
Quem gosta de ir à
escola?
Nos últimos anos temos vindo assistir a um desenvolvimento significativo dos estudos que nos permitem conhecer as razões que levam os professores a atingirem estádios de “mal estar”, “desencanto” e “stress” profissionais.
Mais recentemente uma equipa “bilingue” (Juan Castro Posada, do lado castelhano, e João Pires, do lado português) têm vindo a sugerir que se realize aqui, na nossa zona da Raia, uma réplica de uma investigação já concluída do lado da Estremadura Espanhola e que revela precisamente esses sintomas e efeitos do “desgaste profissional”.
Pensamos que se revela uma iniciativa importante e que deveria recolher os devidos apoios e estímulos das instituições de ensino superior da região.
É que, em boa verdade, todos sabemos, e já o repetimos até à exaustão, que a formação de professores, enquanto processo que visa a mudança, correrá sempre o risco de encontrar resistências. Umas, catapultadas por determinados “períodos” psico-profissionais que os docentes atravessam. Outras, resultantes das políticas educativas, da estrutura organizativa da escola, do estatuto regulador da carreira, e, porque não?, do próprio processo como essa formação foi levada junto dos docentes, de modo mais ou menos impositivo.
Não é menos verdade que, mesmo quando a adesão a iniciativas inovadoras é voluntária, a ausência de finalidade de alguns projectos de reforma (pontuais ou estruturais), a ausência de avaliação do processo e dos produtos realizados, a política “do alterar, pelo alterar”, também têm contribuído para o “desinteresse”, o “afastamento” e até a “resistência” de muitos dos docentes que, à partida, se galvanizaram nesses projectos.
Infelizmente, são demasiados os casos em que os professores se encontravam em ciclos da carreira de desinteressada dádiva ao sistema, à escola e aos alunos, e que os levaram a optimizar o seu investimento pessoal, uma e outra vez, até que o desencanto os contaminou, inesperadamente. Acresce ainda que o sistemático retomar de promessas incumpridas de verdadeira descentralização do sistema educativo, e a negação de se atribuir mais poder de decisão aos professores e às escolas, também têm contribuído para que a resistência se enquiste no sistema, transformando as sinergias naturais em processos de entropia, por vezes incontroláveis.
À falta de poder e de controlo dos professores, no que respeita ao seu trabalho, transformando-os em simples executores de decisões tomadas por hierarquias distantes e sem rosto (a partir das quais as “ordens” se tornam impessoais e difusas, e em que as responsabilidades se diluem),tem conduzido à progressiva desprofissionalização dos professores.
E atribui-se essa situação a muitos factores: o cansaço físico e moral, a falta de reconhecimento social do papel dos docentes, a falta de protecção perante o vandalismo e a violência com que acrescidas vezes se deparam nas escolas, a falta de recursos, os horários inadequados à sua função formadora, a escassa formação para gerir novos programas, a pressão dos pais e outros agentes sociais, a intensificação da atribuição de novas tarefas e funções...
Esta desprofissionalização que alastra em boa parte dos sistemas educativos é uma das razões apontadas para a criação de um progressivo clima de mal-estar.
Pelo que é necessária alguma clarividência para conhecer os factores que fazem peculiar o acto educativo, reconhecendo-se a necessidade de procurar as causas estruturais que condicionam essas situações vivenciadas pelos docentes, já que os professores devem ter expectativas ajustadas às suas possibilidades.
Apesar dos êxitos e dos fracassos se alternarem na sua actividade, eles devem manter expectativas positivas e o entusiasmo que os faz correr ao encontro de novos caminhos e da utopia, mantendo a força das ilusões, apesar dos fracassos circunstanciais. E até porque não se mudam instituições sem mudar as práticas que as produzem no dia-a-dia.
Daí que estudos que nos ajudem a promover a auto-estima dos docentes e o seu bem estar profissional se revelem indispensáveis para combater o desalento que grassa em boa parte das nossas escolas e que se arrisca a minar irremediavelmente o sistema educativo português.

João Ruivo
ruivo@rvj.pt
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