Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano IV    Nº41    Julho 2001

Opinião

CRÓNICA

Variações sobre o medo

O que têm de comum as negociações do O.G.E. a troco de queijo, primeiro, rectificado com banana, após o fartar da vilanagem; a quase bênção que os ex-raptados pelas fleques dão a quem os reteve meses a fio contra a sua vontade, que parece ir muito além da síndroma do sequestrado, de mais fácil justificação; e as provas percentuais de liderança de audição, exaustivamente apresentadas pela SIC e pela TVI?

Fosse esta crónica a abertura de um qualquer telejornal e acrescentaria agora: - Fique para ver na segunda parte. Não é o caso e explico-me já. É o medo (substantivo, masculino, singular: medo).

Para quem acredita que o orçamento rectificativo corresponde ao desígnio superior de atender aos mais necessitados, ao súbito e patriótico desejo de salvar Portugal da banca rota, pode tirar o cavalo do relento, que o bicho não tarda encharcado até às orelhas.

Então? Então, porque é por demais evidente, (com o pormenor pícaro do queijo e da banana, por causa da lusitana tendência para o eufemismo e o inevitável sacrifício pascal para salvação do rebanho restante) que os homens têm medo de perder o tacho.

Na verdade, são cada vez mais apenas os próprios Ministros que desejam salvar o Governo. Aqueles, e mais alguns, acrescente-se por justiça, que se prefiguram como projectos de ministros em fase de acabamento.

O Sr. António, o Sr. Manuel e o Sr. Joaquim, são especialistas na sua arte. Homens simples com a legítima ambição de fazer uma casinha e ter um pé de meia para a velhice. É seu direito. Mas conseguir tal proeza no seu país, com ou sem orçamento aprovado, é que a coisa fia mais fino. Resultado: emigram, das mais variadas formas que há para o fazer, e conseguem em meia dúzia de anos o que em Portugal não seriam capazes numa vida inteira. Como podem então dizer se não bem de quem poderão vir a encontrar de novo mas, dessa vez, com outras terapias, fazerem-lhes a vida negra? É evidentemente o medo de perderem o sustento.

Atentemos, por fim, nos quadros de audiências apresentados pelas televisões privadas. 

Se não fossem um atentado à inteligência, eram com certeza o melhor da chamada nova ficção portuguesa, cuja produção de qualidade também ambas reivindicam.

O alterne das nossas televisões é, neste contexto, o pior, o mais sem vergonha de todos.

Têm medo da concorrência limpa entre si, têm medo que o adversário consiga um programa ainda mais ignóbil que o seu e têm medo que todos deixemos de financiar o seu lixo, para expiamento dos nossos pecados e proveito das suas contas bancárias.

Há fundadas razões para começar a ter medo disto tudo!

João de Sousa Teixeira

 


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