BAGÃO FÉLIX,
EX-MINISTRO DAS FINANÇAS E DA SEGURANÇA SOCIAL
Superior precisa
gestores profissionais
Bagão Félix critica a política educativa da ministra da Educação por retirar aos professores a pouca autoridade que ainda têm. Em entrevista ao Ensino Magazine, o ex-ministro defende uma gestão profissionalizada para os estabelecimentos de ensino e entende que Bolonha faz o «downgrading» das licenciaturas e incentiva uma formação «à la minute». Hoje de regresso à docência após anos de afastamento por afazeres políticos, Bagão Félix diz ainda que as reformas da geração que tem agora 20 anos estão seriamente ameaçadas, rejeita que o referendo ao aborto seja o problema mais importante do país e sobre o seu clube do coração, o Benfica, não põe de parte o «sonho» de ser presidente.
É, pública e notória, a defesa que tem feito dos valores cristãos. Pensa que a voragem consumista, que tem o seu expoente máximo no Natal, acaba por enfraquecer o alcance da mensagem subjacente a esta quadra?
Vivemos num mundo muito utilitarista e orientado para o consumo. Isso faz com que o que é fundamental passe para um plano secundário, pelo menos para aqueles que acreditam (os cristãos), no Natal, como data do nascimento de Jesus Cristo. Não sou daqueles que nega a importância dos presentes, sempre e quando, estes sejam uma forma de saber dar e receber e que se tenha em mente a ideia da família, dos amigos e das pessoas mais próximas e queridas.
Mas nem sempre é assim...
O problema é que a questão das prendas transformou-se num negócio e numa contabilidade, um deve e haver, onde contam mais os cargos do que os seres humanos, onde contam mais as mordomias do que as intenções e onde, verdadeiramente, as pessoas consomem e se consomem. As listas de prendas são por vezes de tal modo sobrecarregadas que, o que devia ser uma festa e um prazer, acaba por se tornar uma grande maçada. Isto não é Natal, é o anti-Natal. O Natal significa, numa perspectiva cristã e civilista, a ideia da proximidade, afecto e da esperança. No fundo, é a celebração da vida e não propriamente o tempo para encontrar problemas e tormentos perfeitamente dispensáveis.
A família e a Igreja são duas instituições associadas ao Natal. Partilha da opinião generalizada que estão ambas em crise?
Um factor comum às sociedades ocidentais assenta na perda de referências estabilizadoras, seja a família, a escola, a Igreja, as instituições militares, etc. Eu defendo que nenhuma sociedade pode construir o seu futuro renunciando a valores superiores. Nesses valores superiores, incluem-se, obviamente, os valores da vida e da família.
Os agregados familiares estão também eles a adaptar-se aos tempos modernos e a tornarem-se menos perenes?
Eu não acho que a família esteja em crise, o que há é famílias em crise, mas isso sempre houve ao longo da História. A família é a única instituição natural, ou seja, não foi criada pelo Direito positivo. Existe pelas pessoas e para as pessoas. Não há família de esquerda ou direita, laica ou confessional, tradicional e não tradicional.
É um dos rostos que tem lutado contra o processo do aborto. O Presidente da República marcou o referendo para o próximo dia 11 de Fevereiro. Como reage?
O aborto não é, certamente, o problema mais importante que o país tem para resolver. Toda a gente sabe que transformar o problema na solução, ou seja a liberalização do aborto, também não resolve o problema dos abortos clandestinos. A clandestinidade do aborto não é tanto uma questão legal, mas sim moral, social e comportamental.
Como defensor das posições anti-aborto pensa que esta consulta popular não vai resolver um problema que se arrasta há décadas?
Para começar, este referendo encerra um aspecto bastante criticável: a pergunta não tem a ver com o que está em causa, porque fala em despenalização, mas do que estamos a tratar, efectivamente, é de uma liberalização. Quando se diz que o aborto pode ser feito por opção da mulher com a condição de ser realizado num estabelecimento de saúde devidamente autorizado, não se está a despenalizar, está a dizer-se que é completamente livre até às dez semanas. É um autêntico referendo do dia seguinte.
Porquê?
Imagine o cenário se o «sim» tivesse ganho em 1998, certamente tinham acabado os referendos sobre a questão do aborto. O objectivo é fazer referendos até que o «sim» ganhe. Se não ganhar desta vez, tentar-se-á uma terceira ou quarta vez.
Se o referendo não for, uma vez mais, vinculativo, será a sentença de morte dos referendos em Portugal?
A Assembleia da República é politicamente soberana para, bem ou mal, legislar sobre esta matéria. Ou seja, o referendo não é uma obrigação para alterar a legislação sobre o aborto. Sou da opinião que a elevada dose de abstenção registada em 1998, e que agora se poderá repetir, é uma abstenção activa, passe o paradoxo. Há quem se abtenha porque, pura e simplesmente, tem dúvidas sobre um problema tão melindroso e complexo para as pessoas simples deste nosso país.
Partilha da opinião da direita que esta insistência em referendar o aborto é uma forma do Governo socialista contentar a esquerda mais radical do espectro político?
O referendo sobre o aborto é uma obsessão de toda a esquerda. Funciona como uma bandeira da esquerda mais radical e também de alguns sectores do Partido Socialista. Todos eles transformaram esta questão num assunto essencial do ponto de vista político-partidário e até parece que é o problema mais grave que se depara a Portugal na actualidade. Na minha opinião, quem deveria estar a ser referendado e escrutinado era o Estado, por não ter posto em prática nas últimas décadas políticas verdadeiras de apoio e promoção à natalidade, assistindo as pessoas em condições sócio-económicas mais vulneráveis.
No início da década de 80 foi secretário de Estado da Segurança Social de Sá Carneiro e mais recentemente ministro da Segurança Social, no Governo de Durão Barroso. Como profundo conhecedor desta pasta, pensa que a situação de pré-colapso é tão grave como os piores diagnósticos apontam?
A Segurança Social passa pelas dificuldades que conhecemos por razões de natureza demográfica - por terem diminuído os nascimentos - e económica, na medida em que o produto interno tem crescido muito menos. Penso que têm sido tomadas algumas medidas políticas para minorar o problema, mas creio que deveria ter-se insistido na questão de ter um sistema complementar que permita às pessoas partilhar o risco futuro das suas vidas. Ou seja, acautelar a «não pôr os ovos no mesmo cesto». Nesse sentido, penso que as medidas tomadas pelo actual executivo pecam por defeito, já que se limitam apenas a adiar o problema e não a resolvê-lo.
As reformas da actual geração dos 20 e dos 30 anos encontram-se seriamente ameaçadas?
Estão em risco, seguramente. É preciso dizer a verdade. O próprio Governo estima que em 2036 haverá ruptura no sistema de Segurança Social. Eu sou mais pessimista e creio que será antes dessa data. Senão veja: o problema demográfico vai agravar-se mais do que é expectável.
Este devia ser um desígnio nacional prioritário?
Voltando a trazer à colação a questão do aborto, e considerando a tendência demográfica das nossas sociedades, é quase criminoso projectá-la como a grande prioridade nacional, quando o que necessitamos mesmo é de mais nascimentos, justamente para equilibrar os sistemas sociais.
A contestação ao Governo tem subido de tom, mas o Primeiro-Ministro continua a afirmar que «o país não pode ser governado por quem grita na rua». Este é um executivo insensível ao que diz o povo?
Os governos devem ponderar a insatisfação e o protesto legítimo das pessoas, mas não se devem deixar abater por essa contestação. O que eu acho é que o Governo adoptou uma frente de ataque chamando «privilegiados» a um conjunto de pessoas que na sociedade portuguesa não o são.
Está a referir-se a que sectores?
Os reformados, os professores são assalariados e a maioria dos funcionários públicos, são tudo, menos privilegiados.
Sócrates está tirar aos pobres para dar aos ricos?
Não diria tanto. O que acontece é que o Governo está a concentrar os seus esforços de consolidação das finanças públicas em grupos mais vulneráveis da sociedade portuguesa. O caso dos reformados e dos deficientes é paradigmático. Especialmente os primeiros, que viram o IRS e a tributação fiscal dos PPR’s agravada,à saída, retiraram-lhes a comparticipação em medicamentos, a fórmula de cálculo das pensões vai sofrer alterações, o que significará a redução das mesmas. Não se percebe, quando ao mesmo tempo há dinheiro para a Ota, que não pára de derrapar, e para o TGV, já para não falar em outros investimentos faraónicos.
Continua a defender que a abolição das «scuts» daria para cobrir dezenas de benefícios que o executivo está a suprimir?
Reafirmo o que disse. É escandaloso manter algo que é custeado pela maioria dos contribuintes que nem utilizam essas vias. A abolição das «scuts» (o que totalizaria 12 mil milhões de euros) daria, nomeadamente, para reequilibrar os sistemas sociais.
Este é um Governo socialista, mas pouco?
É difícil hoje em dia definir o que é socialista. Actualmente, existem políticas de três naturezas: as que não mandamos nada (monetária, cambial e parcialmente a política orçamental), as que ainda mandamos alguma coisa, mas que os caminhos alternativos escasseiam e, finalmente, existem políticas dos valores (aborto, droga, igualdade de género, casamento de homossexuais,
etc.) onde se consegue distinguir a esquerda da direita. Com isto pretendo dizer que a divisão ideológica passa particularmente pela questão dos valores e dos comportamentos.
Lidou de perto com o problema do défice quando foi ministro das Finanças. Como se controla o «monstro» da despesa pública?
É muito difícil enunciar panaceias para o actual estado de coisas. Repare que cerca de 95 por cento dos impostos vão para salários, pensões e juros – ou seja, uma parte da despesa, por ser tão rígida, é muito difícil de mudar no curto prazo. É um autêntico rolo compressor. Por isso é que os governos, especialmente este, quando pretende reduzir as despesas, socorre-se das despesas não rígidas, as de investimento. O que, a meu ver, é um erro. A despesa tem de ser reduzida em termos reais, mas é preciso perceber que isso não se pode fazer de um dia para o outro.
Este Governo entrou em funções com muita arrogância e uma perspectiva excessivamente voluntarista, avançado com soluções sem resultados a curto prazo. O PRACE para reformar a administração pública e outros programas semelhantes, tardam em implantar-se ou estão ainda longe de gerarem frutos.
Reduzir uma parte substancial dos 700 mil funcionários públicos seria uma solução acertada?
O Governo nunca disse que ia tomar essa medida. O que anunciou, e mal, foi uma fórmula falaciosa que se traduz em que cada dois funcionários que saem, entra um, mas esqueceu-se que os dois que se retiram vão directamente para a aposentação e como tal continuam a absorver prestações sociais do Estado. Fazendo as contas, o Estado, em vez de aliviar o peso de funcionários, acaba por ficar com três a seu encargo.
Não concorda que é preciso emagrecer e dotar a função pública de maior flexibilidade?
Considero que é necessário diminuir, rejuvenescer e melhorar a qualidade dos serviços prestados pelo funcionalismo público nacional. Neste campo, o Governo tem procurado desenvolver algum esforço, mas é preciso associar os programas estratégicos com uma perspectiva contratual de longo prazo e isso não tem sido feito. O Governo tem menosprezado os principais agentes da reforma. Não se pode fazer uma reforma da Educação contra os professores, nem uma reforma da administração pública contra os funcionários. Tem que haver o mínimo de cooperação e colaboração, sob pena de as mudanças não darem resultados.
A primeira medida do Governo foi aumentar os impostos. A carga fiscal que os portugueses suportam é demasiado elevada para as contrapartidas do Estado?
Tendo em conta o nosso nível de desenvolvimento sócio-económico, a pressão fiscal é muito elevada. E é preciso ter cuidado para não aumentar ainda mais os impostos, sob pena de uma economia aberta como a nossa, perder ainda mais competitividade. Não precisamos de mais impostos para financiar mais despesas, precisamos é de menos despesas para ter necessidade de menos impostos. Em suma, consolidar do lado da despesa para com isso termos margem para reduzir impostos. E este Governo está a socorrer-se das receitas fiscais para tapar o défice, o que a meu ver é um caminho a evitar. Os socialistas criticaram muito o recurso às receitas extraordinárias quando a direita esteve no poder, mas o aumento do IVA de 19 para 21 por cento é uma autêntica receita extraordinária, e pior, de forma continuada.
O que é que falha para sermos comparativamente com os nossos parceiros da União Europeia os que piores resultados práticos apresentamos no sistema de ensino?
Isso explica-se por um conjunto vasto de circunstâncias. Tenho um grande cepticismo em relação ao actual sistema educativo porque este não gera responsabilização, nem responsabilidade, por parte de alunos, docentes e famílias. É tudo ao molho e fé em Deus. Não há sistema de ensino que consiga ser sustentado se não for baseado numa avaliação adequada dos alunos. E pior é que estes não são avaliados de forma adequada e assistimos a situações extraordinárias de haver alunos que entram para um curso com notas negativas em determinadas cadeiras nucleares. A política de manuais também me parece equivocada, não existindo uma lógica de estabilização. O conteúdo de alguns manuais assemelha-se a compêndios esotéricos em que ninguém sabe o que é que está a aprender ou a ensinar. Finalmente, creio que as escolas de uma forma geral, incluindo as próprias universidades, carecem de uma gestão profissionalizada.
Os gestores profissionais devem ser colocados à frente das instituições de ensino?
Acho estranhíssimo que em Portugal se entregue, na maior parte dos sectores, a gestão aos profissionais do sector, em detrimento dos gestores profissionais. É errado hospitais geridos por médicos, da mesma forma que não faz sentido escolas geridas por professores, universidades geridas por reitores ou administrações judiciais geridas por juízes. Em nome da eficácia, creio que seria tempo de chamar os gestores para supervisionar os estabelecimentos de ensino ou grupos de escolas.
Defende o afastamento dos professores da gestão das escolas?
Sim, até porque muitos docentes não têm vocação para gerir escolas e outros não têm tempo.
Esse é o problema de fundo na Educação?
É um de entre vários e muito complexos. Outro obstáculo de monta, prende-se com o facto de muitos docentes, sobretudo no ensino secundário, o serem porque ainda não tiveram oportunidade de ser outra coisa, ou seja, estão lá como último recurso de emprego. São os chamados professores acidentais. Lamentavelmente, o sistema não distingue os professores que o são por vocação e missão,
daqueles que simplesmente por lá passam. Perante este cenário, os alunos é que saem prejudicados. Não têm referências, porque todos os anos vêem caras novas à sua frente a ministrarem aulas. Os próprios encarregados de Educação estão desligados do dia a dia escolar dos seus filhos. A soberania da Educação reside na família, que, por seu turno, deve delegar parte na Escola, ou seja no Estado, mas o que é certo é que delegou tudo. A ideia de Educação foi usurpada pelas escolas.
Que balanço faz deste ano e meio de Maria de Lurdes Rodrigues como ministra da Educação?
Penso que comete um erro fatal quando vê o problema da Educação apenas do lado dos professores, ao mesmo tempo que procura incutir na opinião pública a ideia que os professores são todos maus profissionais, quando, como em todas as profissões, há bons e menos bons. Com as medidas que tem adoptado, a ministra retirou aos professores a já pouca autoridade que lhes restava nas escolas. Os professores não são respeitados, quer pelos alunos, quer pelos encarregados de Educação, muito por culpa da política educativa em curso. Uma escola sem autoridade e sem professores que se dêem ao respeito, não tem futuro.
A violência nas escolas tem sido um tema na ordem do dia. Como se recupera a autoridade nas salas de aula?
Em primeiro lugar, com equipas de gestão. Depois, é preciso voltar a prestigiar os professores que têm de deixar de ser rotulados com a etiqueta de «maus profissionais». Por outro lado, é necessário estabilizar os quadros de professores nas aulas, com o reforço dos vínculos plurianuais.
Segundo estudos recentes, Portugal tem um milhar de cursos de licenciatura e mais de 14 mil diplomados desempregados. Estes dados estatísticos demonstram o desfazamento entre a vida real e académica?
É o corolário de um conjunto acumulado de erros ao longo das décadas. Existe uma proliferação excessiva de cursos por parte da oferta, uma autêntica macedónia, sem sentido e eficiência. E há outro aspecto: o estudante é universitário porque está no ensino superior, mas a maior parte denota carências gritantes na área da formação básica. Sem risco de exagerar, posso garantir que muitos dos actuais estudantes universitários estão ao mesmo nível que eu estava no meu 5.º ano de liceu, em termos de vocabulário, capacidade de redigir e pensar aritmeticamente. Logo, o mercado de emprego reflecte a tremenda impreparação técnica e cultural dos recém-licenciados.
Marçal Grilo disse num seminário que procurou fazer pactos de regime quando foi ministro da Educação, mas que não o deixaram, argumentando que os interesses partidários se sobrepõem, quase sempre, aos interesses nacionais. Faria sentido um consenso alargado para o sector?
O consenso quando é total e generalizado peca por ineficaz. Geralmente, todos estão de acordo sobre nada. O que eu defendo é que as reformas levadas a cabo sejam inteligentes no sentido de agregar o mais possível as vontades comuns dos vários agentes em jogo e essa é uma questão cívica, geracional e civilizacional, que transcende os interesses partidários. Infelizmente, vezes de mais, os interesses partidários inquinam as soluções, porque estão orientados para uma lógica de poder, sublinhe-se, perfeitamente normal em democracia.
Pelo que diz, depreendo que é céptico em relação à boa vontade dos maiores partidos políticos?
As reformas na Educação, Segurança Social e Saúde, são de âmbito geracional: como têm custos imediatos e proveitos a longo prazo não são benquistas pelos partidos, porque contribuem para estes perderem parte da «clientela» eleitoral. Nessa perspectiva, alguns consensos que possam ser idealizados pelas grandes forças e instâncias, parecem condenados ao insucesso.
Como se resolvem os problemas financeiros das universidades públicas?
As universidades têm que encontrar mais receitas próprias.
Está então de acordo com o ministro Mariano Gago...
Com certeza. É preciso angariar novas receitas, de forma imaginativa, não só apenas através do aumento das propinas, mas diversificando a oferta de cursos, mestrados, seminários, organizações, eventos, produção científica/literária, etc..
Quanto ao já chamado «euro do ensino», o processo de Bolonha, pensa tratar-se de uma oportunidade ou julga que vai expor ainda mais as nossas debilidades estruturais?
Tenho algumas dúvidas sobre o processo. Em nome do uniformismo europeu, Bolonha acaba por fazer um «downgrading» das licenciaturas. Na prática, o mercado vai passar a aceitar licenciados e a admitir um número crescente de mestres. Creio que as escolas de pós-graduação é que serão as grandes beneficiadas com Bolonha, permitindo-lhes angariar alunos que depois se vão distinguir no mercado.
Pensa que Bolonha levanta mais receios do que certezas?
Bolonha tem virtualidades, nomeadamente ao colocar a centralidade no aluno e não no professor, preparando-o melhor para a realidade com que vai viver, mas é demasiado redutor e simplificado e tem o que eu chamaria uma formação liofilizada, à pressa, ou «à la minute», como se dizia no meu tempo. E há coisas que exigem o seu tempo: de curso, de estudo e de maturidade. E ainda há mais: temo que a mobilidade, característica principal deste processo, tenha como consequência para nós, portugueses, que os bons cérebros nacionais saiam e que aqui fiquem os piores. O chamado «hímen» funciona nos sítios mais poderosos, no centro da Europa, e prejudica os países mais periféricos.
É conhecida a sua paixão pelo Benfica. O que é que fez de mais arrojado pelo clube do seu coração?
Destaco algumas assembleias gerais mais tumultuosas em que participei no tempo de Vale e Azevedo e onde se discutiram matérias estatutárias. Houve lutas sérias, fisicamente acaloradas e psicologicamente desgastantes.
Consegue dizer qual foi o momento mais feliz que o Benfica lhe proporcionou?
Há dois momentos: quando o Benfica foi bi-campeão europeu, tinha eu somente 12 anos e mais recentemente, na época 2004/2005, quando fomos campeões nacionais, após 10 anos de jejum. Já não se dava valor à vitória, tal era a ausência de triunfos, e creio que esse título, conquistado «in-extremis», foi um acontecimento inesquecível.
Sonha ser um dia presidente do emblema da águia?
É engraçado porque pensei nisso na altura em que a minha vida profissional e política não me permitia, e agora, que já tenho algumas condições, não me apetece especialmente. Contudo, apesar de ser uma hipótese reduzida, não afasto liminarmente esse cenário.
O Benfica está bem entregue?
Luís Filipe Vieira foi eleito de forma esmagadora pelos sócios. Tem feito coisas muito boas e outras com as quais eu não concordo, mas globalmente o saldo é positivo, nomeadamentre no equilíbrio das contas, a serenidade que devolveu ao clube, o prestígio e a qualidade da equipa de
futebol.
Nuno Dias da Silva
A CARA DA NOTÍCIA
Político, gestor e
benfiquista
António José de Castro Bagão Félix, nasceu em Ílhavo, distrito de Aveiro, a 11 de Abril de 1948. É casado e tem duas filhas. Licenciou-se em Finanças, em 1970, no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras (actual ISEG). Desempenhou inúmeros cargos de relevo em termos profissionais, nomeadamente em matéria de gestão: administrador do BCI, administrador e vice-governador do Banco de Portugal, administrador da companhia de seguros ocidental, vice-presidente da companhia de seguros bonança e da «Médis», administrador da «seguros e pensões gere» e director-geral do BCP. Em termos académicos foi assistente no ISCEF, em 72/73, no ISCTE, 75/76, professor auxiliar na Universidade Internacional, no final da década de 80 e início da de 90. Foi ainda membro do conselho de Universidade de Aveiro. Actualmente lecciona na Universidade Lusíada, em Lisboa.
Mas foi enquanto político que Bagão Félix ganhou mais notoriedade pública. Entre 1980 e 1983, desempenhou as funções de secretário de Estado da Segurança Social nos governos de Sá Carneiro e Pinto Balsemão; entre 1987 e 1991, foi secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional do Governo de Cavaco Silva; exerceu o cargo de deputado, eleito pelo círculo de Aveiro, entre 1983 e 1985. No primeiro Governo PSD/CDS, com Durão Barroso, chegou a ministro do Trabalho e Segurança Social, entre 2001 e 2004, para já com Santana Lopes ser chamado para a delicada pasta das Finanças, cargo que desempenhou apenas por escassos meses. No seu clube de sempre, o Benfica, teve, particularmente durante a década de 90, uma intensa participação na agitada vida interna do clube, tendo chegado a vice-presidente da assembleia geral do emblema da Luz, entre 1992 e 1993.
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