Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano VIII    Nº90    Agosto 2005

Opinião

CRÓNICA

A palavra do mestre

1. No princípio, disse o Mestre:

- Passastes a provação do oásis autista, anunciado por aquele que cuspia pela boca quando falava; também a do que nada via e por isso acreditava que o homem haveria de morder o cão e ser notícia. Depois mergulhastes na miséria da tanga e na noite das concubinas. Estás aptos para tudo. - Concluiu.

Não mais a mentira e a trafulhice, precipitaram os de maior fé.

Volvidos anos e lustres, ei-los como vistosas libelinhas, de nenúfar, espalhando o amor e a semente, para que os vindouros se sintam como verdadeiros eleitos, excepto os fariseus.

Assim, o Mestre entregou um cantil de lama a cada um e disse:

- Levai, que nesse cantil, mais do que a água vai a esperança da terra prometida, cujas sedes sacia de toda a qualidade.

Parou, por instantes, para olhar a cara dos discípulos, não fosse neles encontrar incompreensões ou quebres de disciplinas, logo no início da caminhada, e prosseguiu:

- Caminhai sobre as pedras aguçadas e dizei a todos que esse é o caminho por vós escolhido. Esse é o sacrifício que vos exijo e por isso sereis recompensados com a minha benção. 

Ficou a escutar o murmúrio dos discípulos, inconclusivos, o que foi tido por aprovação unânime.

O Mestre preparou então os itinerários de cada um e concluiu:

- Caminhareis sobre as águas sem vos afundares, trespassareis o fogo sem queimardes sequer uma pestana, e as vossas palavras serão o oiro do povo, mesmo para aqueles que contra vós vociferarem, pois esses são com certeza fariseus.

2. - Não sou santo - disse o Mestre - Santo é o meu pai, que foi, que é e que será.

O caminho é comprido e cumpridos serão os desígnios do Mestre. Haverá imposto sobre o salário porque essa é a sua vontade. Virão depois os que hão-de negar, e tais serão expulsos, escorraçados como cães, lá para onde o demónio quiser a sua companhia. Hão-de vir cépticos, os cegos e, pior, os que não querem ver, mas desses não será este reino. São naturalmente os fariseus.

E mais disse o Mestre, que haveria de criara um novo céu e uma nova terra e que por que por sua graça não haveria recordação das penas já passadas.

Não era ainda a Revelação. Os sinais da Revelação teriam lugar cento e trinta dias e cento e trinta noites depois com a queda do discípulo que mais se expusera. Era o primeiro mártir deste caminho feito em círculo. Caíra de exaustão, quando muito tinha ainda para dar, segundo os companheiros, quando o mestre o abandonou, segundo os fariseus.

Do mestre nunca se ouvirá que este será o princípio do fim dos tempos, mas há-de ser esse o tema da conversa dos proscritos e de todos nós, os fariseus.

João de Sousa Teixeira

 


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