Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano VI    Nº59    Janeiro 2003

Destaque

VEIGA SIMÃO E O FUTURO DO SUPERIOR

Visão para uma década

Propinas mais elevadas para os alunos que “chumbarem” de ano é o que propõe Veiga Simão, ex-ministro da Educação, no seu livro «Ensino Superior: Uma Visão para a Próxima Década».

Lançado na Fundação Gulbenkian, em Lisboa, a obra é também da co-autoria de Machado dos Santos e António Almeida Costa.

O livro foi apresentado perante o Primeiro-Ministro Durão Barros e um bom “lote” de ex-ministros da Educação, nomeadamente Guilherme de Oliveira Martins, Júlio Pedrosa, Roberto Carneiro e Marçal Grilo, para além do actual titular da pasta da Ciência e do Ensino Superior, Pedro Lynce.

Ao explicar as linhas centrais das teses defendidas no livro, Veiga Simão proclamou a «soberania do conhecimento», como «um novo conceito» a explorar mais a fundo.

Referindo-se à situação que se vive de crise económica e de «necessidade de reflexão aos níveis sociais, culturais e educativos», aquele autor defendeu «a qualificação dos recursos humanos do país» e «o cultivo da excelência e do mérito» no interior das instituições de Ensino Superior.

A sua perspectiva para o futuro do sistema passa por um “reforço da competitividade do Ensino Superior, particularmente relevante no espaço da União Europeia”.

Contestando o sistema actual, Veiga Simão foi duro e directo ao lançar acusações à «tolerância pela mediocridade, nuns casos por falta de ambição, noutros por corporativismos ou factores de outra ordem».

Preconizou, por outro lado, «o fortalecimento da liderança do governo académico», no quadro de um novo modelo para o Ensino Superior que se revele como «harmonioso e lógico».

Como um dos principais obstáculos à alteração do sistema, Veiga Simão identificou a «tendência doentia das instituições para sobrevalorizarem questões circunstanciais».

Explicou, depois, o conteúdo do conceito que propõe de «universidade federada»: «uma organização que pode albergar universidades e politécnicos, desde que obedeçam a um mesmo conceito estratégico».

Veiga Simão defendeu a divulgação pública dos resultados de avaliações a escolas e cursos. Em relação aos estudantes, foi claro ao advogar o princípio segundo o qual «ninguém deve deixar de estudar por dificuldades económicas», mas, sem nunca colocar em causa esta premissa, sempre sublinhou que «é legítimo que os alunos contribuam em termos de uma aproximação aos custos reais do ensino ministrado».

Durão Barroso não quis anunciar políticas concretas para o sector, mas, mesmo assim, defendeu que «o actual sistema de ensino superior em Portugal encontra-se esgotado».

Em contrapartida, propôs como eixos centrais das medidas a tomar o reforço da qualidade e a racionalização da rede existente. O Primeiro-Ministro alertou para a necessidade da «abertura ao exterior» das instituições, nomeadamente com uma maior atenção de universidades e politécnicos à função que podem desempenhar na aprendizagem ao longo da vida.

Marçal Grilo, administrador da Gulbenkian, por seu turno, elogiou o livro apresentado e destacou o papel dos politécnicos enquanto «maior bem do sistema no pós-25 de Abril». «Foi inovador e revelou ter um forte impacto regional», salientou o antigo ministro da Educação.

Outro antigo responsável pela pasta, este de um governo social-democrata, Roberto Carneiro, manifestou-se contrário ao «espartilho» do estatuto de funcionários públicos aplicado aos professores e demais agentes do Ensino Superior.

Advogou a «liberdade total» que cada escola deve poder ter, mas apontou, como contrapartida, «a avaliação do desempenho e a apresentação de resultados de cada curso e instituição».

Roberto Carneiro apontou a necessidade de «responsabilizar mais fortemente as instituições perante as comunidades onde se encontram inseridas». Não deixou de criticar a «tendência burocratizante» presente, segundo disse, em muitas escolas, antes de destacar a «encruzilhada» em que o Ensino Superior está. «É preciso incentivar as instituições que aposta na inovação», alertou
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Jorge Azevedo

 

 

 

DEVIDO À REGULAMENTAÇÃO EXCESSIVA

Reitores apreensivos

O Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) encara com «fortes reservas» o anteprojecto de decreto-lei que visa aprovar o regime de criação, alteração, suspensão e extinção de cursos superiores.

Aquele organismo considera que há uma «regulamentação excessiva», o que, associado ao papel do Conselho Nacional de Regulação do Ensino Superior revela opções «claramente contrárias» ao princípio da autonomia universitária e da responsabilização das instituições.

Numa análise geral da filosofia política subjacente à proposta, o CRUP detecta um «complexo excessivo de igualização das responsabilidades» dos sectores público e privado, no que se refere à Educação Superior.

A doutrina da regulação independente dos bens públicos, embora estando em vaga, não é pacífica, lembra o organismo representativo dos reitores portugueses, acrescentando que a sua aplicação ao bem público Educação, tendo em conta o papel do Estado fixado na Constituição «pode levantar dúvidas quanto à não legitimidade e responsabilização políticas de uma comissão do género da referida. Assim, o CRUP defende que a haver alguma regulação deverá caber à Direcção Geral de Ensino Superior.

O Conselho de Reitores chama a atenção para o facto de ser muito mais importante e até eficiente em termos de recursos, neste momento, dar significado e consequência aos resultados do processo de avaliação em curso.

Alertando para a necessidade de se evitar instabilidade nos estabelecimentos de ensino em causa, considerando, igualmente, as expectativas dos alunos, o CRUP critica o «retrocesso» que se verifica nos avanços na consolidação da autonomia e flexibilização da gestão.

«A inclusão do estabelecimento de condições mínimas para a criação de cursos deve ser feita também, à luz da obrigatoriedade do cumprimento de tais condições, de que o Estado até agora tem mostrado alguma incapacidade de o conseguir», sublinha o Conselho.

Jorge Azevedo

 

 

 

O PERCURSO DE LYNCE

Da Agronomia a ministro

Pedro Augusto Lynce de Faria é o ministro da Ciência e do Ensino Superior, após a automização institucional deste nível educativo, anteriormente integrado na orgânica do Ministério da Educação. Licenciado em Engenharia Agronómica e Doutorado em Ciências Agronómicas – Nutrição e Fertilidade, foi professor catedrático do Instituto Superior de Agronomia. Exerceu também as funções de Presidente do Conselho Directivo daquela instituição. Pedro Lynce foi Director-Geral do Ensino Superior e presidiu à Comissão de Avaliação Externa das Universidades (na área da Agricultura). Foi Chefe da Delegação Portuguesa às “Universíadas” de Pequim, em 2001 e exerceu funções como Presidente do Colégio Agronómico da Ordem dos Engenheiros.

Destacou-se, em termos políticos, como Secretário de Estado do Ensino Superior, nos XI e XII Governos Constitucionais.

Desde 6 de Abril de 2002 que é ministro da Ciência e do Ensino Superior, logo após o PSD ter vencido as eleições legislativas. Em “maré” de contenção orçamental na generalidade dos sectores, cabe a Pedro Lynce uma missão duplamente difícil: convencer as universidades e politécnicos da necessidade de “apertarem o cinto” e promover e incentivar mudanças de fundo do sistema que o ministro considera inadiáveis.

JA

 

 

 

A PERSONALIDADE

Sistemático e de raciocínio rápido

Uma das características que melhor o define é o raciocínio rápido, típico dos engenheiros, dizem. Pedro Lynce é um homem de convicções, as mesmas de que não abdicou com a passagem a ministro.

Inteligente, sistemático nas visões que tem do Ensino Superior e da Ciência em Portugal, o governante recebeu a equipa de reportagem do «Ensino Magazine» no Palácio das Laranjeiras, em Lisboa, onde está sediado o Ministério antes da Reforma do Estado, agora do Ensino Superior.

Simpático, o ministro explicou as suas ideias e rebateu ponto por ponto as principais acusações que lhe têm sido dirigidas. Ao longo da entrevista que concedeu ao nosso jornal, ficou patente uma preocupação constante: é preciso mudar o sistema. Os seus agentes têm de olhar mais para fora das paredes das escolas e interligar mais fortemente as instituições com os meios empresarial e social onde estão inseridas.

O interior do país foi particularmente visado por Pedro Lynce. Avisos, muitos deixados de forma muito directa e clara. Para que não restem dúvidas sobre o caminho a seguir, na perspectiva do governante.

Com a previsível redução do número de alunos nas universidades e politécnicos, o ministro está preocupado e pede às instituições que repensem formas de funcionamento e actuação. A altura é agora. Antes que seja tarde.

Jorge Azevedo

 


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