GENTE & LIVROS
Boris Vian

«Chegámos esta manhã e fomos mal recebidos porque na praia não estava ninguém, só uma porção de tipos mortos ou bocados de tipos mortos ou bocados de tipos, tanques e camiões desfeitos. Um pouco de todo o lado apareciam balas, numa destas confusões que não me agradam muito. Saltámos para a água, mas era mais funda do que parecia e escorreguei numa lata de conservas. Um
balázio que nos mandaram levou três quartos da cara ao tipo que ia mesmo atrás de mim, e guardei a lata de conservas como recordação. Meti os bocados da cara no capacete e ofereci-lhos, o tipo foi-se dali para fazer o curativo mas parece que escolheu mau caminho porque se meteu pela água até quase não ter pé, e não acredito que pudesse ver o fundo de forma a não ficar
perdido».
In As Formigas
O que de melhor se escreveu sobre o nascimento de Boris Vian, foi o próprio a fazê-lo: «nasci por acaso a 10 de Março de 1920, à porta de uma maternidade fechada por uma greve com ocupação. Grávida das obras de Paul Claudel (desde aí que não o gramo), a minha mãe já ia no 13ª mês e não podia esperar mais pela Concordata».
Proveniente de uma família francesa abastada, o segundo de quatro filhos do Sr. Paul Vian, passa a infância num palacete na região de Ville d‘Avray, onde aos 5 anos já lia correctamente. Com 19 anos já tinha conseguido dois bacharelatos, Grego/Latim e Matemáticas e preparava a admissão à Escola Central de Artes e Manufacturas. Excelente aluno, sem que as suas preferências se pretendem com o estudo, o jovem Vian tem duas paixões, o Jazz, que o acompanha até ao fim da sua vida e as surprise-parties. Decorre o ano de 1940, a França está ocupada pelas tropas de Hitler desde Maio, Boris Vian passa férias com a família em Capbreton, conhece Michelle Léglise e casa com ela um ano depois. Passam três anos e Boris Vian trabalha como engenheiro na AFNOR (Associação Francesa de Normalização). Contrariando as recomendações médicas entra como trompetista na orquestra de Jazz amador de Claude Abadie – Vian tem de um problema de saúde grave, aos 12 anos sofreu um ataque de reumatismo cardíaco. Ainda em 1943 escreve o seu primeiro romance Trouble dans les Andains - que só sairá da gaveta 23 anos mais tarde - e surgem os primeiros textos assinados com os pseudónimos de Bison Ravi – bisonte extasiado, anagrama de Boris Vian - e Hugo Hachebuisson.
A orquestra de Claude Abadie ganha quase tudo o que havia para ganhar no 1º Torneio Internacional de Jazz Amador de Bruxelas.
Vian troca a AFNOR, em 1946, pelo Office Professionnel des Industries et des Commerces du Pappier et du Carton. À secretária do novo emprego escreve A Espuma dos Dias, com o qual concorre a um prémio literário, que não consegue vencer. Nesse mesmo ano de 20 de Agosto a 3 de Setembro, durante umas férias em Saint – Jean –de Monts, escreve, sob o pseudónimo de Vernon Sullivan, o romance policial negro Irei Cuspir-vos nos Túmulos. 1947 é o ano da publicação de Os Mortos Têm Todos a Mesma Pele, o segundo policial de Vernon Sullivan e dos romances A Espuma dos Dias, Vercoquin et le Plancton e O Outono em Pequim de Boris Vian. O engenheiro Vian é despedido mas Vernon Sullivan publica mais dois livros Morte aos Feios e Elas não Dão por Ela, que vendem bem.
Aos 29 anos Vian é um homem profundamente angustiado. Sofre a morte de um grande amigo - nos seus livros “ O Major”- o casamento
arruína-se, tem problemas com a censura - o Irei Cuspir-vos nos Túmulos é retirado do mercado - os livros não vendem e a saúde piora. As Formigas é publicado em 1949 - algumas das histórias que o compõem já tinham sido editadas em revistas e jornais - e Boris Vian trabalha agora essencialmente como tradutor. A Erva Vermelha (1950) sai a público e Boris Vian é condenado a pagar 100.000 francos de multa por ultraje aos bons costumes do heterónimo Sullivan. Em 1953 é editado O Arranca Corações. Na opinião de muitos o seu melhor livro, é contudo fria a recepção da crítica e do público e o escritor dá como terminada a sua carreira literária. Divorciado há dois anos casa em 54 com a bailarina Ursula Kebler e continua os seus trabalho de tradução a par de pequenos papéis desempenhados no cinema. No seu último ano de vida são publicados alguns textos seus, duas peças teatrais e 23 poemas. Morre a 23 de Junho de 1959, enquanto assiste à projecção privada, da adaptação cinematográfica, do Irei Cuspir-vos Nos Túmulos, que ele detestou.
«Esperei pelos 23 anos para escrever. E esta, ó jovens? É abnegação. Tentei contar às pessoas umas história que elas nunca tivessem ouvido contar. Parvoíce pura, parvoíce dupla: só gostam do que já conhecem. (...) No fundo, eu andava a contar histórias a mim próprio. As que eu teria gostado de ler em livros
alheios». - Boris Vian.
Eugénia Sousa
Florinda Baptista
NOVIDADES
Finados famosos
EUROPA-AMÉRICA. Eis que surgem mais Finados Famosos. Eles só precisaram morrer Mike Goldsmith, Phil Robins e Philip Reeve fizeram o resto, escreveram os livros mais engraçados da temporada. Com Joana d‘Arc - E as suas Ordens de Marcha, ficamos a conhecer uma heroína que conduz o exército francês em combate, passou a vida a tentar provar que não era bruxa, gostava de escrever cartas e acabou “bem passada” numa fogueira. Horácio Nelson - E a sua Vitória, a história mais ou menos secreta de um almirante que perdia coisas - perdeu um olho e um braço em combate -, e venceu uma bronca naval chamada Trafalgar. Dez homens que mudaram o mundo à força de tanto inventar, Inventores - e as suas ideias brilhantes e um outro que descobriu uma lei fantástica Albert Einstein e o seu universo insuflável.
PIAGET. Ensaio Sobre o Desenvolvimento Humano - De uma teoria Emergente da Prática ao Mundo como Implicação, de Luis Marques Barbosa. «No livro que agora publicamos a acção educativa é apresentada, tal como fizemos aos nossos alunos, como um acto
eminentemente social, mas porque dirigida ao cidadão, é este que se assume o eixo em torno do qual intentamos que os agentes educativos organizem as suas intervenções.
Por isso, a descoberta da criança afigura-se-nos o maior desafio a que essas intervenções podem responder (...)».
D. QUIXOTE. Publicações Dom Quixote. Gil Vicente - repositório escolar é uma edição de José Camões e Helena Reis Silva. «Desde muito cedo, o sistema educativo português decidiu que a obra de Gil Vicente integrasse os programas de ensino secundário,
tratando-a, principalmente, como monumento literário e documento da história das mentalidades. Só recentemente se restaurou a primazia do teatro, e nesse sentido se preparou a presente edição».
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