Ensino &
Desenvolvimento
Os Distritos de Castelo Branco, Portalegre e da Guarda pertencem a uma vasta zona do país que se convencionou por designar de Raia de Portugal. Dois autores espanhóis, em publicação que data dos anos setenta, estigmatizaram de forma precisa e rigorosa as características desta zona geográfica, que abarca uma vasta área do território português e espanhol: “Há na Península Ibérica uma grande zona (maior em extensão superficial que a Grécia ou a Checoslováquia, vez e meia a Áustria, três vezes maior que a Dinamarca ou Suíça e quatro vezes a Holanda ou Bélgica...), formada por nove distritos portugueses e seis províncias espanholas, que constitui, no seu conjunto, a mais notável e extensa concentração de subdesenvolvimento da Europa.” (PINTADO & BARRENECHEA, 1974; 9).
Nos últimos anos, mercê de convénios de múltipla colaboração entre associações empresariais, comerciais, culturais, bem como de autarquias e escolas portuguesas e espanholas, a zona da Raia/La Raya tem vindo a ser identificada, privilegiadamente, com os Distritos de Castelo Branco, Portalegre e Guarda, e com as suas regiões vizinhas de Espanha, que rodeiam as cidades de Badajoz, Cáceres e Salamanca.
Trata-se, pois, de uma região desprotegida e periférica em relação ao poder central e às regiões social e economicamente mais desenvolvidas, onde só o espírito de abnegação e de luta por grandes princípios tem permitido algum surto de desenvolvimento. Desenvolvimento e progresso esses que se têm vindo a traduzir numa incipiente mas progressiva industrialização, no desenvolvimento do sector terciário, no combate à desertificação e ao analfabetismo, no estancar da emigração, na criação de iniciativas sociais e culturais e, finalmente, na implantação dum consistente sistema de ensino superior que, hoje, se traduz na vitalidade dos Institutos Superiores Politécnicos de Portalegre, Castelo Branco e Guarda, e na Universidade da Beira Interior.
Este é um dos estigmas do assimétrico desenvolvimento de Portugal, acentuado desde a época de quinhentos, e que corresponde à fase de expansão marítima, mas que mantém, nos dias de hoje, uma infeliz actualidade, como o referem ALMEIDA et al (2000; 39): “No plano geográfico, a progressiva
desertificação do interior rural tem vindo a acentuar-se, acompanhada da concentração da população na faixa litoral urbana, muito em especial nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, ou, mais recentemente, também em algumas cidades próximas daquelas (Setúbal, Leiria, Aveiro, Braga) e na região turística do Algarve. Estas assimetrias regionais são, aliás, fonte de importantes problemas de desenvolvimento e de qualidade de vida, se bem que, em certo sentido, de ordem diametralmente oposta, consoante estejam em causa as regiões em abandono ou, pelo contrário, aquelas em que a população se aglomerou rapidamente, muitas vezes sem estruturas urbanas adequadas e sem o planeamento territorial necessário”.
É, porém, nesta simbiose entre o desenvolvimento regional e a expansão, entre a articulação e inserção do ensino superior politécnico, que teremos de procurar as vias que nos conduzem à revalorização deste sub-sistema de ensino, enquanto estrutura promotora desse progresso, e enquanto instituição que hoje se copagina e identifica com os objectivos e interesses desta região.
É que a tomada de consciência da necessidade de coordenação entre as políticas de educação, formação e emprego, o equilíbrio entre o progresso científico e a compreensão da importância das tecnologias, entre a teoria e a prática – tudo isso nos conduz à atribuição de crescente importância no investimento no factor humano como recurso insubstituível, para o qual é indispensável haver referenciais de qualidade.
Daí que recentes iniciativas que visam promover o crescimento desarticulado destas instituições, colocando-as como concorrentes entre si, em vez de se estruturar uma política de desenvolvimento integrado e sustentado das mesmas, correlacionada com as necessidades do tecido produtivo da região, só pode conduzir, mais tarde ou mais cedo, ao estrangulamento de algumas delas e, logo, ao empobrecimento do Interior.
Quando o bom senso é substituído pela ganância, quando os objectivos comuns se vêem subordinados à mesquinhez dos interesses individuais, quando as estratégias de longo prazo se subalternizam às necessidades conjunturais de minorias sem significado histórico, compromete-se o futuro e empenham-se as aspirações colectivas.
No início de mais este ano escolar ainda acreditamos ser possível corrigir o inexplicável e relançar o ensino superior como motor fundamental de desenvolvimento destas regiões. Porque é isso mesmo que as populações nos
exigem.
João Ruivo
ruivo@rvj.pt
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