Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano IV    Nº37    Março 2001

Geral

JORNADAS PEDAGÓGICAS DA ANP

A utopia da liberdade

A organização da escola actual terá de ser alterada para se rumar à utopia da igualdade e da liberdade, à utopia de uma escola para todos, multicultural e inclusiva. Mas para isso, é também necessário que a sociedade se torne multicultural, que aceite o outro, além de ser mais inclusiva, uma vez que, à semelhança dela, a escola ainda é segregacionista e responde sobretudo à mentalidade do grupo social dominante.

Esta é a principal conclusão da décima edição das Jornadas Pedagógicas da secção de Castelo Branco da Associação Nacional de Professores, que se realizaram a 22 e 23 deste mês numa unidade hoteleira de Castelo Branco. Sob o tema Reinventar a liberdade e a igualdade na escola, as jornadas reuniram cerca de 300 professores de todos os graus de ensino e estiveram integradas no terceiro aniversário do jornal Ensino Magazine.

O presidente da secção de Castelo Branco, António Trigueiros, era uma homem satisfeito e considerou que “o trabalho de equipa realizado ao longo de 10 anos transformou as jornadas numa referência em termos nacionais e provocam o sentimento do dever cumprido, na promoção e divulgação da Associação Nacional de Professores e da cidade de Castelo Branco”.

Menos satisfeitos parecem estar os professores com o actual estado de coisas no ensino, nomeadamente no que toca à liberdade e igualdade. João Ruivo, director da Superior de Gestão de Idanha-a-Nova e director do Ensino Magazine, comparou a escola actual a uma prisão, dado que tem grades de metal e outras psicológicas, onde os auxiliares são os guardas, onde há corredores e intervalos como no sistema prisional. Um sistema que está permanentemente sob o olhar atento da sociedade.

Fala por isso numa escola “em liberdade condicionada”, com uma organização constrangida pelo Estado e pela sociedade, e onde o professor é sujeito a pressões internas para se auto-formar, enquanto externamente sofre pressões para, além de cumprir rotinas, avaliar, tarefa que é, no fim último aquela que a sociedade vê na escola. Uma ideia de avaliação que o presidente do Politécnico de Castelo Branco referiu durante os trabalhos.

Já Hernandez Dias, decano da Universidade de Salamanca, referiu que apesar destas pressões que o professor vive, é nele que está a chave para a mudança. Uma mudança que conseguirá alcançar com mais formação e liberdade, mas também com mais aliciantes do estado, desde melhores remunerações a melhores equipamentos, de modo a que os professores recuperem o status social que foram perdendo progressivamente, ao ponto de muitos países hoje se debaterem com falta de professores.

Ao mesmo tempo, em época de globalização crescente e irreversível, Hernandez Diaz defende que a escola é a instituição que mais se justifica, porque se os conhecimentos surgem em catadupa de várias proveniências, como é o caso da Internet, é sem dúvida a escola que forma consciências críticas para analisarem e seleccionarem esses conhecimentos, sob pena de se cair no Grande Irmão de George Orwell.

Ora, é esta consciência crítica que pode ajudar à liberdade e igualdade, as quais se efectivam se, de facto, a sociedade mudar no sentido da multiculturalidade e do entendimento que tem de ser uma sociedade com lugar para todos. Porque a lógica actual de exigir à escola que resolva todos os seus problemas, desde a droga, aos incêndios, até a guardar os filhos não resulta. A escola será porventura a maior criação da história da humanidade, como refere Valter Lemos, mas não tem soluções mágicas e tem de mudar com a ajuda da sociedade, a qual deve cooperar em lugar de exigir.

Na defesa desta multiculturalidade surgiu precisamente Luís Souta, do Politécnico de Setúbal, para quem actualmente se vivem três equívocos fundamentais na escola. Por um lado, quer-se associar uma escola meritocrática a uma escola da igualdade, com as contradições que daí resultam. Fala-se também de diversificação, mas a escola é massificada. Por último, confundem-se performances com pedagogia, quando é óbvio que a pedagogia é que tem de ser adaptada aos alunos, de modo a conseguirem boas performances.

Também Américo Peças, da Universidade de Évora, defendeu uma sociedade mais humana e respeitadora do outro. Algo que quer ver reflectido na escola. Segundo diz, o desenvolvimento de uma escola inclusiva entendida e progressivamente apoiada pela sociedade, poderá ajudar a combater as grandes taxas de abandono escolar e inclusão verificadas em Portugal, sobretudo nos seis primeiros anos de escolaridade.

Para aquele professor, os alunos com necessidades educativas especiais, que chamou “náufragos do desenvolvimento” são isolados dos seus colegas para terem apoio. Nada mais errado. Na sua óptica, quem precisa de apoio é a escola e os professores, para que a escola seja efectivamente para todos. Hoje não podem existir “professores diplomados para a normalidade” e os outros. Defende assim que é preciso potenciar a heterogeneidade de turmas, de métodos, de estratégias, reinventando a escola e a igualdade e liberdade dentro dessa mesma escola.

 

 

 

MARCHA PELA EDUCAÇÃO

UBI reúne 600 alunos

A marcha pela educação que a Associação Académica da Universidade da Beira Interior realizou a 21 de Março reuniu cerca de 600 alunos da UBI. Os números são do presidente da Associação Académica, Jorge Jacinto, que considerou atingidos os objectivos propostos, os quais passavam por contestar o actual estado de coisas no Ensino Superior, nomeadamente o financiamento, a formação pedagógica do docente, o insucesso escolar, as saídas profissionais e a acção social.

“A Associação Académica informou os alunos com a maior isenção possível e nota que há uma grande união dos alunos relativamente a este mau estar. Os alunos identificam-se com o problema porque o sentem na pele. E só não estiveram presentes mil ou mais alunos devido à muita chuva que caiu nesse dia”, referiu ao Ensino Magazine aquele dirigente associativo.

Integrada na campanha Educação Esquecida, Geração Perdida, que se realizou a nível nacional de 19 a 23 de Março, a marcha teve como fim lutar contra os “vícios e o mau estar do Ensino Superior”. Por isso, naquele dia, a Associação Académica entregou dois cadernos reivindicativos ao Reitor da UBI, Santos Silva, e enviou um dossier ao Ministério da Educação.

“Agora esperamos que algo mude. E saudamos desde já a posição do Presidente da República, que nos últimos tempos se tem referido aos problemas da educação, evidenciando o insucesso escolar e o necessário combate que há a fazer, que é também uma das nossas reivindicações principais”, refere Jorge Jacinto.

Ainda no dia 21, decorreu uma Assembleia Geral da Associação Académica, a qual, pela primeira vez na história, contou com cerca de 300 alunos, os quais aprovaram, por unanimidade, a participação da Academia na manifestação nacional. Uma manifestação que se realizará a 28 de Março, em frente à Assembleia da República, em Lisboa.

No caso concreto da Covilhã, os alunos lutam também pela cantina do Pólo IV, pelo que, em jeito de protesto, inauguraram o relógio tipo Polis, que “marca a contagem decrescente para a inauguração”. O protesto via inaugurações simbólicas verificou-se também no Pólo I, onde se cortou a fita da WC Manuele Subtile, junto ao bar.

Mas a lista de problemas é extensa e a UBI não foge à regra. “Porque não veio o dinheiro para a cantina do Pólo IV?”, pergunta Jorge Jacinto. E a esta questão acrescentam-se outras que têm provocado grande descontentamento, nomeadamente a questão das taxas de repetição e a questão dos “pedagogos ineficazes”.

Jorge Jacinto referira ainda dias antes que “é preciso dizer basta, senão a próxima ponte a cair é a da Educação! E este autocarro tem 400 mil passageiros”, palavras que mantém, enquanto espera frutos da onda de protestos que ficou conhecida pelo nome de “Educação Esquecida, Geração Perdida”.

 

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