BEIRA INTERIOR NÃO
RENOVA GERAÇÕES DESDE 80
Os reflexos da
emigração

Dos resultados obtidos no estudo agora realizado será possível explicar algumas tendências, as quais não poderão ser muito famosas para regiões como a Beira Interior Sul, onde não há renovação das gerações “desde o início dos anos 80. Desde então que a média de filhos por mulher está abaixo dos 2,1, o que é considerado o limiar estatístico para a renovação das gerações”. Já na Beira Interior Norte, a natalidade desceu mais devagar, mas ainda assim, mais depressa do que sucedeu no Douro ou em Alto Trás-os-Montes.
E a verdade é que se estamos a falar de população, não será menos certo concluir que, mais cedo ou mais tarde, será necessário rever os critérios de financiamento dos municípios. É que se conta a área mas também a população, o Interior passará a receber cada vez menos dinheiro. Ora, se recebe menos dinheiro tem menos possibilidade de criar condições para atrair população e corre-se o risco de se entrar num círculo vicioso. “Há que criar incentivos para fixar populações, mas essas medidas devem ser concretas e planeadas a longo prazo. Só por aí é que passará a solução. Não se podem fazer com remendos a dois ou três anos”.
Apesar de tudo há crescimentos. Olhando aos dados dos censos 2001 e tendo em conta toda a Raia Portuguesa, conclui-se que há um crescimento dos concelhos que albergam centros urbanos. “A sensação que dá, seja ou não devido aos programas comunitários, é que as pessoas se deslocam para os centros urbanos, o que também pode ter a ver com a existência dos equipamentos sociais. É complicado manter equipamentos sociais em pequenos aglomerados e as pessoas, à procura do conforto, não se deslocam para grandes distâncias, mas sim para os centros mais próximos”.
É essa tendência que se verifica, com o crescimento da população do Concelho de Castelo Branco, tal como acontece com os concelhos fronteiriços que têm centros urbanos. Existem no entanto algumas excepções, como é caso de Portalegre, “onde não é o Concelho de Portalegre que cresce mas sim o de Ponte de Sor”. Já os concelhos que não têm centros urbanos perdem população. No caso da Beira Interior, o que perde mais habitantes é o de Penamacor, o que prova a dificuldade em manter população nas zonas mais interiores”.
ENVELHECIMENTO. Embora haja crescimentos em certos concelhos do Interior, não se pode escamotear a questão do envelhecimento da população. “Há regiões onde existem três pessoas maiores de 65 anos por cada uma menor de 15 anos. Isto é um enorme desequilíbrio em termos de estruturas etárias. E como as hipóteses de emprego nas zonas rurais não crescem, a tendência é que as pessoas continuem a ir para os centros urbanos, os quais mantêm uma estrutura etária relativamente jovem, embora todo o Interior seja uma região profundamente envelhecida”.
Mas o fenómeno do envelhecimento não é característica do Interior. “Aqui tem contornos mais carregados, mas o fenómeno do envelhecimento é nacional e europeu. Daí a novidade de Portugal e Espanha relativamente a épocas anteriores, pois deixaram de ser países de emigrantes e reserva demográfica da Europa, para passarem a ser países de recepção de emigrantes. Uma questão que levanta problemas sociais porque as sociedades não estavam habituadas a receber”.
A característica do envelhecimento é também comum a Espanha. “Em certas zonas como Huelva, Badajoz ou até alguns municípios de Pontevedra verifica-se um menor envelhecimento. Mas as zonas de Ourense, Zamora e de Salamanca e até a zona de Cáceres, sobretudo mais para o Interior das províncias há zonas de forte envelhecimento. Por exemplo, a província de Ourense, já nos anos 70 não renovava as suas gerações. Estas foram regiões de forte emigração nos anos 60”.
É certo porém que a população é envelhecida, mas a esperança de vida também cresceu. “Em 1996, nas zonas de Salamanca, Ourense, Zamora, a esperança de vida era de cerca de 80 anos, e na Beira Interior Norte e Sul é à volta dos 78 anos. Mas embora seja razoável, essa população não é factor de renovação, pois nesse caso interessa a população em idade fecunda e a forma como o ter filhos é encarado. A própria mentalidade do que é ter um filho também mudou e isso tem influência na evolução da população”.
PROJECÇÕES. Dos dados conhecidos actualmente será possível fazer algumas projecções em termos de evolução da população nos próximos anos. O próprio Instituto Nacional de Estatística faz projecções tendo em conta os dados dos dez anos anteriores relativamente à estrutura etária, evolução da natalidade e da mortalidade, mas há sempre factos novos que alteram a estrutura, como foi o caso da vaga de emigrantes de Leste que ocorreu nos últimos anos.
Maria João Guardado Moreira encara assim as projecções como “um instrumento de trabalho que tem de ser encarado com alguns cuidados, devido ao facto de partir de premissas actuais que se podem modificar”. No entanto, para esta área de fronteira, com excepção do Cávado e Algarve, pode dizer-se que se deve “manter a tendência para este quase crescimento zero, embora algumas projecções falem na diminuição da população. De qualquer modo, a questão da emigração traz um dado novo.
Para já, a primeira vaga de emigrantes é sobretudo constituída por homens, embora alguns possam, quando
atingida alguma estabilidade financeira trazer as famílias. Agora, resta saber os comportamentos que vão ter, pois podem ficar e estabelecer-se cá, o que terá efeitos na evolução da população, ou podem ficar alguns anos e partirem depois. “Também é preciso ver se haverá restrições à emigração, pelo que neste momento podemos dizer que atravessamos uma fase de transição”.
É porém nesta fase de transição que ocorrem alguns fenómenos interessantes ao nível das regiões de fronteira, com o regresso de muitas pessoas que partiram em tempos para as grandes cidades ou para o estrangeiro. “Em alguns concelhos nota-se algum crescimento da população, mas em termos de evolução da população, essas pessoas aumentam o número de habitantes, mas não contribuem para a renovação geracional. De qualquer modo, tanto em Portugal como em Espanha assiste-se a esses movimentos de
retorno”.
Com a
"marca" do Superior
Maria João Guardado Morei-ra é professora-adjunta da ESE de Castelo Branco desde 1994, instituição onde trabalha desde 1991, ano em que deixou o ensino do 2º e 3º Ciclos do Ensino Básico, já depois de fazera profissionalização em serviço no 1º Grupo do 2º
CEB.
Licenciada em História pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, obteve o grau de mestre em Demografia Histórica e Social na mesma faculdade. O doutoramente que agora terminou, em Sociologia, na especialidade de Demografia, também foi concluído na Universidade Nova.
As áreas temáticas dos estudos que tem desenvolvido, quer no âmbito do mestrado quer do doutoramento, inserem-se na história regional e na demografia, tendo feito diversas comunicações nessa área, em Portugal e no estrangeiro, bem como integrado várias comissões organizadoras de colóquios e congressos de demografia, como foi o caso do VI Congresso Internacional da Associação de Demografia Histórica (ADEH), realizado em Castelo Branco, em Abril de 2001.
É a autora de “Vida e Morte no Concelho de Idanha-a-Nova - Estudos de Demografia Histórica, Século XVIII” (Livros Horizonte), e de artigos publicados em revistas científicas.
Maria João Guardado Morei-ra tem sido formadora em várias acções do Programa Foco, faz parte do Conselho Científico, por inerência, e do Conselho Pedagógico da ESE de Castelo Branco e é membro do Centro de Estudos de População, Economia e Sociedade (ligado à Universidade do Porto), da Associação de Professores de História e de associações ligadas à Demografia, entre as quais a Associação de Demografia Histórica/Associación de Demografia Historica, Société de Demographie Historique e Societá Italiana di Demografia
Storica.
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