mercado, mas quem vence são os mais empreendedores. Por isso, a UBI quer que os seus alunos desenvolvam capacidades especificas na área da criação de empresas.
“Queremos que os nossos alunos, no final da Licenciatura, tenham condições para criarem a sua empresa. Através do Ciebi, por exemplo. Mas estamos a introduzir cadeiras nos planos de estudos dos cursos para desenvolver a capacidade e a perspectiva de como podem criar uma empresa. Como podem encontrar financiamento. Mas isto pressupõe a disponibilidade da banca para oferecer capital de risco e o chamado capital semente”.
O objectivo passa por alterar a economia da região. “Está demonstrado a nível internacional que são as micro-empresas as que criam mais emprego. E os jovens engenheiros, que durante o curso desenvolvem tecnologias, podem tentar explorá-las comercialmente quando acabam o curso. Para isso há a banca, as incubadoras de empresas que temos associadas à Universidade e o Parque Tecnológico da Covilhã, que fará a ponte entre a indústria e a investigação”.
Os alunos têm que dar o primeiro passo e não temerem pelo futuro se tiverem confiança nas suas capacidades. Porque empresas a abrir é algo que não falta em Portugal. “Entre 90 e 94 foram criadas 400 mil novas empresas, das quais só 100 mil sobreviveram. Mas também neste período a criação de emprego em Portugal ocorreu nas empresas com menos de 10 trabalhadores”.
De acordo com os números de que dispõe, adianta: “Enquanto que as novas empresas criaram 30 por cento de novos postos de trabalho, as empresas com mais de 250 trabalhadores perderam 22 por cento dos postos de trabalho. Portanto é fundamental implemen-tarmos o entreprenorship”.
E explica porquê: “Porque as empresas querem reduzir custos, aumentar a qualidade e apostar na tecnologia. Logo têm menos pessoas. Essas pessoas devem ter uma actividade de suporte às empresas, dado que algumas das actividades não rentáveis para uma grande empresa podem sê-lo para uma pequena que presta esse serviço à empresa de maior dimensão. É o que chamamos o out-sorcing”.
Esta teoria do entreprenorship é aplicada na UBI desde 1990, data a partir da qual ficou a Universidade entrou numa rede europeia de universidades que dão doutoramento nesta área. Mário Raposo é um dos dois professores da UBI que já concluiu esse curso, mas todos os anos entra mais um professor nesses cursos. “Temos participado em muitas conferências e penso que a Universidade da Beira Interior é pioneira ao nível da investigação nesta área”.
EMPRESÁRIOS. Os primeiros passos da teoria empreendedora implantada na UBI deram já os primeiros frutos, pelo que alguns alunos criaram empresas através do Ciebi. ”Temos empresas de alunos nossos nas instalações do Ciebi. Este ano terão que sair, porque a zona onde está Ciebi vai começar a ser recuperado para a instalação da Faculdade de Artes e Letras”.
Mas algumas das empresas já estão na velocidade cruzeiro e a empresa estará em condições de se candidatar a um projecto e de se instalar num parque industrial. “O Ciebi aí tem sido importante, mas também em facilitar estágios. Alguns alunos passam por lá, têm contactos com empresas e acaba por ser uma escola para os alunos que terminam os cursos. Alunos que não são apenas da UBI. Também temos alunos do Politécnico da Guarda”.
As empresas criadas até ao momento são sobretudo das áreas da consultadoria, de engenharia, de informática. Com a criação do Parque Tecnológico, mais empresas poderão surgir. Um parque que nasce da colaboração de várias instituições, entre elas a Câmara da Covilhã e a Universidade da Beira Interior.
“O parque terá espaços destinados a fazer o interface entre a investigação de uma universidade e o mundo empresarial, desenvolvendo a comercialização de produtos que resultem da investigação dos vários departamentos da Universidade, desde da Bioquímica à Biotecnologia aos Têxteis, Mecânica, Electrónica, entre outros”.
Mário Raposo explica depois que um parque tecnológico é diferente de um parque industrial. “Um parque tecnológico só existe se estiver associado a uma Universidade. Se não é um parque de empresas. Além disso deve ter um meio envolvente que ajude a fomentar a criatividade. Tem empresas, mas desenvolve uma filosofia de uma escola de formação, de um conjunto de serviços de apoio e espaços livres que captem a criatividade”.
Deste modo, os produtos desenvolvidos pelos investigadores podem estar na base da criação de empresas de comercialização. Mas essas empresas terão depois de passar para um parque industrial. “A filosofia do parque tecnológico é que os pavilhões são pequenos. E embora seja importante ter uma empresa âncora, que capte e atraia outras empresas só pelo seu nome, as outras empresas existentes no parque trabalham sobretudo com investigadores e logo, com um número reduzido de pessoas”.
Falta agora definir as áreas fortes de investigação no Parque. A têxtil não será porque o Citeve já tem essa área a seu cargo. Mas o campo do agro-alimentar será uma forte possibilidade. “Pode ser desenvolvida uma área que apoie as indústrias agro-alimentares. Pois, com as obras, o Regadio da Cova da Beira vai desenvolver e aumentar a capacidade de produtos agrícolas e é necessário estudar como se podem comercializar, transportar, conservar...”.
O Parque poderá ainda ser importante na área da saúde, sobretudo quando a faculdade de Ciências da Saúde vai nascer na Covilhã. “Será importante ao nível da farmacologia, biotecnologia, da química fina. Mas no projecto da Faculdade já está previstas algumas áreas destinadas à investigação, junto ao Hospital da Cova da
Beira”.
PÓLOS NÃO SE JUSTIFICAM
Bastam boas vias
Mário Raposo considera que a dimensão da região não justifica a criação de pólos da Universidade da Beira Interior noutras zonas da Beira Interior. Diz que a população jovem está a decrescer e ainda que recupere daqui a 15 ou a 20 anos, há tempo para pensar em alternativas.
O mais importante é melhorar as vias de acesso aos locais onde o ensino superior já é ministrado, ajudando a consolidar também as instituições existentes. Até porque se verificou uma grande oferta de cursos do ensino superior e algumas vagas já ficam por preencher, nomeadamente nas engenharias.
“No Interior do país, em lugar de falar em pólos neste ou naquele local, devemos concentrar as energias nas instituições de Ensino Superior que temos na região, consolidar essas instituições. Ao mesmo tempo deve ser facilitada a movimentação de pessoas dentro da região, para que facilmente cheguem às instituições de Ensino Superior”.
O vice-reitor da UBI fala nomeadamente da auto-estrada entre Castelo Branco e Guarda, que deixa a Covilhã a meia hora de cada uma dessas cidades. “É mais rápido do que ir do Terreiro do Paço até à Faculdade de Ciências, no Campo Grande, em hora de ponta. E se falarmos em ir da Faculdade de Ciências à Faculdade do Monte da Caparica estamos a falar em duas horas de caminho para fazer 20 quilómetros”.
Por esta razão diz que é necessário dotar as instituições existentes dos equipamentos necessários, e não duplicar estruturas. Também se deve apostar em áreas com grande empregabilidade, além de melhorar a rede de transportes a nível ferroviário também, o que poderá facilitar a rede de complementaridade entre escolas de ensino superior.
“Há jovens que optam pelo ensino Universitário e outros pelo Politécnico. Mas com uma boa rede de transportes movimentavam-se facilmente na região. Logo, esta questão dos pólos não faz sentido. Estamos a falar de pequenas coisas localizadas em locais pequenos. E com a melhoria das redes, as pessoas podem morar no Sabugal ou em Penamacor mas irem às aulas a Castelo Branco ou à Guarda. E isso evitaria também a desertificação do
Interior”.
COM OS NOVOS CURSOS
Mão-de-obra vem da
UBI
A Faculdade de Ciências da Saúde poderá arrastar para a Covilhã algumas empresas ligadas à saúde, uma vez que dentro de algum tempo não faltará mão-de-obra qualificada. Mário Raposo está de acordo com essa ideia e revela que, mais uma vez, a Universidade estará na base do desenvolvimento de um sector empresarial na região.
“Desde que a Universidade começou a sua actividade e ainda como Politécnico da Covilhã, de há 25 anos para cá, os objectivos foram sempre os de formar quadros para a Região. Hoje em dia tem contribuído para melhorar o nível da formação da recursos humanos, porque as empresas têm de trabalhar com uma gestão profissionalizada em termos
organizativos, tecnológicos, de produção, entre outros”.
Aquele responsável afirma que um dos factores mais apontados para o insucesso das empresas é precisamente o da falta de recursos humanos qualificados, que limitam a competitividade. É nesse sentido que surgem os novos cursos de Design Multimédia e Design Têxtil e do Vestuário, que se iniciam no próximo ano.
“Tentamos abrir cursos que têm grande empregabilidade. Hoje em dia aposta-se bastante no multimédia. Tudo o que é comercialização de produtos via Internet, o que é desenvolvimento de campanhas de comunicação, entre outras, tem grafismo e
design. E vai ser incrementado no futuro. Logo, é fundamental que tenhamos pessoas especializadas, que dominem essas técnicas”.
As estatísticas mostram que, de facto, em Portugal há uma grande falta de técnicos nesta área, pois as instituições de ensino superior não tiveram tempo de organizar a formação. Já na área do Design Têxtil pretende-se responder às necessidades de outras áreas do sector, que não só as empresas de produção, mas também de comercialização.
NA UNIVERSIDADE
Tutores chegaram
este ano
Este ano lectivo foi criada a figura do tutor na UBI. Um papel desempenhado habitualmente por um professor, que tem a seu cargo os alunos de um dos anos de um curso e que os orienta.
“Em muitos casos, quando chega à Universidade, o aluno fica um pouco perdido. Porque nem sempre as expectativas correspondem à realidade. Daí que tem de ser acompanhado, aconselhado acerca do modo de, por exemplo, lidar com os professores, escolher métodos de avaliação, lidar com os meios disponíveis...”.
Esta figura mantém-se ao longo do curso, pelo que há um tutor para cada ano de cada curso. “Muitas vezes pode resolver pequenas questões que surgem e acabam por gerar um mau ambiente e um mau estar porque o aluno não sabe a quem há-de recorrer para tirar dúvidas. O tutor tem essa função de encaminhamento e muitas vezes fazer a ponte entre o aluno e o docente”.
Este ano cada departamento nomeou um tutor para cada ano de cada curso e o trabalho iniciou-se. Mas os primeiros resultados só podem ser conhecidos depois do final do ano. Por agora é importante que as horas de tutoria estejam bem definidas. Mas é certo que “à medida que o aluno progride no curso as suas necessidades serão outras e obviamente que o tutor terá de se adaptar aos alunos dos diferentes
anos”.
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NUNO GUERREIRO À
CONVERSA COM JOAQUIM CARDOSO DIAS
O
melhor anjo
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