Director Fundador: João Ruivo    Director: João Carrega    Publicação Mensal    Ano XI    Nº124    Junho 2008

Editorial


Ser professor

Durante o passado mês assistiu-se à divulgação de um livro intitulado Ser Professor, editado pelo Instituto Politécnico de Castelo Branco e pela Associação Nacional de Professores. A obra torna público um estudo que divulga dados de uma sondagem nacional sobre a satisfação profissional dos professores e educadores e sobre o papel das organizações de docentes.

Em resumo, a pesquisa revela-nos que os sujeitos estudados (educadores e professores dos ensinos básico e secundário) se sentem satisfeitos quando avaliam a sua auto-estima bem como a sua imagem profissional. A maioria revela que não sente que a sociedade reconheça o seu trabalho profissional, o que desde logo se traduz num vencimento que não corresponde ao esforço dispendido para cumprir as funções exercidas, pelo que experimenta alguma preocupação com o futuro.

Demonstram ter capacidade e vontade para serem educadores e professores e gostam da profissão. Contudo sentem-se merecedores de mais e melhor reconhecimento, melhor vencimento e, sobretudo, de mais garantias relativamente ao futuro. Em geral manifestam-se satisfeitos com a escola e com os alunos, designadamente com a transparência na gestão da escola, com o bom ambiente aí vivido, e com a atenção que se disponibiliza aos alunos com dificuldades educativas especiais.

A maioria não está satisfeita com o interesse revelado pelos alunos nas questões de aprendizagem escolar e também apresenta uma insatisfação quanto às políticas educativas do Ministério da Educação. Concordam com a criação de uma Ordem dos professores e reflectem desilusão com o processo de progressão na carreira docente.

O que está a montante destas afirmações? Quanto a nós, desde logo o facto de vivermos uma conjuntura política, económica, social e até cultural que não motiva a escolha da profissão docente. Ser professor não é fácil. O Estado e a Sociedade olham para a escola e obrigam-na a sarar todos os males sociais que os governos não são capazes de enfrentar. A escola obriga-se a prevenir a toxicodependência, a educar para a cidadania, a formar para o empreendedorismo, a promover uma cultura ecológica e de defesa do meio ambiente, a motivar para a prevenção rodoviária, a transmitir princípios de educação sexual, a desenvolver hábitos alimentares saudáveis, a prevenir a Sida e outras doenças sexualmente transmissíveis, a utilizar as novas tecnologias da comunicação e da informação, a combater a violência, o racismo e o belicismo, a reconhecer as vantagens do multiculturalismo, a impregnar os jovens de valores socialmente relevantes, a prepará-los para enfrentarem com sucesso a globalização e a sociedade do conhecimento, e sabe-se lá mais o quê…

Porém, os professores foram treinados para saberem fazer o que sempre fizeram e bem: ensinar. Mas, além disso, todo o dia se lhes exige o cumprimento de cada vez mais objectivos educativos que a sociedade não consegue alcançar.

Entregues a si próprios, sem acompanhamento nem adequada e suficiente formação complementar, os docentes sentem sobre os seus ombros o peso da enorme responsabilidade que lhes é imputada pelo Estado e pelas famílias.

Hoje, a profissão de professor caracteriza-se por oferecer poucos estímulos, incentivos, e até razões para que os docentes se envolvam num processo de motivação e evolução qualitativa das suas capacidades pessoais e profissionais. Por cada nova competência que se lhes exige, sem a correspondente e adequada formação, o professor vai atingindo níveis cada vez mais preocupantes de incompetência no cumprimento desses novos saberes que se lhe impõem e para os quais não foi preparado, aumentando os seus níveis de stress e de erosão profissional. Ou seja, o professor desprofissionaliza-se. E esta desprofissionalização determina o emergir de um progressivo clima de mal-estar que, a não ser alterado, pode vir a ter consequências muito negativas na aprendizagem dos alunos.

João Ruivo
ruivo@rvj.pt

 

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