Director Fundador: João Ruivo    Director: João Carrega    Publicação Mensal    Ano XIII    Nº153   Novembro 2010

Cultura

GENTE & LIVROS

David Nicholls

«Os convidados reuniam-se agora na tenda, amontoados de roda da disposição de lugares como se fossem os resultados dos exames. Dexter e Emma encontraram-se na multidão.
- Mesa cinco - disse Dexter.
- Eu estou na mesa vinte e quatro - disse Emma. - A mesa cinco é bem perto da noiva. A vinte e quatro é lá fora, perto das casas de banho portáteis.
- Não deves levar isso a peito.
- Qual é o prato principal?
- A fábrica de boatos diz que é salmão.
- Salmão. Salmão, salmão, salmão, salmão. Como tanto salmão em casamentos, que duas vezes por ano sinto um impulso de nadar rio acima.
- Vem para a mesa cinco. Trocamos os nomes dos cartões.
- Sabotar a disposição de lugares? Aqui fuzila-se gente por menos que isso. Têm uma guilhotina lá fora.
Dexter riu-se.
- Falamos depois, sim?
- Vem procurar-me.
- Ou podes vir tu procurar-me.
- Ou vens tu procurar-me.
- Ou procuras-me tu. (...)»


In Um Dia
 


David Nicholls nasceu em Hampshire, Inglaterra, em 1966. Estudou Literatura Inglesa e Drama na Universidade de Bristol, onde entrou em 1985. Após terminar o curso começa a trabalhar como actor. Parte para os Estados Unidos ao ganhar uma bolsa de estudo na Academia Americana de Música e Drama e só regressa a Londres em 1991. Aceita vários trabalhos em bares e restaurantes. Nos próximos oito anos vai representando esporadicamente. Volta a estudar, desta vez Teatro, na Royal National Theatre, durante três anos. Quando termina o curso é para se dedicar à escrita de guiões para televisão. Escreve para o canal britânico BBC uma versão moderna da peça de William Shakespeare, Much Ado About Nothing, e Tess of the D`Ubervilles.

É duas vezes nomeado para os prémios BAFTA, pelos guiões de televisão e cinema. Dos guiões televisivos destacam-se pelo seu sucesso a terceira série de Cold Feet, Rescue Me e I Saw You.

A primeira incursão na escrita dos romances é bem sucedida. O primeiro romance Starter For Ten foi selecionado para o Prémio Richard and Judy Book Club, em 2004, e adaptado ao cinema em 2006. Em Portugal o filme tem o título de Concurso Viciado.

O seu mais recente romance, Um Dia (2009), é um bestseller aclamado pela imprensa internacional - em Portugal tem a chancela da Civilização Editora. Um Dia encontra-se em fase de produção para o cinema, e o próprio Nicholls escreveu o guião. A realização do filme está a cargo de Lone Scherfig e os papéis principais pertencem à actriz Anne Hathaway (o casamento de Rachel e Alice no País das Maravilhas) e o actor Jim Sturgess (Duas irmãs, um Rei e Crossing Over).

O escritor vive no Norte de Londres, com a esposa Hannah e os dois filhos, Max e Romy.
 

Um Dia. Emma e Dexter conhecem-se a 15 de Julho de 1988, na noite em que terminam o curso. A partir desse dia eles seguem destinos diferente. Mas durante 20 anos, e sempre a 15 de Julho, o leitor acompanha a vida deles. Emma tem um percurso ascendente: começa por trabalhar num restaurante, mas acaba por conseguir o que sempre quis escrever. Apesar de um ou outro “romance” amoroso falhado, Emma avança. Dexter arranca profissionalmente como apresentador de televisão num programa de sucesso. Mas, quando a fama o abandona, arranja um emprego que não o realiza e enfia-se por um casamento que não resulta. E Vinte anos depois, ainda haverá tempo para Emma e Dexter ficarem juntos?

Eugénia Sousa

 

 

 

LIVROS

Novidades literárias

D. QUIXOTE. Aristóteles e Alexandre, de Annabel Lyon. Ano 342 a.C. O famoso filósofo Aristóteles decide, por fim, ser tutor de Alexandre, o Grande, o futuro herdeiro do trono da Macedónia. Perante uma corte cheia de perigosas intrigas, a presença e sabedoria do filósofo tornam-se uma questão vital para o jovem Alexandre. O romance é Prémio de Ficção Rogers Writers`Trust.
 

ACADEMIA DO LIVRO. A Arte de Ensinar, de Alan Haigh. São vários os objectivos que o autor propõe aos professores com este guia prático: Ensinar com Precisão; Estabelecer limites e orientações claros; proporcionar um ambiente seguro e de confiança; ensinar os alunos a pensarem; avaliar e ponderar o seu ensino.

difel. A Chave Maldita, de James Rollins. Um geneticista morre num laboratório biológico de alta segurança, na Universidade de Princeton. Um arqueólogo do Vaticano é encontrado morto na Basílica de São Pedro. Em África, o filho de um senador americano é morto num acampamento da Cruz Vermelha. Cometidos em três continentes diferentes os homicidios tem uma ligação: as três vítimas exibem a mesma marca na carne. Só o comandanete Gray Pierce e a Força Sigma poderão trazer a luz sobre estes crimes.
 

OBJECTIVA. Caderneta de Cromos, de Nuno Markl, com ilutração de Patrícia Furtado. Os ouvintes coleccionadores dos cromos de Nuno Markl podem agora ser também leitores coleccionadores, a caderneta de cromos passou das ondas da Rádio Comercial para as páginas de um livro imperdível. Se teve a sorte, ou não, de crescer nos anos 70 e 80 então vai mesmo querer ler “Retalhos da vida de um quarentão”.
 

EUROPA-AMÉRICA. O Coleccionador de Chuva, de Julia Stuart. Balthazar Jones é guarda na Torre de Londres e vive aí com a esposa Hebe e com a Sr. Cook, uma tartaruga centenária. É neste cenário que vamos encontrar uma interessante galeria de personagens com os seus conflitos, onde não falta o fantasma de Sir Walter Raleigh.
 

ESFERA DOS LIVROS. Mulheres que Amaram Demais, de Helena Sacadura Cabral. O que tem em comum Marie Curie, Gabrielle Chanel, Marguerite Yourcenar, Gala Dalí, Jacqueline Kennedy Onassis, Wallis Simpson, Marlene Dietrich, Golda Meïr, e Madre Teresa de Calcutá? Todas elas foram mulheres que amaram demais, tenha sido a ciência, a arte, o poder, os outros, e Deus.
 

OFICINA DO LIVRO. Contos de Andersen, para crianças sem medo, de Alice Vieira, e ilustrações de Carla Nazareth. Alice Vieira partiu de alguns contos do famoso escritor dinamarquês Hans Christian Andersen e deu-lhes uma nova roupagem e um novo encanto.
 

CAVALO DE FERRO. Os Peixes também Sabem Cantar, de Halldór Laxness. O jovem Álfgrímur vive uma infância tranquila ao lado da avó adoptiva. Os trabalhos na quinta, as lições de latim, as sagas islandesas que a avó recita e as histórias que os vizinhos contam ao serão preenchem as suas horas. Álfgrímur sonhava ser pescador como o avô até os seus propósitos serem abalados pela chegada de um cantor lírico que outrora foi famoso e agora esconde um segredo. Halldór Laxness é Prémio Nobel da Literatura de 1955.
 

 

 

PELA OBJECTIVA DE J. VASCO

Lord of the Dance em Portugal

Voltaram a Portugal entre 13 e 24 de Outubro. Primeiro em Lisboa e depois no Porto. Assinado por Michael Flatley, trata-se de um espectáculo onde o bem e o mal se confrontam. Toda a história parte do folclore irlandês, onde, na dança, o rigor dos movimentos está associado a um elevado sincronismo que exprime toda a força da cultura tradicional irlandesa. Foto de ensaio.

 

 

 

Música

Hurts - Happiness. Os Hurts são uma das grandes revelações deste ano de 2010. Esta dupla de Manchester, composta por Adam Anderson e Theo Hutchcraft, pisou pela primeira vez um palco no passado Verão num conhecido festival Português. A edição do álbum foi antecipada pelos singles “Wonderful life” e “Better than love” que constituiram 2 grandes sucessos radiofónicos.

No íncio deste mês de Novembro foi conhecida a terceira aposta do trabalho, a escolha recaiu sobre “Happiness” o tema que dá título ao registo. Kylie Minogue é a convidada especial no tema “Devotion”, a Australiana fez uma óptima parceria no tema. Os Huts apresentam uma sonoridade pop rock com influências da década de oitenta à mistura com incursões na música electrónica, e em alguns temas com uma melancolia muito própria.

As músicas foram muito bem construídas, percebe-se que houve muitos cuidados na produção do disco, e a frequente utilização de refrões possantes que ficam no ouvido. O potencial deste projecto é enorme, esta dupla poderá juntar-se à galeria dos maiores nomes do rock da actualidade. Destaque para os singles : “Better than love”, “Wonderful life” , “Stay” e o tema “Devotion”.
 

 

Bandon Flowers - Flamingo. A voz dos The Killers aproveitou a pausa da carreira da sua banda para lançar um disco em nome próprio. Bandon Flowers estreou-se a solo com “Flamingo”, o novo trabalho que teve como cartão de visita o single “Crossfire”.

Este novo registo conta com diversas participações de peso, como Jenny Lewis dos Kiley, Stuart Price, Daniel Lanois e Bredan O´Brien. O video do primeiro single tem outra convidada bem especial, trata-se da conhecida actriz Charlize Theron.

A primeira amostra do trabalho, o tema “Crossfire” foi muito bem recebido pela critíca e pelas rádios, recentemente foi extraído o segundo single que é o tema “Only the young”. O ponto fraco deste álbum é a colagem ao som da sua banda, em algumas faixas parece que estamos a ouvir os Killers! Mas para compensar esse facto, encontramos ao longo do disco outros temas com bons rasgos de genialiade, um rock soft capaz de embalar numa noite de Outono como é o caso do primeiro single. Os temas fortes deste trabalho são os singles ,“Crossfire” ,“Only the young”,”Hard enough” e “Was it something i said”. Esperemos que o voo deste “Flamingo” não seja o fim dos The Killers!

 

 

30 Seconds to Mars – This Is War. Este álbum é sem sombra de dúvidas um dos melhores álbuns rock dos últimos tempos! “This is war” é o terceiro álbum da banda de Los Angeles liderada por Jared Leto. Deste registo já foram retirados vários singles como é o caso de “This is war”, “Kings and Queens” e “Closer to the Edge”.

A sonoridade das novas canções é na linha condutora do anterior registo, mas com mais profundidade nas letras e acordes que deram origem a um resultado final deslumbrante! O trabalho merece nota máxima a nivel criativo, as letras são de intervenção em algumas áreas importantes da actualidade, com refrões fascinantes à mistura com uma base instrumental muito poderosa. É já no próximo mês de Dezembro que a banda regressa a Portugal, no dia 16 este trio vai subir de novo ao palco do Pavilhão Atlântico em Lisboa. Mas as boas notícias não ficam por aqui, no dia 2 do corrente mês chegou às lojas um reedição do álbum como muitas surpresas, a versão deluxe acompanhada de novos temas e um dvd como videos e algumas gravações ao vivo. Não é necessário destacar os melhores temas, porque vale a pena ouvir da primeira a ultima faixa!

Hugo Rafael

 

 

 

BOCAS DO GALINHEIRO

"Um acontecimento no cinema Português"

A “Cultura Vibra” brindou-nos nas últimas semanas com dois momentos altos de cinema. Dois momentos que, a avaliar pelo notável número de assistentes, espero, tenha reconciliado a cidade com a sétima arte, passe o chavão. Quando há oferta, e se insiste nela, os frutos, mais tarde ou mais cedo aparecem. E foi o que se viu. Ainda bem.

Primeiro com “Os Mistérios de Lisboa”, uma soberba adaptação de um folhetim de Camilo Castelo Branco publicado entre 1853 e 1855, pelo chileno Raúl Ruiz, que nesta sua incursão no cinema português o faz com uma clarividência e uma sensatez invejáveis. O argumento de Carlos Saboga, absorve a grande capacidade de Camilo para efabular narrativas, de compreender e observar a sociedade, partindo daí para narrativas ora românticas, ora sarcásticas, sobretudo imaginativas, normalmente sem poupar o pedantismo da aristocracia decadente, nem o novo-riquismo da burguesia. E, tudo isto perpassa neste filme imenso, na valia e na duração. São mais de quatro horas que se passam sem dar por elas, numa história cheia de histórias. A de um menino sem nome num colégio católico, que à medida que cresce, crescem também os mistérios da sua vida e a daqueles que o rodeiam, numa sequência absorvente de crimes, vinganças, viagens e morte. Uma das grandes e belas homenagens do cinema a Camilo Castelo Branco. Para quem não foi ao Cine-Teatro Avenida e não consiga ver o filme, a RTP vai exibir uma versão em formato de série. Não é a mesma coisa, mas decerto valerá a pena.
Outro momento alto foi a exibição da cópia restaurada pela Cinemateca Portuguesa de “Maria do Mar”, filme mudo, de 1930, com realização de Leitão de Barros, acompanhado ao vivo por Bernardo Sassetti, autor da música, ao piano e pela Orquestra Filarmonia das Beiras, sob a direcção do maestro Vasco Pearce de Azevedo, uma viagem aos primeiros tempos do cinema, em que os filmes eram exibidos sempre com acompanhamento musical e durante bastante tempo por narradores.

Sobre Maria do Mar não resisto a respigar dos textos de dois homens a quem o cinema português tanto deve. Félix Ribeiro, primeiro director da Cinemateca Portuguesa, e João Bénard da Costa, que a dirigiu até à sua morte, há bem pouco tempo. Escreveu Félix Ribeiro na sua obra “Filmes, Figuras e Factos da História do Cinema Português, 1896-1949”: “um importante acontecimento vai registar agora o cinema português – a apresentação de ‘Maria do Mar’, e quanto a nós, uma obra de excepção, que ficaria sendo, a par de ‘Os Lobos’, um dos filmes capitais da história do cinema mudo português, marcos impagáveis na senda modesta, mas efectiva e teimosa, da nossa cinematografia. Leitão de Barros, que em ‘Nazaré, Praia de Pescadores’ abordara inteligentemente e com grande sentido do significado e do poder da imagem cinematográfica, o documentário, e que em ‘Lisboa’ nos oferecia o quadro impressivo e palpitante da existência duma grande capital, apresenta-nos com ‘Maria do Mar’ a sua primeira obra de grande fôlego e autêntico prestígio”. Por seu lado Bénard da Costa refere que “foi a partir das obsessivas imagens de ‘Nazaré’ - certamente - das mais obsessivas de todo o cinema português - que Leitão de Barros, crescentemente influenciado pelo cinema soviético (e obras de Pudovkine ou Eisenstein de menor conteúdo propagandístico) e que conhecera melhor numa viagem ao estrangeiro em 1929, empreendeu o ‘documentário romanceado’ ‘Maria do Mar, estreado em 1930 e que foi unanimemente considerado o maior acontecimento havido até então no cinema português”.

O filme saiu dos estúdios da Lusitânia Filmes, fundada em 1918 por “uma meia dúzia de rapazes, alguns acabados de sair do liceu”, onde Leitão de Barros era preponderante e realizou os seus primeiros filmes, a maior parte deles de reconstituição histórica, desde logo “Malmequer”, como também haveriam de ser muitos dos seus filmes já no sonoro, “A Severa”, “Bocage” ou Inês de Castro”. Um filme que, na senda do documentário sobre a Nazaré, retrata o dia-a-dia dos pescadores e da dureza da vida do mar. Envolto em tragédia, o naufrágio e morte dos pescadores, o drama passional, os amores proibidos de Maria do Mar e Manuel. Um filme que foi uma lufada de ar fresco na cinematografia lusitana, com um toque de modernidade e de audácia, claramente revelado nas cenas envolvendo os dois amantes quando ele a salva do mar, o vestido molhado colado ao corpo e o plano fugaz do seio desnudo. Estávamos no Portugal de 1930. Foi obra. Apesar de alguns pontos fracos, desde logo a capacidade interpretativa dos actores, muito desigual, passados estes anos todos não envelheceu, o que num filme é o que se lhe exige.

Até à próxima e bons filmes.

Luís Dinis da Rosa

 

 

 

Educação às tiras

Cartoon: Bruno Janeca
Argumento: Dinis Gardete

 

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