Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano IV    Nº39    Maio 2001

Opinião

CRÓNICA

Nova corrida

Não, meu caro Severiano Teixeira, isto não é uma carta aberta, não tenho jeito para tal.

Prefiro que me tome por treinador de bancada. É politicamente mais correcto e, dadas as circunstâncias, como soe acontecer no futebol, V. Exa. continuará com a esperança de vencer, e eu com a consciência tranquila de o ter avisado.

Com efeito, depois de o ouvir anunciar as novas medidas (proibições, é melhor assim) para combater a alta taxa de sinistralidade nas estradas portuguesas, propus-me cumprimentar escrupulosamente, após o que, se me permite, tirei as minhas conclusões.

Passei a andar a 90 à hora. Resultado: todos me ultrapassam, camiões incluídos. É verdade que há tipos a 40, mas, com franqueza, para esses devia também ser estabelecida uma coima.

Deixei de fazer manobras perigosas, quer dizer, daquelas que todos fazemos para fugir ao trânsito, para encurtar caminho, para facilitar. Resultado: passei a ser insultado, a sentir-me diferente, com as consequências pessoais nefastas do foro psicológico, como compreenderá.

Passei a beber água mineral (a água canalizada e dita potável da zona onde habito é de péssima qualidade) sempre que conduzo. Resultado: as dores de estômago têm-me prejudicado a condução ao ponto de há dias quase me ter estampado contra um tipo que travou de repente.

Por estas e por outras, atrevo-me a propor-lhe algumas medidas alternativas, quiçá mais acutilantes.

Em primeiro lugar, V. Exa. não pode endrominar o condutor dum Audi A3, dizendo-lhe que o seu limite de velocidade é igual ao de uma 4L, como o seu chefe diz a todos nós que somos europeus de pleno direito com salários iguais aos praticados no Sri Lanka. Tá a ver? Como igualmente não deve decretar medidas avulsas (tentação herdada) na procura desesperada de condutores assépticos, que obviamente não existem fora da sua douta cabeça.

Em segundo lugar, desmentir de forma tão drástica o que um antigo governante ilusionista (fascista) promoveu durante décadas, assim, do pé para a mão, sem preocupações de outra ordem, é arriscado e, na minha opinião, contraproducente.

Lembrei-me, por isso, de lhe apresentar algumas sugestões, porventura de maior eficácia e com resultados capazes de o manter no lugar, muito para além do esperado pelos seus pares.

Começo pelas escolas de condução. V. Exa. saberá melhor que eu o que lá se ensina e como se ensina. E como se obtém a carta, V. Exa. sabe? Já ouviu falar de envelopes? Não era boa ideia dar por aí uma volta?

E as estradas, estão mesmo em condições? Quantas vezes o estado foi multado pelo mau estado duma boa parte das nossas estradas?

E os nossos agentes? Todos bons rapazes, corporativismo obriga. Não é verdade, meu caro Severiano Teixeira? Eles são corruptíveis como todos nós. Que tal uma mãozinha por esse lado?

Por fim mas não por último, e a educação? Não é do seu pelouro, eu sei, mas V. Exa. come batatas e não é ministro da agricultura, não é verdade? Eu sei que isso demora muito tempo e o mandato é efémero, mas então não aceite tarefas para as quais não está preparado ou então assuma a sua incapacidade, e, como noutro qualquer ofício, demita-se.

Uma coisa, no entanto, lhe peço. O conselho é de borla e garanto-lhe que o poderá fazer durar mais uns anitos: conduza com cuidado, Sr. Ministro.

João de Sousa Teixeira

 


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