
Os prudentes sabem
mudar
Ninguém ignora que a fonte do vitalismo e
do crescimento do ensino superior nos países mais desenvolvidos da
Europa e dos Estados Unidos se fez à custa da admissão de milhares de
alunos seniores que aí procuraram uma formação que lhes permitisse
sobreviver na feroz economia do mercado concorrencial, ou que aí
regressaram para melhorar, ou mesmo reconverter a sua formação de base.
Para que isso acontecesse, foi necessário que essas universidades
revelassem um grande grau de abertura à mudança, à incorporação do
“novo” e uma clara percepção da estratégia a seguir face à evolução de
uma sociedade cada vez mais erosiva e, logo, desactualizante.
A procura constante desse “novo” encontrou fundamentação no princípio de
que o ensino superior é um dos recursos fundamentais e não esgotáveis
para promover o bem-estar, a segurança pessoal e social dos povos e das
nações, no pressuposto de que o capital intelectual tem tendência para
substituir o capital financeiro e o capital físico, tornando-se, por
isso, a pedra angular da prosperidade e do desenvolvimento.
As instituições de ensino superior mais prestigiadas souberam seduzir e
cativar esses novos públicos que hoje as robustecem e as revigoram.
Agiram bem, porque é sabido que existem milhares de cidadãos que se
interrogam face ao seu futuro nesta sociedade global e de grande
mobilidade de gentes e de saberes, conscientes que estão da necessidade
de manterem uma aprendizagem permanente, já que a sociedade do
conhecimento, dialecticamente, também gera a desactualização permanente.
Esses novos públicos são constituídos por adultos integrados na força do
trabalho, que interiorizaram o princípio da aprendizagem ao longo da
vida, procurando, por essa via, novos saberes que reforcem a qualidade
do exercício da sua vida profissional e lhes abram novos caminhos, ou
diferentes percursos, no seu processo de crescimento pessoal. Muitos
outros procuraram as instituições de ensino superior numa idade ainda
socialmente útil, mas em que os processos de reforma os encostaram à
desocupação precoce, não compaginável com a vitalidade que ainda
revelavam.
Neste desafio, foram as entidades privadas e de livre iniciativa que
primeiro despertaram para a realidade, adequando a oferta à procura,
enquanto que as instituições públicas se envolviam em processos de
discussão endogâmica, que certamente lhes permitiu purificar, ao limite,
a árvore, mas que as impediu de, em tempo útil, se lançarem na
exploração do manancial oferecido pela floresta.
Claro que estes novos públicos obrigam a mudanças radicais nas rotinas
organizacionais das instituições. Mudanças que abarcam sectores tão
diferenciados quanto os que respeitam aos horários de funcionamento, à
tutoria, à incorporação de novas tecnologias e do ensino a distância,
tudo isso tendo em vista a criação de um clima organizacional de
bem-estar e um atendimento pessoal e personalizado. Mudanças que
envolvem, ainda, a criação de bibliotecas virtuais, ou a implementação
de procedimentos de comunicação próximos do que poderíamos designar por
uma “pedagogia digitalizada”.
Estes novos paradigmas educacionais encerram também a necessidade,
inadiável, de exigir uma clarificação da designação das titulações das
formações em vigor, assunto sobre o qual urge a busca de um consenso,
pelo menos entre os países que integram a Comunidade Europeia, bem como
os que se candidatam ao seu alargamento.
As alterações de que falamos exigem, finalmente, o apoio da opinião
pública. Vale a pena o esforço de informação e marketing no sentido de
tentar alterar as atitudes mais conservadoras quanto ao papel do ensino
superior: o que se está a tentar mudar são estruturas demasiado
enraizadas nas representações do cidadão médio e cujas alterações custam
a compreender e a acompanhar.
Mau, muito mau mesmo, é não saber gerir os inevitáveis custos destas
alterações, cultivando-se o natural imobilismo de instituições seculares
que tardam em aceitar os novos desafios, a mudança e a necessidade de
alterar atitudes de quem aí trabalha, tendo em vista uma plena inserção
na sociedade do próximo futuro.
Péssimo, muito péssimo mesmo, é o marasmo dos governos e dos governantes
que preferem deixar nas mãos (nem sempre limpas) das regras
concorrenciais do mercado a sobrevivência das instituições de ensino
superior, em vez de desenharem com essas mesmas instituições os novos
percursos e o sentido da mudança desejada.

João Ruivo
ruivo@rvj.pt
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