
Histórias de sucesso
Com meia dúzia de anos permanentemente a “rasgar”, o Ensino Magazine constitui já um indicador de referência na pequena história editorial deste país banhado pela iliteracia das conveniências.
É assim mesmo, e por isso repisamos: raras são hoje as publicações, destinadas a grandes públicos, que se dedicam a temas de educação, cultura e investigação científica. Poucas as que sobreviveram, à nacional indiferença por tudo o que não seja novela ou escândalo político-sexual. E, estamos em crer, nenhuma terá alcançado o mérito de, partindo de uma região do interior profundo, progressivamente acolher o reconhecimento e a aceitação numa parte significativamente interessante do território nacional.
Como temos vindo a divulgar, o jornal atingiu a confortável tiragem de cerca de dezasseis mil exemplares. Alargou, no presente ano, a sua cobertura ao distrito de Leiria, que assim se veio juntar à rede de distribuição dos distritos de Castelo Branco, Portalegre, Guarda, Viseu, Évora e Beja. Melhorou a qualidade e diversidade dos seus colaboradores, ganhou audiência nos meios académicos de Espanha, popularizou a publicação online das suas edições, patrocina, divulga e apoia, anualmente, dezenas de eventos culturais.
Nunca esta voz se cansará de o dizer: tal só foi possível devido ao inesgotável profissionalismo, criatividade e dedicação da dinâmica equipa da RVJ, a que se juntou, em boa hora, a experiência do saber e do fazer do semanário Reconquista.
Este empreendimento editorial é ainda mais relevante porque tem merecido acolhimento e simpatia dos leitores em momentos de desânimo, indefinição e crise do sistema de ensino, mesmo quando o filme educativo balançava entre a comédia familiar e o mais burguês dos melodramas.
E, filme por filme, permitam-nos que desviemos por um instante a vossa atenção do quadro do desencanto para uma cenografia mais reconfortante, como a que nos é proposta por Cristina Barroco, na obra “O Zé Analfabeto no Cinema”, numa oportuna edição da Educa.
Pese embora o pendor científico desta publicação, a escrita é cativante e o tema não deixará de suscitar a curiosidade dos leitores, mesmo que supostamente leigos nestas coisas da investigação e da produção do conhecimento.
O propósito da autora foi o de desvendar dois mundos que se cruzaram nos idos anos cinquenta do século passado em Portugal: o analfabetismo e o cinema educativo. Em 1952, por decreto-lei, nascia o Plano de Educação Popular que englobava a Campanha Nacional de Educação de Adultos. Esta seria encarada como um projecto de combate a uma das mais altas taxas de analfabetismo da Europa, e o cinema emergia como um dos seus instrumentos de propaganda e, simultaneamente, como um recurso para a educação popular.
A sétima arte ao serviço da educação, e mais concretamente de um programa de alfabetização de adultos, foi um acontecimento inédito em Portugal, assim como original e inovadora foi a Campanha, de iniciativa e controle estatais, marcada pelo voluntarismo público, que procurou romper com um certo corpus mental construído à volta do analfabeto.
O limite temporal desta investigação é o da duração da própria campanha: 1952-1956. Nesse período, as principais ditaduras europeias já haviam caído. As primeiras vagas de descolonização já tinham sido iniciadas. Porém, Portugal insistia em manter-se “orgulhosamente só”.
O mal é que “orgulhosamente só” ainda se vai mantendo hoje este país. Assim, quase como condenação ou fado com que se esbarra em cada encruzilhada da vida.
Valham-nos, pois, os intervalos em que comemoramos algumas histórias de sucesso...

João Ruivo
ruivo@rvj.pt
|