MARIA JOSÉ MORGADO,
PROCURADORA-GERAL ADJUNTA
Houve democracia a
mais nas nossas escolas

Em entrevista concedida por e-mail, a
magistrada do Ministério Público critica a «cultura de facilidade»
instalada na Escola e a desvalorização da disciplina, exigência e
responsabilidade, defendendo a sua rápida reabilitação. Maria José
Morgado, o rosto mais (re)conhecido pelos portugueses no combate à
criminalidade económica, entende ainda que a máquina judicial é da idade
da pedra, rejeita políticas criminais laxistas e alerta que o combate
contra a corrupção é uma guerra prolongada.
A insegurança aumenta e desafia
pessoas e o Estado. A onda de assaltos é fruto da sofisticação da
criminalidade organizada ou acha que está a ser empolada pela
mediatização do fenómeno? As alterações da legislação penal aumentam a
sensação de que o crime e os que o praticam raramente têm castigo?
As causas são muito variadas. Mas do lado do Estado, das polícias e do
Ministério Público, não pode haver políticas criminais laxistas no
combate ao crime grave.
Em diversas intervenções, tem dito
que faltam meios para realizar Justiça no nosso País. Refere-se a meios
materiais ou humanos? Pensa que a Justiça nacional faz jus ao ditado que
«sem ovos não se fazem omoletas»?
Penso que é urgente modernizar a máquina judicial. Continuamos a ter uma
máquina da idade da pedra, o que aumenta as desvantagens e a demora
indesejável na resposta ao crime.
Morosidade processual, prescrições
crónicas e tribunais sem segurança são apenas alguns exemplos que não
contribuem para dar uma boa imagem da Justiça. Uma reforma transversal
do sistema ajudaria a mudar a impressão negativa que a opinião pública
tem do sector?
O que precisamos, insisto, é de melhor e mais moderna organização. De um
sistema informático em rede que dê velocidade às comunicações judiciais
e celeridade aos processos. Esse problema continua por resolver, o que
me parece preocupante.
É sabido que em Portugal legisla-se
em demasia. Existe a tentação de fazer leis ao sabor de uma dificuldade
ou obstáculo?
Pois é, e é mau. A legislação compulsiva nunca resolveu problema nenhum,
muito menos aqueles que temos e que continuamos a ter.
Costuma dizer-se que fugir ao Fisco
é um desporto nacional. Existe ainda a cultura do «chico-espertismo», em
que o prevaricador dificilmente é apanhado nas malhas da impunidade da
lei?
No Fisco, o panorama mudou. Pelo menos os que têm declaração são
“apanhados” nos casos de fraude. É preciso é que, aqueles que continuam
fora do sistema, sejam detectados e penalizados nos casos de rendimentos
ilegítimos.
Conhecendo os comportamentos
reactivos dos portugueses, defende que é preferível que os ilícitos
económico-financeiros sejam reprimidos ou prevenidos por parte das
autoridades?
As duas coisas. A repressão tem de andar a par com a prevenção. E a
repressão justa, em tempo útil, também funciona como prevenção.
Definiu corrupção como «o vírus da
democracia». O que é que é preciso fazer para erradicá-lo, pelo menos de
forma parcial?
A luta contra a corrupção é uma guerra prolongada. As instituições, a
sociedade, as pessoas singulares e as empresas, para além das
autoridades, têm de travar pacientemente essa guerra. Para construirmos
instituições fortes, impermeáveis às tentações.
Um estudo do DCIAP e do ISCTE
revelou que dois terços dos processos por corrupção acabam em
arquivamento. Isto é desmotivante para quem diariamente procura combater
o fenómeno?
É assim, e vai continuar a ser assim. A prova tem regras e por vezes
dificuldades insuperáveis. Estamos no domínio dos crimes invisíveis, com
objecto imaterial, que não deixam impressões digitais nem manchas de
sangue, mas que causam prejuízos de milhões. Com o crime económico e
financeiro é assim em qualquer parte do mundo. É claro que temos que
trabalhar arduamente para perseguir esta grave criminalidade.
O que quer dizer quando afirma que
os políticos vêem a corrupção de forma «preconceituosa» e como um
«tabu»? Estamos perante conflitos de interesses?
Os conflitos de interesses fazem parte da vida: têm é que ser resolvidos
correctamente.
Tem sido uma crítica das offshore,
tendo dito numa entrevista recente que o seu combate «vai ter de
continuar». Vendo como estes esquemas proliferam, não pensa que estamos
perante uma luta perdida?
É outra guerra prolongada. Não podemos baixar os braços.
Se existisse uma educação para os
valores da cidadania, honestidade e igualdade, a começar na Escola,
pensa que em duas ou três gerações os nossos compatriotas podiam passar
a ter uma atitude diferente perante a corrupção e a fraude?
A educação ajuda, é uma parte do problema.
A violência e a indisciplina nas
escolas é uma questão que tem merecido grande atenção mediática nos
últimos meses. A Escola é o espelho das nossas sociedades?
A Escola faz parte da sociedade – não é uma offshore. Os valores da
democracia, igualdade, honestidade, responsabilidade, devem fazer parte
da aprendizagem.
Elevadas taxas de abandono escolar,
resultados medíocres comparativamente com os nossos congéneres europeus,
sucessivos ministros e sucessivas políticas distintas para o sector,
são, em síntese, o balanço de 34 anos de ensino no regime democrático.
Como qualificaria, globalmente, o nível actual do sistema educativo,
desde o 1.º ciclo até às universidades?
Não sou especialista em ensino. Provavelmente, houve democracia a mais
nas nossas escolas. Quero dizer que se desvalorizaram os valores da
disciplina, da exigência e responsabilidade. Pessoalmente, parece-me
necessário reabilitá-los, seriamente. Criou-se uma cultura de facilidade
que me parece má inspiradora, mas como disse, não percebo nada disso.

Nuno Dias da Silva
Cara da notícia
A imagem pública de Maria José Morgado,
nascida em 1951, é a de uma Procuradora incorruptível, determinada,
profissional, merecedora de confiança. Magistrada do Ministério Público
desde 1979, tendo passado pelo Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa,
Tribunal da Boa-Hora e Departamento de Investigação e Acção Penal de
Lisboa (DIAP), alcançou o cargo de Procuradora-Geral Adjunta do Tribunal
da Relação de Lisboa.
Maria José Morgado tomou posse em Abril de 2007 como coordenadora do
DIAP de Lisboa e posteriormente passou a acumular essas funções com a
chefia da Equipa de Coordenação do Processo “Apito Dourado”, relativo a
alegada corrupção e tráfico de influências no futebol profissional e na
arbitragem. Morgado coordena também, desde Setembro do ano passado, a
investigação a todos os inquéritos pendentes e os que resultarem da
sindicância aos serviços do Urbanismo na Câmara Municipal de Lisboa.
Chefiou entre Novembro de 2000 e Agosto de 2002, a Direcção Central de
Investigação da Corrupção e da Criminalidade Económica e Financeira (DCICCEF)
da Polícia Judiciária, altura em que foram investigados vários crimes de
“colarinho branco”, alguns deles ligados ao mundo do futebol, como o do
caso do ex-presidente do Benfica, Vale e Azevedo. Enquanto exerceu
funções de Procuradora-Geral Adjunta no Tribunal da Relação de Lisboa,
nunca deixou de intervir e falar abertamente sobre a alta criminalidade,
tendo alertado que «a corrupção em Portugal está fora de controlo»,
realçando que «a Justiça não está preparada para enfrentar os
poderosos». Em 2003, Maria José Morgado lançou, em conjunto com o
jornalista José Vegar, o livro “O Inimigo sem rosto, fraude e corrupção
em Portugal”.
Antes do 25 de Abril integrou um movimento estudantil antifascista de
orientação maoísta, na Faculdade de Direito de Lisboa, onde se licenciou
em 1979, na companhia do que acabaria por ser seu marido, o fiscalista
Saldanha Sanches. Nunca fala de casos judiciais em concreto. Adora ler
jornais, nadar e trabalha, mesmo fora de horas ou em casa. À semelhança
do marido e da filha, tem aversão a automóveis, preferindo os
transportes públicos. Por isso, considera-se «verdadeiramente
ecológica».

LUCÍLIA JUSTINO,
PRESIDENTE DA SECÇÃO PORTUGUESA
DA AMNISTIA INTERNACIONAL, EM ENTREVISTA
Jogos Olímpicos foram
oportunidade perdida

É Presidente da Secção Portuguesa da
Amnistia Internacional e a recompensa para o trabalho desenvolvido
encontra-o na salvaguarda dos Direitos daqueles por quem apela. Defende
os activistas dos Direitos Humanos como actores globais, mas viu os
Jogos Olímpicos de Pequim como uma oportunidade mal aproveitada. Em
entrevista ao Ensino Magazine, Lucília Justino fala da ONG, Prémio Nobel
da Paz, que começou por um caso português.
O mundo assistiu no mês passado aos
Jogos Olímpicos de Pequim mas também assistiu ao sofrimento do povo
tibetano e a alegada violação dos direitos e liberdades do povo Chinês.
Falta coragem aos senhores que governam o mundo para ajudar o povo
tibetano na luta desigual contra o gigante chinês?
A posição da Amnistia relativamente ao Tibete é uma posição como tem
noutras situações de conflito, lutar para que não haja violação de
Direitos Humanos. Não tomamos posições políticas, nem defendemos
posições de governos, ou de grupos armados ou seja do que for, o que
queremos é que não haja violação de Direitos Humanos. O povo Tibetano
quer autonomia, nem sequer é independência, mas a Amnistia não é por
isso que luta, é para que as pessoas possam manifestar as suas opiniões.
Os Jogos Olímpicos, com tudo o que nós sabemos que se passa na China de
violação de Direitos Humanos, constituíram uma oportunidade fabulosa da
China mostrar que fez algum esforço e que algumas situações iriam mudar.
Até porque tinham os olhos das pessoas em cima deles e foi esse um dos
compromissos do próprio país ao organizar os jogos Olímpicos. Teriam de
fazer algumas alterações e obedecer a alguns padrões internacionais de
não violação dos direitos Humanos.
A Amnistia fez campanhas?
Acontece que a Amnistia fez campanhas, colaborou em tudo o que pode
antes dos Jogos Olímpicos, mas havia uma indicação do secretariado
internacional da Amnistia para que durante os Jogos Olímpicos não se
fazer nenhuma acção - manifestações, entrevistas - para não parecer que
estávamos a apoiar um boicote. A Amnistia, com cautela a mais, decidiu
não fazer nada durante os Jogos Olímpicos. A secção portuguesa, e outras
secções também, manifestaram após os Jogos Olímpicos esse desagrado
junto do secretariado internacional da Amnistia - o grupo da China
manifestou esse desagrado também no meio de uma petição conjunta com a
direcção. E portanto estamos a aguardar resposta. Foi uma oportunidade
que se perdeu. Durante os Jogos Olímpicos poderíamos ter tido apoio de
atletas, que já tivemos nos jogos de Atlanta, e na altura não houve
nenhum impedimento. Agora com a China houve aqui uma situação que nos
desagradou. A Amnistia é uma organização que não tem medo de falar. Os
Jogos Olímpicos foram essa oportunidade, mas poderíamos ter feito um
trabalho mais assertivo, mais aberto, relativamente àquilo que ainda
sabemos que são as graves violações dos Direitos Humanos na China.
Como activista da Amnistia
Internacional e agora como presidente, há alguma história que a tenha
sensibilizado particularmente?
Há muitas histórias, até acho injusto escolher uma. Por exemplo, a
história de um professor de matemática, um professor da China, em que
nós trabalhamos imenso para que tivesse um julgamento justo, imparcial,
no sentido de obedecer aos padrões internacionais de justiça e a carta
que escreveu depois a agradecer. Ou quando nós sabemos que alguém vai
ser condenado à morte. Aquelas mulheres que sofrem por causa dos crimes
de honra, que são violentadas de uma maneira absolutamente incrível e
condenadas à morte por lapidação. Quando a pena é comutada e as pessoas
já não vão ser mortas, isso para nós é fantástico. Saber que às 3 tarde,
do dia tal, alguém ía ser condenado à morte e não foi, porque os apelos
foram imensos, da Amnistia e de outras Organizações de Direitos Humanos,
isso é das coisas melhores. Depois são as cartas que recebemos dos
familiares, ou dos próprios condenados. Das entidades governamentais
também gostamos de receber, é sinal que nos lêem pelo menos. Não sei se
nos ouvem, mas incomodamos com as cartas, pois é a nossa grande arma.
Não paramos de escrever até que nos expliquem o que está a acontecer a
determinada pessoa, porque é que foi condenada, porque é que está
esquecida na prisão há que tempos sem julgamento, eventualmente com
problemas de saúde. Temos casos de pessoas que estão na prisão e
precisariam de cuidados de saúde e sabemos, por familiares, que não têm.
Protestamos e evidentemente que as entidades governamentais não gostam
que se saiba que a pessoa tal não tem apoio médico, não gostam de ficar
mal na fotografia. Felizmente que alguns ainda tem pruridos de não
querer ficar mal na fotografia, outros há que se acham donos do mundo.
Mas o discurso de Direitos Humanos é capaz de ser o nosso discurso
salvador neste mundo globalizado. Os activistas da Amnistia são actores
globais, já não trabalhamos só para um mundinho ou paísinho, trabalhamos
para o respeito pelos direitos Humanos no mundo.
Somos mais fortes quando lutamos
pelos outros?
Somos muito mais fortes quando lutamos pelos outros. Ser activista de
Direitos Humanos é exactamente romper o campo da intervenção
institucional, como por exemplo os partidos, sindicatos, etc e ao
contrário deles não intervir a favor de nós próprios, mas desenvolver
solidariedade, movimentar pessoas, provocar mudanças em questões que vão
para lá dos nosso interesses imediatos. Ficamos muito mais fortes quando
lutamos por outros que não por nós, e quando lutamos por causas em que
acreditamos. Os activistas da Amnistia Internacional sabem que temos
regras muitíssimo exigentes. O activismo dos Direitos Humanos não é
apenas um gesto de esperança. Sabemos que defendemos as pessoas com as
quais concordamos e com as quais discordamos, mas defendemos que tenham
direito a ser diferentes. Defendemos os prisioneiros de Guantánamo não
pelo que eles fizeram, ou possivelmente fizeram, mas porque são seres
humanos e têm direito a ser julgados, e a ser punidos. Somos
absolutamente contra a impunidade. É esta confusão que muitas pessoas
fazem relativamente aos activistas da Amnistia Internacional, queremos
que sejam julgados e punidos, impunidade é que nunca, nem para os
violadores dos direitos humanos, nem para as vítimas. Tem de haver
regras, julgamentos. Nós defendemos a pessoa humana. Evidentemente não
quereria, nem ninguém quereria que as pessoas que cometeram crimes
horrorosos estivessem algum dia à frente de alguma instituição credível.
Queremos que a pessoa seja julgada e a partir daí cumpra a sua pena. É
por isso que vivemos num mundo que tem de obedecer a regras.
São vitórias dos Activistas da AI?
O activismo de sucesso é também isso, nós acreditarmos que depois de
algumas acções que fazemos se vai conseguir que alguém não seja
condenado à morte porque a pena de morte para a Amnistia é uma questão
que não se discute. Não há argumentos a favor e contra, a Amnistia é
absolutamente contra a pena de morte, ponto final. Esse é um sucesso que
os activistas de direitos humanos conseguem, se alguém tiver a pena
comutada, em vez da pena de morte, prisão; saber que alguém pela nossa
intervenção conseguiu ter apoio em termos de saúde. Está preso sim
senhor, fez mal tem de estar preso, mas é um ser humano, já está a pagar
a sua pena por um julgamento que terá sido justo não pode pagar duas
vezes, deixar-se morrer porque está doente, como temos alguns
prisioneiros que precisam de cuidados e que de facto às vezes não têm.
Há uma situação de ser activista, que é uma noção de actor global. Os
activistas de Direitos Humanos são actores globais tão importantes, tão
quanto os media, ou os sindicatos ou outras instituições. E isso é que
nós temos de ver, é que temos imenso poder e se calhar a salvação está
mesmo num discurso globalizado de Direitos Humanos.
A Amnistia Internacional teve como
catalisador o sentimento de revolta do advogado britânico Peter Benenson
ao ler um artigo no jornal The Observer em 1961, sobre a detenção de
dois estudantes portugueses que brindavam “à liberdade” num café de
Lisboa. E os estudantes portugueses o que podem fazer hoje pela
Amnistia?
Os estudantes portugueses podem fazer muitas coisas. Tornar-se membros,
apoiantes, voluntários, dirigentes - porque não? - de grupos, de
núcleos, mesmo nas suas instituições de ensino. Podem sobretudo ser
solidários com esse corpo a que eles pertencem, que foi o corpo fundador
da Amnistia internacional, os 2 estudantes que terão sido presos por
brindarem à liberdade. Até por uma questão de solidariedade grupal, os
estudantes têm obrigação de se movimentarem, de não serem amnésicos
relativamente ao que aconteceu a esses dois colegas. E Amnistia vem
exactamente disso, de amnésia, esquecimento. Os estudantes deveriam ser
os sentinelas, para não deixarem esquecer as pessoas que não têm voz,
para dar voz a quem não a tem. Organizarem-se, lutarem,
comprometerem-se. Porque ser activista é ter compromissos, é fazer um
trabalho pelos Direitos Humanos mas sabendo que há pessoas que estão
dependentes do nosso trabalho. Por exemplo quando se toma um compromisso
de escrever cartas sobre um determinado caso, não deixar cair. E os
jovens sabemos que sim são muito activos, muito generosos. Eles podem de
facto envolver-se em grupos, angariar fundos para acções concretas.
Podem ser essa voz desassossegada. Gostam de música e conhecem Bob
Marley, podem ouvir muitas vezes aquela canção Get Up, Stand Up, Stand
Up for Your Rights, acho que é uma boa maneira das pessoas não pensarem
que os Direitos Humanos estão garantidos. Nós não podemos confiar em
nenhum governo, em nenhum poder, em nenhuma estrutura como guardiões dos
Direitos Humanos. Os Direitos Humanos são de todos nós e as sociedades
são muito frágeis. Não há nenhuma situação que esteja garantida, os
riscos de violação de Direitos Humanos estão sempre presentes e portanto
temos de ser vigilantes. Os estudantes têm de estar vigilantes também,
connosco, e se quiserem estar em grupo, então temos uma organização que
os apoia nessa vigilância constante que é a Amnistia Internacional.
Passaram 60 anos sobre a Declaração
Universal dos Direitos do Homem. Em Portugal o que está menos bem em
matéria de Direitos Humanos?
Nós somos um país que respeita os Direitos Humanos. A questão da
Educação para todos, acabar com a pobreza, acho que são Direitos que
estão menos bem conseguidos a nível de população.
Violação do direito de liberdade de expressão, de liberdade religiosa,
pena de morte, “desaparecimentos” no país, casos de tortura, não temos.
Evidentemente que há denúncias de maus tratos, mas houve mais no
passado. Estamos a melhorar muito as questões nas prisões com os guardas
prisionais, ou nas esquadras, onde por vezes as pessoas apresentam
queixas de maus tratos. Agora em termos de outros Direitos, em que
falharemos como país?
Falhámos sobretudo com os Direitos económicos, Direitos civis, Direitos
políticos e religiosos. Não temos grandes problemas de cumprimento
desses Direitos e da Declaração.
A Declaração para muitas pessoas será apenas um documento romântico,
poético e algo ingénuo, que tem 30 artigos e se pensarmos que vamos
conseguir cobrir e dar resposta a todos, não se consegue. Mas podemos
estar descansados e de consciência tranquila, a maioria dos Direitos
conseguimos cumprir como país. Há bolsas onde alguns não serão
cumpridos, como por exemplo a violência doméstica, mas está a fazer-se
muita coisa. Há outras questões a montante da violência doméstica que
não conseguimos resolver, mas evidentemente se têm dado passos nesse
sentido.
A Abolição da pena de morte é uma
bandeira da Amnistia Internacional. Quais são as outras?
É uma bandeira da Amnistia Internacional e de outras ONG que tem também
estas preocupações de Direitos Humanos. Acabar com o tráfico de armas,
com a violência contra as mulheres, com os “desaparecimentos” forçados -
nós dizemos sempre desaparecimentos e escrevemos entre aspas, porque as
pessoas não desaparecem, são levadas -, acabar com a tortura, com os
maus tratos. Acabar com a violação dos Direitos Humanos. Evidentemente
nós sabemos que esta bandeira dos Direitos Humanos pode ser usada de um
modo perverso. Nunca se falou tanto em defesa dos Direitos Humanos e por
vezes à conta deste “chapéu” cometem-se muitas injustiças e a Amnistia
tem consciência disso. Agora a bandeira da Amnistia é de facto não se
calar sempre que seja informada de fonte segura. Temos equipas de
investigadores pelo mundo que recolhem informação, cruzam informação de
várias fontes, para que seja muito difícil haver enganos. Pode acontecer
nas fontes que recolhemos, mas se houver, também dizemos que nos
enganamos.
Retomando a questão da pena de morte, é evidentemente uma bandeira. Mas
em Portugal as pessoas nem sequer se mobilizam muito, a não ser que haja
uma acção urgente da Amnistia sobre alguém que vá ser condenado, aí sim
as pessoas actuam, escrevem, participam nas acções no nosso site. Temos
depois imensas campanhas como por exemplo a campanha por Darfur, em que
estamos envolvidos com outras organizações. São tudo bandeiras, não
temos uma, temos a bandeira que são os 30 artigos da Declaração que tem
60 anos, mas que é muitíssimo actual e um documento inspirador de outros
documentos e factos internacionais.

Eugénia Sousa
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