9 ANOS DE ENSINO MAGAZINE
Novos desafios
À entrada do seu 10º ano de vida, o Ensino Magazine apresenta-se aos leitores com uma imagem gráfica renovada, com novas secções criadas e com o rigor e a credibilidade jornalística intactos. Mas apresenta-se também com a mesma determinação que a equipa que há 9 anos idealizou a publicação, constituindo o elo mais forte na cadeia comunicativa entre a sociedade, o ensino e a cultura com a escola nos seus mais variados níveis de ensino.
Em mês de aniversário não poderia deixar de focar alguns aspectos que tornaram o Ensino Magazine numa das publicações do género mais lidas nas escolas portuguesas e pela comunidade académica, num universo de aproximadamente 200 mil leitores.
O alargamento da distribuição a todo o país e à Ilha dos Açores (a Madeira será o passo seguinte), de uma forma consolidada, foi um objectivo alcançado plenamente no último ano, mas traçado desde o início da publicação, quando começou a ser distribuída nos distritos de Castelo Branco, Guarda, Viseu, Portalegre, Évora e Beja, numa caminha séria, sem atropelos e com a dignidade que um projecto como este exige.
O próximo passo será consolidar o caminho até agora percorrido, alargar a distribuição à Ilha da Madeira e estruturar a internacionalização da publicação, numa primeira fase na região raiana espanhola. Como referiu o antigo Reitor da Universidade de Salamanca, Ignácio Bergudo, “o ensino não tem fronteiras”. Uma aposta que será concretizada a seu tempo e que tornará ainda mais único o Ensino Magazine, apresentando uma mescla cultural dos dois países e das duas línguas.
O desafio lançado às escolas, no último ano lectivo, com o Concurso Nacional de Fotografia envolveu mais de mil participantes e contou com o apoio das principais instituições de ensino superior do país. Um sucesso que também nos permitiu aferir dos elevados índices de leitura do Ensino Magazine. Este ano seremos mais ousados, com o concurso nacional de Páginas de Internet/Blogs, onde toda a comunidade, educativa ou não, poderá participar com os trabalhos por si criados, numa iniciativa em que o Centro de Competências da Beira Interior (Nónio) é parceiro. Ainda este ano iremos avançar com o concurso nacional de SMS’s. Uma novidade em todo o país, onde a participação é gratuita e vale prémios às mensagens mais originais.
Os últimos nove anos do Ensino Magazine tornaram-no uma marca apetecível do ponto de vista do investimento educativo. É através dele que a comunidade conhece aquilo que se passa na sua escola, politécnico ou universidade. É com ele que os jovens confidenciam as suas escolhas para o ensino superior. O novo Ensino Magazine, que hoje lhe chega às mãos, mantém as mesmas características de sempre, apresentando novas rubricas destinada a vários públicos, casos do Trabalho Temporário, Rotas do Geoparque, Dicas para a Net, e mais espaços dedicado a temas da juventude. O caminho está traçado para mais uma década de sucesso. Obrigado por nos acompanhar e por fazer parte da nossa equipa.
João Carrega
CRÓNICA
Objectivo

Munido dos adereços adequados, partimos ao seu encontro. Digo adereços, não endereços. Estes são caminhos, itinerários, cartas de orientação, informações que se recolhem na procura, mas não garantem o êxito. Para a ocasião, é mais seguro usar de máscara, de camuflagem, de tintas invisíveis e outros apetrechos de evasão e disfarce. De que serviria um bom endereço, se cada afogo do percurso é, por si só, impedimento de toda a empreitada?
Pese embora o atavio, nem sequer cómodo, o adereço permite que se atinja o objectivo contornando escolhos e os imbróglios que causam as falsas indicações.
Postos à prova – se prova pode ser chamado o nosso intento de chegar – depressa nos apercebemos que o caminho se faz caminhando e, por isso, o mais importante é sermos mais destros e astutos do que os que nos precedem e, inevitavelmente, mais originais e serenos do que os que vão à nossa frente. Eis o paradigma de quem tem o intuito de chegar a um determinado lugar, sem quebras de ânimo, nem falhas por negligência.
Não fugi propositadamente ao assunto. Na verdade, apenas quis sublinhar o que de mais humano ocorre sempre que nos dispomos a seguir um trilho estabelecido.
Com efeito o adereço tranquiliza-nos, descontrai-nos, sem nos tornar clandestinos, e isso leva a que o nosso andar adquira a leveza de um voo de águia. Podemos mesmo seguir em direcção errada por puro divertimento. Ninguém tem a ousadia de nos perguntar de onde vimos e para onde vamos, capaz depois, por ruindade, apontar caminhos ínvios para o nosso destino ou, por indiscrição, querer saber quem somos, o que nos fez peregrinos obstinados ou qual vem a ser o propósito de tal empresa. Além do mais, há ainda a vantagem de podermos olhar para trás sem que alguém duvide da nossa determinação e, como frequentemente acontece, logo interpretarem como saudade ou arrependimento, quando apenas avaliamos o esforço, medindo à vista o percurso realizado.
Mas tudo tem o seu epílogo. Este vai tornando-se claro à medida que os panos descem em jeito de fim de acto e as palmas, que não precisamos de ouvir porque as sentimos, (fazem parte do aplauso que nos devemos) como se o nosso animal doméstico nos lambesse a alma em sinal de agradecimento, apenas por existirmos e estarmos ali.
E só agora enxergo ao que vim. Tarde de mais. Se o soubesse, teria descuidado da cautela posta nesta aventura, teria desaprendido os caminhos que me deixam prostrado aos pés do fim. É claro que esta andança é relativa. Tudo depende das opções e das tecnologias postas à disposição, cujos nomes seguimos através do respectivo manual de instruções.
Para ser sincero, se o soubesse, nunca teria dado um só passo para aqui chegar.
João de Sousa Teixeira
PAU DE GIZ
Sobre o Outeiro,
sabias?
Andava de calções e ajoelhado num banco, debruçado da janela alta em casa da minha avó Mendes, via o mundo a discorrer um andar abaixo na rua do Outeiro.
Via os cães e os gatos a vadiar, armando bulhas com a bicharada que atravessava a arrazoar das outras ruas, e ao final da tarde havia sempre magotes de canalha a jogar ao jogo da panela, ao farrabóque ou ao velho de esconder.
Nessas correrias esbarrava a malta com as mulheres sentadas às portas, nas cadeiras baixas de estar ao lume, que lhes rogavam pragas e raios te partam, pelo desconforto.
Elas de avental e combinação de flanela por baixo das saias rodadas, usavam um lenço atado na cabeça, as duas pontas reviradas no ar como um par de cornos de chibo. Ocupavam ao entardecer o que lhes sobrava das réstias do dia, aproveitando a fresquidão para espairecer e actualizar os mexericos.
Ainda a rádio renascença não transmitia em directo o terço, às seis e meia de tarde.
Nessas invasões desgovernadas tropeçava também a corja nos homens à saída da taberna do Ti’ Passamano, que lhes davam uns tabefes e bramiam palavrões ecoando a trovoada.
Eles com a voz grossa e pastosa, barba de dois dias e calças de fazenda que picavam por dentro, apuravam o último lote especial da casa, enxugando o pipo dos cinquenta litros pelos copos de meio quartilho.
Ainda a televisão não transpusera os limites da Feira Popular.
Andava de calções e ficava a ver, debruçado da janela alta ajudado por um banco, as mães e avós a passarem com cântaros à cabeça.
Quase todas andavam pelas fábricas, das oito às cinco, algumas a trabalhar por turnos, ou tiravam nós, cortavam pontas e metiam fios em casa, mal tendo vagar para tratar do caldo e dos vivos. E da água para encher a talha de barro, no chafariz em frente ao portão da farmácia, onde alinhavam os cântaros de lata, na fila de espera da correnteza que tardava em correr.
A água alcançava ali vinda da mina na Tapada do Rato, só de madrugada, nunca se sabendo às quantas chegava.
Como em todos os buracos se fabricavam fazendas (chegaram-se a produzir mais de vinte por cento dos tecidos cardados nacionais, sabias?) e se a mulher não trabalhasse para tratar da lida, o homem trazia a féria certa todas as semanas no bolso.
Se havia os que se aliviavam maneiras da semanada na baiuca mais à mão, onde metiam conversa sobre picotilho e ciclismo, isso era para desanuviar do lanzum no qual andavam enfronhados de segunda a sábado.
Quando, nos idos de sessenta, muitos dos de cá se meteram a salto raia fora, outros vieram para os lugares que os de cá esvaziavam nas fiações de carruagem, nos C-45 da Auto Mecânica, nos batanos e nas barcas de tingir em madeira.
Os primeiros vieram em rancho de S. Miguel d’ Acha, vieram depois do norte alentejano, vieram das duas margens da Ocreza cortilhões e plingancheiros, vieram da campina da Idanha, vieram ainda de mais longe guarda livros, mestres de cardas, debuxadores e ultimadores.
Era tudo gente para as fábricas, que andavam precisadas de mão de obra (e que há menos de duas dezenas de anos passavam de mil os postos de trabalho, sabias?).
Alguns traziam um carimbo na testa: jogador.
Um ou outro um rótulo na gravata ensebada: treinador.
Nos dois casos particulares, o mesmo destino, complementar ao trabalho na indústria: o Indústria FC.
Todos foram bem recebidos e todos por igual acolhidos. Todos tinham o salário assegurado mesmo que não fossem grande coisa como técnicos nas contas, nos fios e na jarda, ou na afinação da tesoura com o papel de mortalha entalado nas lâminas.
Aos domingos (e de uma gloriosa equipa que andou pela 3ª Divisão nacional, sabias?), no Campo dos Fiéis, desculpava-se-lhes tal como aos nossos, os chutos no cauchu que passavam ao lado, ou batiam com estrondo nas balizas de traves quadradas.
Sabias?
António Luis Caramona
paudegiz@gmail.com
CONTRABAIXO
Escudo protector

Já está avariado há uns 5 ou 6 dias! É uma vergonha, ninguém vem arranjar isto… Pode ser uma lâmpada num qualquer candeeiro público, um buraco na estrada, no meio da rua ou um automóvel com aparência de estar por ali, abandonado. São raros os que tomam a iniciativa, embora possam conversar largos minutos, à mesa do café, sobre a falta de civilização dos indígenas. Iniciativa é, muitas vezes, pegar no telefone e avisar a entidade competente. Acontece que nem sempre funciona à primeira, mas quando é necessário, alguma insistência resulta na solução do problema. É nesta fronteira que se promove uma cultura de exigência e de responsabilidade. No dia-a-dia, nas pequenas coisas do nosso quotidiano.
Acontece que é sempre mais fácil pensar que alguém já o fez ou vai fazer por nós. E é esta lassidão exasperante que nos adormece, como se vivêssemos com uma áurea protectora, uma espécie de escudo retardador da realidade.
Na minha vida profissional, em diversos contextos, tenho lidado com este escudo protector, nem sempre com sucesso. Desenhar e construir uma proposta cultural, prepará-la ao mais ínfimo pormenor e, depois, não conseguir tocar as pessoas tem, de uma certa maneira, o seu quê de trágico. Não são só os investimentos financeiros que estão em causa. É todo um potencial de mudança, se quiserem de revolução/evolução permanente, que é desaproveitado. Parece fácil. Aparentemente é só trabalhar o orçamento de uma tal forma que a comunicação ocupe uma parte importante. Parece fácil. Mas não o é. O escudo protector também já está adaptado à quantidade brutal de estímulos visuais e outros a que estamos sujeitos e mesmo grandes investimentos podem passar totalmente ao lado das pessoas.
Uma das delícias de um programador é conseguir comunicar com um determinado grupo de tal forma que são elas que procuram a informação através de um canal que já conhecem e com o qual se relacionam de uma forma confortável. Quando isso acontece e o grupo vai aumentando, estamos perante um processo no qual são as próprias pessoas que promovem a nossa programação, que passou a ser, também, delas. Esta identificação torna-as parte activa e é geradora de crescimento e enriquecimento.
“Deixe-se tocar…” dizia a promoção da Orquestra Metropolitana de Lisboa, há uns anos atrás. É este primeiro toque que se torna fundamental e não tenhamos ilusões: a disponibilidade para as pessoas se deixarem tocar não abunda. Mas, ao mesmo tempo, há uma enorme necessidade de contacto, de comunicação e de abandono da protecção inibidora. O facto de irmos assistir a um espectáculo, passarmos numa galeria, museu ou de olharmos um edifício que nos chamou à atenção, pressupõe desejo, disponibilidade e uma postura activa e reflexiva. E é nesse diálogo complexo entre aquilo que é íntimo e pessoal e o desejo de universalidade, que o nosso próprio conceito de ser social pode ganhar novos horizontes.
Ao deixarmo-nos tocar, ganhamos um espaço de aprendizagem, de fruição e de comunicação. Talvez assim o escudo protector abra uma brecha. Definitivamente, não podemos é pensar que é coisa de e para os
outros.
Carlos Semedo
carlossemedo@gmail.com
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