DIRIGENTES SINDICAIS NÃO
TÊM DÚVIDAS
Empresas resistem aos
licenciados

É cada vez mais preocupante o desajustamento entre o mercado de trabalho e o número de licenciados que todos os anos deixam as faculdades. A situação é particularmente grave em determinadas áreas. São os casos do Direito, Letras, Línguas e Engenharia Civil. Tal não invalida, no entanto, que também existam cursos onde o emprego é garantido: Engenharia de Sistemas, Informática, Telecomunicações, Hotelaria e Restauração e Enfermagem.
Tratam-se de domínios em que se verifica um défice de profissionais. As áreas tecnológicas são das que mais sofrem. No ano lectivo de 1998-99, apenas 8,5 por cento dos alunos, incluindo licenciados e mestres, se diplomou nesses cursos. No pólo oposto, estão as formações que apenas exigem “lápis e papel”, como é o caso do Direito. O problema da integração dos licenciados das mais variadas áreas no mercado de trabalho está a ser analisado pelo Sistema de Observação de Percursos de Inserção dos Diplomados do Ensino Superior (ODES). Este projecto governamental, numa primeira fase, realizou um inquérito-piloto aos licenciados de 1993/94 em seis domínios: Economia, Gestão, Engenharia, Contabilidade, Educadores de Infância e Professores do 1º Ciclo do Ensino Básico.
O estudo concluiu que a taxa de desemprego, no momento da inquirição (em Novembro de 1999) atinge 2,7 por cento. No entanto, 18 meses após a obtenção do diploma, é ainda significativa - da ordem dos 6,7 por cento. O desemprego atinge valores mais elevados nos licenciados em Gestão e um mínimo nos Professores do 1º Ciclo do Ensino Básico. O inquérito permitiu verificar, por outro lado, que de 1994 a 1999 quase 46 por cento dos diplomados passaram por períodos em que não tinham trabalho. Desses, 20,2 por cento foram atingidos pelo desemprego de longa duração (12 meses e mais), com especial incidência nos educadores de infância.
Para a UGT, na origem do desemprego dos licenciados do Ensino Superior, encontra-se um forte desajustamento entre o mercado de trabalho e os tipos de formação que as faculdades proporcionam. O secretário-geral daquela central sindical, João Proença, afirma ao Ensino Magazine que «falta criar uma rede que dê informação aos alunos e aos pais sobre quais os cursos que, à partida, possuem um maior grau de empregabilidade». Na sua perspectiva, «os jovens estudantes não têm à disposição dados rigorosos e em quantidade suficiente sobre o mercado de trabalho em Portugal, pelo que tomam opções e decisões sem estarem munidos de todos os elementos indispensáveis».
«É também preciso que o próprio país adopte uma gestão profissional dos seus recursos humanos, assumindo-se como fundamental o conhecimento das necessidades futuras do país», salienta. João Proença critica o «completo desajustamento» de um conjunto de cursos de ensino «cujas designações apenas dizem alguma coisa aos professores que os criaram». Contesta também a «subavaliação» dos números apresentados de licenciados desempregados, os quais «são claramente superiores aos 15 mil referidos». O secretário-geral da UGT explica que os dados oficiais englobam situações de pessoas que «se encontram a trabalhar, mas são pagas com bolsas e outros tipos de subsídios».
Avisa, por outro lado, que o país «está a desperdiçar recursos humanos de grande valia, muitos dos quais não têm emprego nas áreas em que estudaram». João Proença aponta como «escândalos crassos» a carência de médicos e enfermeiros, por falta de vagas no Ensino Superior nestas áreas. Propõe às faculdades uma maior aposta na requalificação de muitos profissionais que, assim, poderiam ficar melhor preparados para o desempenho das suas funções.

SALÁRIOS. O responsável máximo da UGT critica a «pouca exigência» colocada na avaliação dos cursos superiores, em muitos dos quais «não são valorizadas as saídas profissionais». João Proença ataca a classe empresarial nacional por «continuar a apostar num modelo de competitividade assente nos baixos salários e na precaridade laboral». É essa a razão fundamental para não admitirem licenciados, avisa o líder sindical.
Ernesto Cartaxo, da Comissão Executiva da CGTP, partilha desta posição. Critica fortemente o «paradoxo» de Portugal possuir dos níveis mais baixos de qualificação dos seus trabalhadores, mas ter um número crescente de licenciados desempregados.
Alerta para a situação de muitos deles estarem a cumprir funções que não estão de acordo com a formação obtida, o que «ainda agrava mais o problema da falta de trabalho dos licenciados».
Para Ernesto Cartaxo, está também em causa «o esforço de milhares de famílias que têm expectativas legítimas sobre o futuro profissional dos seus filhos». Mas, o país «deita-as por terra, em muitos casos». Sem dúvidas de que «Portugal está a formar imensa gente para o desemprego», aquele membro da Comissão Executiva da CGTP critica também o aproveitamento dos recém-licenciados para executarem trabalhos «sem direitos e caracterizados essencialmente pela precaridade».
É que, «mesmo dos diplomados que obtêm emprego, uma boa parte tem vínculos não permanentes: contratos a prazo ou recibos verdes». Uma situação que, segundo Ernesto Cartaxo, compromete o desenvolvimento futuro de Portugal, pois «nenhum país consegue progredir sem apostar fortemente na sua massa cinzenta, verdadeira mais-valia de qualquer nação».
Jorge Azevedo
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