RUI SANTOS, JORNALISTA
O comentador
anti-sistema

Polémico, frontal, sem papas na língua. O
seu maior desejo é continuar a analisar e a escrever em liberdade. Os
adeptos e os “donos” da bola, sejam eles indefectíveis ou detractores do
estilo, já não dispensam ouvir e ler os seus comentários na TV e nos
jornais. Rui Santos, o comentador que ousa vergastar o «sistema», afirma
que «a fraca credibilidade do futebol começa na fraca credibilidade do
poder político», que o tráfico de influências é o maior problema do
futebol e que a imprensa desportiva é um prolongamento do «aparelho
clubístico». O rosto do «Tempo Extra», na SIC-Notícias, fala também
sobre o País, considerando que Portugal está «bloqueado» e «cada vez
mais perigoso» e que em termos de impulso reformista vivemos algures
entre os reinos de D. João VI e D. Sebastião.
Quando o leitor tiver este jornal
nas mãos, já se iniciou o campeonato. Pensa que o FC Porto parte melhor
posicionado para conquistar o quarto título consecutivo? Que análise faz
aos plantéis dos «grandes»?
O FC Porto apresenta-se sempre mais bem posicionado desde que alguns
presidentes do Benfica, acolitados por outros dirigentes sem visão nem
opinião, deram cabo de um capital imenso de credibilidade de uma das
maiores marcas e referências de Portugal. Vale e Azevedo é o bode
expiatório útil. Mas é, no mínimo, intrigante que, no presente, outros
presidentes do passado sejam poupados pela “entourage” actual. O Benfica
já estava em plano inclinado quando Vale chegou. O Benfica partiu sempre
com a vantagem de ter uma massa adepta ímpar no contexto nacional (e até
internacional), chegou a ter o maior estádio do País (um erro resultante
da típica megalomania portuguesa) e os melhores jogadores portugueses. O
que não teve? Alguém que, ao longo dos tempos, percebesse que os
resultados, no futebol, não dependem apenas de magistérios de
influências mas também de profissionalismo. O Benfica desgastou-se muito
a combater magistérios de influência que foram seus, nunca encontrou
forma de combater Pinto da Costa (porque quis copiá-lo) e perdeu-se na
voragem de fazer e desfazer plantéis a qualquer preço. O FC Porto soube
criar condições para “dominar” a conjuntura mas teve a ciência de, no
futebol, impor um regime de profissionalismo que, nos últimos anos,
conheceu hiatos, mas nunca fracturas comprometedoras.
O Sporting de Paulo Bento poderá ser
um conjunto mais equilibrado?
O Sporting não se assume, gere. Num campeonato macrocéfalo como o nosso,
isso às vezes chega para criar uma ideia de força. O Sporting tem o
conceito exacto do ponto de vista da detecção dos talentos. Mas falha a
seguir, na pós-formação, não apenas por razões financeiras. Tal como no
Benfica, há um paradigma de falta de exigência impressionante.
Quanto aos plantéis: Benfica melhorou, mas tem uma factura pesada do
passado a pagar (uma equipa nova não se constrói com três cantigas);
Sporting melhorou, porque soube alterar a sua concepção de jogo,
eliminando um conjunto de jogadores que não eram solução para nada; o FC
Porto manteve o molde, roubou o melhor jogador ao Benfica
(inacreditável!), mas tem algumas questões em aberto. O plantel é bom.
Disse na apresentação do seu livro
«Estádio de Choque» que «há muitas ilusões, enganos e mentiras à volta
da indústria do futebol. Há que trabalhar para erradicar a batotice».
Este «nosso» futebol precisa de um tratamento de choque?
Já não acredito em tratamentos de choque, simplesmente porque não vejo
pessoas capazes de os protagonizar. A fraca credibilidade do futebol em
Portugal começa na fraca credibilidade do poder político. Essa osmose é
catastrófica para o País.
O ex-presidente do Sporting, Dias da
Cunha, apontou o dedo a Pinto da Costa e a Valentim Loureiro,
nomeando-os os «rostos do sistema». Os processos “Apito Dourado” e
“Apito Final” deitam por terra esta teoria ou tudo vai continuar como
dantes?
Todos aqueles que se insurgiram contra os “donos da bola” ou estão na
prateleira, na reforma ou foram pura e simplesmente exterminados. Há,
também, os enganadores. Os falsos reformistas. Apregoam que são a favor
da mudança quando apenas defendem o seu torrão. Os deuses-diabos da
vida. É certo: avançou-se alguma coisa, mas não o suficiente. Ainda
estamos entre o D. João VI e o D. Sebastião. E não nos livramos da
herança fascista. Há para aí uns “grandes democratas” que são piores que
os bastiões da ditadura. Portugal precisa de uma grande referência no
aparelho de Estado. Sócrates tem alguma sede reformista, mas, na sua
aparente firmeza, precisaria de não nos fazer lembrar Alves dos Reis.
Na minha juventude, porque vivi o 25 de Abril numa fase crucial do meu
crescimento, acreditava no socialismo moderado. Continuo a acreditar na
defesa de causas, mas acho que o modelo partidário cavou a sua própria
sepultura. Estou muito decepcionado com o PS e com o próprio Bloco
Central. A esquerda e a direita barafustam, dizem algumas verdades,
nesse sentido têm um papel útil, mas os portugueses não gostam de correr
riscos. O País está bloqueado.
Escreveu num artigo no «CM» que
existe um «Corrupção Futebol Clube». É essa convicção generalizada, que
afasta os adeptos das bancadas ou há outros factores, como o preço dos
bilhetes e a falta de qualidade dos espectáculos, que tira espectadores
dos recintos?
O tráfico de influências é o maior problema do futebol português e,
porventura, do País. A falta de clareza e de verdade nos discursos. A
clubite assustadora. A falta de cultura desportiva e democrática. E,
claro, o fraco nível da nossa Liga, os bilhetes caríssimos e a sensação
de insegurança.
Foi jornalista de «A Bola» durante
26 anos. Hoje, critica fortemente a subserviência do jornalismo
desportivo aos «três» grandes, ignorando o lado «negro» do futebol. De
que interesses está «refém» a imprensa especializada?
A imprensa desportiva é um prolongamento do “aparelho clubístico”. Ao
partir do princípio que não sobrevive sem ele, acumulou erros sobre
erros e deitou-se por baixo dele, prostituindo-se. Há ainda uns assomos
de independência e ainda há quem pense que é a crítica independente que
afasta os leitores. Não é. É a falta de trabalho, a investigação, a
aposta em jornalistas sem tempo suficiente para adquirirem experiência
no terreno. É, também, a precariedade do emprego e, sobretudo, as
chefias que são preenchidas por comissionistas da ideologia clubística.
O problema de alguns jornalistas desportivos nem é sequer a questão
muito badalada de nunca terem dado um pontapé na bola (o argumento, nem
sempre verdadeiro, dos ignorantes); é a falta de cultura geral.
Segundo consta abandonou, por
vontade própria, o seu jornal de sempre, «A Bola», alegadamente por os
seus artigos terem sido «censurados» por dirigentes de um grande clube.
É verdade?
Os meus detractores puseram a correr a infâmia segundo a qual teria sido
“expulso” de «A Bola». Como se isso fosse possível! Era accionista,
estava há 26 anos no jornal que me formou e ao qual dei toda a minha
disponibilidade e afectividade, mas confirmo que já não me identificava
com a “política de favores” que a Direcção do jornal começou a pôr em
prática, ao contrário do desígnio dos fundadores e dos jornalistas de
referência. «A Bola» deixou de ser a «Bíblia» quando o sucessor de
Carlos Miranda passou a fazer todo o tipo de favores aos clubes e a pôr
em causa a liberdade de expressão. Saí porque amo a liberdade, mas saí
quando quis e como quis. «A Bola» continua viva na minha memória e não
confundo dois ou três comissionistas com a história e os verdadeiros
heróis do jornal. Lamento muito que o Arga e Lima tenha consentido o que
consentiu. E a saída de Maria Margarida Ribeiro dos Reis diz tudo sobre
a degradação que tomou conta do jornal. «A Bola» está hoje como o
Benfica – conservou o nome (marca) e sobrevive à conta dele.
Artificialmente.
Citando o prof. Moniz Pereira,
existe uma «monocultura futebolística», desenvolvida pelos mass media,
que abafa todos os outros desportos e até acontecimentos de relevo.
Concorda?
Em absoluto. Teria propostas para contrariar essa situação, mas, hoje,
longe das redacções, não tenho nada a ver com isso. Porque não vejo
pessoas interessadas na mudança. Só quero escrever em liberdade. E
escrever em liberdade pressupõe ter de suportar as pressões não apenas
dos “homens do futebol” e da política mas também dos tais comissionistas
(de serviço) da imprensa. Não é nada fácil.
Foi alvo de uma tentativa de
agressão à saída da SIC, depois da sua participação no «Tempo Extra».
Utilizando uma imagem da política, celebrizada por Jorge Coelho, pode-se
dizer que quem se mete com os “donos da bola”, leva?
Vivemos num País cada vez mais perigoso. E de pessoas muito mal
formadas. Quando fui agredido até puseram a correr o boato de que aquilo
tinha sido uma encenação. Só eu sei o que passei e o que tive de fazer
para garantir, de algum modo, a minha segurança e daqueles que me
rodeiam. Choca-me que a mediocridade pessoal e profissional chegue a
este ponto.
O seu programa é dos mais vistos do
canal por cabo de Carnaxide. Analisando os moldes do «Tempo Extra» e de
«As Escolhas de Marcelo», encontramos algumas semelhanças. Considera-se
o prof. Marcelo Rebelo de Sousa do futebol?
Tenho alta consideração por Marcelo Rebelo de Sousa e acho-o de uma
competência inquestionável. Infelizmente não o consigo ver nem ouvir
como gostaria, por causa do meu trabalho. Penso que a admiração é mútua.
Assumiu-se como um dos maiores
críticos da gestão Madaíl/Scolari. Contudo, a selecção fica para a
história, como vice-campeã de Europa e 4ª classificada no mundial.
Perante os factos, o novo seleccionador, Carlos Queiroz, recebe uma
herança demasiado pesada?
Não concordei com o regresso de Carlos Queiroz à Federação Portuguesa de
Futebol (FPF). Penso que ele será o maior prejudicado. Calculo que os
problemas com os quais se confrontou há quase 20 anos sejam praticamente
os mesmos. Os tempos são outros, Queiroz está mais maduro, mas acabará
por se sentir saturado de uma mentalidade que não muda. A porcaria é
mais ou menos a mesma. Mas compreendo que, depois de tantos anos de
emigração (forçada) sentisse vontade de regressar e fazer uma coisa que
tanto gosta: treinar, escolher jogadores e apurar tácticas, ao mesmo
tempo que olha para os problemas do futebol nacional. Irá perceber que o
País não mudou e que mais valeria ter aguentado as nuvens negras e o
frio de Manchester. E não terá o apoio que Scolari teve.
Acompanhou durante muito tempo as
camadas jovens do nosso futebol, nomeadamente na era Queiroz/Vingada. A
actual crise de títulos pode indiciar que o «viveiro» de grandes
talentos, como Cristiano Ronaldo, Quaresma, Moutinho e Nani, entre
outros, está em risco de se esgotar?
Sim. Porque ninguém se preocupou com a continuidade de um “programa de
desenvolvimento” que assegurou durante cerca de 15 anos alguma
credibilidade à Selecção Nacional. Queiroz criou a “geração de ouro” e
os que lhe seguiram não tiveram capacidade para manter as rotinas e os
métodos. Podemos cair, a prazo, no vazio. Scolari foi um dos maiores
inimigos do desenvolvimento sustentado. Ajudou a demolir o “edifício das
Selecções”, ao não evidenciar qualquer tipo de preocupação com as
selecções mais jovens.
Segundo várias organizações
internacionais, o sistema de ensino português continua altamente
deficitário em termos de resultados. A Educação está ao nível do futebol
indígena, paupérrima e sem futuro?
Acredito na Escola como um complemento da Educação. Sem Educação a
Escola é praticamente inútil.
Ministério da Educação, professores,
alunos e encarregados de educação, são os principais agentes de um
sistema burocrático e, não raro, envolto em convulsões, como se viu
recentemente com a contestação da classe docente. Qual a receita para
pôr estes protagonistas a remar para o mesmo lado?
Uma revolução cultural e de mentalidades. O foco deve ser colocado sobre
os alunos na melhoria dos resultados daqueles que representam o futuro
do País.
Na coluna «Semiópticas» no «CM»,
efectua, frequentemente, incursões na análise política. Recentemente
escreveu que «o sistema político protege os políticos e não as pessoas».
Para mudar este sistema é preciso mudar a cultura partidária instalada?
Já respondi: os partidos esgotaram-se na convicção de que o povo pode
ser permanentemente manipulado. Não é assim. Há cada vez mais
universitários nas caixas dos supermercados.

Nuno Dias da Silva
Cara da notícia
Os programas de debate e análise
futebolística são os que captam mais audiências na SIC-Notícias. «Tempo
Extra» é um deles, no rescaldo de cada jornada dominical. Ao longo de
mais de 60 minutos Rui Santos comenta as incidências do futebol
indígena. São muitos os que o odeiam, tendo sido inclusive vítima de uma
tentativa de agressão quando saía dos estúdios de Carnaxide, mas também
há os que não lhe regateiam elogios pela sua frontalidade visando o
status quo futebolístico. Mas todos o vêem, religiosamente ao domingo à
noite, e também o lêem, de segunda a sexta-feira, na última página do «Record».
Rui Santos nasceu em Lisboa a 6 de Junho de 1960. Há 33 anos que escreve
na imprensa. Cumpriu uma longa parte da sua carreira na «Bola», que
muitos consideram a «Bíblia» do desporto-rei, onde publicou o seu
primeiro artigo a 12 de Janeiro de 1976. Durante os 26 anos que passou
no diário desportivo da Travessa da Queimada, tendo sempre por
referência o seu tio, o carismático jornalista Vítor Santos, ocupou
diversos lugares de chefia, nomeadamente o de chefe de redacção,
acumulando com o cargo de accionista do título. Acompanhou de perto as
camadas jovens do «nosso» futebol, especialmente no período áureo de
vitórias das gerações de Figo, Rui Costa e João Pinto, sob a batuta da
dupla Carlos Queiroz e Nelo Vingada.
Antes de ingressar na SIC, foi colunista do «Correio da Manhã», no
jornal e nas revistas da publicação da Cofina, cruzando, frequentemente,
os temas futebol e política. Em Fevereiro de 2007, publicou «Estádio de
Choque», da editora Esfera dos Livros, um livro que é «uma reflexão
sobre o futebol» e a «denúncia daquilo que é o futebol».

ANTÓNIO CÂMARA,
EMPRESÁRIO E INVESTIGADOR
Faz falta uma reforma
política das universidades

A meteórica projecção da YDreams na
vanguarda tecnológica devia ser um exemplo para Portugal. António Câmara
é o homem do leme desta empresa que desenvolve, entre outras
funcionalidades, jogos para telemóveis, com clientes nos quatro cantos
do Planeta, e que recorre à qualidade e à originalidade como os seus
maiores trunfos. O investigador e empresário rejeita o défice de
exigência dos cursos universitários portugueses, afirma que o dinheiro
não é problema, mas não deixa de criticar a política de recursos humanos
nas faculdades. Sobre os portugueses, diz que lhes falta sonhar.
A YDreams é uma empresa de sucesso
na área do software para multimédia, realidade virtual e computação
móvel. Fundada em 2000, tem interesses em quase todo o mundo e
delegações em Barcelona, Austin, Xangai e Rio de Janeiro. Qual o segredo
para tão rápido sucesso?
A investigação conduzida na FCT-UNL (a origem da empresa), e depois
continuada na Ydreams, sempre com os mais elevados padrões de qualidade.
China e Índia, dois mercados
emergentes, são apostas prioritárias da sua empresa. Num momento em que
Portugal perde os seus sectores tradicionais, como os têxteis, para
estes mercados, qual acha que é o factor de atracção das soluções
software da sua empresa?
A originalidade. A YDreams apostou no mundo pós-computador pessoal e
pós-browser. Há um número muito reduzido de empresas que o tenha feito.
O jogo de telemóvel com Cristiano
Ronaldo é das soluções mais populares da YDdreams. O que é que Portugal
tem a ganhar ao potenciar ao máximo a popularidade do futebolista para
projectar o País internacionalmente?
O Cristiano Ronaldo é hoje uma das principais marcas mundiais. A
associação à sua marca permite notabilizar imediatamente um produto no
mercado global.
Frequentemente exalta a confiança
que se deve depositar na capacidade dos portugueses e prevê, até, que
Portugal em 2015 pode ser o local mais vibrante para viver, estudar e
trabalhar na Europa. Não acha que é excesso de optimismo quando
assistimos, diariamente, a manifestações de passividade e derrotismo?
O sonho comanda a vida, como dizia o meu antigo professor Rómulo de
Carvalho. No mundo de hoje, em que as mudanças são rápidas, não é
impossível ver empresas portuguesas no primeiro plano mundial em oito
anos. O impacto desses acontecimentos na sociedade portuguesa será
enorme devido à nossa reduzida dimensão.
Quando foi distinguido com o «Prémio
Pessoa», o júri enfatizou o seu carácter empreendedor. Inovação,
criatividade e empreendedorismo, é o que falta a Portugal?
Falta, em primeiro lugar, o sonho. Depois, em termos mais prosaicos, o
conhecimento e experiência de marketing e vendas à escala global. Mas há
criatividade e uma capacidade, pelo menos idênticas às dos países mais
avançados, de resolver problemas.
O facto de ter estudado no
estrangeiro, mais concretamente nos Estados Unidos, mudou-lhe os
horizontes profissionais, pessoais e a atitude perante as adversidades?
Totalmente. Foi uma experiência decisiva e só tenho a agradecer a
Virginia Tech que pagou integralmente o meu doutoramento.
Diz-se que a falta de cultura de
exigência, aliada ao desinvestimento em verbas para investigação e
desenvolvimento, é uma das pechas transversal a todo o sistema
educativo. Concorda?
Não. Há fundos nacionais e europeus mais do que suficientes para
projectos de investigação. Nunca tive o menor problema nesse aspecto.
Quanto à cultura de exigência também não concordo. Todos os jovens que
seguiram o Programa Erasmus, com quem falei, dizem que o ensino superior
em Portugal é mais exigente do que nos países europeus. Em engenharia,
não tenho a menor das dúvidas que assim é.
Acredita que o sonho de qualquer
jovem engenheiro deve ser fundar a sua própria empresa baseada no
conhecimento. Em Portugal, pensa que isso é facilmente exequível, visto
que as empresas e as universidades estão por norma de costas voltadas?
Acredito. O principal problema para um jovem é ter acesso aos potenciais
clientes. Essa era uma ajuda decisiva que as universidades poderiam dar,
a exemplo do que se passa nos Estados Unidos.
Faz falta uma reforma política das
universidades, por forma a que estes estabelecimentos acompanhem os
sinais dos tempos?
Sem dúvida. A gestão das universidades, começando pela inconcebível
gestão dos recursos humanos, tem que ser alterada.
O Processo de Bolonha, com a livre
circulação de estudantes pelo espaço europeu, vai «roubar-nos» os
cérebros que ainda restam no nosso País?
Vai certamente roubar alguns, mas a exposição ao mundo exterior vai ter
consequências positivas a médio prazo.
Numa entrevista recente afirmou que
este ano a Ydreams iria desenvolver uma acção de responsabilidade social
na formação da juventude para o empreendedorismo e no domínio da ciência
e tecnologia. Que frutos pensa recolher com esse autêntico serviço
público que uma empresa privada, como é a sua, desenvolve?
Temos programas de visitas, estágios e pensamos organizar um campo de
férias no próximo Verão. Esta é uma responsabilidade que assumimos com o
maior prazer e sem querer recolher quaisquer frutos.
Os jovens de hoje demonstram
demasiado apego, quiçá dependência, face ao mundo virtual, através de
horas a fio passadas no Messenger, YouTube, Hi5, Facebook ou blogs. Se
não se regular o tempo dispendido no mundo virtual, corre-se o risco de
ficarem «desligados» da realidade?
Corre-se e há já casos extremos referidos nos media. Os pais têm uma
imensa responsabilidade nesta situação.
A Web 2.0, baseada nas redes
sociais, tende a tornar mais impessoais os relacionamentos humanos?
Ainda é cedo para o afirmar. Nós vivemos, apesar de tudo, no mundo
físico e contactamos sempre com um número limitado de pessoas. As
relações com as dezenas de pessoas que listamos nas nossas redes sociais
são mais impessoais, certamente.
Tem expresso a sua opinião sobre a
redefinição do modelo de cidade. O que pode ser feito para que as nossas
cidades, do litoral e do interior, possam ser mais atractivas para
residentes e turistas?
Tornarem-se em laboratórios de experiências na fronteira da ciência,
arte e desporto. Apostarem na inteligência colectiva baseada na
participação pública. Privilegiarem a qualidade de vida, tratando a
cidade como um ecossistema.

Nuno Dias da Silva
O investigador que
gostava de ser Tenista
Considera-se um «professor/empresário»,
mas não esconde que o seu sonho era ter sido tenista, a grande obsessão
enquanto estudava engenharia. Sempre ligado à docência na Faculdade de
Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCTUNL), António
Câmara, 56 anos, conseguiu construir um currículo impar. Licenciado em
Engenharia Civil pelo Instituto Superior Técnico, em 1977, partiu para
os EUA para fazer o doutoramento em Sistemas Ambientais, concluído em
1982 no Virginia Tech. O pós-doutoramento, um ano depois, aconteceu no
MIT, onde voltou em 1988-89 como professor visitante. De regresso a
Portugal, António Câmara tinha o projecto de criar um laboratório de
computação e assim o fez. Foi o embrião da YDreams. Deu aulas nos EUA
(como professor convidado da Cornell University (88-89) e MIT (98-99),
esteve ligado ao estudo de impacto ambiental do Alqueva, à reconversão
ambiental da Expo’98 e ao Sistema Nacional de Informação Geográfica.
Criou a Ydreams, em Junho de 2000, uma empresa de sucesso na área do
software para multimédia, realidade virtual e computação móvel e, desde
então, nunca mais parou.
Em 2006, recebe o Prémio Pessoa, instituído pelo semanário “Expresso” e
a empresa Unysis, que distinguiu, até hoje, 22 personalidades
portuguesas com «intervenção relevante» na vida científica, artística e
literária do país. A Ydreams, empresa criada no seio da FCTUNL, saltou
para as páginas dos jornais depois de desenvolver o jogo Undercover para
os telemóveis, a que seguiu o Serial Lover. Dois blockbusters, que
grandes operadores de telemóveis integraram nas suas ofertas.
Recentemente lançou o jogo Cristiano Ronaldo. EUA e China são desafios
recentes. Além dos jogos para telemóveis, a YDreams é também conhecida
pelas montras interactivas e pelos miradouros virtuais.

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