Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano V    Nº51    Maio 2002

Editorial


As ESEs e a má fé

Num país com um pouco mais, um pouco menos, de dez milhões de habitantes. Num país em que cerca de dois terços da sua população reside numa estreita faixa geográfica que se confina ao litoral e se situa entre a área metropolitana de Lisboa e a cidade de Braga. Num país com estas características, dizíamos, não estranha a importância, em termos de inovação e renovação da formação de professores, que atribuímos ao impacto da descentralização dessa formação, consubstanciada na criação das ESES na rede nacional do ensino superior politécnico.

Senão vejamos. A partir de 1986 iniciam a sua actividade 16 Escolas Superiores de Educação, praticamente uma por cada Distrito de Portugal, contrariando uma lógica de formação de docentes quase exclusiva do ensino universitário, sediado junto do poder central, e nessa estreita faixa geográfica já referenciada.

Tal permitiu aproximar a formação de docentes das necessidades da rede escolar de cada região; permitiu que cada escola elaborasse os seus próprios currículos e estratégias de formação, de acordo com essas necessidades pressentidas; proporcionou a implementação de uma dinâmica ímpar junto das escolas básicas e secundárias em que os formandos desenvolvem os seus estágios pedagógicos e profissionais; mobilizou um conjunto significativo e diversificado de docentes, quer das ESES, quer das escolas em que os formandos realizam os seus estágios (professores, supervisores, cooperantes da prática pedagógica...); possibilitou a oferta de formação especializada aos professores em exercício, através dos Cursos Estudos Superiores Especializados, e de Complementos de Formação, permitiu um desenvolvimento ímpar no que respeita à formação acrescida desses docentes; impulsionou a sua progressão na carreira docente dos ensinos básico e secundário; contribuiu para a melhoria qualitativa do conjunto do corpo docente das escolas da região, com evidentes benefícios no que respeita ao incremento da eficácia nos processos de ensino e de aprendizagem, na melhoria da cultura organizacional dessas escolas e no crescimento profissional dos seus docentes.

Proporcionou, ainda, a fixação nessas zonas geográficas de uma massa cinzenta e crítica de docentes que as regiões jamais pensaram poderem vir a usufruir; e ajudou a quebrar o estigma da desertificação, sobretudo dos jovens. Esta realidade assume particular importância no Interior do país, designadamente na região de Raia de Portugal.

Conviria, pois, e uma vez mais, salientar o carácter descentralizador e regionalizante da ESES, designadamente no que se refere ao seu contributo, extraordinariamente inovador, para o desenvolvimento das regiões em que estão inseridas, bem como a clara explicitação de que um dos seus objectivos estratégicos se reporta ao apoio à comunidade local. Devendo entender-se essa comunidade num duplo sentido: a comunidade social e a comunidade educativa.

Não estranha pois que repetidamente se saliente este carácter inovador de algumas destas escolas do ensino superior politécnico. É que, face aos objectivos que lhes estão cometidos, são estas as únicas que poderão, neste momento de tendência para a globalização, oferecer serviços de proximidade: o global necessita do local e as instituições são solicitadas a relacionarem-se em rede e a tecer as teias horizontais que melhor respondam aos défices de vizinhança.

As ESES foram, pois, criadas para corresponder a necessidades de formação dos professores, no contexto dum importante conjunto de reformas no Sistema Educativo, incluindo a efectivação do prolongamento da escolaridade e a renovação curricular.

Vinte nos depois, estas necessidades mantêm-se. Entretanto, apesar da sua curta história, foi realizado um inegável e notável investimento em edifícios, em equipamento e em formação de pessoal que se traduz num irrecusável e visível património material e de experiência, em diversos domínios.

Ou seja, a existência desta rede distrital de ESES, com vocação e capacidade para apoiar a investigação e o desenvolvimento tem-se vindo, progressivamente, a constituir como um dos elementos chave para a qualidade da educação em Portugal.

E, quem não o quiser reconhecer só poderá vir a ser acusado de cegueira, ou má fé.

João Ruivo
ruivo@rvj.pt

 


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