EDUCAÇÃO EM PORTUGAL
Sistema é confuso
Já ouvimos dizer que a educação é o grande fracasso do regime democrático. O que é que falta para que colhamos frutos do dinheiro que investimos no sector?
É preciso mudar da óptica dos professores para a óptica dos alunos. Nos últimos tempos tivemos poucas greves e manifestações de alunos e muitas greves de professores. O foco do sistema educativo deslocou-se ao nível da opinião pública para os professores. É uma inversão completa.
Que outros pecados aponta ao sistema educativo?
Desenvolveu-se em Portugal nos últimos 20 anos um certo tipo de pedagogismo que é inconveniente para o funcionamento global do sistema.
Quer esclarecer o que é que quer dizer com pedagogismo?
O culto da inovação e da experimentação pedagógica e da introdução de novidades, levou a uma desagregação do sistema de ensino. Uma das características que marca os sistemas de ensino nos países mais desenvolvidos nesta campo é a continuidade. Os programas não mudam todos os anos.
Está a criticar a alteração sucessiva dos programas?
O que é que se ministra nas escolas? Uma espécie de mediana do conhecimento que existe disponível. A mediana não se altera em cinco ou dez anos de prática. É incompreensível alterar os programas de História. A nossa visão da História não se altera numa década. Assistimos nas últimas duas décadas a uma espécie de hegemonia do técnico e da transformação o que criou rupturas sucessivas no nosso sistema educativo. Tem existido demasiada experimentação pedagógica.
De que modo é que o sistema de ensino sai beliscado com essa experimentação?
Tanta experimentação, tanta inovação, tanta alteração de currícula, de sistemas, de horários e de colocação de professores, necessariamente criou um ensino marcado pela descontinuidade. É impensável para mim que um aluno ou uma pessoa aprenda uma língua durante cinco anos, com cinco professores diferentes. O sistema educativo em Portugal é extremamente confuso. Uma tarefa importante seria nomear uma comissão que se encarregasse de simplificar o sistema.
Que simplificações prioritárias defende?
É urgente reduzir nomes, variantes, alíneas, sub-alíneas, categorias, designações etc. O sistema educativo tem que funcionar com um corpo de regras relativamente estável e beneficiaria muito se fosse drasticamente simplificado. Devia seguir aquela fórmula que se utiliza nas empresas norte-americanas: «keep it simple, stupid». O número de vezes em que se alteraram as terminologias ou as designações dos estabelecimentos de ensino, é inacreditável. Alguém sabe o que quer dizer Escola Secundária C+S 123? É um factor de complicação dispensável para os cerca de 70 por cento dos portugueses que não estão familiarizados com o sistema.
Está de acordo com os que dizem que
se formam pessoas para o desemprego?
Em parte, isso é verdade. Estamos a formar licenciados gerando um certo desemprego. Portugal ainda vive de uma concepção relativamente arcaica que é a cultura do «canudo». Aqui, ainda se acha, e até em meios urbanos isso acontece, que ter um «canudo» devia dar acesso a um estatuto de privilégio social.
Mas o fenómeno dos licenciados sem perspectivas de emprego já acontece há muito tempo noutros países mais desenvolvidos...
Isso acontece há décadas em Inglaterra e na Alemanha. Nestes países há muitos licenciados a exercerem funções, nomeadamente em repartições, que não estariam destinadas a uma pessoa formada universitariamente.
Os portugueses terão de se conformar com essa realidade?
Nós haveremos de tender para uma situação, que seria a ideal, que todas as pessoas devem ser obrigadas a ter uma licenciatura. A educação básica em Portugal devia ser a licenciatura, mas enquanto isso, todas as funções sociais terão de continuar a ser cumpridas. A educação em
Portugal democratizou-se extraordinariamente o que gerou alguma desadequação: haver licenciados em excesso não é negativo, preocupante é que haja um excesso de licenciados em certos ramos de estudo e um défice
noutros.
NDS
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