Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano IV    Nº41    Julho 2001

Entrevista

O MÉTODO DA RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS E O COMPUTADOR

Uma experiência que resulta

Numa época em que os professores se queixam da extensão dos programas e da falta de tempo para leccionar todos os conteúdos, o que torna algumas aulas monótonas, com alunos passivos na maior parte do tempo, há uma solução que poderá revolucionar este problema.

Essa solução destina-se às aulas de ciências e passa pela utilização do computador em conjugação com o método da resolução de problemas. Funcionando como uma ferramenta para os alunos, o computador pode contribuir para o sucesso educativo, permitindo desenvolver hábitos reflexivos nos alunos, tornando-os activos no processo de ensino-aprendizagem.

Este é pelo menos o resultado de uma investigação desenvolvida ao longo de um ano e meio numa escola de 2º Ciclo de Castelo Branco. O trabalho foi coordenado por Henrique Gil, professor-adjunto da ESE de Castelo Branco, e inseriu-se no âmbito da sua tese de doutoramento em Filosofia da Educação, a qual defendeu em Junho último, na School of Education da Universidade de Exeter, em Inglaterra.

De todo o trabalho prático desenvolvido, há dois aspectos a destacar, estando um relacionado com a utilização de meios informáticos no ensino, enquanto o segundo relaciona o uso da informática no caso concreto das ciências e do ensino experimental. Algo que aparentemente não seria um problema, mas que acaba por ser na realidade, uma vez que o que se afirma é muito diferente daquilo que se pratica.

“Existe demasiada unanimidade em dizer que a informática é importante e que, no caso das ciências, é imprescindível no ensino experimental. Mas na prática, nenhum nem outra é usada extensivamente. Apenas um reduzido grupo de professores o faz”, afirma. Nesse sentido, procurou encontrar as razões que estão na base deste problema, concluindo que, para tirar vantagens efectivas do computador, a este nível, é preciso mudar a organização da escola.

“Os professores em Portugal estão sob a ditadura do programa, o qual é muito extenso. Como não têm tempo suficiente, estão mais preocupados em debitarem informação do que em porem os alunos a pensar”. Perante este facto, Henrique Gil decidiu promover uma estratégia na qual se usasse o computador, nomeadamente os sistemas de aquisição e tratamento de dados, na aula de ciências e para tratar dados experimentais.

EXPERIÊNCIA. A grande vantagem do computador no caso concreto das ciências não será difícil de demonstrar. “Se a máquina recolhe os dados, por exemplo de temperatura, humidade, pressão, pH, etc., e se esses dados saem da impressora, não faz sentido que os alunos percam tempo na recolha desses dados. Ora, o que acontece normalmente, é que os alunos passam muito tempo a recolher os dados e pouco tempo a interpreta-los”, afirma.

Outro dos problemas é que os testes experimentais realizados nas aulas surgem muitas vezes para demonstrar a teoria ou para a ilustrar, pelo que se tentou ultrapassar cada uma destas duas questões. Recorrendo à ajuda de um grupo de estagiários de Matemática e Ciências da Natureza e dos seus professores cooperantes, Henrique Gil desenvolveu uma experiência em que utilizou a informática no ensino experimental.

O ponto de partida foi um problema colocado aos alunos e que consistia em saber até que ponto a qualidade do tecido e a cor das roupas usadas pelas pessoas se relacionam com a estação do ano. “Aparentemente, esta situação não estava relacionada com as matérias e conteúdos mas, ao resolverem esse problema, os alunos entenderam o que estava por detrás dele”.

Em resultado, conseguiu-se disponibilizar tempo para que os alunos interpretassem os dados. Esta metodologia interessou mais os alunos e fez com que os professores estagiários ganhassem experiência ao nível da resolução de problemas, não da resolução de problemas de Matemática, mas do método da resolução de problemas, onde os alunos são parceiros activos, enquanto o professor assume cada vez mais o papel de guia, de regulador da aprendizagem.

RESULTADOS. No final da investigação, Henrique Gil considera que o trabalho desenvolvido teve resultados positivos. “Conseguiu-se demonstrar que numa aula de 50 minutos foi possível realizar experiências e discutir os resultados, o que não se faz em termos tradicionais”.

Ao longo da experiência, os alunos tiveram oportunidade de constatar que havia diferenças nas cores e qualidade de tecidos usadas pelas pessoas nas diferentes estações do ano. Viram, através de amostras de tecidos, que alguns desses tecidos reflectiam melhor as cores do que outros. Começaram a perceber também que no Verão se usam mais as roupas claras. Daí partiu-se para a análise da pelagem dos animais, gerando-se assim uma conversa que entrou de facto nos conteúdos da disciplina.

“Abordou-se a adaptação dos seres vivos ao meio ambiente, não só da cor da pelagem, mas noutros factores. Gerou-se um conversa e não mais uma aula expositiva, pelo que as crianças sentiram que a aula era mais deles e esse terá sido o aspecto positivo. A verdade é que dá trabalho e é uma tarefa para a qual não existe um livro de instruções. Todas as opiniões e achegas dos alunos têm de ser discutidas e reformuladas”.

Henrique Gil está porém confiante que os professores podem ser encorajados por esta experiência, procurando por isso seguir a metodologia da resolução de problemas, conseguindo assim que os seus alunos consigam níveis de desenvolvimento reflexivo acima da média, além de terem outra motivação para as aulas. “A grande questão é levar os alunos a pensar. Mas o que se faz actualmente passa por aumentar os conteúdos e parece que quanto mais conteúdos se ensinarem melhor é o professor, mas isso é apenas memorização”.

Ao contrário, defende, o professor não deve programar a experiência para dar o resultado que já tinha exposto aos alunos, mas deve realizar a experiência e analisar resultados. Se o resultado é díspare, deve analisar com os alunos o que é que foi mal feito, qual foi o erro e tentar identificá-lo. Porque, quem sabe interpretar o erro, sabe resolver os problemas e sabe reflectir sobre os problemas, algo que hoje acontece pouco em Portugal onde, mais do que é reflexão, se apela à memorização
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