GENTE & LIVROS
Anthony Burgess

«Houve então um pouco de govorito e discussão e eu ali de pé, irmãos, completamente ignorado por todos aqueles bratechenos ignorantes. Por isso é que grichei: - E eu, e eu, eu! Então e eu? Qual é o meu papel no meio de tudo isso? Sou algum animal, algum cão?
E isso pô-los a govoritar aos berros e a agredir-me com eslovos. Por isso é que grichei ainda mais alto, continuei aos grichos:
- Serei então uma laranja mecânica?!»
In A Laranja Mecânica
Romancista, ensaísta, tradutor e músico Jonh Anthony Burgess Wilson nasceu em Manchester em 1917 e morreu em Londres em 1993. Proveniente de uma família católica da classe média estudou Literatura e Língua Inglesa na Universidade de Manchester, especializou-se em Joyce e Shakespeare e terminou o curso em 1940. Dois anos depois casava e enquanto dura a II Guerra Mundial presta serviço no Royal Army Medical corps.
Apaixonado pela música, estuda composição e compõe peças musicais antes ainda de escrever o seu primeiro romance, A Vision of Battlement (1949).
Em 1954, ao serviço do Ministério da Educação, parte para a Malásia. Aí escreve a trilogia Time for a Tiger (1956) The Enemy in the Blanket (1958) e Beds in the East (1959).
Já na Inglaterra, o médico diagnostica-lhe em 1959 um tumor cerebral e um 1 ano de vida. Ele preocupa-se sobretudo em não deixar a mulher sem uma forma de sustento, escreve a um ritmo desenfreado seis romances em 12 meses. O diagnóstico estava errado e Anthony Burgess, com uma “nova vida” e sem perder o ritmo, escreve onze novelas de 1960 a 1964, em Malta, Itália, EUA e Mónaco.
Nesse período surge Clockwork Orange (1962) o seu romance mais famoso. A Laranja Mecânica é parcialmente autobiográfico, pois a personagem do escritor que tem a sua máquina de escrever destruída por um bando de malfeitores e que assiste manietado e silenciado à violação da mulher é o próprio Burgess. A esposa do escritor havia sido atacada brutalmente, numa travessa de Londres, por quatro desertores do exército norte-americano, acabando por abortar.
Realizado por Stanley Kubrick, em 1971 estreia o filme A Laranja Mecânica. Classificado como muito violento, o filme é proibido desde logo na Inglaterra, seguindo-se outros países. Mas a censura não impediu o filme de se tornar uma referência cinematográfica.
Católico convicto, Anthony Burgess produziu mais de 30 novelas, obras de não ficção e várias composições musicais, incluindo sinfonias óperas e jazz antes de morrer, quase 34 anos depois de um mau diagnóstico.
A Laranja Mecânica. O narrador e protagonista do livro, conta em linguagem “nadescente” - calão usado pelos adolescentes do futuro- a sua história. Alex vive em Londres, tem quinze anos e uma carreira no crime. Líder de um bando violento é traído pelos amigos, capturado e levado para a prisão onde o Governo desenvolve um programa experimental de combate ao crime. Em troca da liberdade, Alex submete-se a uma “repro-gramação” mental. Mas a violência do Estado é preferível à do cidadão? E o Bem? Pode ser imposto ou é sempre uma opção livre?.
Eugénia Sousa
Florinda Baptista
Livros
EUROPA-AMÉRICA. Na colecção Grandes Biografias, a Europa-América publica Darwin de Michael White e John Gribbin. Autor da teoria da evolução através da selecção natural, Darwin revolucionou o seu tempo e o pensamento da época. A biografia reúne informação preciosa sobre o homem e o cientista. Desde um percurso de estudante pouco motivado, a uma viagem de cinco anos que lhe mudou vida e o conduziu ao estatuto de cientista brilhante. Imprescindível para perceber o contributo científico de Darwin.
GRADIVA. “Nascido para Mandar” de José de Pina com ilustrações de João Fazenda. José de Pina é um dos autores e criadores do Contra Informação e do Herman Enciclopédia e finalmente escreveu o Manual prático que faltava ao país. A pensar em todos os que gostam do poder, querem o poder, tem e não tem poder, querem mas não podem... ”talvez mandar”. Anarquistas e simpatizantes não se abstenham, a leitura do Nascido para Mandar não determina o futuro exercício de qualquer cargo político, nem existe em formato “cunha”.
ASA. “Augusto Cid, O Cavaleiro do Cartoon” . «Habituámo-nos a ver, na imprensa, os seus desenhos humorísticos e satíricos, que põem em causa políticos e os seus actos, deixando-nos, através do seu inconfundível e inteligente traço, comentários certeiros sobre a nossa actualidade. Admirador do seu trabalho, mesmo quando sou visado ou dele discordo, quero testemunhar o meu apreço pela obra de Cid e congratular-me com a realização da exposição antológica Augusto Cid, o cavaleiro do Cartoon» - Jorge Sampaio, Presidente da República.
PIAGET. “A Política e o Ambiente” - A Dimensão do Indivíduo, de João Paulo Tavares de Almeida Fernandes. Um livro que é uma reflexão séria e crítica sobre o ambiente e revela a experiência do autor como técnico de ambiente, professor universitário e antigo consultor para os assuntos ambientais do Presidente da República Jorge Sampaio.
Um livro inovador na medida em que aponta novos caminhos para ultrapassar a crise ambiental, não apoiados exclusivamente na argumentação técnica mas principalmente no factor humano.
BOCAS DO GALINHEIRO
"O Padrinho"
está de volta

A personagem de Vito Corleone, “O Padrinho” da mafia siciliana encarnada por Marlon Brando no filme com o mesmo nome realizado em 1972 por Francis Ford Coppola, o primeiro da célebre trilogia, foi considerada a melhor de sempre do cinema segundo uma votação de críticos norte-americanos que elegeram as 100 melhores personagens vistas nos écrans, casos de Fred Dobbs, o mineiro a que deu vida Humphrey Bogart em “O Tesouro da Sierra Madre”, de John Huston, Scarlett O’Hara, por Vivian Leigh em “E Tudo o Vento Levou”, de Victor Fleming, James Bond, na interpretação de Sean Connery no primeiro 007, “O Agente Secreto”, o canibal Hannibal Lecter, criado por Anthony Hopkins em “O Silêncio dos Inocentes”, de Jonathan Demme ou o não menos famoso Norman Bates vivido por Anthony Perkins no “Psico”, de Alfred Hitchcock. Uma listagem de peso.
“O Padrinho” é um filme de gangsters com uma autenticidade e densidade sem precedentes. Baseado na novela homónima de Mario Puzo, que também colaborou no argumento, suplantou em muito a obra literária e projectou Francis Ford Coppola para uma carreira fulgurante, com muitos altos e baixos, mas sempre com uma matriz muito pessoal, de “Apocalypse Now”, a “One From The Heart”, passando por “Gardens of Stone” ou “Bram Stoker’s Dracula”. Não resistiu a reincidir mais duas vezes com “O Padrinho”. Mas para sempre ficará o Don Vito Corleone de Marlon Brando, que durante o casamento da filha recebe no seu escritório e decide sobre a vida ou a morte dos que o rodeiam, da “família”, ou não estejamos perante a “Cosa-Nostra”, face obscura de um império construído sobre crimes e assassínios. Mas, Don Vito Corleone não foi o primeiro grande papel de Marlon Brando no cinema. Nascido a 3 de Abril de 1924 em Omaha, no Nebraska, estreou-se na Broadway em 1944, depois de estudar teatro com Erwin Piscator e Stella Adler, com a peça “I Remember Mama”. Em 1946 é considerado o mais prometedor actor da Broadway depois de fazer “Truckline Café”. Todavia o seu ponto alto nos palcos acontece em 1948 com o papel de Stanley Kowalski na peça “Um Eléctrico Chamado Desejo”, de Tennessee Williams, com encenação de Elia Kazan. A peça manteve-se em cena dois anos, consagrando Brando como uma das grandes estrelas da Broadway.
A saída para Hollywood foi inevitável. A estreia no cinema dá-se em 1950 com “The Men” (O Desesperado), de Fred Zinneman, onde tem o papel de um ex-soldado paraplégico que com a ajuda da noiva tenta adaptar-se à vida civil. Porém o seu primeiro grande êxito no cinema é justamente a adaptação para o grande écran de “Um Eléctrico Chamado Desejo”, com realização também de Elia Kazan. O seu emigrante polaco, criado na tela, ao lado de Vivian Leigh, com o famoso “método” do Actor’s Studio (estilo de representação baseado nos ensinamentos de Stanislavski, uma autentica revolução nos anos 50, e seguido por nomes como James Dean , Paul Newman e Marylin Monroe ou Al Pacino e Robert De Niro) valeu-lhe o reconhecimento público e a nomeação para o Oscar de melhor actor, vendo Vivian Leigh arrecadar a sua segunda estatueta. Mas o “motard” Johnny de “The Wild One”, de Laszlo Benedek ou o Terry Malloy de “Há Lodo no Cais”, realizado por Elia Kazan em 1954, não lhe ficam atrás e é justamente com esta última interpretação que Hollywood se rende a Brando dando-lhe o Oscar que já lhe fugira por duas vezes, havia sido nomeado com “Viva Zapata!”, também de Elia Kazan, em 1952.
A sua longa filmografia e alguns excessos, fizeram dele um nome incontornável da 7ª Arte. Quer por dar a vida aos tais papéis únicos, a que podemos acrescentar o inesquecível Marco António no “Júlio César”, de Joseph L. Mankiewicz, ou o pistoleiro de “Duelo no Missouri” em que enfrenta esse outro seguidor do “método”, Jack Nicholson, quer pelas tais aparições lendárias de que se tornou especialista nos últimos anos da sua carreira, de que se destaca o coronel Kurtz de “Apocalypse Now”. Chegou a ser o actor mais bem pago. Ainda bem. Não só o mereceu como fez por isso. E, isso, paga-se!
Luís Dinis da Rosa
CONTRABAIXO
Sorriam, por favor!
Nestes tempos conturbados nos quais parece que tudo o que acontece é mau, não há nada melhor do que respirar fundo, sorrir e olhar para o que de bom temos à nossa volta. Porque, acreditem, não é tão pouco assim.
Abril. Memórias de há trinta anos. Os balanços fazem-se em catadupa, relembram-se as canções, as imagens mais marcantes e as personagens que dão corpo às ideias. Vivi o 25 de Abril de 1974 com a serena alegria da inconsciência. Ao chegar à escola, recebi um bilhete de volta e senti que alguma coisa se devia estar a passar de realmente importante. Mas fui brincar durante o resto do dia. Agora, quando olho à minha volta com o tal sorriso, sinto que, embora estejamos completamente dominados pelo primado da economia e da linguagem futebolística, sintoma de uma enorme superficialidade cultural, há muito espaço para a liberdade criativa, para o debate, para a iniciativa individual e colectiva.
Quando vejo surgir um Festival de Jazz em Portalegre com um cartaz extremamente interessante, quando na mesma cidade, o Grupo de Cantares o Semeador lança um novo disco, quando o Instituto Politécnico de Castelo Branco consegue, finalmente, a garantia da construção da Escola Superior de Artes Aplicadas ou quando o Clube de Castelo Branco comemora o seu centenário com uma mão cheia de iniciativas, que sentir? E o que dizer do renascer do grupo de teatro A Carroça e o aniversário do Váatão, grupo que escolheu este tempo de Abril para convidar os mais diversos agentes culturais para ajudar na festa? E o Conservatório Regional de Castelo Branco que teima em continuar o seu papel fundamental na formação de milhares de jovens que por ali passaram ao longo destes quase 30 anos. Quando no Fundão surge uma Academia de Música extremamente dinâmica ou quando na Covilhã, aliando-se ao Conservatório Regional de Música (pelo menos, na fase inicial), surge uma Escola Profissional de Artes que altera completamente o cenário da formação e divulgação musical nessa região, o que dizer?
Quando em Portalegre e Covilhã, grupos profissionais de teatro continuam a trabalhar e lutar após tantos anos, tantos ministros, secretários de estado e autarcas. Quando o Primavera Musical - Festival Internacional de Música de Castelo Branco chega à sua 10ª edição ou o IMAGO – Festival de Cinema se afirma como uma organização de impacto nacional, que pensar?
Quando os órgãos de comunicação social sobrevivem em condições extremamente adversas e a revista Raia sai juntamente com o Expresso, trazendo para a capa o projecto experimental de Belgais e a sua mentora, Maria João Pires, sem esquecer o Ensino Magazine que, paulatinamente, tem vindo a alargar a sua abrangência territorial, de que depressão se fala? Sim, de que depressão se fala quando o Centro Cultural Raiano se afirma como um espaço importante na vida cultural da região e quando surgem dois novos CineClubes, no Fundão e em Castelo Branco?
Muitas colectividades, associações e entidades não foram referenciadas, porque não era minha intenção ser exaustivo, mas esse facto só ajuda a perceber o quanto importantes estes 30 anos foram. Com tanta coisa boa a acontecer, porque andamos cabisbaixos?
Sorriam, por favor!.
Carlos Semedo
EDUCAÇÃO ÁS TIRAS

Desenho: Bruno Janeca
Argumento: Dinis Gardete
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