Director Fundador: João Ruivo    Director: João Carrega    Publicação Mensal    Ano X    Nº112    Junho 2007

Editorial


Nativos e imigrantes digitais

Alguma literatura tem dividido o mundo entre aqueles que considera serem "nativos" e os que classifica de "imigrantes" digitais.

É uma excelente metáfora. A geração dos nativos reage como quem nasceu, cresceu e sempre viveu em determinado território. A língua que fala vem-lhe do berço e sente-se tão bem por aí que não lhe passa qualquer peregrina ideia de ir viver para outro lado. Os nativos digitais vivem num mundo muito jovem. Têm menos de 25 anos e governam-se através de um complexo sistema de rede global, de acesso democrático, onde a partilha de informação e a comunicação permanente ajuda a consolidar essa nova sociedade do conhecimento. Nasceram num mundo onde havia computadores e telemóveis e interactuam com os novos meios tecnológicos, como o são a Internet e os videojogos.

Já os imigrantes digitais mantêm todas as características daqueles que abandonaram as suas terras de origem e entraram num novo país para viver nele. Por mais anos que aí residam, notar-se-á sempre um envergonhado sotaque. As saudades da terra pátria assaltam-no em cada nova dificuldade encontrada. Têm entre 30 e 55 anos e todos os dias redobram os esforços de integração nessa nebulosa comunidade digital. Nasceram com televisão, e habituaram-se a consultar papéis onde abunda a palavra escrita. Só vão à Internet quando não encontram um livro que aborde o problema. Antes de usar qualquer aparelho electrónico lêem, com detalhe, as instruções. Antes de utilizarem qualquer programa informático precisam saber, com todo o pormenor, todas as teclas em que devem carregar…

No extremo oposto, encontram-se os nativos digitais: fazem primeiro e perguntam (raramente) depois. Adoram a velocidade com que buscam e tratam a informação e acham perfeitamente natural fazerem várias coisas ao mesmo tempo. Preferem os ambientes gráficos aos textuais. Operam em rede, onde trocam com o mesmo entusiasmo a banalidade e a descoberta. Necessitam de saber que está alguém do outro lado, não no mesmo espaço, mas no mesmo tempo. É nessa teia que se alimentam de uma gratificação e de uma recompensa constantes e onde todos os dias exigem de si mesmos ir um pouco mais longe, na busca de novos desafios, enquanto navegam na galáxia digital. Para muitos deles, a separação entre o real e o virtual torna-se imperceptível. Por isso preferem os jogos virtuais ao trabalho escolar, mais sério e disciplinado: grande seca! Para eles não há vida sem telemóvel, Internet, comunidades online, blogs, ou acesso ao Orkut.

Já para a geração dos imigrantes digitais, as novas tecnologias da informação e da comunicação servem, sobretudo, para comparar preços ou fazer encomendas na Internet, para aceder ao site do banco, ou para facilitar a comunicação na escola ou no escritório. Gostam de ocupar o tempo livre frente à televisão, cujos malefícios educativos tanto temiam, e realizam a maioria das interacções do dia-a-dia através do telefone.

Sejamos, porém, realistas. A história recente ensinou-nos que o cinema não morreu com a generalização das videocassetes e do DVD. Tal como o rádio não sucumbira à televisão, e nenhum deles consegui substituir o papel e função da imprensa escrita. A imagem não substituiu a palavra e o ensino à distância não se fez sem os professores.

Mas é bom que se reconheça que os hábitos mudaram com uma velocidade vertiginosa e o mundo dos jovens que nos rodeiam supera em dificuldade qualquer detectado risco das comunidades estudantis que conhecemos nos anos sessenta. Por isso exige conhecimento, acompanhamento, muitas doses de paciência e uma redobrada atenção. É que a geração dos nativos digitais, quando bate com a porta do quarto, não é para se isolar. Quando o faz, nesse preciso momento, entra ansiosa e, quantas vezes, vingativamente, num reino mítico, proporcionado pela fantasia da navegação e da aventura sem rumo, nas estradas e sítios virtuais. Dá para se encontrarem ou desejarem o regresso. Mas também pode acontecer que alguns por lá se percam.

João Ruivo
ruivo@rvj.pt

 


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