Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano VII    Nº73    Março 2004

Entrevista

MANUEL FERREIRA PATRÍCIO, REITOR DA UNIVERSIDADE DE ÉVORA

A caminho de Bolonha

A Universidade de Évora já está a seguir as orientações definidas pela Declaração de Bolonha, no que à formação inicial diz respeito. Quem o garante é o reitor da instituição, Manuel Ferreira Patrício, em entrevista ao Ensino Magazine. “Quando em 2002 vi o resultado das colocações, não fiquei satisfeito. Era preciso reagir, mas de uma forma pro-activa e foi o que fizemos, arrancando com um processo de reestruturação da oferta de cursos, de forma a respondermos aos sinais dos jovens estudantes e já com base na Declaração de Bolonha”, começa por explicar.

Manuel Ferreira Patrício recorda que “a opção tomada na altura foi a de avançar para uma reestruturação global, segundo Bolonha e os pareceres do Conselho Nacional de Avaliação. Esta estratégia foi comunicada ao então ministro da Ciência e do Ensino Superior, prof. Pedro Lynce, e esse nosso desafio, que alguns pensavam ser impossível de alcançar, já que a data limite para entregar o processo no ministério era 31 de Janeiro”.

A aposta dos responsáveis da Universidade de Évora acabou por se revelar decisiva em matéria de colocação de alunos já neste ano lectivo. “A resposta dos estudantes candidatos ao ensino superior foi excelente, já que preenchemos 92.5 por cento do total das vagas disponíveis. Ou seja fomos a universidade que melhor resposta teve nessa matéria”, justifica. Para Manuel Ferreira Patrício, a qualidade da oferta formativa é um dos pilares essenciais para que as instituições de ensino superior, do interior do País, possam continuar a cativar jovens para os seus cursos. Mas não só.

No entender daquele responsável a entrada de jovens estudantes no ensino superior existente no interior de Portugal passa também pela “pertinência social da oferta. Nós não devemos andar à trela da economia e da sociedade. A universidade é uma instituição social que não deve estar a desenvolver uma actividade científica e pedagógica que apenas dê satisfação aos seus próprios docentes e aos sectores que a constituem. É necessário encontrar um equilíbrio entre a própria visão daquilo que deve ser a actividade e oferta social da universidade e aquilo que são as necessidades da própria sociedade. E nós tivemos essa preocupação”. Manuel Ferreira Patrício lembra também que, neste quadro, é fundamental “procurar responder à vontade do universo estudantil. A sociedade é feita de pessoas, e ninguém melhor do que eles, sabe aquilo que lhes convém e em que se querem formar. Deste triângulo, instituição-sociedade-estudante, deve resultar um desenho dialéctico e equilibrado que resolva o problema. Nós tivemos essa preocupação e obtivemos uma boa resposta por parte dos estudantes”.

 

 

 

ENTENDIMENTO ENTRE INSTITUIÇÕES

Problema complexo

Em entrevista ao Ensino Magazine, o anterior ministro da Ciência e do Ensino Superior, Pedro Lynce, afirmou que as instituições de ensino superior do interior do país teriam que se entender, no que à oferta formativa diz respeito, para evitarem o risco de algumas encerrarem as suas portas. Uma opinião que o reitor da Universidade de Évora, Manuel Ferreira Patrício, analisa com cuidados redobrados, já que considera a matéria como muito complexa. “Na base desse problema há questões conceptuais muito importantes, como, por exemplo, a relação entre os dois sub-sistemas de ensino superior. Em Portugal temos o ensino politécnico e o universitário, o que está relacionado com a natureza das instituições e da actividade científica e pedagógica que desenvolvem. Por isso, se se achar que o País precisa do ensino politécnico, não poderemos afirmar que ele só é digno se for transformado em ensino universitário. Ele é digno se for o que é e se tiver a qualidade elevada que deve ter qualquer instituição de ensino superior”. 

O reitor da Universidade de Évora lembra mesmo que “nós não podemos encarar o acolhimento e a distribuição dos estudantes pelas instituições, pensando nos estabelecimentos de ensino numa perspectiva económica e comercial. O apelo que deve ser feito às instituições é que elas desenvolvam um trabalho de qualidade académico o mais elevado possível”. Outra questão conceptual está relacionada com a rede de ensino superior existente em Portugal, que envolve o sector público e o privado. “Temos que ver qual é o papel que cada instituição tem, verificando como é que o interesse do país deve ser salvaguardado, respeitando as especificidades de cada uma das instituições, e distinguindo-as entre instituições públicas e de função pública a desempenhar. Isto é importante para que haja um ensino superior saudável, de forma a evitar que surjam instituições vistas como uma espécie de vendedoras do saber. As próprias instituições de ensino privado não quererão que isso seja assim”. Além disso, afirma aquele responsável, as “condições de acesso ao ensino superior devem ser idênticas entre todas as instituições. Isso será uma garantia de tratamento justo entre todas as instituições”.

Manuel Ferreira Patrício aborda ainda esta questão numa outra perspectiva. “Será que as instituições só são tratadas com justiça se forem tratadas de uma maneira igual, ou deveremos, nesta abordagem, distinguir entre justiça e equidade (justiça aplicada ao caso particular). Isto é, será que uma instituição de ensino superior no interior do País, inserida numa região economicamente deprimida, com menos população, deve ser tratada da mesma forma, numa lógica quase mecânica, que uma outra que apresenta uma situação mais privilegiada, ou deve atender-se a outros interesses que permitam o desenvolvimento harmonioso do país. Penso que a segunda hipótese deve ser a escolhida. Tem que ser aplicado um princípio de discriminação positiva às instituições que se encontram em regiões deprimidas, pois para essas zonas as instituições são um factor de desenvolvimento insubstituível. Além disso, se nós melhorarmos a qualidade do saber dessas regiões, elas ficarão com um trunfo fundamental para lutarem pelo seu próprio desenvolvimento”. 

O reitor da Universidade justifica aquela sua posição com o facto de hoje “a sociedade do conhecimento vai colocar a preparação da população como um factor decisivo para o futuro. Uma região como o Alentejo, que apresente um problema de escassez de população, não deve ter um problema da escassez da população qualificada. Mas para que isso aconteça é essencial que o ensino superior funcione e que as instituições não estejam dependentes, de uma forma mecanicamente aplicada, para as suportar do ponto de vista financeiro”. Manuel Ferreira Patrício vê também o ensino superior no espaço ibérico e avisa que “Portugal não deve confundir as boas relações que possui com o país vizinho, com uma debilitação da nossa parte que poderá resultar de uma absorção da outra parte. Não há nenhum nacionalismo nas minhas palavras, há um saudável apego à minha própria casa e família nacional. A Europa deve constituir-se com um mosaico de independências nacionais de estados e de culturas e não avançarmos para uma uniformização empobrecedora e, no fundo, destruidora da Europa. Uma política inteligente, sábia e promotora do interesse nacional, não pode deixar de atender às universidades do interior e àquelas que constituem a linha de contacto com o país vizinho”
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PÓS-GRADUAÇÕES

Formar para a vida

A formação ao longo da vida é outra das apostas da Universidade de Évora. Manuel Ferreira Patrício sublinha a importância dos cursos de pós-graduação e explica em que medida eles contribuirão para o desenvolvimento da região. “O nosso projecto é muito abrangente. Temos um plano de formação graduada, que é composto por mais de 40 licenciaturas activas, um plano de formação pós-graduada (pós-graduações, mestrados, doutoramentos e pós doutoramentos) e iremos avançar com uma formação contínua, aberta a graduados e não graduados, que se possa afirmar com uma grande diversidade de oferta, através de cursos curtos que respondam a necessidades da sociedade”, justifica.

O Reitor da U.E. classifica a aposta da Universidade naquela área como fundamental. “Hoje precisamos de ser uma espécie de chave de molas para ir abrindo o cofre dos problemas sociais que se nos apresentam. Temos que ser muito flexíveis”. 

A formação pré-graduada é outro dos caminhos anunciados pelo reitor da Universidade de Évora. “Serão cursos que não vão conferir graus académicos, que terão uma duração inferior aos da formação inicial (entre um a dois anos), e que serão ministrados pelo corpo docente da própria universidade. E este é um dado importante, pois a dignidade dos cursos depende da qualidade com que eles forem feitos, e o corpo docente universitário é uma garantia”. No entender de Manuel Ferreira Patrício este tipo de formação “poderão dar resposta às necessidades de desenvolvimento do país e da Região”. O arranque daquela formação deverá avançar após a aprovação da nova Lei de Bases do ensino superior, e para já há uma grande abertura por parte das autarquias e do sector empresarial do Alentejo.

O plano da Universidade aponta para vários níveis de ensino dentro da própria instituição. “Ficaremos com cursos de formação pré-graduada, com licenciaturas (preparadas com base na Declaração de Bolonha), pós-graduações sem títulos académicos, mestrados, doutoramentos e pós-doutoramentos. E finalmente existirá uma formação contínua muito flexível, ajustada às necessidades, e com tudo isto a Universidade ficará com um grande instrumento de formação ao serviço de toda a comunidade”.

 


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