Director Fundador: João Ruivo    Director: João Carrega    Publicação Mensal    Ano XI    Nº126    Agosto 2008

Entrevista

NUNO ARTUR SILVA, DIRECTOR-GERAL DAS PRODUÇÕES FICTÍCIAS

O dono da fábrica das piadas

Da imaginação das Produções Fictícias nasceram êxitos como «Contra-Informação», «Herman Enciclopédia», «Diz que é uma Espécie de Magazine» e «Contemporâneos». Nuno Artur Silva dirige a agência criativa que goza com o Portugal contemporâneo, que dá cartas, não só no humor, mas também na ficção. Antes de enveredar pela carreira de argumentista leccionou Português em escolas secundárias onde constatou que o ensino só pode progredir se a riqueza das escolas, assente na diversidade e autonomia, for aproveitada. Nuno Artur Silva diz que a grande reforma do ensino está por fazer, critica a ministra por ter hostilizado os docentes, mas não guarda palavras doces para os sindicatos, acusando-os de terem politizado o debate.
 

As Produções Fictícias (PF) completaram 15 anos de vida recentemente. Como é que surgiu este projecto?

Nascemos mais concretamente no dia 1 de Abril. É uma data convencionada porque começámos a assinar PF em 1993, algures na Primavera, mas não sabemos o dia certo. Por isso, foi escolhido o primeiro de Abril como marco para a nossa existência.
 

Considera-se o dono da fábrica dos conteúdos humorísticos de Portugal?

A sede das PF localiza-se na Travessa da Fábrica dos Pentes, mas há os que a brincar dizem que esta é a Travessa da Fábrica das Piadas. Respondendo à sua questão, creio que as PF terão contribuído certamente para a criação e divulgação de um tipo de humor que se ramifica em vários estilos. No fundo, renovámos o humor em Portugal. Nesse sentido é uma fábrica de onde saíram pessoas, conceitos e marcas que acabaram por fazer o seu caminho e, de alguma maneira, afirmaram-se na cultura popular portuguesa, fixando-se no imaginário colectivo.
 

«Acreditamos no trabalho em equipa de criativos irremediavelmente singulares», é uma mensagem no vosso site. A congregação da nata dos criativos portugueses ditou o vosso êxito?

O êxito deriva de uma conjugação de factores. As capacidades individuais dos autores, primeiro, e o método de trabalho seguido, foram a receita para o sucesso. Numa área onde praticamente não existiam argumentistas, as PF credibilizaram o trabalho destes profissionais. Creio que a grande mais-valia foi termos atingido um modelo de profissionalismo que não existia nos media e no audiovisual, rompendo com um período de um certo amadorismo na escrita criativa.
 

Quem escrevia fazia-o, quase, como um hobby...

Eram pessoas oriundas de vários meios: jornalistas, professores, publicitários, etc, que faziam «uma perninha» nos tempos livres na redacção de guiões. As PF introduziram esta especialização como primeira profissão para muitos autores. Neste momento, quem trabalha para nós, vive unicamente daquilo que escreve.
 

As PF fazem o pleno, produzindo para televisão, rádio, jornais e agora net e telemóveis. Qual o segredo para produzir em série, com piada e cumprindo os apertados prazos?

O facto de sermos vários elementos e que trabalham em equipa, é uma forma de prevenir o cansaço e o incumprimento de prazos. É como no futebol, se um falha o corte, há sempre outro colega na «dobra». A exigência que nos é apresentada é enorme, dirigida para a indústria do entretenimento, o que levou a aperfeiçoarmos os métodos de trabalho.
 

Portugal é um país inspirador para fazer crítica, sátira e humor?

Sem dúvida, e em tempo de crise, talvez seja ainda mais. É mais fácil gozar com o que está mal do que com o que está bem. Quanto pior as coisas correm, mais necessidade catártica existe de libertar o pessimismo e a depressão através do humor. Há um amigo meu, psiquiatra, que diz que o humor é o triunfo maníaco sobre a depressão. Em termos nacionais, podemos dizer que se o País está deprimido, pessimista e em crise, o humor, ou o gozo com o Portugal contemporâneo que fazemos, pode ser uma forma de sublimarmos o problema.
 

As PF têm 15 anos de vida e o País está em crise declarada há uns 7 ou 8 anos...

Nos últimos anos a crise tem-se agudizado. Tivemos o período de euforia que coincide com a Expo 98, o nobel da literatura de Saramago, o auge do guterrismo. Depois veio a «tanga» e a fuga de Durão para a Europa e entrámos em descrédito, sem esquecer o intervalo do Euro 2004. Quando as coisas pareciam entrar nos carris, a tremenda crise internacional deitou tudo a perder.
 

O que é o filet mignon para um criativo escrever humor em Portugal: a política, o futebol ou os portugueses, de uma forma geral?

Os três que referiu sinalizam bem o que é mais popular. Acrescentaria a essa lista as figuras que aparecem na televisão, pela sua notoriedade pública. Mas as pessoas normalmente riem daquilo que conhecem. Se eu fizer piadas sobre profissões e escritores obscuros, porventura ninguém vai rir porque não estão familiarizados com esse universo. Ao invés, o futebol está em toda a parte e a qualquer hora. É mesmo um massacre. No fundo, rimos do futebol, dos políticos e dos portugueses (os «cromos» da província ou do país, as novas profissões, o velho país rural, a cidade, os jovens ou os «pintas», são grandes clássicos), porque reconhecemos as personagens.
 

É um dos responsáveis pelo lançamento dos Gato Fedorento. Consegue arranjar explicação para o que se passou?

Os «Gatos» são um fenómeno dificilmente explicável. Há uma mistura de factores que surpreende todos, a começar pelos próprios. O Herman José teve a sua época, quando era uma pop star, e ainda é, mas sem a força do passado. Agora o impacto dos «Gatos» era de todo imprevisível. O humor que produzem está baseado nos jogos e tiques de linguagem. O seu sucesso é uma mescla de talento, oportunidade e sorte. Eles são inultrapassáveis a captar o espírito do tempo, mas há que dizer que tiveram a sorte do seu lado: apareceram da maneira certa, no meio certo e no tempo certo. O timing, que não foi calculado, revelou-se muito favorável.
 

Consegue eleger o sketch perfeito das duas séries do «Diz que é uma Espécie de Magazine?»

O melhor sketch, de longe, é o de Marcelo Rebelo de Sousa sobre o aborto. Pelo brilhantismo e pela repercussão política que teve, desmontando uma argumentação e uma personagem. Foi uma espécie de sketch de intervenção.
 

Certos opinion makers chegaram a dizer que os «Gatos» eram os verdadeiros líderes da oposição. Concorda?

Nem a oposição ao governo se esgota nos «Gatos», nem o humor se esgota nas coisas que passam na televisão. Temos aqui nas PF um produto que considero ser de humor político de grande qualidade, que é o «Inimigo Público», que sai às sextas com o jornal «Público». Para além de termos, ainda no ar e com sucesso, o primeiro programa genuíno de humor político do País e que se chama «Contra-Informação». Falar apenas dos «Gatos» é como dizer que a literatura portuguesa se esgota no Lobo Antunes ou no Saramago. Não faz sentido.
 

Quer com isso dizer que há vida para além dos «Gatos»?

Durante muito tempo parece que o humor se esgotava no Herman e, na verdade, não era assim. Hoje, existe esse paralelo com os «Gatos». As pessoas têm a tendência para circunscrever o País ao que a televisão transmite. Há muito mais pessoas a fazer humor. Mas o mérito dos «Gatos» é indiscutível e deve ser sublinhado: tornaram-se populares sem fazer humor fácil.
 

Pensa que eles vão manter na SIC, a partir de Setembro, o êxito alcançado na RTP?

Se houvesse capacidade de previsão na indústria do entretenimento estávamos todos ricos. Para já, eles estão em alta. Esperemos que dure. A estratégia de parar 9 meses também foi pensada de forma inteligente. Mas a evolução pode não passar pelo formato «Gatos» e evoluir para carreiras a solo, como acontece nos grupos rock.
 

As PFtv, o canal online da empresa, alojado no portal Sapo, comemorou 1 ano e tem motivos para festejar, atingindo as 25 milhões de visualizações. «Os Incorrigíveis» é apenas um caso de sucesso. Quais são as mais-valias deste suporte?

O canal online é uma espécie de bloco de notas electrónico da actividade das PF, óptimo para fazer experiências e de acompanhamento permanente dos produtos. Permite inserir material que vamos gravando para as televisões, o chamado snack-Tv, bem como outros conteúdos que não são vistos pelo grande público, como os bastidores dos programas, os bloopers, as entrevistas com os actores, etc. Quando os «Gatos» regressarem vamos ter na nossa plataforma o acompanhamento das gravações e conversas de bastidores, o mesmo se vai passar em relação ao Herman e aos «Contemporâneos». As PFTv permite ter uma espécie de rede/comunidade de fãs e espectadores que querem saber mais sobre os nossos programas. É, também, um óptimo barómetro para avaliarmos a aceitação dos produtos.
 

A lógica da net vai substituir a era da televisão no que respeita à exibição dos conteúdos?

Todos os teóricos dos media apontam nesse sentido. Durante muito tempo a TV ocupou o lugar central na distribuição de conteúdos audiovisuais. O que se tem vindo a verificar é que através dos jovens a net (portátil, telemóvel, iphone, consola, etc) vai sendo orientada para uma recepção de conteúdos onde o ecrã do PC ou um visor já dominam as preferências. Provavelmente vamos ter que encontrar uma nova designação para definir o ecrã que congregue todas essas funcionalidades, seja navegar na net, ver TV ou ler. No fundo, tudo converge para um ecrã. Penso que a natureza do conteúdo (seja um filme, um sketch, a síntese das notícias ou o resumo dos golos da jornada) e o local onde nos encontramos (seja em casa, no trabalho ou na praia) condicionará o tipo de ecrã a escolher pelos utilizadores. Vai ser assim o paradigma do consumo de conteúdos no futuro e os modelos de negócio vão, necessariamente, mudar.
 

As PF procuram posicionar-se na vanguarda das novas tendências?

Não pode ser de outra maneira. Aquela coisa de esperar pelas 9 da noite para ver um programa de humor, acabou. Costumo ouvir isto: «É pá, viste ontem os “Contemporâneos”? Não, vejo logo na net». Até por isso hoje os índices de audiência não são tão precisos devido a este fenómeno. É um quebra-cabeças que vai obrigar, no futuro, a repensar o modo de financiamento dos canais. Em Inglaterra, 12 por cento do total da publidade dos «media» está na net, em Portugal ainda estamos nos 4 por cento. Quando fiz o liceu, eu não tinha net, telemóvel, nem sequer um gravador de vídeo em casa. Os dois canais de televisão eram do Estado. Agora, tenho 45 anos, não sou assim tão velho. Estimo que com a aceleração tecnológica que levamos, dentro de 3 ou 4 anos, o panorama ainda vai mudar mais.
 

Portugal ficava ainda mais triste se os argumentistas das PF fizessem greve como os seus colegas americanos?

Infelizmente não temos uma indústria como a americana. Lá eles param e aquilo tem impacto imediato. O cinema e a TV são uma indústria poderosíssima. Cá, temos meia dúzia de pessoas a viver do que escrevem para televisões e o que nós produzimos não paralisa ninguém.
 

Não está a menosprezar o poder das PF?

O nosso público mais fiel são os jovens e as classes A e B. Veja que o humor mais popular reside nas anedotas, que até nem são feitas por nós. «Os malucos do risos», é o exemplo do que acabo de dizer. O humor mais popular continua a ser distinto do nosso, que tem picos de episódios populares, mas que é mais a excepção do que a regra, dificilmente atingindo todas as classes.
 

As PF arrancam a 15 de Setembro com novas edições de cursos de escrita de humor, ficção para televisão, cinema e escrita criativa. O objectivo é formar novos argumentistas?

Primeiro, vamos dar a nossa experiência aos que participarem nos cursos, em relação aos fundamentos da escrita, os cânones, as técnicas, etc. Depois estas iniciativas permitem-nos recrutar alunos presentes nos cursos para virem trabalhar connosco. Tem acontecido sempre que os melhores são convidados para integrar os projectos das PF. Dou-lhe o exemplo do Ricardo Araújo Pereira que frequentou um curso e posteriormente foi convidado. À semelhança dos restantes elementos dos «Gatos» e de muitos dos que hoje são argumentistas profissionais.
 

Recebem guiões de muitos anónimos?

Todos os dias. De toda a espécie e proveniência. Infelizmente a maior parte do que nos chega deixa um pouco a desejar em relação à qualidade e, pior do que isso, peca pela deficiente apresentação. Devia haver um curso para as pessoas aprenderem a expor as suas ideias de uma forma mais coerente. É como ir a uma entrevista de trabalho descuidando a apresentação pessoal. Recebemos mensagens do género: «as pessoas dizem que eu sou engraçado, não me querem dar uma oportunidade?». Obviamente que sem conhecermos a pessoa, nada podemos fazer. Mas, de vez em quando, recebemos conteúdos com qualidade. O Zé Diogo Quintela, que ninguém (nem eu) conhecia, mandou uns textos, eu passei os olhos por eles e chamei-o para uma entrevista. Passado uns tempos frequentou um curso das PF e depois começou a integrar projectos nossos. O resto da história já todos sabem...
 

Da experiência que teve como professor de Português no secundário, que imagem reteve do sistema de ensino?

Fiquei com a ideia de que ser professor é duríssimo. O tempo livre que eu tinha quando dava aulas era escasso, - agora sei que está reduzido ao mínimo – , o que é errado, visto que o professor deve ter tempo de preparação para, como um atleta, poder, em «alta competição», render o máximo. O trabalho burocrático que os obrigam a fazer é uma estupidez sem nome. Já na altura senti que estavam a transformar os professores em funcionários, o que é péssimo. À sombra disto, os maus professores, têm tempo livre e não se preparam. São as injustiças do sistema.
 

O sistema é excessivamente centralizador?

Basicamente o sistema é muito centralizador e os programas bastante irrealistas. Deveria haver autonomia dos conselhos directivos das escolas, dos grupos disciplinares, para estes poderem fazer a sua versão adaptada do programa. Da mesma forma devia haver mais autonomia dos estabelecimentos, de modo a que fosse oferecido um ensino mais personalizado, permitindo aos encarregados de educação mais liberdade para escolher a opção de ensino que mais lhes interessasse. A riqueza do ensino deve ser extraída, especialmente, da diversidade das escolas. Mas, obviamente, a regulação dessa diversidade estaria a cargo do Ministério da Educação.
 

O Ministério tem dado mostras de ser mais opressor do que regulador?

Eu senti isso. No fim dos anos 80 / princípio dos 90, quando dei aulas, já havia turmas com demasiados alunos, falta de infraestruturas nas escolas e uma lógica de curriculum e programas demasiado estática e pouco mobilizadora. A imaginação e boa vontade dos professores procurava iludir essas lacunas. E, acima de tudo, faltava a ligação da escola à comunidade, que se limitava às reuniões com os encarregados de educação. Levar os alunos a participar nesse contexto social e trazer o ambiente e as valências da comunidade para dentro do espaço escolar era algo que não era promovido.
 

Teve problemas disciplinares enquanto professor?

Tive, claro. A Escola Secundária Ferreira Dias, no Cacém, tinha como grande obstáculo o seu tamanho gigantesco. Era super populosa e era impossível dar aulas em condições e aproximar alunos e docentes. Já na Veiga Beirão, onde também leccionei, tive problemas devido à origem dos alunos, provenientes de bairros difíceis, mas tinha a seu favor a questão da pequena dimensão. A coesão dos professores acabaria por ajudar a desenvolver actividades e iniciativas bem interessantes.
 

O episódio verificado na Escola Carolina Michaelis, no Porto, do célebre «Dá-me o telemóvel», foi dos momentos mais glosados do ano. Foi um episódio ilustrativo da fraqueza dos docentes?

A autoridade reconhece-se ou não. Para mim seria impossível dar uma aula a alunos com os telemóveis ligados. Mas a questão da escala da escola é fundamental, principalmente quando falamos de adolescentes. As turmas têm de ser mais pequenas. 20 alunos por turma seria o número ideal e nunca os 40 que temos nalguns estabelecimentos. E, ao mínimo acto de indisciplina, convidar o aluno a sair.
 

A imagem do professor não foi excessivamente beliscada?

No tempo do PREC o papel do professor foi completamente desvalorizado e desautorizado. Os alunos reuniam em conselho plenário e saneavam o docente. Hoje em dia a posição do professor está descredibilizada, porque compete com meios mais atraentes, como a televisão, a net e os meios tecnológicos. Chega-se ao cúmulo de o aluno saber mais sobre estes assuntos do que o próprio professor. No fundo, os professores de hoje não são os únicos educadores. Por isso, mais uma razão para tornar o espaço da aula especial e reforçar a autoridade de quem ensina.
 

É preciso vocação para ser professor?

Tem que forçosamente existir um enquadramento escolar e um treino das pessoas que vão para professores. É como ir falar diante de uma câmara: é preciso ter características de personalidade e apreender técnicas de comunicação. O professor é um apresentador, um conferencista ou um emissor de conteúdos. As primeiras aulas do ano lectivo são cruciais para estabelecer um contrato do docente com a sua turma. Da mesma forma que entendo que a avaliação de professores é fundamental, mas com critérios bem definidos, para evitar situações de distorção.
 

Como analisa a evolução do sistema educativo nos últimos 30 anos?

Apesar de tudo melhorámos na educação, em especial no ensino básico. É verdade que o nível de algumas universidades privadas é muito mau, mas a selecção natural está ser feita. É verdade que foram feitos muitos negócios fraudulentos com universidades, houve dinheiro mal gasto em formação, etc. Mas há que reconhecer que estamos melhor do que antes do 25 de Abril. Contudo, a grande reforma do ensino continua por ser feita. O Ministério da Educação tem culpa, mas é vítima do imobilismo da função pública, das estruturas burocráticas do Estado e da incompleta reforma deste. Contudo, não alimento um grande pessimismo quanto ao desempenho do sistema educativo, o mesmo não digo da Justiça, que considero o principal problema nacional.
 

Se fosse professor hoje vinha para a rua exigir a demissão da ministra?

Se fosse professor hoje tinha tanta razão de queixa dos sindicatos como da ministra. Não critico o que ela tem feito, mas discordo da forma como hostilizou os professores. Não se pode querer fazer uma reforma do sistema sem ter os professores ao lado. Mas os sindicatos também não ficaram bem na fotografia. Politizaram o debate e usaram os professores como arma de arremesso contra o Ministério.

Porém no tempo em que vivemos é muito cruel e há muita modernice a tapar a crueldade. Veja que foram todos a correr para o Rock in Rio, mas falou-se pouco de música e mais de negócio. Ninguém se insurge por ter vindo um brasileiro patrocinar um evento e chamar praticamente só artistas estrangeiros, relegando os poucos portugueses para horas impróprias. Não pode ser. Isto revela muito provincianismo. Com a idade que tenho, não posso calar-me. Não me peçam para não ver. Está diante dos olhos de todos.

Nuno Dias da Silva

 

 

 

Cara da notícia

É num discreto prédio nas imediações do Jardim das Amoreiras, em Lisboa, que fica a sede das Produções Fictícias (PF), a fábrica do humor e da ficção portuguesas. Reconhecido por muitos pelo seu papel de moderador no corrosivo, mas bem sucedido nas audiências da SIC-Notícias, «O Eixo do Mal», Nuno Artur Silva lidera a equipa de argumentistas que diariamente, e em ritmo de contra-relógio, redige as piadas e dá vida às personagens que põem os portugueses a rir.

O director-geral das PF nasceu no dia 5 de Outubro de 1962, em Lisboa, cidade da qual é profundo devoto. Desde muito jovem que o seu maior prazer era ouvir e contar histórias. Esteve a um passo de seguir Ciências, mas a providencial influência da irmã mais velha fê-lo repensar o percurso académico. Optou por Letras. Acabaria por entrar na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Nova, no curso de Línguas e Literaturas Modernas, variante Português/Inglês.

Deu aulas de Português, com «o maior prazer», em vários liceus da zona de Lisboa, durante cerca de 7 anos. «Adorava leccionar», mas o apelo da escrita nunca o largou. De permeio aventurou-se em peças de teatro e sketchs humorísticos, a meias com amigos, para exibição em salas de teatro. «Se na altura houvesse TV Cabo, tinham nascido os Gato Fedorento nos anos 80», graceja. Entretanto, conhece os actores José Pedro Gomes e Miguel Guilherme que o convidam a escrever. Herman José é o próximo a requisitar os seus serviços. A admiração que tem pelo «verdadeiro artista» impede-o de recusar a proposta. «Há comboios que só passam uma vez na estação das nossas vidas», diz-nos. Os projectos não param e em 1993 nasce as PF, da qual é fundador e actualmente o sócio maioritário. Com o crescimento da empresa, este argumentista de cepa, enveredou por funções de direcção criativa e estratégica, mas em breve promete regressar ao «bichinho» da escrita. No intervalo destes 45 alucinantes anos, Nuno Artur Silva fala com carinho dos três álbuns de banda desenhada em que deu vida ao detective Filipe Seems, dos disco de canções infantis que escreveu para a voz de Maria João, da peça de teatro que levou à cena sobre «As aventura do rapaz de papel» e, the last but not the least, a adaptação para teatro da obra «O que diz Molero», de Dinis Machado. Uma vida cheia. De humor, ficção e muita, muita criatividade.

 

 

ALEXANDRA BORGES EM ENTREVISTA

Jornalismo contra a indiferença

Em entrevista concedida ao Ensino Magazine por email, a repórter Alexandra Borges fala de um jornalismo interventivo, definindo as suas maiores virtudes como «ser activo, crítico, contra a indiferença e denunciar situações de injustiça».

Fala também dos meninos escravos do Gana e de Rita Garcia, protagonistas das grandes reportagens Infância Traficada e Vidas - A Vida de Rita.
 

A reportagem Vidas venceu a 10º Edição do Prémio Jornalismo Contra a Indiferença. O Prémio tem um significado especial por ser atribuído pela AMI?

Este prémio é especial e prestigiante. Qualquer jornalista sentir-se-ia muito honrado em recebê-lo. Para mim este prémio homenageia justamente a ideia que tenho de um jornalismo social e interventivo que eu defendo há muitos anos.
 

Na reportagem Vidas diz que os cuidados Paliativos em Portugal «são o luxo de alguns quando deviam ser direito de todos». A medicina paliativa no nosso país ainda é um oásis num deserto de sofrimento?

Infelizmente sim. Todos nós vamos morrer um dia e, a maioria de nós, vai passar por uma doença crónica e incurável. A maioria de nós terá que passar por sofrimento e dor...mas se há uma medicina paliativa que evita essa agonia terá que estar acessível a todos.
 

Vidas fala de Rita Ressano Garcia, uma doente oncológica terminal, falecida em Julho do ano passado. A Alexandra chamou-lhe amiga. A Rita trouxe o quê à sua vida?

Numa semana, a Rita deu-me mais que muitas pessoas em toda a vida.

Teve uma coragem inquestionável e sobretudo uma generosidade imensa em partilhar momentos íntimos como a doença e a morte. A Rita ensinou-me grandes valores humanos que, às vezes, só conseguimos aprender em situações extremas. A Rita ficará para sempre no meu coração.
 

Ao tomar conhecimento das crianças escravas do Gana foi até lá e fez a reportagem Infância Traficada. O que esperava encontrar no Gana, e o que encontrou?

Nem no Gana, nem em qualquer outro lugar do mundo contava encontrar escravatura infantil...o que encontrei é uma violação gritante dos mais básicos direitos humanos. Não podia ficar indiferente a uma questão como esta e, hoje, a minha luta é denunciar a situação como jornalista, como mulher, como cidadã e como mãe.
 

O interesse pelos meninos escravos do Lago Volta não se esgotou numa Reportagem. Em Portugal escreveu com Luís Figo o livro Filhos do Coração. Os direitos de autor e receitas de vendas revertem a favor da ONG, Touch a Live Kids. Como está a correr esse projecto?

Está a correr bem. Já vai na segunda edição (cada edição de 6 mil livros!)e cada 600 livros vendidos permite-nos pagar um ano de alimentação, saúde e escolaridade a uma criança resgatada do Lago...o problema é que elas são muito pequenos e temos que lhes garantir, pelo menos, até aos 16 anos...

Por isso vamos lançar agora um projecto com um CD “Filhos do coração” para angariar mais dinheiro.
 

Quais são as melhores virtudes e os piores defeitos do jornalismo actual?

O pior defeito do jornalismo quando ele é passivo e os jornalistas se tornam simples papagaios sem espírito crítico. A maior virtude é o oposto...ser activo, crítico, contra a indiferença e denunciar situações de injustiça.
 

Há 7 anos atrás, em entrevista ao Ensino Magazine, afirmou que o futuro do jornalismo passava pelas grandes reportagens. Ainda pensa o mesmo?

Sem dúvida.

Eugénia Sousa

 

 

 

Cara da notícia

Alexandra Borges, 40 anos, jornalista há quase 20, desempenha o cargo de Repórter na TVI desde Maio de 2000.

Licenciada em Comunicação Social pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Alexandra Borges ocupou um cargo de Docente no Instituto Português de Estudos Superiores, de 1998 a 2003.

Entre outros cargos desempenhados, foi freelancer da Revista Sábado e Turisver; responsável pela Produção Jornalística na instalação e coordenação da Delegação em Portugal da TVE - Televisão Espanhola; jornalista de Informação Diária no Telejornal da RTP, entre 1992 e 2000.

Já na TVI faz a reportagem A Vida de Rita e ganha o Prémio AMI – Jornalismo contra a Indiferença, 2007.

Edita o livro Filhos do Coração (2007), escrito em parceria com Luís Figo, que tem como objectivo angariar fundos para o resgate das crianças escravas do Lago Volta, no Gana, retratadas na reportagem Infância Traficada.

Com a reportagem Infância Traficada vence o Prémio AMADE, patrocinado pela UNESCO, do Festival Internacional de Televisão de Monte Carlo, (2007), na categoria Documentário-Notícias.


Visualização 800x600 - Internet Explorer / Firefox

©2002-2008 RVJ Editores, Lda.  -  webmaster@rvj.pt