GENTE & LIVROS
André Frossard

«Tendo entrado às
dezassete horas e dez numa capela do Quartier Latin em busca de um
amigo, saí de lá às dezassete horas na companhia de uma amizade que não
era terrena.
Entrei lá céptico e ateu de extrema esquerda, e ainda mais céptico e
ainda mais do que ateu, indiferente e ocupado com algo bem diferente de
um Deus que eu já nem sequer sonhava em negar, de tal maneira me parecia
ter caído há muito tempo na conta dos lucros e perdas da inquietação e
da ignorância humanas, saí alguns minutos mais tarde «católico,
apostólico, romano», levado erguido, retomado e enrolado pela vaga de
uma alegria inesgotável.
Tinha vinte anos ao entrar. Ao sair, era uma criança pronta para o
baptismo e que olhava à sua volta, de olhos semicerrados, aquele céu
habitado, aquela cidade que não sabia estar suspensa no ar, aqueles
seres em pleno sol que pareciam andar na escuridão, sem verem o imenso
rasgão que acabava de ser feito na tela deste mundo. Os meus
sentimentos, as minhas paisagens interiores, as construções intelectuais
em que me sentira à vontade já não existiam; os meus próprios hábitos
tinham desaparecido e os meus gostos tinham mudado.»
In Deus Existe, Eu Encontrei-o
André Frossard (14 de
Janeiro de 1915 - 2 de Fevereiro de 1995) jornalista e escritor, membro
da Academia Francesa de Letras, nasceu em Saint Maurice-Colombier,
França.
O pai foi Louis-Oscar Frossard, jornalista, homem político da III
República e primeiro secretário-geral do Partido Comunista Francês.
Proveniente de uma família em que o pai era ateu, a avó paterna judia e
os avós maternos protestantes, André Frossard foi criado como ateu. Aos
vinte anos converteu-se à religião católica romana e foi baptizado a 8
de Julho de 1935, na Chapelle des Religieuses de l’Adoration. A sua
conversão ficou registada no livro Deus Existe, eu encontrei-O (Chancela
da Esfera dos Livros).
Jornalista do jornal Le Fígaro, durante a II Guerra Mundial alistou-se
na marinha Francesa. Fez parte do movimento de Resistência à ocupação da
França pela Alemanha Nazi, e acabou por ser preso pela Gestapo. Durante
um ano esteve prisioneiro na «Barraca dos Judeus», na prisão de Fort
Montluc. Quando a guerra terminou recebeu do presidente Francês, Charles
de Gaulle, a Légion d’Honneur, a mais alta condecoração militar de
França.
Foi redactor-Chefe e jornalista em diversos jornais como Le Temps
Présent, L’Aurore e Paris-Matche; e, desde 1946, escrevia uma crónica
quotidiana para o jornal L’Aurore, com o título de O Cavaleiro
Solitário, que continuou depois no Fígaro.
Ao longo da sua vida escreveu mais de 15 mil artigos para jornais e
publicou 23 livros, muitos deles de carácter religioso. Recebeu do papa
João Paulo II a condecoração religiosa Grã-cruzada de Pio IX, em 1990.
Da sua Bibliografia constam títulos como: O Sal da Terra (1956); Viagem
ao País de Jesus (1958); A Arte de Acreditar (1979); Crime contra a
Humanidade ( 1988); Retrato de João Paulo II (1988); Deus em perguntas
(1990); O Mundo de João Paulo II (1991); e Defesa do Papa (1993).
Deus Existe, Eu
Encontrei-O. Nesta obra autobiográfica, não confessional, André Frossard
relata os anos de infância e juventude e retrata a família onde cresceu.
Contra todas as probabilidades, o pai era um homem com preocupações
sociais, mas sem preocupações espirituais, e os avós dividiam-se em
protestantes e judeus, acabou por se converter ao catolicismo. Numa
família onde não havia lugar para a religião, existiu todavia sempre um
lugar para Jesus Cristo. Pelo seu amor aos pobres, pela sua severidade
com os poderosos, por ter sido condenado pelo poder religioso da época. 
Eugénia Sousa
LIVROS
Novidades literárias
D. QUIXOTE. Um traidor dos
Nossos, John Le Carré. Perry, jovem professor académico de Oxford, e a
namorada passam férias na ilha de Antígua, quando travam conhecimento
com Dima.Dima é um milionário russo que se faz acompanhar sempre dos
guarda-costas e da família, possui estranhos sinais de riqueza e uma
tatuagem não menos suspeita. Quando Dima entra na vida de Perry e Gail
começa uma ligação perigosa que conduzirá o jovem casal até às mãos dos
Serviços Secretos britânicos.
Um Traidor dos Nossos é o celebrado regresso do melhor escritor de
espionagem da actualidade.
ÂNCORA. A Estátua – A Tortura
preferida pela Pide, de José António Pinho. Este livro é um relato
contado na primeira pessoa. O despertar para a realidade de um país
oprimido pela falta de liberdade, leva um grupo de jovens portugueses -
a quem a figura de Jesus Cristo e Che Guevera inspiram - até ao Partido
Comunista Português. Mas a demanda de um ideal de liberdade também os
fará cair nas mãos da Pide. Aqui ficam registados os quarenta dias de
prisão do autor e os sete dias de tortura.
OFICINA DO LIVRO. Portugal
Revisitado, de Chakall. O cozinheiro argentino Chakall criou um roteiro
de Viagem pelos sabores de Portugal. A partir de um périplo que o levou
de Norte a Sul do país, numa cozinha improvisada sobre rodas, o chef
utilizou os ingredientes típicos de cada região para criar receitas
simples, saborosas, com poucos ingredientes, mas de excelente qualidade.
Portugal Revisitado é uma deliciosa proposta pelo que de melhor existe
na gastronomia portuguesa.
PRESENÇA. Cinco Minutos Antes de
Adormecer, de Geronimo Stilton. De países próximos como a Espanha, ou
tão longínquos como a China, o autor escolheu belas histórias e lendas
de todo o mundo. Para ler bem aconchegado um bocadinho antes de dormir.
Cinco Minutos Antes de Adormecer é uma boa forma de desejar Feliz Natal
aos mais pequeninos.
ESFERA DOS LIVROS. Longe do meu
Coração, de Júlio Magalhães. Atrás do sonho de uma vida melhor, Joaquim
deixou Portugal a salto. Para chegar a França andou a pé durante
quilómetros, debaixo de neve e chuva, viajou em camionetas de gado e
quase perdeu a vida na travessia dos Pirineús. Ao chegar ao destino à
sua espera estava um bairro de lata de barracas tristes, com fardos de
palha em vez de cama. Mas Joaquim não foi tão longe para desistir.
Naquele lugar teria de começar a construir o futuro.
EUROPA-AMÉRICA. Os Senhores da
Sombra, de Daniel Estulin. No seguimento da obra O Clube Bilderberg,
Daniel Estulin, um premiado jornalista de investigação, volta a falar da
face obscura dos Senhores que governam o mundo. Os Senhores da Sombra
expõe as ligações entre Governos e Serviços Secretos com traficantes de
droga e terroristas mundiais, com vista a assegurar o poder e o lucro.
GATAFUNHO. O Alfabeto Trapalhão,
de Lurdes Breda, com ilustrações de Rute Reimão. Cada uma das letras do
alfabeto é a protagonista de uma quadra, e todas juntas vão construir a
história de um alfabeto trapalhão, mas muito divertido.

PELA OBJECTIVA DE J.
VASCO
SWAN LAKE ON ICE no
Porto e em Lisboa

Com música de Tchaikovsky, O Lago dos
Cisnes conta a história de um príncipe que se apaixona por uma
rapariga-cisne, vivendo um amor impossível mas enternecedor.
O Lago dos Cisnes no Gelo tem produção da Imperial Ice Stars, uma
companhia de renome internacional, que reúne os melhores patinadores de
gelo do mundo. Passaram por Portugal no passado mês de Novembro.

Música

Duffy - Endlessly. Com o
aproximar do Natal multiplicam-se as novidades no mundo da música,
trata-se de uma época estratégica para as editoras e músicos. Uma das
grandes novidades é o regresso de Duffy, dois anos depois do álbum de
estreia, ela está de volta com “Endlessly”. O primeiro avanço do novo
registo foi o single” Well well well”, que chegou às rádios algumas
semanas antes do trabalho chegar às lojas. O tema foi produzido por
Albert Hammond e contou com a participação especial dos The Roots. A
escolha não podia ser mais acertada, o tema é sem sombra de dúvidas a
faixa mais forte do alinhamento do trabalho, possui um ritmo contagiante
e um refrão esmagador!
Os novos temas mostram uma evolução na sonoridade da Gaulesa. A
melancolia é trocada pelo optimismo, o soul é trocado pelo funk e hip
hop e as baladas apresentam uma envolvência mais romântica e pessoal.
Aimee Duffy mostrou que consegue colocar a sua poderosa voz em baladas
relaxantes ou em temas bastante energéticos no triângulo do pop, funk e
hip hop, sem copiar nenhuma das divas da música. Destaque para o single
” Well well well” e os temas “My boy”,”Keeping my baby” e “Lovestruck”.
É uma boa proposta para aquecer os dias frios deste Inverno!

Black Eyed Peas - The Beginning.
Os Black Eyed Peas tem novo álbum no final deste ano de 2010. O trabalho
recebeu o título de “The Beginning” e sucede ao multi-platinado “The
E.N.D”. O cartão de visita foi o single “The time (Dirty bit)”, uma nova
versão do tema “The time of my life” da banda sonora do filme Dirty
Dancing” de 1987. A nova versão deste tema constituiu uma enorme
surpresa, pelo facto de não ser um tema original, e por pegarem num
verdadeiro clássico da música e darem-lhe uma roupagem electrónica
actual inserida no som da banda. As reacções foram bem distintas, o
público mais jovem gostou da nova versão deste tema, mas os amantes da
música dos anos oitenta tiveram uma opinião bem diferente. Wil.i.am, um
dos membros deste quarteto, continua a ser o criativo do grupo, tendo
produzindo algumas das novas faixas, mas a produção de “The Beginning”
contou também com DJ Ammo e o conceituado David Guetta. Em relação à
sonoridade das novas músicas, não surgiram grandes novidades, o som é
muito parecido com anterior “The E.N.D”.Continua a mistura da pop
Americana com a electrónica que se produz na Europa. Os temas fortes são
o single “The time (Dirty bit)” e os temas “light up the night”,” Love
you log time” e “Whenever”. Apesar da banda ter chegado ao topo do
sucesso, neste álbum dificilmente poderá haver um tema com tanta
notoriedade como “I got this feeling”.

Rihanna - Loud. Em apenas cinco
anos, Rihanna editou cinco álbuns no mercado, num impressionante ritmo
de trabalho. O primeiro avanço deste registo foi o single “Only girl (In
the world)” que foi dado a conhecer no final do passado Verão.
Recentemente foi editado o segundo single deste “Loud”, trata-se do tema
“What´s my name” que conta com a participação especial de Drake. Para a
produção do disco foram convidados vários nomes bem credenciados como
Alex da Kid, Tricky Stewart, Star Gate e Polow da Don. Rihanna convidou
ainda Nicki Minaj que dá a voz no tema “Raining men”, e a fechar o
alinhamento do álbum surge ainda a segunda versão do tema “Love the way
you lie” que tem a participação de Eminem. O novo álbum é bastante
ambicioso em vários aspectos. A personalidade de Rihanna é camuflada
através das experiências com novos sons, de uma forma versátil.
A sonoridade dos novos tema é dominada por uma inteligente mistura de
Soul, Hip Hop, Dance Hall e Rap sempre com a carismática energia vocal
da cantora. As faixas que mais emergem neste disco são os singles “Only
girl (In the world)”, “What´s my name”, o tema “Fading” e a segunda
versão de “Love the way you lie”.Até o Pai Natal vai gostar de ouvir
este “Loud”!!!

Hugo Rafael
BOCAS DO GALINHEIRO
Adeus Mr. Berlanga!

No panorama do cinema europeu, a que
temos dado a devida relevância neste espaço, não por falta de vontade,
mas pelo quase monopólio que o cinema de fala inglesa, principalmente o
americano, impõe, a cinematografia do nosso vizinho ibérico teve sempre
relativa relevância, nomeadamente por via de um punhado de realizadores
que se impuseram à escala mundial. E, se outra medida não tivesse, as
nomeações para o Oscar podem ser um ponto de partida, mais ainda quando
trazem a cobiçada estatueta para casa. E em ambos os casos a lista já é
distinta.
De “A Vingança”, de Juan Antonio Bardem (1958), passando por “O Amor
Bruxo”, de Francisco Rovira Beleta (1967) “Tristana”, (1970) e “Esse
Obscuro Objecto do Desejo”, de Luis Buñuel, “Mamãe Faz Cem Anos”, (1979)
e “Carmen”, (1983) de Carlos Saura, “Sessão Contínua”, (1984), “Matéria
Aprovada” (1987) e “O Avô” (1998) de José Luis Garci ou ainda “Mulheres
à Beira de um Ataque de Nervos” (1988), de Pedro Almodóvar, são alguns
dos filmes nomeados para o galardão de Hollywood, sendo que foram
galardoados, em 1972, Luis Buñuel, pelo Melhor Filme de Fala Não Inglesa
com “O Charme Discreto da Burguesia”, até que em 1983 um espanhol volta
a ganhar o Óscar para Melhor Filme de Fala não Inglesa, na altura José
Luis Garci com “Voltar a Começar”. Fernando Trueba é premiado em 1993
pelo Melhor Filme de Fala Não Inglesa, com “Belle Époque”, um filme com
co-produção portuguesa e uma lasca do Oscar com sabor albicastrense, uma
vez que um dos assistentes de realização foi o meu amigo Fernando
Centeio (há tanto tempo que não o vejo que lhe mando daqui um grande
abraço). Por seu lado Pedro Almodóvar, recebe estatuetas de o Melhor
Filme de Fala não Inglesa com “Tudo Sobre inha mãe” em 1999 e em 2003,
para o Melhor Guião de “Fala Com Ela” e com Alejandro Amenábar Espanha
volta ganhar em 2004 o Óscar para o Melhor Filme de Fala não Inglesa com
“Mar Adentro”, para já não falar dos dois Oscar para melhores
secundários de Javier Bardem em 2008 no filme dos irmãos Coen “Este País
não é para Velhos” e no ano seguinte Penélope Cruz arrecada o seu em
“Vicky Cristina Barcelona”, de Woody Allen.
Curiosamente aquele que unanimemente é considerado o melhor realizador
espanhol, Luis García Berlanga, apesar duma primeira nomeação em 1961
por “Plácido”, que com “Bienvenido, Mr. Marshall!” (1952) e “El Verdugo”
(1963) formam a trilogia de obras-primas que o imortalizaram, por elas
se ficou.
Nascido em Valência, no seio de uma família burguesa, neto de um
governador da cidade e filho de um deputado da União Republica (Frente
Popular), estudou Direito, Filosofia e Letras, que abandonou para
intervir nos últimos meses da Guerra Civil (1936-1939) pela facção
republicana. Mais tarde, integrou a Divisão Azul e, no seu regresso da
Rússia, dedicou-se à pintura e criou um cineclube em Valência.
Das suas primeiras curtas-metragens, destacam-se “Paseo por Una Guerra
Antigua” e “Tres Cantos”, ambas de 1948, “El Circo” (1949) e “Se Vende
un Tranvia” (1950).
A sua estreia na longa-metragem foi em 1951 com o filme “Esa Pareja
Feliz”, co-dirigido com Juan António Bardem. “Bienvenido, Mr. Marshall”
foi o seu primeiro filme, tendo sido premiado em Cannes. Na década de
1950, rodou “Novio a la Vista” (1953), “Calabuch” (1956) que recebeu o
Prémio OCIC em Veneza, e “Los Jueves, Milagro” (1957). Na década de 1960
filma “Plácido” (1961) e “El Verdugo” (1963). Da sua produção da década
de 1970 destaca-se “Tamaño Natural” (1973) e a sua original denúncia da
corrupção do poder em “La Escopeta Nacional” (1977). Na década de 1980,
em que recebeu o Prémio Nacional de Cinematografia (1981) e a Medalha de
Ouro de Belas-Artes, voltou a representar a Espanha na corrida ao Óscar
com “Património Nacional” (1981), e estreou “La Vaquilla” (1985) e
“Moros y Cristianos” (1987). Em 1993, com “Todos a la Cárcel”, recebeu
três Prémios Goya (Melhor Filme, Realizador e Som) e o Círculo de
Escritores Cinematográficos distinguiu-o como o Melhor Realizador.
“París-Tombuctú” (1999) fechou esta década e a sua filmografia, tendo
recebido o Prémio da Federação Internacional da Imprensa Cinematográfica
(Fipresci) e um galardão do Festival Internacional de Mar de Plata. A
sua produção cinematográfica caracteriza-se por uma ironia mordaz e
sátiras sobre diferentes situações sociais e políticas, sendo que
durante a ditadura franquista, apesar da censura, sempre consegui
contornar as situações com diálogos esmerados alguns da autoria do seu
grande colaborador o guionista Rafael Azcona.
Berlanga tido como “libertário e individualista”, fez um “brilhante
trabalho” em prol do cinema espanhol enquanto presidente da Filmoteca
Nacional (1979-1982), trabalho que rematou em 1989, inaugurando a nova
sede da Filmoteca e o restauro do Cine Doré. Presidente honorário da
Academia Espanhola do Cinema, de que foi um dos artífices, retirado
desde 2000, apareceu em público pela última vez a 16 de Maio na
inauguração da Sala Berlanga (antigo cinema Califórnia, que antes fora
um cinema “de barrio” e depois porno ), um espaço destinado a tornar-se
um ponto de referência do cinema espanhol, ibero-americano e europeu
independente.
Morreu no passado dia 13 de Novembro na sua casa em Madrid. Até sempre!

Luís Dinis da Rosa
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