GENTE & LIVROS
Joanne Harris

«Empoleirámo-nos nos bancos como moscas-de-bar nova-iorquinas, com um chocolate quente para cada uma. Anouk toma o dela com crème chantilly e lascas de chocolate; eu tomo o meu quente e preto, mais forte do que espresso. Fechámos os olhos na fragrância do vapor e vemo-los chegar - dois, três, uma dúzia de uma só vez, os rostos iluminando-se, sentando-se ao nosso lado, os seus rostos duros e indiferentes, derretendo-se em expressões de boas vindas e deleite. Abro os olhos depressa e Anouk está à porta. Por um instante vejo Pantoufle encavalitado no ombro dela, de bigodes torcidos. A luz por trás dela parece, de algum modo, mais quente, mudada.
Sedutora».
In Chocolate
Filha de pai inglês e mãe francesa Joanne Michèle Sylvie Harris nasceu a 3 de Julho de 1964, em Yorkshire, Inglaterra. Educada num ambiente pouco cosmopolita, Joanne muito cedo mostra tendência para o isolamento, o refúgio na leitura e na escrita de pequenas histórias.
Estudou francês, línguas modernas e medievais na Faculdade de Santa Catarina, em Cambridge e guitarra baixo num clube de Jazz. Após algumas tentativas frustradas de carreira - música, herbanária e contabilista - cede à vontade dos pais e durante 12 anos dá aulas de francês num colégio em Leeds.
Com 25 anos publica o primeiro romance, A Semente do Mal (1989) - contudo ela recomenda com veemência a sua “não leitura”. Quatro anos depois sai Sono, Irmã Pálida (1993).
Chocolate (1999) é o grande sucesso literário da escritora e o primeiro livro a ser traduzido em Portugal. Chocolate é adaptado ao cinema em 2000, pelo realizador sueco Lasse Hallstrom. No elenco do filme encontra-se Juliette Binoche, no papel de Vianne Rocher, e Johnny Deep, como cigano Roux.
Ao ritmo de um livro por ano, Joanne Harris publicou Vinho de Amoras (2000), Cinco Quartos de Laranja (2001) e Coastliners (2002).
Joanne Harris abandonou o ensino, há já alguns anos, para escrever a tempo inteiro. Actualmente reside em Yorkshire com o marido, Kevin Harris, a filha de dez anos, Anouchka Fleur Harris e 2001 coelhos invisíveis.
CHOCOLATE. Elas vêm e partem com o vento e nada fica igual à sua passagem. Quando Vianne Rocher chega com a filha Anouk à pequena aldeia de Lansquent-sur-Tannes provoca uma “pequena tempestade”. O padre Reynaud, a maior influência do lugar, encara-a de imediato como inimiga. Tudo naquela mulher lhe lembra o paganismo. Apesar da hostilidade, ela está disposta a permanecer algum tempo ali, com a filha e o Pantoufle - o canguru imaginário de Anouk. Vianne abre uma chocolateria e à medida que os habitantes da aldeia vencem o receio e vão entrando, ela recomenda o chocolate que melhor se identifica com cada um. Atrás do balcão de La Céleste Praline, Vianne promove a felicidade em
Lansquent.
Eugénia Sousa
Florinda Baptista
NOVIDADES
Mar de Pão

João de Sousa Teixeira acaba de publicar “Mar de Pão”. Colaborador do Ensino Magazine, o autor é um albicastrense a residir no Alentejo. Uma história de um Alentejo de outrora, a sonhar uma reforma agrária que permitisse ao povo viver condignamente, uma história do Alentejo de agora que ainda se não cumpriu, é um pouco do que se pode dizer sobre “Mar de Pão”. Percorrendo quase oitenta páginas encontramos personagens tão tocantes como a Miraldina e o Chico. O seu romance aconteceu em simultâneo com o arranque da cooperativa Estrela Nova mas passados os anos, levando por bagagem pouco mais do que o grande amor que sentem um pelo outro, são obrigados a abandonar terra e família e rumar ao Barreiro. A cooperativa falhou, é preciso «Fazer Pela Vida».
Com a avó, a ti Jacinta, fica o filho da Miraldina e do Chico, o António Joaquim. O menino tem agora oito anos e frequenta a escola primária onde «A professora falou toda a manhã sobre uma grande barragem que um dia irá inundar vastos terrenos, incrementar o regadio e a esperança de quem aguarda pacientemente a gota de água e ferve à míngua
dela».
«O Caminho é feito de Vontades» mas aqui se trata também da vontade dos que ficaram. Das novas gerações, o Guilherme, filho único da Ti Cremilde e órfão de pai, ainda moço “deslocou-se-lhe o coração” ficando conhecido depois e para sempre como Guilherme das Lérias.
O Faustino, o Joaquim das Vacas , a Inácia, a Jacinta, a Ti Cremilde são «Os Velhos». Faustino, o dono da taberna, que em tempos ao fim da tarde se enchia com os homens da terra; o Joaquim das Vacas – o homem da Inácia - que à noite se senta no poial da casa e espera pela passagem da coruja azeiteira, « Só ele sabe por que faz aquela espera inútil ao pássaro branco, mas este não é, por enquanto, o tempo de o sabermos nós.». Invoca memórias de tempos idos, da seara e do pão e do esforço colectivo dos homens na conquista diária do alimento.
“Mar de Pão” fala de nascimento, companheirismo e trabalho mas fala também de suicídio, solidão e perda. Um povo que sofre com o roubo das suas melhores aspirações, mas no fim, porque no fim é sempre o que fica, a esperança « A seara nova: esta seara não existe (ainda) e é, ao mesmo tempo, a maior: tem o tamanho da esperança. E a esperança é como um silo: se não enche não vale a
pena (...)».
Eugénia Sousa
CONTRABAIXO
Congresso Nacional

Provavelmente, à hora de fecho desta edição do Ensino Magazine de Outubro, que marca o surgimento deste novo espaço, foram tomadas decisões extremamente importantes para a música e os músicos portugueses. No mínimo, foram discutidos problemas de uma forma nunca vista em Portugal.
Refiro-me ao Congresso Nacional dos Músicos, que contou com o patrono e a presença do Dr. Jorge Sampaio, presidente da Comissão de Honra que é
constituída, também, por artistas destacados tais como os pianistas Maria João Pires e Pedro Burmester, o actor Raul Solnado bem como de personalidades tão proeminentes como Rui Vilar e Paolo
Pinamonte.
Acho que só o facto desta comissão de honra ser tão ilustre bastará para nos dar uma ideia da importância que esta organização terá para a nossa vida musical. Mas o grande interesse que este Congresso desperta é derivado da abrangência dos temas nele abordados. Desde a situação actual do músico, até às fontes estruturais de rendimento dos mesmos, passando pela educação e formação, sem esquecer a defesa da nossa cultura e dos nossos intérpretes e compositores, tudo terá um espaço neste grande fórum.
Devido a limitações de espaço e, obviamente, ao enfoque específico do nosso Ensino Magazine, irei debruçar-me de uma forma extremamente sintética, apenas sobre as questões relacionadas com o ensino e a formação.
Diz o documento prévio para discussão no Congresso que o estatuto do músico não pode ser visto e
analisado sem o enquadrar no plano da educação e formação profissional. Não posso estar mais de acordo. Esta questão é central e se observarmos atentamente a diferença entre o discurso legislativo e as práticas, teremos de reconhecer que o pouco que já se fez é meritório, mas carece de ser aprofundado e generalizado. Começando pela educação artística no ensino genérico, verificamos que no 1º Ciclo as experiências já feitas (algumas delas com uma relativa consolidação, como o programa “Crescer com a Música”, (realizado no concelho de Castelo Branco), mostram um potencial extremamente importante quer no despertar da sociedade para a vivência artística, quer pela “pressão” que é colocada no outrora isolado 2º Ciclo. Isolado porque, durante muitos anos, só aí se encontravam, de uma forma generalizada, as aprendizagens no domínio da música. Pressão porque um ensino no 1º Ciclo virado para a prática, conduz a hábitos e a exigências naturalmente diferentes e que poderão ser aproveitadas pelos docentes do nível de ensino seguinte.
Quanto ao ensino especializado, a aparente agonia das Escolas Profissionais, responsáveis por uma década altamente estimulante no ensino da música, é um autêntico desbaratar do investimento realizado e que, a par da descaracterização dos Conservatórios e Academias, são sinais da falta de rumo da política educativa e da sua incapacidade para retirar conclusões que não passem da contabilização das poupanças em euros. Míseros, por sinal...
Só o facto de se realizar, faz com que este fórum seja um dos acontecimentos mais importantes para a vida musical portuguesa dos últimos 20, 30 anos. Que as suas conclusões sejam a semente de mudança de que tanto precisamos!
Carlos Semedo
Carlos Semedo é Director Artístico do Festival Internacional de Música Primavera Musical
e assina esta coluna, mensalmente no Ensino Magazine
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