O que faz falta é
avaliar a malta?
A avaliação de um professor é uma
actividade projectada no futuro. Conhecidos que forem os resultados da
avaliação, tudo, ou quase tudo está por fazer. É com base nos dados
recolhidos pelo avaliador e pelo avaliado que se traçam as grandes
linhas de actuação que estão para vir. Ou seja, as actividades de
melhoramento ou de remediação do desempenho do professor começam
precisamente aí. Por isso mesmo, o resultado da avaliação é tido como um
dado de presságio que, em contínua espiral de desenvolvimento, deve
acompanhar toda a carreira do professor, adaptando-se às necessidades
pressentidas em cada um dos diferentes estádios profissionais que ele
atravessa.
O processo de avaliação, assim entendido, terá que merecer uma aceitação
indiscutível por parte de avaliadores e de avaliados. Até porque o
professor, em determinadas situações avaliador de si próprio, deve
contribuir para que progressivamente sinta que é dispensável a ajuda
externa dos seus supervisores, já que a avaliação deve encaminhá-lo para
estádios de mestria, e para progressivos níveis de excelência,
conferidos pelo auto-controle e pela auto-formação. Nestes contextos a
classificação pode até ser um prescindível elemento da avaliação… Daí
que se diga que o principal objectivo do supervisor é… tornar-se
dispensável.
Em Portugal vivemos momentos de pura cegueira sobre esta matéria. Há
quem entenda que a implementação séria de um modelo de avaliação dos
professores é tarefa administrativa, resultando apenas de progressivos
consensos gerados à mesa de negociações.
E, de todo, não o é! Pelas implicações pessoais e profissionais que pode
implicar, um modelo de avaliação de professores é coisa mais séria… Tem
que contemplar a soma das actividades em que ele se desdobra e em que se
envolve. Logo, deve apreciar o professor enquanto profissional, mas
também como pessoa, como membro de uma comunidade, como técnico
qualificado na arte de ensinar e como especialista das matérias que
ensina. Portanto, requer a intervenção, desde logo dele próprio, mas
também de outros agentes que sobre ele se pronunciam. E todos esses
intervenientes do processo avaliativo, para que consigam alcançar o
exercício pleno da sua missão, carecem de uma formação específica e
especializada em supervisão e em observação de actos pedagógicos.
Na sociedade do conhecimento e da informação, requer-se também a
montagem de uma rede de comunicações, em que a vídeo gravação e a
observação à distância tenham lugar de destaque; assim como se deve
promover o recurso à hetero-observação, à autoscopia, à
vídeo-conferência e à circulação de portefólios digitais, enquanto
recursos, meios e produtos indispensáveis ao desenvolvimento de docentes
que, diariamente, lidam com jovens da geração facebook.
Por isso mesmo, a avaliação, e os produtos dela decorrentes
(eventualmente a classificação) não podem ser anuais! São desejáveis
períodos mais longos (por exemplo quatro anos – medida do intervalo dos
concursos e da progressão nos escalões) para que o resultado da
avaliação se sedimente; para que os efeitos da melhoria do desempenho
possam ser observados, registados e reflectidos; e para que deles possa
emergir um sentimento de gratificante recompensa pelo trabalho
entretanto desenvolvido.
Um sistema destes também requer tempo para ser testado e validado, antes
de ser generalizado. Impõe uma escolha criteriosa das escolas que irão
constituir a amostra, bem como dos instrumentos e dos agentes que vão
avaliar esse pré-teste. Obriga a uma escolha prudente dos futuros
avaliadores, após se ter procedido ao estabelecimento de um perfil
desses supervisores. Impõe a rápida formação dos professores e dos seus
avaliadores… Isto é, a implementação de um tal sistema requer tempo e a
afectação generosa de recursos humanos e financeiros.
Não me parece ser este o caminho escolhido pela tutela. Esta está mais
apostada em proceder a um rápido remendo administrativo, ou a uma
reforma semântica, de um sistema de avaliação, burocrático e siadapiano,
que até hoje apenas provou que nada vale.
Á mesa das negociações traçam-se cenários que tudo têm a ver com a busca
de uma solução política que ultrapasse o quadro de guerrilha que se
apoderou das nossas escolas. Mas, reconheça-se que, se nessa fotografia
ninguém quiser ficar mal, esses cenários pouco terão que ver com as
merecidas vitórias por que tanto e tão dignamente lutaram os professores.
João Ruivo
ruivo@rvj.pt
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