GENTE & LIVROS
V. S. Naipaul

«O mundo é o que é; os homens que não são nada, que se permitem tornar-se nada, não têm lugar nele.
Nazruddin, que me tinha vendido a loja por pouco dinheiro, nunca pensou que me fosse fácil tomar conta dela. O país, como tantos outros em África, vivera, tempos agitados depois da independência. A cidade, situada no interior, na curva do grande rio, tinha deixado praticamente de existir; e Nazruddin disse-me que eu teria de começar tudo de princípio». (…)
In A Curva do Rio
Vidiadhar Surajprasad Naipaul, nasceu a 17 de Agosto de 1932 em Chaguanas, Trinidad e Tobago. Descendente de uma família de imigrantes hindus do Norte da Índia aos seis anos, muda-se com a família para a capital Port of Spain e estuda no Queen‘s Royal
College.
Aos 18 anos imigra com a família para a Inglaterra, entra em Oxford e escreve o seu primeiro romance que não é aceite para publicação. O pai, Seepersad Naipaul, é correspondente do jornal Trinidad Guardian, publica pequenas histórias e encoraja sempre o filho a escrever. Em 1953 tira o curso de Bacharel de Artes em Oxford e nesse mesmo ano o pai morre de ataque cardíaco. Em meados dos anos 50 trabalha como jornalista free-lancer na BBC viajando pela Ásia, África e América. Em 1955 casa com Patricia Hale, ela morre em 66 e Naipaul volta a casar com uma paquistanesa, Nadira Alvi. Dedica-se inteiramente à escrita em 1957 e publica o seu primeiro romance O Massagista Místico e quatro anos depois Uma Casa para Mr Biswas, inspirado na figura do seu pai. Ganha em 1971, o Booker Prize com o romance Num Estado Livre.
Guerrilhas (1975) e A Curva do Rio (1979) abordam a emergência do nacionalismo em países do terceiro mundo após a época colonial.
Em 1986 atribuem-lhe o Prémio T.S. Elliot para escrita criativa e em 1990 nobilitado pela rainha Isabel II. Naipaul é também autor de uma vasta bibliografia de viagens e testemunhos em que o enfoque recai sobre o fundamentalismo muçulmano em países não Árabes como a Indonésia, o Irão, a Malásia e o Paquistão. Doutor honoris causa pelas Universidades de Columbia, Cambridge, Londres e Oxford, Meia Vida (2001) é o seu último romance e tem caracter auto-biográfico.
Naipaul é autor de mais de 20 livros e recebe o Prémio Nobel da Literatura em 2001, considerado um escritor politicamente incorrecto, a escolha é defendida pela Academia Sueca «Naipaul é um nave-gante de mundos literários único em seu estilo que ilumina o que os outros esqueceram, a história dos perdedores».
A Curva do Rio conta-nos a história de Salim um mercador Indiano num país algures em África. Com a subida ao poder de um presidente ditatorial a vida transforma-se em algo de muito frágil. A morte do padre Huismans, a amizade de Salim com Raymond, um dos homens do presidente, mais tarde caído em desgraça. A relação sentimental com Yvette a mulher de Raymond. Salim, Metty, Indar, Mahesh, Shoba personagens condenadas ao desencanto e ao exílio à alienação colectiva e à desilusão
pessoal. 
Eugénia Sousa
Florinda Baptista
LIVROS
Novidades
EUROPA-AMÉRICA. Criaturas de Louise Cooper é a novíssima coleção para os mais jovens, Se Fores ao Bosque, Atirei o Osso ao Cão, Uma Vez Ganhei um Peixinho e Criaturas do Natal. Se acreditas que os peixinhos são calmos e pacíficos, o cão é o melhor amigo do homem, o Natal é uma época de muito amor e nada de muito estranho pode acontecer durante uma peça de teatro amador, estás enganado e tens de ler Criaturas. Elas estão soltas nas livrarias, agarra-as. Mas tem muito cuidado elas são perigosas.
ASA. Os filhos de Adão e Eva, de Donizete Rodrigues tem por tema a origem e evolução biológica e cultural do Homem. O percurso da humanidade abordado através do prisma da paleontologia cultural. Donizete Rodrigues é doutorado em Antropologia Social pela Universidade de Coimbra, professor Associado da Universidade da Beira Interior, Professor convidado da universidade de Salamanca e Visiting Professor da University of
Bristol.

BOCAS DO GALINHEIRO
No centenário de John
Steinbeck

Prémio Nobel em 1962, John Steinbeck é um dos autores cuja obra tem suscitado a atenção do cinema. Os seus livros, de denúncia social, em que temas como a migração, a pobreza e a exploração são preocupação para este humanista vigoroso, tornaram-se alvo preferencial de realizadores atentos. De John Ford e Elia Kazan, de Hitchcock a Victor Fleming, e não só.
Em “As Vinhas da Ira” (1940) - na foto- numa adaptação excelente de Nunnally Johnson, John Ford consegue apreender de forma superior a obra de Steinbeck, com a presença sempre agónica da terra a impor a migração para a nova “terra prometida”, a Califórnia dos vastos laranjais, para onde a família de Tom Joad vai na esperança de trabalho remunerado e do “American Dream” rooseveltiano. “As Vinhas da Ira” é um “road movie” pela América rural, numa camioneta que ficou na história do cinema e que só por milagre chegou ao seu destino. Uma realidade, em plena depressão, uma visão crua do reverso do optimista “american way of life”, abordada com um grande sentido humanista, em que o drama da condição humana, da nostalgia e da sina dos desprotegidos, da sorte e da natureza, à mercê de toda a espécie de oportunistas e exploradores, é dissecada pelo realizador com um rigor absoluto, tanto do ponto de vista humano, como no uso sublime da câmara, numa magistral fotografia de Greg Toland. Uma adaptação marcante de um livro que é uma soberba crónica sobre os desprotegidos, personagens vigorosamente traçados nos campos agrestes que atravessam e que mereceu o prestigiado Prémio Pulitzer, ao mesmo tempo que era banido de bibliotecas públicas em Kansas City e Oklahoma, pela sua visão socialista da América. O filme recebeu sete nomeações para as estatuetas de Hollywood. Viria a ganhar apenas duas: John Ford, Oscar para o melhor realizador e Jane Darwell, a espantosa Ma Joad, melhor actriz secundária. Fraco pecúlio para tal obra-prima.
Outra adaptação famosa de Steinbeck, e que disputa a primazia com “As Vinhas da Ira”, é sem dúvida “A Leste do Paraíso” (1955), de Elia Kazan. Agora já não será só a valia da obra literária, que a tem, indiscutivelmente, nem do mérito do realizador, um dos grandes. Nesta fita, uma das mais brilhantes do realizador, quem faz a diferença é seguramente James Dean, na primeira das suas três aparições como actor principal no cinema. Uma presença com a marca do Actors Studio, consolidada no facto de o actor ter perdido a vida ainda nesse ano e ter entrado para a restrita galeria dos mitos populares, de que este filme, uma adaptação muito livre do romance de Steinbeck, numa visão moderna de Caim e Abel, passou a ser referência obrigatória. Com Elia Kazan, já Steinbeck havia colaborado, uma vez que é seu o argumento de “Viva Zapata” (1952), aqui de novo com um produto do Actors Studio de Kazan, Marlon Brando, numa abordagem não muito convencional do herói, Emiliano Zapata , que, mais pelo lado do realizador, nos é mostrado como um homem sem futuro, um herói sem querer, um revolucionário sem revolução.
Mas a relação deste notável escritor, um dos ícones da novela social norte-americana do século XX, nascido a 27 de Fevereiro de 1902, em Salinas, na Califórnia, local de referência para muitas das suas obras, é vasta. “Tortilla Flat”, o seu primeiro livro consagrado pelo público, sobre os paisanos da Califórnia, passou ao cinema em 1942 pela mão de Victor Fleming, com Spencer Tragy e John Garfield. Mas, já em 1939 “Ratos e Homens” chegara ao grande écran numa realização de Lewis Milestone, realizador que reincidiria com Steinbeck em 1949 com “The Red Pony”, claramente superior à versão que Gary Sinise protagonizou e realizou em 1992. Bem melhor foi a adaptação de “Cannery Row “ e “Sweet Thursday” de que resultou a fita de estreia de David S. Ward, “Cannery Row” (Bairro da Lata), de 1982, com Nick Nolte e Debra Winger, e que conta com John Huston como narrador, numa história de amor entre gente simples e humilde, como quase sempre acontece com os personagens deste grande escritor, que conseguem acreditar que há sempre uma réstia de esperança e de dignidade onde na maior parte das vezes só vemos miséria e desolação. “Lifeboat” (1943), de Alfred Hitchcock, talvez um dos filmes menos conhecidos do cineasta, mas deveras curioso, um microcosmos da guerra, passado todo ele num salva-vidas, em que mais uma vez a contradição humana é explorada, pondo em relevo os dois mundos então em guerra, dum lado o nazismo, do outro os aliados, a democracia, tem argumento de Jo Swerling, baseado numa história original de Steinbeck, bem diferente da adaptação que Emilio Fernandez fez em 1948 de “The Pearl” (A Pérola), um dos romances mais conhecidos do autor, talvez porque, por cá, de leitura nos liceus, sobre a história dum pobre pescador que vê toda a sua vida alterada quando encontra uma valiosa pérola. Outro personagem na linha dos que povoam a galeria rica de
Steinbeck.
Provavelmente, como concluiria Ma Joad, depois de dividir a parca refeição pelas crianças do acampamento, num daqueles momentos plenos de generosidade de “As Vinhas da Ira”: “nós duraremos sempre porque somos o
Povo!”.

Luís Dinis da Rosa
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