Percursos de
formação
A Federação Nacional dos Professores lançou um desafio a todos os docentes com o objectivo de os envolver num debate, que se supõe sério e alargado, sobre o ensino secundário,
designadamente no que respeita a revisão curricular daquele ciclo de ensino.
Num documento, dirigido aos professores e às escolas, a Fenprof reflecte sobre os designados “percursos de formação” do secundário, referindo, particularmente, que a diversidade de jovens que têm aceso a esse nível de ensino, bem como as exigências da sociedade impõem a necessidade de diversificar esses trajectos escolares, relembrando, ainda, que a actual estrutura do ensino secundário, para além dos cursos do ensino artístico especializado, dos cursos profissionais e do ensino recorrente, já contemplava os cursos gerais e os cursos tecnológicos do ensino regular.
Ora, no ajustamento curricular que agora se propõe, e que algumas escolas se preparam para implementar estruturam-se os cursos gerais como cursos claramente orientados para o prosseguimento de estudos e os cursos tecnológicos como cursos claramente orientados para a integração no mundo do trabalho. Por isso, defende aquela organização sindical, que a centração desses cursos nos objectivos que lhes são próprios (o prosseguimento de estudos ou a inserção no mercado de trabalho), a existência de uma vertente comum a todos eles, e a possibilidade da criação de um ano pós-12º, facilitaria a
permeabilidade entre os vários cursos, permitindo aos alunos que o desejassem corrigir o seu percurso formativo, o que contribuiria para a democratização do ensino e da sociedade e para uma real igualdade de oportunidades.
Ainda segundo aquela federação sindical, a existência destes dois percursos justificar-se-ia com base na edificação do ensino secundário sobre uma base comum, constituída pela componente de Formação Geral (Língua Portuguesa, Língua Estrangeira I ou II, Filosofia, Educação Física e, de carácter facultativo, Educação Moral e Religiosa) e pela Área de Projecto/Projecto Tecnológico. Pelo que esta formação forneceria aos alunos um conjunto instrumentos conceptuais e metodológicos de que necessitam ao longo da ida, com vista a uma participação activa e crítica na vida social e cultural.
Os alunos do ensino secundário poderiam, deste modo, adquirir uma cultura geral ampla e aberta que integrasse as componentes humanista, social, artística, científica e tecnológica, que lhes permitisse construir a base da sua identidade pessoal e social, compreender o mundo, integrar-se nele e participar na sua construção e transformação.
Este conceito de cultura geral incluiria, necessariamente, uma dimensão crítica e ética, indispensável face ao extraordinário desenvolvimento das ciências e das tecnologias e às suas
consequências directas na vida quotidiana dos indivíduos. Pretender-se-ia, assim, desenvolver uma visão integradora da ciência, da tecnologia, da sociedade e do ambiente, ao mesmo tempo que se promoveria, de forma articulada com as diferentes áreas e disciplinas, o domínio das novas linguagens tecnológicas.
Tratar-se-ia, em suma, da aquisição de uma “bagagem de vida” necessária à integração dos jovens num mundo complexo, em acelerada evolução, caracterizado pela mobilidade, pelo
multiculturalismo e pelo multilinguismo.
Eu bem queria, sem qualquer ingenuidade, acreditar na seriedade destes projectos de intenções. Mas porque será que me assalta a legítima dúvida e o mais pavoroso dos medos, ao imaginar que alguém nos está a empurrar, novamente, para um tipo de ensino secundário que reproduz a selecção social, através da criação de percursos que “preparam para a vidinha” os que “à partida”, e desde o seu posicionamento social, há muito que já estão “condenadinhos” a incorporar-se, o mais rapidamente possível, no mundo do trabalho?
João Ruivo
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