Semana negra
A contribuir para acentuar a já demasiado degradada auto-estima dos portugueses, esta semana os média presentearam-nos com um conjunto de notícias de envergonhar o mais puritano dos leitores.
Desta vez a educação e o ensino foram o alvo seleccionado, e as notícias não podiam ter sido mais desencorajadoras.
De uma só leva, o Diário de Notícias publica os dados divulgados pelo Observatório da Ciência e do Ensino Superior, que atribuem uma taxa de 43% de insucesso escolar aos alunos que frequentam o Ensino Superior; o Expresso, em entrevista ao Ministro da Educação, adianta que no próximo ano lectivo serão encerradas mais 800 escolas básicas, sendo que o número ascenderá às 2300 (!) até 2007; a TSF dispara que em 2006 vai ocorrer uma drástica falta de médicos em Portugal, embora o Bastonário da Ordem conteste a decisão do Governo em aumentar o ingresso de alunos nos cursos de medicina; e, para finalizar a semanada, o Diário Económico faz público o relatório da Fundação Europeia de Formação , o qual coloca Portugal na cauda da EU quanto à formação especializada, no quadro do ensino superior, dos seus cidadãos.
Por si só, cada uma destas notícias deverá merecer comentário particular. Todavia, permitam-nos que hoje nos detenhamos nesta última, talvez por coincidir com uma (pouco)ingénua (?) pressão sobre o sistema de ensino superior, alegando que em Portugal existem demasiadas instituições universitárias e politécnicas e, logo, demasiados cursos superiores.
Porém o que nos chega através da Fundação Europeia de Formação é uma realidade bem distinta: Portugal é o único país da Europa dos Quinze que tem uma percentagem de licenciados inferior à média dos futuros estados membros e países candidatos à União Europeia. Ou seja, de forma muito simplista, mas significativamente realista, Portugal, após mais de uma década de entrada de fundos comunitários, apresenta-se num situação mais deficitária do que os países que irão integrar a EU a partir de 2004 e que, logo, serão também candidatos à aplicação desses mesmos fundos.
E outra conclusão será fácil de tirar: Com a entrada de dos dez novos membros da EU, em Maio de 2004, Portugal vai continuar no fundo da lista, já que os níveis de escolaridade dos novos membros são muito superiores aos registados no nosso país.
É que os mesmos dados revelam que apenas 9% dos portugueses possui uma licenciatura. Uma média demasiado baixa, quando comparada com a média dos países que vão entrar para a UE, que é de cerca de 14%, e apenas metade dos Quinze que a integram actualmente (21%).
E se tivermos em conta a população que termina o ensino secundário o fosso ainda é maior: apenas 19%, face aos 77% dos estados membros e dos países candidatos. Se a tudo isto somarmos o facto de Portugal também ter a mais elevada taxa de abandono escolar, os piores níveis de iliteracia e a inacreditável taxa de frequência (apenas 3 em cada cem adultos) de cursos de formação contínua, as notícias não poderiam ser mais confortantes.
As responsabilidades não podem ser imputadas àqueles que sempre disseram presente! aos desafios, àqueles que estiveram na primeira linha da inovação e do profissionalismo: os professores e educadores de Portugal. Aliás, os mesmos que o poder central ignora quando se revoltam contra o forçado emagrecimento da rede do ensino básico, ou não calam a voz contra os que querem violar o rumo de democratização do sistema de ensino superior.
As responsabilidades terão que ser imputadas a quem delegamos o poder de fazer escolhas e falharam.
Ele há semanas que mais vale não serem esquecidas.
João Ruivo
ruivo@rvj.pt
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