Deixem-nos trabalhar!
Uma questão que hoje nos importa aqui salientar refere-se ao grau de autonomia de que gozam as instituições do ensino superior politécnico. Autonomia essa que, quanto a nós, se traduz numa importante mais valia destas instituições face à sua inserção regional e face à possibilidade de incentivar e promover, quer a dinamização da comunidade escolar envolvente, quer a criação de cursos adaptados às necessidades regionais, quer a promoção da formação académica dos seus docentes de acordo com uma lógica de levantamento de necessidades, das características dos seus cursos e do seu plano de desenvolvimento, quer, finalmente, a possibilidade de recrutar docentes, inseridos na região e no “mercado de trabalho” próximo, numa dupla perspectiva: uns pelo seu perfil e nível de formação académica; outros pelo seu relevante currículo profissional, enquanto garantia de permanente ligação destas escolas ao “terreno” concreto a que se destinam os seus formados.
De acordo com um documento do CCISP (2000), a autonomia de um sistema de ensino desenvolve-se, no essencial, em torno da autonomia científica, da autonomia pedagógica, da autonomia de governo e da autonomia financeira e patrimonial.
O princípio da autonomia científica tem sido desenvolvido no sentido de reconhecer às escolas o direito de estas programarem e executarem a investigação aplicada e as demais actividades científicas a desenvolver no seio da instituição e o direito ao apoio financeiro necessário para recuperar o abismo que separa as instituições de ensino superior politécnico das universidades, mediante programas específicos e contratualizados com aquelas instituições.
O princípio da autonomia pedagógica tem pressuposto a possibilidade de criação, supressão e extinção de cursos, a liberdade na elaboração dos respectivos planos de estudo, programas das disciplinas, definição de metodologias de ensino, determinação dos processos de avaliação.
Por isso se entende que, quer o princípio da autonomia científica, quer o princípio da autonomia pedagógica devem ser desenvolvidos no sentido da relevância social dos cursos oferecidos por cada escola.
O princípio da autonomia de governo deve traduzir-se pela faculdade de definir o seu estatuto, escolher os responsáveis pela gestão e o modelo organizativo, quer do ponto de vista administrativo, quer do ponto de vista financeiro e patrimonial, quer do ponto de vista disciplinar.
O princípio da autonomia financeira e patrimonial deve ser desenvolvido no sentido de reconhecer às escolas o direito aos recursos necessários ao desenvolvimento da sua actividade e o direito de afectar tais recursos à satisfação das suas necessidades de acordo com os objectivos traçados pela instituição.
A autonomia das escolas do ensino superior politécnico deve desenvolver-se no quadro do modelo de ensino politécnico, de acordo com a sua filosofia de preparação dos formandos para a sua inserção directa no mercado de trabalho, o que pressupõe um forte entrosamento das instituições com os agentes económicos, sociais, culturais e artísticos da região em que se inserem.
Ora, nesta perspectiva, não faz qualquer sentido que o Ministério da Educação tutele estas instituições para lá de alguma razoabilidade por ambos consentida.
Porém, e infelizmente, nos últimos meses tal não tem acontecido.
A tutela deu sinais recentes e graves de interferir indiscriminadamente nos projectos das Escolas, comprometendo o seu projecto de desenvolvimento, o seu futuro, o futuro das regiões em que aquelas estão inseridas, sem que tais medidas sejam suportadas por qualquer lógica, aparentemente racional.
Nesta matéria não se pode ser liberal nos discursos e ditador nos despachos.
Fica mal a quem o faz. Envergonha o Governo que o consente.
João Ruivo
ruivo@rvj.pt
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