Director Fundador: João Ruivo    Director: João Carrega    Publicação Mensal    Ano X    Nº116    Outubro 2007

Opinião

CRÓNICA

Os 11 de Setembro

Cómo puedes negarte
Al ciclo de la luz tú que mostraste
Caminos a los ciegos?


Pablo Neruda
La Lámpara Marina

 

No dia 11 de Setembro de 2001, dois Boeing comerciais, com passageiros a bordo, conduzidos por terroristas com ligações à Al Qaeda, derrubaram as torres gémeas do World Trade Center, em Nova Iorque. A tragédia é que foram mortas cerca de três mil de pessoas. Este é o 11 de Setembro mediático, aquele que todos entendem e se diz que mudou o mundo. Seguiu-se a invasão do Iraque, que Bush também utilizou, com juros pagos em petróleo, como manobra de diversão, para americano ver. Houve mais golpes e outras violências, com protagonistas da mesma génese, neste espaço de influência norte-americana, mas não é disso que hoje daremos conta.

No dia 11 de Setembro de 1973, um golpe de estado, liderado pelo general Pinochet e apoiado pela CIA norte-americana, derrubou o governo legítimo do Chile e assassinou o seu presidente, Salvador Allende. Estima-se que tenham sido mortas cerca de 3000 pessoas, 35 000 torturadas e 300 000 detidas pela ditadura imposta pelo golpe. Este é o 11 de Setembro de que não se fala e fez regredir o mundo e cujas sequelas ainda perduram, mas em que alguns gostariam de passar um pano de esquecimento.

O choque dos aviões contra as torres gémeas indignou justamente o mundo e os americanos em particular, que disso fizeram eco. Os acontecimentos foram transmitidos pela televisão, ao vivo e a cores um pouco por todo o lado.

Em 1973, no Chile, para não falar em Portugal (na altura também uma ditadura), as vozes mundiais depressa emudeceram. Quem ousasse levantar a voz contra a ditadura era deportado ou morto. Felizmente que, de Abril, ainda nos sobeja a possibilidade do livre protesto contra a injustiça.

A Grã-bretanha não extraditou para Espanha, a pedido do juiz Garzon, o ditador Pinochet que lá se encontrava em tratamento médico, mas tinha feito coro com Washington para a captura de Bin Laden. Como se o tempo limpasse as nódoas de sangue ou este valha mais se circular nas veias de um americano do que nas de um chileno.

Afinal de contas, (vítimas à parte) o que vale a experiência socialista chilena de 73, se comparada com o betão armado das duas torres, símbolo maior do capitalismo dos EUA?

Também é crime esta dualidade de critérios.

Há, portanto, com 28 anos de permeio, dois 11 de Setembro trágicos, que devem ser lembrados porque, como disse Salvador Allende: “…não se detêm os processos sociais com o crime… A história é nossa e é feita pelos povos”.

João de Sousa Teixeira

 

 

 

PAU DE GIZ

Rua, rua era dantes

 Faz agora anos, deu no rádio, Os russos lançaram o primeiro satélite artificial da Terra.

Ouviu-se um bip-bip-bip longínquo, e passei noites na rua, nariz no ar Cata Aviões, a descobrir uma estrela, uma luz no céu que mexericasse, sem reparar que cá na terra as ruas ainda nem nome tinham.

Por exemplo, a nossa rua tinha o nome ampliado às ruas adjacentes, e pouco tempo depois do piparote soviético no Sputnik, para a distinguir, e às outras, cada qual, aquele funcionário camarário do fato de macaco azul pintalgado, pintou Rua Professor António Manuel à esquina da Paraíso e do Outeiro, empregando um alfabeto de letras recortadas em chapa, borradas de tinta preta, onde apenas se distinguia cada letra pelo entalhado das latas que chocalhavam, misturadas numa caixa com asa e um buraco de lado por um nó ter saltado da tábua.

Todos concordam, O Professor António Manuel merece ter o nome numa rua.

Natural de Inguias, Belmonte, nos finais do século dezanove foi professor de algumas gerações, e sem ideia nenhuma sobre ensino especial, teve a arte e a manha para ensinar o Mudo a ler.

Lembro-me do Joaquim Gonçalves Monteiro, de pé, muito atento a ler no missal, a camisa branca imaculada a destacar-se do fato escuro, no altar o Padre Mateus paramentado de roxo, a seu lado a careca do sacristão João Santinho a luzir, depois o Mudo a descer a coxia, a Voz da Fátima ou seria o Cavaleiro da Imaculada? dobrado debaixo do braço, o olhar inquiridor no tecto de madeira da igreja pintado a azul celeste e tal como eu hoje me pergunto, o Mudo a perguntar-se, O que fará aquele ferro preso de um lado ao outro nas paredes da igreja lá no alto a segurar uma pequena estrela dourada ? se fosse uma pomba compreendia-se a Santíssima Trindade.

Não sei se o Mudo sabia, mas eu sei de fonte segura, a minha família paterna deve ao Professor António Manuel a alcunha e como ele baptizou para sempre o meu avô da Argentina. Contou-me o meu tio Joaquim, Lá pelos idos de mil oitocentos e oitenta e não sei bem o teu avô chegou atrasado à escola e pediu licença, Posso entrar ? e à frente do bando dos pardais sentados nos bancos mouchos o professor respondeu-lhe, Entra lá ó Batata.

Foi quanto bastou para a canalha baptizar o meu avô aos oito ou nove anos, baptizando logo ali a sua futura mulher e os filhos que tivessem. Hoje, só alguns poucos de velhos, ou os acintosos, pelas costas nos chamam assim, perdoando-se aos amigos empregarem-na cara a cara sempre que lhes aprouver aquele eterno mimo do referenciado educador.

Dizia, A nossa rua não tinha um nome em concreto. E poucas ruas tinham os nomes de agora, nomes de santos e santas predilectos, escolhidos por unanimidade pelos inquilinos. Há ruas com nomes de gente importante da época, poetas, descobridores e políticos. Houve nomes que os arredaram das paredes pós-vinte e cinco de Abril e há nomes de ruas conservados, os mesmos que as ruas sempre tiveram desde o tempo em que as ruas não precisavam do nome pintado nas esquinas.

As casas, é claro, não tinham o correspondente número de polícia pespegado pelos portados, o que nada atrapalhava o senhor Gonçalves na eficiente distribuição do correio.

Quer fizesse sol, quer se começassem a ouvir pelos quintais os porcos a guinchar, prenúncio da matança, sinal da invernia, o Carteiro circulava carregado de cartas, postais e pacotes fofos de papel. Uns rolos cilíndricos com as pontas reviradas para dentro, contendo ofertas de amostras dos lotes de lãs nacionais. A assomar dos canudos viam-se as fibras curtas dos mungos, nas cores na berra, azul royal, verde garrafa, mescla geral.

Quando chegava o frio para curar o enchido a chuva sabia-se, de antemão, já não despegava até finais de Maio do ano seguinte, a calçada transformava-se num rio barrento e oleoso coberto por uma fina camada de caramelo luzidio e deslizante, onde as pastas e os livros de leitura faziam esqui.

Ganhava quem conseguisse fazer avançar até mais longe o material escolar à biqueirada das botas de cano alto. Umas botas em borracha preta que assavam por dentro na barriga das pernas quando as meias grossas, feitas à mão com duas agulhas, se escoavam até à pontinha das unhas dos dedos dos pés.

Rua, ruas era onde morava gente no Outeiro, dos Gonçalpares à Latada passando pela Corga e Fonte Seixo, da Tapada do Rato ao Rossio passando pelo Ribeiro e Monte, do Capitão Mor às Bandas passando pelo Tinto Velho ou Fonte Nova, do Quichoso à Fontaínha passando por cima dos dois ribeiros cobertos com lajes e pela Porta Grande.

Rua, ruas era tudo onde fiava ou tingia a gente, onde a vida estremecia alegre e contente, ou viajava mansa e açucarada a descortinar o Sputnik no céu, a jogar futebol, a baldear as poças da água com as botas de borracha, os rebolos a brilhar, gemendo água, pequenos fios dourados nelas tecendo sonhos, fortuna, raízes como no tear.

Rua, ruas hoje sem trama e por empeirar.

António Luís Caramona
paudegiz@gmail.com

 

 

 

CONTRABAIXO

Fórum Cultural

Durante dois dias estive no Centro Cultural de Belém para participar no Fórum Cultural Europeu. Não tinha uma expectativa que fosse mais além de encontrar alguns amigos, poder por a conversa em dia, entender o que se pretende com a agenda de Lisboa e, com sorte, apanhar algum orador interessante.

Se a agenda de Lisboa continua a ser, para mim, uma nebulosa na qual os contributos que foram dados no fórum caiem que nem uma gota de água, já algumas das intervenções foram clarividentes e muito enriquecedoras. Na sessão de abertura o embaixador Francisco Seixas da Costa destacou-se ao colocar em causa alguns dos pressupostos que nos levam a encarar a Europa como uma ilha, num discurso apelativo e com muitos pontos de interesse. Mas, na minha opinião, foi o irlandês Michael Ó Suilleabháin que mais justificou as largas horas sentado no grande auditório. Para os mais curiosos, valerá a pena passar no sítio www.culturalforum.pt , no qual se podem encontrar alguns dos discursos e textos de referência.

Escolhi a workshop “A Economia da Cultura”, mas poderia optar por outras duas: “Diálogo Intercultural” ou “Europa e o resto do Mundo”. O formato escolhido era muito mais vocacionado para o auscultar de pontos de vista da audiência multinacional (a chamada sociedade civil), com um moderador, o britânico Anthony Lilley e um relator que enquadravam as intervenções previstas e estimulavam a participação do público. Neste particular, Lilley foi um excelente moderador, acutilante, preciso e pouco ou nada politicamente correcto.

Muitas vezes a confusão instalou-se ao nível dos conceitos (Indústrias Culturais, Indústrias Creativas, Creatividade, Economia Creativa, Economia da Cultura, etc, etc) e muitas das intervenções da plateia não se enquadravam na linha do que estava a ser discutido naquele preciso momento, consequência de um ponto de partida no qual tudo ou quase cabia. Por exemplo, quando o moderador perguntou a Thomas Paris, que falava sobre fontes de financiamento, qual o papel do capital de risco no financiamento de projectos culturais, o francês começou a falar do risco inerente a qualquer projecto, num claro misturar de alhos com bugalhos. Senti falta de muitos protagonistas, sobretudo artistas, e alguns países não estavam representados, no entanto, acho que foi um momento importante e que permite avançar com algumas notas:

1 - A Europa Comunitária acordou tarde mas parece ter acordado para a realidade do peso da cultura como factor de desenvolvimento económico.

2 - É necessário diferenciar as contribuições das Indústrias Culturais, das Artes do Espectáculo e de outros sectores culturais para este peso. Não é a mesma coisa falar de festivais e de canais de televisão ou empresas que desenvolvem jogos de computador.

3 - É imperativo defender a criação artística que não tem como receptor a multidão.

4 - Uma ideia chave, roubada ao irlandês que já referi, é encarar a Europa e o Mundo ou no Mundo e nunca a “Europa e o resto do Mundo”.

5 - Senso comum mas é bom lembrar: a inovação tem de ser balanceada com a tradição, com as raízes.

6 - Precisam-se escolas artísticas mais interdisciplinares e mais artes em outros cursos, como por exemplo nas engenharias.

Finalmente não deixa de ser curioso ser Portugal, um país altamente deficitário na área cultural, a promover e organizar um primeiro Fórum desta natureza. Está, pois, de parabéns o Ministério da Cultura.

Carlos Semedo 
carlossemedo@gmail.com
 

 

 

 

OPINIÃO

Cartas desde la ilusión

Querido amigo.

Hemos acabado las vacaciones de verano (¡qué lejos están!) y ya estamos de nuevo con toda la responsabilidad en el desarrollo del nuevo curso académico.

Han pasado ya tres semanas y hemos entrado en contacto con nuestros nuevos alumnos, hemos tratado de adaptarnos a ellos, de observarlos, de estudiar su comportamiento, de detectar sus tendencias como grupo y como individuos…

Yo he vuelto a reanudar mi programa de desarrollo de la autoestima con mis alumnos, ya que, supongo que tú también, me corresponden los mismos alumnos del año pasado, y, por eso, puedo dar continuidad a mi trabajo.

En mi última carta te conté mi última actividad en relación con el desarrollo de su autoestima. Ahora paso a recordar mis impresiones de aquellos momentos en que estábamos finalizando el curso.

Si recuerdas, nuestra última actividad fue la del “collage” en que cada alumna/o plasmaba su manera de ser y de ver las cosas.

La presentación de cada uno de los “collages” fue una experiencia inolvidable, creo que tanto para mi como para cada una/o de mis alumnas/os.

Pasé toda la sesión observando las reacciones de los que presentaban “su” manera de verse y las reacciones concomitantes del resto de los alumnos que recibían los mensajes transmitidos en cada una de las cartulinas (por cierto, algunas resultaron impactantes no sólo desde el punto de vista psicológico, sino también desde el punto de vista artístico). Reconozco que disfruté observando las caras de aceptación, de acuerdo, de valoración positiva y, en ocasiones, también de sorpresa, de algunas/os de las/los alumnas/os.

El resultado final fue una especie de “re-generación” del clima en el aula que, lo reconozco, me sorprendió gratamente. Observé que las/los alumnas/os habían comenzado a desarrollar cierto sentido de la empatía, aunque muy primitivo. Pero es algo que este nuevo curso escolar espero seguir potenciando.

Me gustaría que tú emprendieses, también, este camino. Creo que es muy productivo e intuyo que, al final del curso, se apreciarán claramente los resultados.

Seguiré contándote mis actividades y mis resultados mes a mes.

Un abrazo fuerte

Juan A. Castro (Salamanca)
juancastrop@gmail.com

 


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