Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano V    Nº54    Agosto 2002

Destaque

MUSEU DO RELÓGIO

Luta contra o tempo

O museu privado da vila de Serpa, que percorre 400 anos de relojoaria em Portugal e além-fronteiras, vai resistindo ao fechar de portas à custa do restauro de relógios e da venda de modelos raros para Espanha. O Estado e a autarquia não dão um tostão para o espaço, cujo director, há muito reclama o estatuto de utilidade pública.

Quis a ironia que o único Museu do Relógio da Península Ibérica se localizasse na pacata vila alentejana de Serpa, no distrito de Beja. Ali mesmo, em pleno «Alentejo Profundo», na localidade situada na margem esquerda do Guadiana, onde o tempo parece caminhar com uma cadência peculiar. Disponibilizando uma colecção que totaliza 1600 relógios mecânicos (de bolso, punho ou sala), o Museu tem como principal «cérebro» António Tavares d’Almeida, o actual director que há três décadas pôs mãos à obra, quando herdou dos seus avós três relógios de bolso avariados. A partir de então tomou-lhe o gosto e nunca mais parou de acumular exemplares distribuindo-os de forma ordenada pelas dez salas em abóbadas que compõem o acolhedor Convento de Mosteirinho, datado do século XVI.

Nos últimos anos, o Museu recebeu 300 relógios avariados, de pessoas que fizeram doações dessas peças e, muitos deles, foram restaurados com êxito na oficina que existe para o efeito, chegando ali encomendas de alguns pontos mais longínquos da Europa.

Inaugurado em 1995, o Museu do Relógio é um dos cartões de visita da vila de Serpa –tendo recebido até à data a visita de aproximadamente 150 mil pessoas – retratando 400 anos de história do objecto que se tornou indispensável no período seguinte à Revolução Industrial, rivalizando em popularidade com o altaneiro castelo, «ex-libris» local. «Vêm de Norte a Sul e inclusive do exterior, caso de Espanha, Inglaterra e Alemanha», diz Euler Resende, gestor e guia do Museu, um brasileiro que seguiu o desafio de uma amiga e trocou o bulício de Minas Gerais pelo bucolismo das planícies alentejanas.

IMPOSTOS. Mas nem a boa receptividade que o espaço tem tido junto de turistas consegue diminuir a mágoa dos seus responsáveis. A relutância das autoridades competentes em conceder ao Museu o estatuto de utilidade pública faz com que «continuemos a pagar impostos como se de uma perfumaria se tratasse», lamenta António Tavares d’ Almeida. «A solução muitas vezes encontrada passa por vender relógios raros para Espanha para sobreviver».

Os custos de manutenção das peças são significativos e a receita reunida pela venda de bilhetes (2 euros cada) – calcula-se que em média afluam por mês 500 visitantes – é manifestamente insuficiente para suprir as dificuldades. «O Estado não ajuda nada e vem buscar as mais-valias do Museu sob a forma de impostos», protesta o director. A falta de viabilidade financeira obrigou mesmo, em 1997, a fechar portas do espaço do Convento do Mosteirinho. Actualmente para além da venda (um relógio com a inscrição «Museu do Relógio» custa 15 euros) e recuperação de relógios e da bilheteira, a outra fonte de rendimentos, ao abrigo da Lei do Mecenato, traduz-se no apoio financeiro e promocional de uma empresa afecta a uma entidade bancária. Como se não bastasse também a nível local a iniciativa de Tavares d’ Almeida está longe de ser acarinhada. «O presidente da Câmara está no cargo há mais de 20 anos e nunca cá entrou», refere.

No Museu do Relógio podem ser observadas as mais conceituadas e elitistas marcas da alta relojoaria mundial – o Rolex, um dos ícones do século XX -, sem esquecer os «pouco afamados» Roskpft, em homenagem a um engenheiro suíço. O modelo que foi o preferido pela modesta classe do século veria, mais tarde, a sua popularidade quebrada. O primeiro relógio fabricado em Portugal, no Porto, em 1890, tem presença garantida, bem como vários exemplares trazidos pelas tropas de Napoleão, que ali pontificam em grande quantidade. Finalmente, os relógios oficiais das forças armadas nacionais nos conflitos do século passado também têm reservada uma secção exclusiva
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REPORTAGEM PREMIADA

O menino-pastor

À procura de “histórias” de lugares e pessoas do “país real”, Ana Leal andou com uma equipa de reportagem por Trás-os-Montes. Em Pitões das Júnias, aldeia desertificada da região, descobriu uma família especial. Pobre, muito pobre, mas com um pai e uma mãe que insistem em transmitir aos seus filhos valores de vida dignos.

Daniel – o filho – é um menino-pastor, 6 anos de idade, gosta de ir à escola, mas o seu quotidiano é passado no meio de vacas que controla por entre as pastagens. Cajado na mão, atento e observador do que o rodeia foi, desde logo, o centro da reportagem de Ana Leal. Daniel já foi aos outros «países» que são, afinal, as aldeias mais próximas. Mas, nunca viu um estádio de futebol. O Benfica está-lhe no coração e Pedro Mantorras, o “craque” angolano do clube encarnado. Daniel queria que o futebolista lhe explicasse umas jogadas. Em troca, prometia ensiná-lo a «guardar vacas».

A TVI fez a vontade a Daniel e Mantorras chegou à aldeia carregada de prendas do clube das águias. O petiz, conforme prometido, lá lhe disse como guarda vacas. Mas, a estação televisiva reservou-lhe outra surpresa: ver o mar, o mar que ele nunca tinha visto.

Em Pitões das Júnias, o pequeno menino-pastor só tinha para brincar um carrinho que o presidente da Junta lhe deu e que percorria nas pedras da aldeia. Ana Leal e a TVI mostraram-lhe a Bracalândia, um parque de diversões de Braga, com carrossel e tudo. Um novo mundo aos olhos de Daniel e da sua irmã . Os pais, esses, só querem que os filhos «sejam felizes, independentemente de serem médicos, engenheiros ou outra coisa qualquer».

No Jornal Nacional a história de Daniel emocionou os portugueses. Os telefones não pararam de tocar na redacção da TVI. Em apenas dois dias, a Confederação das Associações de Família decide atribuir um prémio a Ana Leal pela reportagem de «verdadeiro serviço público» que fez.

O «Ensino Magazine» antes e depois do anúncio do prémio, apresentou à jornalista da estação de Queluz de Baixo as suas felicitações pelo exemplar trabalho apresentado. Tal como nos confidenciou, esta reportagem representa o lado humano e real do país em que vivemos. O tal lado que Ana Leal gosta de retratar, conforme disse, poucos dias antes do prémio, ao nosso jornal.

No próprio dia em que Mantorras chegou à terra de Daniel, tornando o petiz no centro de todas as atenções, Ana Leal (atenta ao que se passava como telespectadora) realçou ao «Ensino Magazine» o carácter humano do pequenote e da sua família. Conforme nos confidenciou, «não sei se, com a exposição mediática que teve, Daniel deixará de ser guardador de vacas, mas com a família que tem, de certeza que será o que quiser».

O menino decidiu baptizar uma vitela entretanto nascida com o nome da jornalista. A provar que as crianças, por vezes, são mais gratas do que os adultos…

Na memória de muitos portugueses ficam os olhares traquinas e as expressões “marotas” do miúdo fielmente captadas pelo operador de imagem da TVI. Apetece-nos apenas dizer, como Ana Leal, «até sempre Daniel». O de Pitões das Júnias e os outros, desconhecidos, por este país fora.

JA

 

 

 

O lado dos porquês

À procura permanente da descoberta. É assim que Ana Leal se assume nas grandes reportagens de investigação que faz na TVI, onde transforma o jornalismo na sua paixão quotidiana.

Os prémios que recebeu trouxeram-lhe o reconhecimento institucional que o público já tinha atribuído ao levar o Jornal Nacional a aumentar audiências quando as reportagens de investigação (suas e de colegas) são difundidas.

Simpática, Ana Leal explicou ao «Ensino Magazine» os porquês de apostar neste género de trabalhos e a satisfação que lhe traz ajudar a tornar realidade sonhos de pessoas comuns. Afinal, conforme reconheceu ao nosso jornal, a televisão tem desses efeitos, positivos, no caso.

A entrevista demorou alguns dias a ser realizada, já que Ana Leal andava pelo Alentejo em reportagem de investigação, é claro. Mas, logo que regressou à estação de Queluz de Baixo, os esclarecimentos ao «Ensino Magazine» foram imediatos. Discreta, muito discreta mesmo, não gosta de protagonismos nem estrelatos sem sentido. Porque, o que faz mesmo sentido é descobrir o outro lado das pessoas e do mundo, as razões escondidas por detrás dos porquês...

JA

 


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