Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano V    Nº48    Fevereiro 2002

Entrevista

CO-RESPONSABILIDADE NO FINANCIAMENTO

Contratualizar é preciso

O Governo tem actuado com rigor acrescido na detecção de fraudes na Acção Social Escolar, garante o ministro da Educação.

Júlio Pedrosa considera ser essencial continuar a assegurar que nenhum aluno deixará de fazer o seu curso superior por falta de recursos financeiros, nomeadamente os que são oriundos de regiões longínquas.

Em relação ao financiamento do Superior, o governante considera que cada instituição deve contratualizar o seu projecto com o Ministério, num acordo que define em cada caso as necessidades financeiras. E as responsabilidades: umas do Estado, outras das universidades e politécnicos.

Sobre a polémica criação do Instituto Universitário de Viseu, o ministro “não abre o jogo” e anuncia apenas uma decisão antes de cessar funções.
 

Que relevância atribui às instituições de Ensino Superior enquanto “motores” do desenvolvimento regional?

Uma importância, sem dúvida, muito grande. As instituições de Ensino superior têm cumprido essa missão, mas as exigências de progresso variam com o tempo e as circunstâncias. Neste momento, preconizo que cada estabelecimento faça um exercício de reflexão sobre qual é hoje a situação da região em que a respectiva instituição está integrada, quais os problemas com que se debatem e os factores de desenvolvimento mais relevantes aos quais as instituições do superior podem estar associadas.
 

O modelo de financiamento do Ensino Superior continua em debate. O que defende, a este nível?

Deixe-me dizer-lhe que o orçamento para 2002 foi preparado com muita responsabilidade por todos: instituições, conselhos de Reitores e dos Politécnicos e pelo Governo, de modo a se chegar a um orçamento que permitisse aos estabelecimentos de Ensino Superior funcionarem com normalidade este ano. As instituições conhecem o quê que lhes está destinado, como componente desse orçamento. Antes de cessarmos funções, pensamos que poderemos ter à nossa disposição um primeiro trabalho sobre o que poderá ser o desenvolvimento do modelo de financiamento que existe actualmente. É um trabalho que deverá continuar, constituindo um contributo e uma base para a próxima equipa governativa. Se cada escola passar a dispor de um projecto institucional próprio, contratualizado com o Ministério da Educação, no acordo deverá surgir o modelo de financiamento que essa escola acolherá. Serão definidas, naturalmente, as responsabilidades do Estado e da instituição, em termos da procura e uso de outro tipo de receitas que aquela poderá obter. O objectivo final do projecto é o de ser desenvolvido com qualidade e de modo adequado por uma escola em concreto. Em resumo, defendo instituições com projectos, contratualizados nos seus objectivos e enquadrados na política nacional de Ensino Superior. Estes são aspectos que constam do trabalho que será objecto de debate ainda antes de cessarmos funções.
 

Muitos dos principais investigadores portugueses têm-se afirmado e alcançaram um grande êxito no estrangeiro. Porque não o conseguiram em Portugal?

Temos excelentes equipas de investigação em Portugal, nomeadamente nas universidades públicas, com reconhecimento internacional. Publicam a bom ritmo em meios prestigiados. Um grande “salto” que as universidades públicas conseguiram nos últimos anos foi o da sua capacidade de realizarem formação pós-graduada. Nem as universidades privadas, nem as públicas mais novas nem os politécnicos teriam se desenvolvido ao ritmo a que progrediram se não tivesse existido uma grande capacidade de formar mestres e doutores. Os índices de publicação científica em revistas de mérito não teriam sido tão bons se não se tivessem formado equipas de investigação de tão elevada qualidade como as que se constituíram nas universidades. A avaliação que foi efectuada pela Fundação para a Ciência e Tecnologia das equipas de investigação portuguesas, por parte de júris internacionais classificou algumas delas como excelentes. Os indicadores demonstram-no. É um caminho a prosseguir. O que acontece é que o país tem o desenvolvimento que tem e há um passivo para corrigir. Defendo que devem ser dadas melhores condições para possibilitar uma ainda mais forte capacidade de investigação. Precisamos de ter mais investigadores a tempo inteiro nas instituições. Os investigadores jovens que queiram realizar as suas pesquisas devem poder fazê-lo. O trabalho que estamos a efectuar com as universidades e politécnicos no domínio da revisão do estatuto da Carreira Docente integra o objectivo de dar um impulso à investigação científica nas escolas de Ensino Superior.

Há famílias que têm os seus filhos a estudarem longe de casa, suportando grandes encargos financeiros. São cada vez mais os alunos que o fazem. O que tem feito o Governo no sentido de apoiar?

Esse apoio deve ser a principal missão dos Serviços de Acção Social. Todos os alunos carenciados devem ter condições para estudarem e fazerem o seu curso superior. Os serviços têm de ser cada vez mais eficientes a identificar reais alunos carenciados, no combate às fraudes que, infelizmente, ainda ocorrem. Tal é preciso para que existam recursos disponíveis de modo a que nenhum aluno carenciado fique sem o apoio da Acção Social, com os requisitos normais de progressão dos estudos. Há meios para apoio directo, através de bolsas e por meio da disponibilização de residências, refeições e outro tipo de apoios. O Governo tem prestado uma atenção sistemática aos recursos da Acção Social, que têm aumentado, quer em investimentos para refeitórios e residências, quer para as bolsas de estudo. Temos também verificado regularmente o cumprimento do objectivo essencial de que ninguém deixe de fazer o seu curso por falta de ajudas do Estado. Posso adiantar que está a ser ultimado um estudo sobre o modelo de financiamento da Acção Social para podermos ser, também a este nível, mais rigorosos e justos no uso e distribuição de recursos.
 

Numa altura em que se coloca a hipótese de fusões entre universidades privadas, como encara o panorama actual do sector privado?

Temos vindo a colaborar com a Associação Portuguesa de Ensino Superior Privado e Cooperativo no sentido da definição de áreas prioritárias de intervenção, tendo para o efeito sido constituído um grupo de trabalho conjunto. Vamos continuar, na medida do possível, a elaboração do Estatuto do Ensino Superior Privado e Cooperativo, enquanto preparamos legislação de enquadramento das instituições para responder a eventuais problemas de reajustamento na rede. A questão que colocou de associação ou fusões de instituições integra esta lista de matérias do referido grupo de trabalho. Foi, por outro lado, identificada a necessidade de se acelerar o desenvolvimento das metodologias de avaliação de cursos. São matérias consideradas como prioritárias. Naquilo que forem questões do âmbito de um Governo de gestão iremos resolver as que pudermos; as outras serão consideradas em trabalhos que ficarão para a próxima equipa governativa analisar e dar continuidade, se assim o entender. Mas, não estamos parados com sentido de responsabilidade.
 

Confirma a decisão de aprovação do Instituto Universitário de Viseu, duramente criticada pelo Conselho de Politécnicos por não se inserir no âmbito de um Governo de gestão?

Assumiremos as nossas responsabilidades. Em relação a essa matéria, o que foi dito é que antes do Governo cessar funções tomará uma decisão. E não acrescento nada mais em relação a esse assunto.
 

 

 

BÁSICO E SECUNDÁRIO

Reformar com precaução

Júlio Pedrosa tem nas reformas do Básico e Secundário as políticas mais marcantes da sua governação.

Tal como revelou ao «Ensino Magazine», são mudanças que têm vindo a ser preparadas e organizadas com todo o cuidado. Não são visíveis aos olhos da opinião pública, mas é um trabalho “de bastidores” que dará frutos, garante o ministro.

Semear para o futuro é o que pode fazer a escasso tempo de cessar funções, depois da inesperada decisão de António Guterres de pedir demissão de Primeiro-Ministro.

Oriundo da Universidade de Aveiro, onde era Reitor, com um trabalho reconhecido nessa instituição e uma actuação marcante como Presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, não teve tempo para revelar o mesmo brilhantismo no Executivo socialista.

Mesmo assim, deixa ao seu sucessor no Ministério da Educação estudos que constituem bases de trabalho importante. Pontos de partida para decisões políticas, sejam elas ou não no mesmo sentido. Nas suas palavras, é notória uma preocupação com a necessidade das instituições de Ensino Superior em ajudarem ao desenvolvimento do país. No interior sobretudo, têm sido “motores” do progresso. É por aí o caminho, defende Júlio Pedrosa, para quem a qualidade do Secundário é indispensável para que os alunos cheguem às universidades e politécnicos melhor preparados. Daí a aposta em mudanças curriculares, mas não só. O ministro lembra e relembra constantemente que a intervenção chega à melhoria das instalações das escolas. Mais laboratórios, bibliotecas e computadores, aliados ao ensino experimental. Formas de se ultrapassar a tradicional crítica que os empresários portugueses formulam de que a Educação do país é demasiado teórica e sem ligação à prática. Por isso, o ensino profissional está a ser acarinhado, salienta o governante.

Ao nosso jornal, o ministro revelou sempre precaução. Nada de “revoluções” abruptas de um sistema complexo, grande e que “mexe” com todos os portugueses, sejam eles pais e/ou professores. E que, afinal, “mexe” especialmente com o futuro de Portugal como nação que se pretende moderna e mais próxima da Europa.

 


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