GENTE & LIVROS
Antero de Quental

Na Mão de Deus
Na mão de Deus, na sua mão direita,/ Descansou afinal meu coração./ Do
palácio encantado da ilusão/ Desci a passo e passo a escada estreita.
Como as flores mortais, com que se enfeita/A ignorância infantil,
despojo vão,/Depus do Ideal e da Paixão/ A forma transitória e
imperfeita.
Como criança em lôbrega jornada,/ Que a mãe leva ao colo agasalhada/ E
atravessa, sorrindo vagamente,
Selvas, mares, areias do deserto.../Dorme o teu sono, coração liberto,/
Dorme na mão de Deus eternamente!
In Sonetos Completos
Poeta açoriano, Antero
Tarquínio de Quental nasceu a 18 de Abril de 1842, em Ponta Delgada.
Os estudos preparatórios são passados entre Ponta Delgada e Lisboa. Em
Coimbra, matriculando-se no Colégio de São Bento em 1855, onde frequenta
o curso de Direito que termina em 1864.
Sonetos (1861) é a sua primeira obra publicada em livro. Iriam seguir-se
Beatrice (1863); Fiat Lux (1863); e Odes Modernas (1865).
Lê Proudhon e Hegel, interessa-se pelas ideias e ideais socialistas e
por filosofia. A polémica com os escritores românticos havia de
acontecer em 1865 com António Feliciano Castillo, antigo director do
colégio do Pórtico, a criticar os jovens escritores de Coimbra. Em
resposta, Antero escreve o opúsculo Bom Senso e Bom Gosto e A Dignidade
das Letras e as Literaturas Oficiais, defendendo que a literatura deve
ter uma função social, por oposição ao ultra-romantismo decadente.
Vivia-se a célebre “Questão Coimbrã” e uma nova geração literária
surgia, a Geração de 70 de Antero, Eça de Queiróz, Oliveira Martins,
Ramalho Ortigão, Teófilo Braga, Adolfo Coelho, Guerra Junqueiro, Gomes
Leal.
Antero parte para Lisboa em 1866 onde vive como a classe operária, a
trabalhar como tipografo, profissão que também irá exercer por algum
tempo em Paris.
De regresso a Lisboa, participa na organização da associação operária e
na divulgação dos ideais revolucionários; publica textos políticos e
literários no Diário Popular; Jornal do Comércio e O Primeiro de
Janeiro.
Na casa que partilha com Jaime Batalha Reis discutem-se as novas ideias
que chegam de França e é criado o grupo do Cenáculo. Antero integra a
redacção de jornais de orientação socialista A República, O Pensamento
Social, em 1871 participa na organização das Conferências do Casino.
Primaveras Românticas é publicado em 1872.
Em 1873 herda uma fortuna que lhe permite viver despreocupadamente, mas
no ano seguinte é-lhe diagnosticada doença bipolar. Convidado pelo
Partido Republicano a candidatar-se como deputado, a doença determina a
sua recusa.
Ainda preside à efémera Liga Patriótica do Norte, formada em resposta ao
ultimato dos ingleses, mas a sua depressão é já permanente. No dia 11 de
Setembro de 1891, o poeta genial suicida-se com um tiro disparado na
cabeça, no banco de um jardim em Ponta Delgada? 
Eugénia Sousa
LIVROS
Novidades literárias
UBI. No principio é a lã…a cultura
pastoril, é título do catálogo e de uma exposição do Museu de Lanifíos
da Universidade da Beira Interior. Com a coordenação de Elisa Calado
Pinheiro; textos de Manuel José dos Santos Silva e Elisa Calado
Pinheiro; a fotografia é de Danilo Pavone, Joana Correia e Pedro Leitão
Pais; e o design de Joana Correia. Este é o resultado de um longo
trabalho de uma grande equipa, na divulgação de uma prática ancestral.
Dom Quixote. O Fogo do Céu, de César Vidal. Século II d.C. e Roma
enfrenta tempos decisivos na manutenção do império. É preciso
salvaguardar as fronteiras do ataque dos bárbaros e manter a ordem na
capital, onde não param de chegar homens e mulheres Através de um
episódio extraordinário da Vida de Roma, o autor conta-nos uma história
inspirada no amor, na morte, na guerra, e também na dignidade.
Gradiva. A Ilha das Trevas, de José Rodrigues dos Santos. Paulino
da Conceição assistiu com a família à saída dos portugueses de
Timor-Leste e aos acontecimentos que se seguiram. Sofreu e viveu a
invasão Indonésia de 1975 e o referendo de 1999 que trouxe por fim a
independência a Timor. Mas Paulino guarda um segredo e só existe uma
pessoa a quem ele o poderá confessar.
Difel. Marilyn, Últimas Sessões. Durante trinta meses eles foram
protagonistas de uma história que terminaria de forma dramática. Ela é
Marilyn Monroe, o maior sex symboll de todos os tempos. Ela precisa
desesperadamente de alguém que a ensine a viver fora das telas e o seu
psicanalista pode ser essa pessoa. Todavia, o desejo de a proteger não
chega e a acusação de a ter destruído, persegue-o.
Pergaminho. O Dom da Mudança, de Marianne Williamson. Todas as
mudanças com que nos deparamos ao longo da vida, são essencialmente
etapas fundamentais para a descoberta da nossa própria identidade. A
autora pretende mostrar o caminho para redimensionar a nossa existência
e espiritualidade, de forma permitir que seja o amor a comandar a nossa
vida.
Presença. Os Cisnes de Leonardo, de Karen Essex. Na Itália da
Renascença, movida por intrigas de corte, paixões arrebatadores e
extraordinárias manifestações artísticas, as duas filhas do duque de
Ferrara, Isabella e Beatrice d‘Este, rivalizam pela atenção do mundo e
dos homens. Acima de tudo, Isabella deseja que a sua beleza seja
imortalizada pelas mãos do mais genial de todos os mestres, Da Vinci.
Asa. Os Fantasmas de Goya, de Jean-Claude Carrière e Milos Forman.
Goya, pintor extraordinário da corte de Carlos IV de Espanha tem como
clientes Lorenzo Casamares, um dominicano do Santo Ofício, e Inês de
Bilbatua, a sua bela musa. Quando Inês é acusada de heresia, Goya apela
a Lorenzo para que a salve. Mas Lorenzo apaixona-se por Inês. Ela é
presa e torturada, enquanto ele é banido da igreja e obrigado a fugir
para França. Vinte anos depois o reencontro entre os três acontece, e é
tempo para fechar as suas histórias.
Estampa. A Oficina dos Escritores, de Francis Amalfi. Este livro
é um tributo aos escritores e aos livros. Aqui podemos ler uma breve
biografia, as melhores citações, e recomendações bibliográficas sobre
grandes nomes das letras como Camões, Cervantes, Pessoa, Goethe, Kafka,
Hemingway, Camus, Conrad ou Neruda.
Europa-América. O Fascínio do Islão, de Martine Gozlan. A autora
afirma: «O Islão não se limita a avançar, galopa». Dos 500 milhões da
década de 70, a religião islâmica passou para um número que ascende aos
1,2 mil milhões. Como se explicam estes números? Qual a explicação para
o crescente interesse por esta religião e o que a torna tão procurada
pelos ocidentais?
Cotovia. Sonótono de Daniel Jonas. Este é o quarto livro de
poemas do autor que nasceu no Porto em 1973, e teve a sua estreia com O
Corpo está com o Rei (1997). Os livros Moça Formosa, Lençóis de Veludo
(2002) e Os Fantasma Inquilinos (2005), também com a Chancela da
Cotovia, antecedem Sonótono.
Campo das Letras. Dom Quixote Contado às Crianças, por Rosa
Navarro Durán, e ilustrações de Francesc Rovira. Os clássicos da
literatura são os mestres por excelência. Assim, é com enorme prazer que
surge o que já foi eleito por muitos como o melhor romance de todos os
tempos, adaptado ao melhor de todos os públicos, as crianças.
Ambar. Os Amigos não são para Comer, com texto e ilustrações de
Elsa Lé. Esta é a história de um menino que tenta por todos os meios
restaurar a harmonia e a paz na floresta colorida, onde sempre brincava
e era feliz. Mas com a vinda do monstro, os animais sentem medo e já não
há alegria na floresta. Conseguirá o amor do menino salvar os amigos?
Eugénia Sousa
BOCAS DO GALINHEIRO
Pirata de Perna de
pau...

Jack Sparrow, o mais recente membro da já
longa família de piratas no cinema, está de volta, na terceira entrega
da saga realizada por Gore Verbinski. Depois de “ Piratas das Caraíbas –
A Maldição do Pérola Negra” e de “ Piratas das Caraíbas – O Cofre do
Homem Morto”, Johnny Depp torna a vestir a pele do mais inesperado
pirata alguma vez visto no grande écran. Despudoradamente mentiroso,
cobardolas e narcisista, com uma pitada do Rolling Stone Keith Richards,
era, para todos os efeitos, o anti-pirata, ou seja, tudo aquilo que não
pensávamos possível nestes sanguinários dos mares, adornados aqui e ali
com um toque de gentleman e de sedutores, tal como os imaginámos na
nossa infância. Porém, o êxito desta criação ultrapassou as expectativas
mais optimistas. Das iniciais reservas da produtora, temendo mesmo um
grande fracasso do filme e de tentativas sensibilizar Depp para suavizar
os exageros da sua representação, foram certamente caladas e no segundo
episódio, se não o incentivaram a polir aquele diamante caído nos braços
de Jerry Bruckheimer, pelo menos não se manifestaram. O que é sinónimo
de apoio.
Nesta terceira e última parte (será mesmo ?), “Piratas das Caraíbas –
Nos Confins do Mundo”, este inusitado grupo de corsários, agora com
Elizabeth Swann (Keira Knightley) e Will Turner (Orlando Bloom) vão até
aos confins do mundo para resgatarem Jack Sparrow e o Pérola Negra mas
para tal vão precisar de muita ajuda e, como é timbre nos blockbuster’s,
de um festival de efeitos especiais. E, durante três horas não nos dão
tréguas, numa imprevisível aventura em que num ritmo estonteante somos
levados de Singapura à terra dos mortos, como não poderia deixar de ser
com muitas traições pelo meio e a inevitável presença da omnipotente
Companhia das Indias Orientais e do temido Holandês Voador e do se
amaldiçoado capitão Davy Jones, para no fim tudo acabar bem, ou quase.
É claro que esta visão romântica da pirataria é a que resulta da
literatura e não da história. O nosso imaginário foi alimentado pela
leitura de “A Ilha do Tesouro”, de Robert Louis Stevenson, obrigatória
no que ao tema do corso diz respeito mas, principalmente, tendo em conta
a quantidade de obras suas que foram editadas entre nós, do italiano
Emílio Salgari, criador de Sandokan, o Tigre da Malásia. Longa era a
semana nas férias na aldeia à espera da carrinha da Biblioteca
Itinerante da Gulbenkian para devorarmos mais uma ou duas aventuras dos
piratas de Mompracém. A passagem da séria televisiva no nosso pequeno
écran, na década de setenta, fez reviver este personagem, interpretado
então por Kabir Bedi, o mesmo acontecendo com a obra da Salgari,
reeditada na altura. É pela pena de outro italiano, Rafael Sabatini, que
a literatura nos dá outro grande vulto da pirataria, o Capitão Blood, um
médico que se tornou capitão dum barco de piratas.
Como sempre, o cinema não desperdiçou o filão e desde cedo estas obras
foram adaptadas ao grande écran, sendo que grandes actores imortalizaram
estes vultos literários, desde logo Errol Flynn, símbolo maior do cinema
de aventuras dos anos 30 e 40, no papel de Capitão Blood no filme
homónimo de Michael Curtiz de 1935, repetindo em 1940, também pela mão
de Curtiz no papel de Geoffrey Thorpe, claramente inspirado no célebre
pirata da Inglaterra Isabelina, em permanente conflito com Espanha,
Francis Drake, em “O Gavião dos Mares”. Todavia o primeiro pirata
célebre do cinema é Douglas Fairbanks. Exímio acrobata, muitos dos
gestos reproduzidos até à exaustão nas fitas do género nasceram com ele
e no seu “Pirata Negro”, realizado em 1926 por Albert Parker. Outro
grande atleta, Burt Lancaster deu corpo a outro personagem inolvidável
em “O Pirata Vermelho”, realizado em 1952 por Robert Siodmak, em que o
humor e acção se mesclam de forma magistral. Decerto uma inspiração para
Depp.
Jogando a sua cartada no humor, Roman Polanski investiu muito em
“Piratas”, de 1986. O resultado não correspondeu às expectativas, mau
grado a interpretação de Walter Mattau e alguns gags que, hoje, talvez
fossem vistos com outros olhos. Também pelo lado da sátira Alexander
Mackendrick dirige em 1965 “A High Wind in Jamaica”, com Anthony Quinn,
sobre um grupo de miúdos deixados ao sabor das ondas num barco pirata,
fazendo reféns os tripulantes.
As piratas também tiveram o seu momento no cinema., desde logo com “Anne
of the Indies”(A Rainha dos Piratas), de 1951, dirigido por Jacques
Tourneur com Jean Peters encarnando, não muito convincentemente, a mais
célebre pirata das Bahamas, Anne Booney, que já fora vista em “The
Spanish Main”, 1945, de Frank Borzage, para mais recentemente, 1995,
Renny Harlin , realizar “A Ilha das Cabeças Cortadas”, com Geena Davis e
Matthew Modine. Outro monstruoso fracasso, este da saga da pirata Morgan
Adams e do seu escravo, Modine, na procura do mapa de um tesouro.
Muitos outros e bons piratas passaram pela tela, casos do Capitão Kidd,
uma inolvidável criação de Charles Laughton, no filme de 1945 de Rowland
W. Lee, personagem que repete em “Abbot and Costello Meet Captain Kidd,
1952, de Charles Lamont, uma variante cómica, mais uma, sobre o tema, ou
do célebre Capitão Gancho de Peter Pan, tanto na versão animada da
Disney de 1953 ou no mais recente “Hook”, 1991, de Steven Spielberg.
Bons ou maus, com ou sem olho de vidro ou perna de pau, no cinema pirata
é sinónimo de aventura e acção, e é delas que o cinema vive. Bons
filmes!
Luís Dinis da Rosa
Educação às tiras

Desenho: Bruno Janeca | Argumento:
Dinis Gardete
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