Director Fundador: João Ruivo    Director: João Carrega    Publicação Mensal    Ano XIII    Nº151   Setembro 2010

Entrevista

ANTHIMIO DE AZEVEDO, METEOROLOGISTA

Senhor do tempo

Durante anos a fio foi o homem que entrou pela casa dos portugueses em horário nobre para anunciar a chuva ou o bom tempo no dia seguinte. Mesmo reformado, Anthimio de Azevedo não deixa de acompanhar e pronunciar-se, de forma sábia e pedagógica, sobre os cada vez mais extremos fenómenos climatéricos. O meteorologista afirma que «falta sentido de Humanidade», e que estamos «a gastar o Planeta como se fossemos os últimos habitantes». Sobre o sistema de ensino refere ser «chapa um» para todas as mentalidades e teima na receita do «como se faz», em vez do «porque se faz».

As suas capacidades de comunicador enquanto homem da meteorologia fizeram com que ainda hoje perdure na memória afectiva de muitos portugueses. Que lembranças guarda do período em que foi apresentador do Tempo no canal do Estado, em que o sol e a as nuvens ainda eram representados através de símbolos magnéticos?

Fui apresentador da informação meteorológica, quanto ao “estado do tempo”, na RTP, de 1964 a 1967, interrompi oficialmente para ir chefiar o Serviço Meteorológico da Guiné. Voltei à RTP em 1971 a 1975, para regressar à Guiné-Bissau, em 1976-1977, como técnico da Organização Meteorológica Mundial para organização do serviço, agora nacional, e formação de pessoal.

Regressei à RTP em 1981, para apresentação de previsões gerais e para a agricultura, até Abril de 1990, quando fui para a minha terra, os Açores, como Director Regional de Meteorologia e Sismologia.

Nessa altura não havia as novas tecnologias...

Foram tempos de ”meteorologia de “lápis e borracha”. Recebíamos observações das 00 TMG e 12 TMG, que cobriam: o Atlântico Norte até ao Trópico de Câncer, parte oriental da América do Norte, América Central, Noroeste de África e toda a Europa até aos Montes Urais. Os boletins chegavam por telefax; iam sendo marcados manualmente por pessoal treinado e, cerca de 4 horas depois da hora da carta, começava a interpretação e análise, começava a meteorologia de “lápis e borracha”. O meteorologista começava a interpretar o campo da pressão e as diferenças de massas de ar, mas… vinha mais um boletim, terrestre ou oceânico, que obrigava a usar a borracha. Pelas 6h depois da hora da carta, tentava-se um boletim de previsão que cobria o período até 24h depois da hora da carta.

Da carta das 12 TMG saía, por volta das 18h, o boletim para os meios de informação. (O TMG é agora Tempo Universal Coordenado – TUC, porque o observatório meteorológico de Greenwich foi transformado em museu. Mas o meridiano de Greenwich, considerado meridiano de longitude 00, foi mantido como referência mundial). Na RTP, a situação geral e as previsões eram riscadas, a giz, numa carta de plástico. Houve evoluções progressivas.

Depois de reformar-se, ainda voltou à televisão…

Em 1990 regressei a Lisboa, reformei-me, e fui convidado para coordenar e apresentar a informação meteorológica na TVI, então Canal 4. Aí a técnica de apresentação evoluiu rapidamente para a electrónica, com um sistema semelhante ao da CNN de então e de agora. O apresentador é que comanda a mudança de imagem, com um comando de interruptor com cabo, durante muitos anos; agora com comando de emissor. A imagem não está no “croma”.

A meteorologia “personalizada” regressou, em 2007, após 17 anos de ausência. Pensa que este tipo de apresentação credibiliza a informação meteorológica?

Qualquer informação televisiva é mais credibilizada pela “força” de comunicação de um apresentador. O que seria um telejornal de legendas comentadas em “off”? Porquê o locutor? E porque não é um, ou uma, qualquer? Para a meteorologia é fundamental uma imagem de evolução comentada da situação: explica indirectamente porquê a previsão anterior, acertou ou falhou, aponta para a evolução que se prevê e as suas consequências, tanto mais que, sendo agora usadas previsões por computador, ajustadas a cada região, o computador debita o que lhe introduzimos como características de evolução, aquela evolução que dá sequência ao que vem de trás. Mas a natureza não tem compromissos com os modelos que nós inventamos para interpretá-la…Muda sem aviso. Comentar a evolução até agora e descrever a sequência que, na continuidade, se prevê, é prevenir.

Comparando o tempo em que estava no activo e a actualidade, deu-se um grande salto em termos de fiabilidade das previsões, graças à sofisticação dos meios tecnológicos?

Deu-se um grande salto no tempo de análise e previsão. Quando começamos a trabalhar com análise e previsão por computador, com as observações das 18h TUC tínhamos a previsão, para o dia seguinte, por volta das 04h. Agora, por volta das 04hTUC, temos a previsão para 4 dias e, um pouco mais tarde, para 10 dias e a 30 níveis na atmosfera. Os coeficientes de acerto no Centro Europeu de Previsão a Médio Prazo, que pode orgulhar-se da qualidade das suas previsões em áreas de previsão de outros centros, são de 96 % para 24 h, de 75% para o quarto dia e de 30% para o décimo dia. A natureza não nos previne das suas mudanças…

Este verão está a ser especialmente quente, tendo-se já registado quatro ondas calor desde Maio. Pode-se falar em anormalidade?

As nossa vidas são pequenas comparadas com o fluir do tempo em geral. Em 5 Junho de 1985 o termómetro de temperatura máxima registou, no aeroporto a Portela, 43,0 grau Celsius de máxima. Quem se lembra disso? A nossa memória meteorológica depende muito do nosso desejo de “bem estar”.

Ainda este Verão a Europa de leste esteve debaixo de água, existindo ainda o caso das temperaturas históricas registadas na Rússia. É exagero afirmar que o ; tempo está louco?

As diferenças regionais que actualmente estamos a verificar, são desconcertantes, mas… serão exactamente anomalias? Nós vemos os estados do tempo na dimensão das nossas vidas e de alguém mais velho. Não vemos em termos de Humanidade, não vemos em termos de tempo astronómico. Ouve-se comentar que as andorinhas estão a aparecer mais cedo, de ano para ano (cerca de 15 dias). Mais cedo em relação ao calendário oficial de começo da Primavera. Que há plantas a florir mais cedo. Mas andorinhas e plantas têm um calendário biológico, que se rege pela “precessão dos equinócios”. Ou seja, pelo tempo astronómico de começo das estações. Não temos já a sensação de uma indefinição de começo das estações, mesmo em relação aos nossos tempos de ida para a escola?

O filme «A verdade inconveniente», de Al Gore, veio alertar para a influência negativa do homem no clima. Que quota parte de culpa tem a mão humana no extremar dos fenómenos meteorológicos?

O filme do senhor Al Gore, um espirro político de um político que não foi eleito, teve a oportunidade de criar imagens de informações científicas escondidas pelos interesses comerciais e não entendidas pelo vulgo. Mas há no Havai um observatório de poluição da atmosfera. E há um IPCC (Internacional Pannel for Climate Change) que há muito informou que o dióxido de carbono, CO2 , na atmosfera triplicou desde a Revolução Industrial.

Disse, em entrevista ao Correio da Manhã, em 28 Setembro de 2008, que «se todos os países do Mundo deixassem de emitir gases com efeito de estufa, seriam necessários três séculos para a natureza recuperar dos danos sofridos». Significa isto que os estragos infligidos na Terra são quase irreversíveis?

Foram quatro climatologistas ligados ao IPCC, que afirmaram, num artigo publicado na Scientific American de Agosto de 2007: “A Física por detrás das mudanças do clima”, que a atmosfera levaria cerca de três séculos a recompor-se. Mas não parámos com a poluição. Na reunião de alterações climáticas de Copenhaga, depois das cimeiras de Kioto, Rio e Janeiro e Montreal, o senhor Presidente dos Estados Unidos da América, pessoa responsável, como tem mostrado, só pode afirmar que “ os E.U. se comprometem a reduzir a sua carga poluente, até 2020, em 17% do nível de 2005”. 17%, só, pelo país mais poluidor do planeta (a China e a índia vão ultrapassar rapidamente!). Depois desta “garantia” que as empresas petrolíferas e químicas permitiram, fica “o quê?” Fica a irresponsabilidade e desrespeito pela pessoa humana dos novos poluidores e a cínica atitude de compromisso de todos os países poluidores que não têm metas de redução da sua poluição, de “pagarem quotas de poluição aos países não poluidores” ou seja “como és pobretana e não poluís, toma lá para comeres… e evoluíres (até seres membro do clube dos poluidores!)”.

Pensa que falta assumir de forma global uma consciência ecológica? Que papel devem ter os governos de todo o mundo?

Falta sentido de Humanidade! Estamos a gastar o Planeta como se fossemos os últimos habitantes dele. E é frequentíssimo ouvir, de pessoas responsáveis: “Quando é que prevêem isso? Mil anos? Quem cá estiver que se amanhe!. “Os governos existem mais para “representarem o seu partido” do que para resolver problemas. Só quando já não há hipótese de adiar é que se pensa em resolver. É utópico pôr os governos de todo o Mundo em uníssono.

O posicionamento do anticiclone dos Açores é apontado pelos especialistas do Tempo como o maior responsável pela maior parte dos fenómenos meteorológicos no velho continente. Utilizando uma linguagem simples pode explicar-nos o seu efeito para termos um dia de sol ou de chuva?

Sobre o anticiclone dos Açores, aproveito a oportunidade para esclarecer que: - Um anticiclone é um centro de pressão atmosférica alta, porque o ar desce no interior dessa região. O contrário de anticiclone é ciclone, que é um centro de pressão baixa, porque o ar sobe sobre essa região. Por erro de conceito, costuma ouvir-se falar de ciclone como região de mau tempo. Ora é verdade que as situações de mau tempo só se podem formar em centros ciclónicos, porque o ar sobe, facilita a formação de nuvens e de correntes de ar ascendente que transporta calor e humidade para níveis superiores gerando problemas de instabilidade. Mas, dos centros ciclónicos que se formam na atmosfera terrestre, 96% não chegam a ser tempestade. Ciclone não é sinónimo de tempestade!!! No Hemisfério Norte, em torno dos anticiclones o ar roda no sentido dos ponteiros do relógio e em sentido contrário em torno dos centros ciclónicos. No Hemisfério Sul, as circulações são ao contrário, por causa da rotação da Terra de oeste para leste.
 
Então, o anticiclone dos Açores, definido por ser um centro de pressão alta localizado, com muita frequência, perto do Arquipélago dos Açores, transporta ar frio do norte. Se o anticiclone está perto da costa ocidental da Europa, transporta sobre o continente todas as características de estado do tempo no Norte da Europa. Está sempre associado a um centro ciclónico a leste do anticiclone. A circulação conjunta compromete as situações. Se o A, como se designa anticiclone, está perto da Península Ibérica, bloqueia a vinda de ar marítimo e de chuva, para a Península. O anticiclone dos Açores está a manifestar tendência para estar, com muita frequência, entre o Arquipélago dos Açores e a Península Ibérica, provocando já a antevisão de algumas áreas da Península Ibérica com faltas graves de água em 2025. ( Conforme Peter Gleik. Hidrologista conceituado, num artigo “Poupemos a nossa água!” , onde apresenta uma carta mundial com análise “Onde haverá água em 2025!”).

Falando agora de questões relacionadas com a educação. Que formação e bases deve um estudante ter se quiser seguir a carreira de meteorologista?

A formação universitária para ser meteorologista é a licenciatura em ciências geofísicas, curso que tem sido modificado. Mas, se há vagas no quadro e aparecem candidatos, precisam de ter formação em Física e Matemática, a nível compatível. Eu fiz a licenciatura com a primeira estrutura do curso: as cadeiras mais exigentes de Matemática e de Física e uma introdução às geofísicas interna (sismologia e vulcanismo) e externa (meteorologia), seguindo-se um estágio de dois anos já em Meteorologia.

De uma forma global, que opinião tem sobre o sistema de ensino em Portugal?

O sistema de ensino em Portugal continua a ser “chapa um” para todas as mentalidades. É muito no ensino de «Como se faz»! (receita pura). Falta o fundamental da formação do conhecimento: «Porque se faz!» (razão dos porquês). A formação pelos porquês implica professores que saibam os porquês especializados para cada universo de conhecimento. Portanto, mais professores, capazes de leccionar alunos com níveis diferentes de aquisição (e teríamos turmas pequenas especiais, muitos mais professores a trabalhar e reprovações a muito menos). Mas os professores não devem parar no que aprenderam. Devem actualizar-se. Senão teremos o caso daquela professora que ensinava que a Terra está mais perto do Sol no nosso verão (o Verão do Hemisfério Norte), quando isso foi verdade há uns doze mil anos, com ciclo completo em 24 000 anos. É a precessão das estações a que me referi numa das questões anteriores.

Nuno Dias da Silva
Direitos Reservados

 

 


Cara da Notícia

Anthimio José de Azevedo, nasceu em Ponta Delgada, S.Miguel, Açores, a 27 de Abril de 1926. É licenciado em Ciências Geofísicas e especializado em Meteorologia e Climatologia. Na Meteorologia Nacional, chefiou o Serviço Meteorológico da Guiné (1967-1970). Foi Técnico da Organização Meteorológica Mundial para Organização e Formação na Guiné-Bissau (1975-1977). Chefiou as Divisões de Climatologia (1981-1985); Formação Meteorológica (1985-1988); Relações Internacionais (1988-1990).

Foi Delegado Nacional ao Grupo de Códigos da Organização Meteorológica Mundial (1975-1990) e ao Grupo de Meteorologia do Comité Militar da OTAN (1986-1992). Foi Director Regional para Meteorologia e Geofísica Interna, nos Açores (1990-1992.

Para Meteorologia em televisão, na RTP, foi apresentador (1962-1990) – com interrupções para as comissões na Guiné, antes e depois da independência. Na TVI, foi coordenador e apresentador de Meteorologia (1992-1996). No 10.º aniversário da METEOSAT apresentou as previsões para Portugal, via televisão alemã ZDF, desde Darmstadt. Em termos de docência foi professor auxiliar convidado na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologia, de Climatologia para Engenharia do Ambiente, de 1997-98 a 2007-08, e de Meteorologia, para Ciências do Mar, de 2004-05 a 2007-08.
 

 

 

 

CHEGA AO FIM EM AGOSTO

Amália na voz dos jovens

Os Amália Hoje despediram-se dos palcos no mês de Agosto de 2010, colocando um ponto final no Projecto Musical que no ano passado mais álbuns vendeu em Portugal. Para Nuno Gonçalves, um dos mentores do projecto, Amália Hoje foi um risco e um desafio, mas cumpriu-se o objectivo de dar a conhecer Amália Rodrigues às gerações mais novas.

É certo que os Amália Hoje é um tipo de iniciativas que não é inédito, aconteceu, por exemplo, com os Humanos. Mas foi um grande desafio pegar nos temas da Amália?

O repertório dos Humanos era um repertório que não existia, ou seja, não estava gravado, havia apenas cassetes. Deve ter sido extremamente estimulante para eles, mas não havia um termo de comparação, nós não sabíamos como as maquetes soavam. Nos Amália Hoje tínhamos o grande peso, e a grande responsabilidade, de Amália ser a maior artista de sempre, de Portugal. Era um desafio grande, mas também um grande risco. Primeiro pelas comparações óbvias com a Amália Rodrigues, e em segundo lugar, arriscarmos interpretar canções de sempre, numa linguagem não muito comum no Fado. Foi um objectivo cumprido, e uma feliz coincidência de estarmos todos juntos, para podermos fazer isto pela música portuguesa.

Como é que foi feita a escolha para o lote dos temas que foram incluídos neste trabalho?

Foram aqueles que nós achamos que serviam melhor a linguagem Pop, e a estética Pop, que nós queríamos. Não queríamos escolher aqueles fados mais óbvios da Amália Rodrigues e os mais conhecidos. Se hoje a Gaivota é possivelmente uma das músicas mais conhecidas da Amália Rodrigues é também devido a este projecto. Fizemos questão de não escolher um Povo que Lavas no Rio, ou o própria Amália, ou O Barco Negro. Foi uma escolha em que queríamos dar a conhecer um outro lado da Amália, que não estava conhecido.

Em relação às roupagens utilizadas nos temas, foi também um excelente desafio pegar naqueles temas e dar-lhe vida nova, dar-lhe o som actual?

Sim, nós vimos de uma estética Pop, nos The Gift. Eu e a Sónia vimos do Pop alternativo. O bom disto foi tentarmos juntar, ou cruzar, novas músicas portuguesas, os Moonspell, o Paulo Praça. Então o desafio foi mesmo esse, tentarmos actualizar as canções de Amália Rodrigues. Ao final deste tempo, quando se assiste a um concerto ao vivo dos Hoje, consegue-se perceber que os Hoje soam a hoje, ou seja, apesar de tudo, conseguimos ter aqui uma identidade muito própria, que é muito agradável.

Depois do estúdio, no palco as canções ganham nova vida?

Sim, por isso mesmo lançamos um disco ao Vivo, os Amália Hoje ao Vivo, gravado no Coliseu de Lisboa. Precisamente no dia em que fez 10 anos que a Amália Rodrigues faleceu. Foi uma data emblemática e nós sentimos que estas canções foram feitas também para o povo, tal e qual como a Amália as cantava. Este sentir o pulso deste fenómeno é extremamente importante para o Projecto e obviamente que as canções ganham uma vida nova, ganham uma dinâmica de palco. Acaba também por ser um puro divertimento, nós divertimo-nos imenso a tocar. Isto é muito interessante.

O disco Amália Hoje foi o álbum mais vendido no nosso mercado, no ano de 2009. Foi uma boa surpresa?

Foi, mas nós já estávamos à espera a partir do momento em que o disco esteve em número um, desde Abril, até quase Outubro. Houve ali duas semanas que saiu para número dois, mas já sabíamos à partida que um disco quando está seis meses no top, em número um, corríamos esse risco. Foi uma agradável surpresa, numa altura em que cada vez se vendem menos discos, termos uma quádrupla platina a cantar em Português.

Com o enorme sucesso deste projecto foi também uma forma de dar a conhecer os temas da Amália, e sobretudo de chamar a atenção do público mais jovem para o Fado?

O objectivo era mesmo esse. Nós sabíamos que as gerações que conheceram Amália em vida redescobriram as canções, e voltaram a ouvi-las, e quem não conhecia, experimentou pela primeira vez ouvir. Por exemplo, no vídeo clip oficial da Gaivota, quando nós começamos a gravar o disco, havia 400 ou 500 “views”, e hoje em dia temos mais de 100 mil “views”, na própria “bio” original Amália. A nova geração descobriu Amália Rodrigues através dos Hoje e o objectivo primordial era esse. Hoje quando vemos crianças de 4, 5, 6 anos a cantar os refrões, e a cantar não só os singles, mas também os outros temas, como é o caso de Foi Deus, do Nome de Rua, da Formiga Bossa Nova, é um sinal que o objectivo foi cumprido. Não só os mais velhos conhecem hoje em dia Amália Rodrigues, os mais novos também cantam Alexandre O`Neill, ou seja, temos miúdos de 5 anos a cantar a mais rica da poesia portuguesa. Acho que é muito interessante e de saudar.

Em relação aos elementos do projecto há um elemento surpresa, quase improvável, que é o vocalista dos Moonspell?

O casamento é todo improvável, o Paulo Praça, a Sónia Tavares e o Fernando Ribeiro não são escolhas óbvias. Se calhar a Sónia, sim, porque é minha parceira dos The Gift, mas eu queria correr riscos nesse sentido. Sabia que o Fernando era uma pessoa muito ligada às palavras, com dois livros de poesia editados, seria a pessoa indicada para cantar estes poemas com sentimento profundo; o Paulo Praça é um homem do Norte, e queria que este disco também tivesse pronúncia do Norte. O fado está associado a Lisboa, mas não é só Lisboa, Amália Rodrigues cantava em todo o lado, daí a escolha do Paulo Praça, que vem de Vila do Conde; e a Sónia porque achava que era a pessoa, em Portugal, que podia ir ao choque com as comparações directas com a Amália Rodrigues, ou seja, é uma pessoa que tem uma personalidade vocal muito forte. Para mim é a melhor vocalista feminina do momento e tenho a sorte de poder viver na mesma cidade que ela, ter a mesma banda com ela, e poder desfrutar da voz dela, em todos os concertos.

Tendo a Amália Rodrigues um rico espólio de temas, uma discografia bastante longa, há intenção, de voltar com um segundo trabalho?

De momento, não. Como eu disse no início foi uma feliz coincidência estarmos os três vocalistas livres, - comigo - para fazermos este projecto. Viveu de espontaneidade, viveu também de muita verdade, empenhamo-nos imenso para que este não fosse daqueles projectos plásticos. Empenhamo-nos muito nisto, por isso tocamo-lo ao vivo, até final de Agosto. Mas a porta fecha-se. O caminho mais óbvio seria talvez fazer o Amália Hoje, dois. Mas nós achamos que o caminho mais óbvio é o Paulo Praça fazer um disco a solo, que vai lançar já em Setembro; os Moonspell gravarem um disco novo; e os The Gift também saírem com um disco novo. É o caminho que nós achamos que faz sentido, nesta altura.

A Dupla The Gift em breve também com um trabalho de originais. Podem vir muitas surpresas?

Sempre. Nós nos The Gift nunca escolhemos o caminho mais fácil. Quem gosta dos The Gift está sempre à espera de alguma diferença e acho que isso se vai notar no próximo disco. Se depois as pessoas gostam, ou não, também depende um bocado do papel das rádios. Saber se na altura certa estarão lá para apoiar os temas.

Entrevista: Hugo Rafael
Texto: Eugénia Sousa
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