CRÓNICA
Lumpen
Com o Natal à porta, mal não ficaria o apelo à contrição dos dias negros que vivemos e que o O.E. para 2004 não desmente, e, pior ainda, gerido por alguém que impôs uma política económica restritiva aos portugueses, eufemismo de Robin dos Bosques ao contrário, com o argumento de que havia normas comunitárias que a tal obrigavam. Agora mandou o PEC às urtigas porque Portugal está primeiro e os próximos actos eleitorais em segundo e vice versa.
À sombra duma orientação política que delapida as condições básicas de vida de cada vez mais portugueses e privilegia, no alinhamento internacional, os putativos donos do mundo, contando para tal com a hibernação da chamada oposição maioritária, há uma aposta clara e cínica na demonstração ampliada e permanente da degradação dos valores éticos; dos casos de miséria extrema de quase pó humano, moral e material. É neste campo fértil que se movimentam os fazedores de opinião, os que recorrem à cunha para se chegarem à frente e, naturalmente, os peregrinos do embuste, do futebol e das santas que choram como os crocodilos. Estes últimos, porém, não são inéditos. Com maior ou menor abundância de cloreto de sódio e igualmente com o propósito de se fazerem acreditar, não há muito tempo alguns rostos trouxeram a terreiro esse exemplo máximo de humanidade. Mas no dizer popular também há sabedoria para perceber quando são lágrimas do tal réptil, sobretudo porque a experiência ensinou àqueles para quem a vida é madrasta, que quem chora não mama.
A maquilhagem proporciona a mediatização em doses certas e letais para a chicana política e social dos nossos dias. O que é evidente não carece de exemplos.
E desta forma corro o risco de o meu apelo natalício se dirigir aos falinhas mansas, aos falas barato e aos troca-tintas da fauna subterrânea, que obviamente não me ouvem e em Janeiro cá voltamos chatos e repetitivos a dizer que não há remédio para tão grande ferida. Mas há. Há se acreditarmos que o mundo gira e que com ele amadurecemos as nossas convicções, daremos combate aos instalados no ardil que construíram e criaremos condições para uma vida melhor e mais próspera. O que não será é para dois mil e quatro.
João de Sousa Teixeira
|