Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano VI    Nº59    Janeiro 2003

Editorial


Novos públicos

Nos últimos anos, o crescimento do ensino superior na Europa e nos Estados Unidos tem sido conseguido à custa da procura de novos públicos.

Tal crescimento tem-se justificado com base no princípio de que o ensino superior é um dos recursos fundamentais e não esgotáveis para promover o bem-estar, a segurança pessoal e social bem como a saúde das nações. Tal desenvolvimento e expansão tem-se radicado no pressuposto de que o capital intelectual vai substituindo o capital financeiro e o capital físico, tornando-se, por isso, a pedra angular para a prosperidade, o desenvolvimento e bem-estar dos países e das regiões.

Daí que, por todo o mundo, vá prosperando a convicção de que existem novos públicos que alimentam e se querem servir do ensino superior, de que existem milhares de cidadãos que se dirigem às instituições de ensino superior conscientes da necessidade da aprendizagem permanente, já que a sociedade do conhecimento gera a desactualização permanente.

Esses novos públicos constituem-se, assim, por adultos integrados na força do trabalho, que interiorizaram o princípio da aprendizagem ao longo da vida, procurando, por essa via, novos saberes que reforcem a qualidade do exercício da sua vida profissional, lhes permitam novos caminhos profissionais, ou apenas novos percursos no seu processo de crescimento pessoal. Muitos outros procuram as instituições de ensino superior numa idade ainda socialmente útil, mas em que os processos reforma os encostou à desocupação precoce, não co-paginável com a vitalidade que ainda revelam.

Infelizmente por vezes são as entidades privadas a despertar para esta realidade, enredando-se as instituições públicas em processos de discussão endogâmica que, certamente lhes permitem purificar, ao limite, a árvore, mas que as impedem de se lançar na exploração do manancial oferecido pela floresta.

Claro que estes novos públicos obrigam a mudanças radicais nas rotinas organizacionais das instituições. Mudanças que abarcam sectores tão diferenciados quanto os que se reportam aos horários de funcionamento, ou ao atendimento e entendimento pessoal e personalizado dos novos alunos. Mudanças que envolvem a criação de bibliotecas virtuais, ou a implementação de procedimentos de comunicação próximos do que poderíamos designar por “pedagogia digitalizada”.

Estes novos paradigmas encerram também a necessidade, inadiável, de exigir uma clarificação da designação das titulações em vigor, assunto sobre o qual urge a busca de um consenso, pelo menos entre os países que integram a Comunidade Europeia.

Isto para quem queira evoluir no sentido certo não ver confrontado, novamente, com o embaraço do enquadramento legal das titulações nos diferentes países, embaraço que invariavelmente atinge sobretudo os alunos quando são surpreendidos com obstáculos à sua inserção no mundo do trabalho.

Estas eventuais alterações exigem o apoio da opinião pública. É que se tenta mudar estruturas demasiado enquistadas nas representações do cidadão médio e cujas alterações custam a compreender e a acompanhar.

Mas, pior do que o enfrentar dessa situação, é o imobilismo das próprias instituições de ensino superior em aceitar estes novos desafios, em incorporar a mudança, em inflectir comportamentos que visem aproximar o investimento pessoal de quem aí trabalha das necessidades da sociedade do futuro.

Bem pior que enfrentar essa situação, é o atavismo dos governos que preferem deixar nas regras concorrenciais do mercado a sobrevivência das instituições, em vez de, num esforço conjunto, desenhar com essas instituições os novos percursos e o sentido da mudança.

Por isso nos interrogamos se todos e cada um de nós está preparado para o caos que se avizinha e que alguns alimentam enquanto gozo e vício pessoal.

João Ruivo
ruivo@rvj.pt

 


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