Director: João Ruivo    Publicação Mensal    Ano III    Nº27    Maio 2000

 

Investigação

EST NO PROJECTO ANHYDRA

0,05 litros aos 100 quilómetros

Os números que pode ler no título referem-se de facto, a consumos reais de combustível de veículos automóveis que se produzem hoje. Estes níveis de consumo são possíveis graças ao empenho de organizações de Investigação e Desenvolvimento (I&D), que por todo o mundo lutam para atingir o consumo mínimo possível de combustíveis convencionais, como a gasolina e também desenvolver automóveis cujos órgãos propulsores são alimentados por energias alternativas, como o gás e a energia solar.

Em Portugal temos já cerca de uma dúzia de associações que participam activamente neste desenvolvimento, como a Enhydra. Uma associação sem fins lucrativos criada com múltiplos objectivos que se enquadram na esfera da organização de actividades que promovam a reflexão e a inovação técnico-científica. Neste âmbito, encontram-se iniciativas que promovam a divulgação científica, formação em áreas de I&D de relevante interesse nacional, fóruns de discussão e reflexão sobre temas relacionados com a investigação e inovação técnico-científica, bem como acções destinadas a desenvolver e incentivar projectos e actividades de I&D em interligação com Universidades e/ou Empresas nacionais e estrangeiras.

Correntemente o seu projecto de maior envergadura é a construção do veiculo G2000 que participou na 15a. Shell Eco-Marathon com o número 61, no circuito de Paul Ricard entre 3 e 6 de Junho do ano transacto e que irá competir na 16a. Shell Eco-Marathon com o número 102, no circuito de entre 18 e 21 de Maio deste ano.

A Maratona Shell é uma competição anual que tem como objectivo principal o baixo consumo de combustível e as preocupações ambientais que dai advêm.

A Enhydra conta com uma equipa técnica constituída, neste momento, por cerca de 9 engenheiros graduados pertencentes a varias instituições de I&D (Universidade de Coimbra, Universidade Católica Portuguesa, Instituto Politécnico de Castelo Branco) e empresas nacionais. Em conversa com a equipa, o director da Associação, Joaquim Norberto Pires, esclareceu que o veículo G2000 foi construído para 5 anos. Isto é, será evoluído durante os próximos cinco anos de acordo com um plano de desenvolvimento técnico já rigorosamente definido. “Este foi o ano do chassis. Totalmente concebido em fibra de carbono, o chassis do G2000 é uma excelente base de trabalho (como aliás foi largamente reconhecido durante a participação em França na 15ª Shell Eco-Marathon) que permitirá incorporar os desenvolvimentos futuros que se prevêem ao nível do motor, transmissão, direcção e gestão electrónica. Estes são os objectivos específicos dos próximos anos. O chassis pesa 13 kg, e foi totalmente desenhado usando a ferramenta gráfica SolidWorks 98, por uma equipa liderada por José Carlos Outeiro. Os modelos obtidos permitem rapidamente alterar pequenas partes do carro, como aliás irá acontecer este ano no formato da tampa traseira do motor, no sentido de melhorar o seu comportamento aerodinâmico e facilitar o acesso ao motor e transmissão”.

A transmissão e a direcção, totalmente redesenhadas por Bruno Chaparro e Pedro Antunes, visam melhorar a sua funcionalidade e o seu peso. A relação de transmissão é variável, o que permite ao carro adaptar-se às condições da pista. Isto é importante “visto a prova realizar-se numa nova pista (Nogaro) que desconhecemos”.

O motor do G2000 é actualmente um motor Honda de 22 cm3 a quatro tempos. Este motor tem um consumo específico baixo à potência máxima, estando adaptado ao tipo de prova como é a Shell Eco-Marathon. Jorge Antunes e Cláudio Moreira reconhecem que nesta área há sempre trabalho a fazer e que “essa adaptação pode e deve ser melhorada, quer pela substituição do carburador por um mais flexível que permita regular a riqueza da mistura, quer pela adição de uma injecção electrónica. Há ainda pequenas optimizações, todas associadas com equilibragem, que permitirão obter um conjunto mais eficiente”.

No ano passado, devido a dificuldades várias (muitas também de ordem financeira), não foi possível à equipa “mexer” no motor, de forma que usou o motor original. Essa será uma das prioridades deste ano. Comentando a participação da Enhydra na Shell Eco-Marathon, Norberto Pires disse que “uma parte muito importante é também a gestão electrónica e a aquisição de dados em prova. Só assim é possível garantir o funcionamento óptimo do veículo, bem como o acompanhamento da corrida de forma a poder actuar correctamente à medida que esta evoluí. O piloto deve concentrar-se somente na condução e deixar o resto para a electrónica. Durante a prova de Paul Ricard, optou-se por desligar o sistema electrónico de gestão do motor, bem como o acelerador electrónico. Isto porque os problemas que experimentámos ao nível mecânico, com direcção, transmissão e rolamento não permitiam ter tantas variáveis, optando-se por reduzi-las e concentrarmo-nos nos outros problemas que eram mais sérios. No entanto, a pequena experiência que foi possível ter com o sistema on-line, permitiu concluir que é preciso melhorar o “interface” com o piloto, de forma a tornar o sistema mais fácil de usar. Esta é outra das prioridades para este ano”.

A melhorar significativamente são os aspectos relacionados com a direcção e transmissão. Estes foram já revistos e novas soluções serão usadas este ano. Helena Serrano e Manuel Carvalho, outros dos engenheiros que integram o projecto, falaram-nos ainda das actividades de divulgação da Associação Enhydra, das quais destacamos a organização de uma mostra dos carros desenvolvidos pelas várias equipas nacionais, no Parque das Nações, no decorrer do Dia da Ciência e da Técnica, uma organização da Unidade Ciência-Viva do Ministério da Ciência e Tecnologia. Nesta mostra vocacionada principalmente para jovens do ensino primário e secundário, era facultado o acesso ao interior das viaturas e era inclusivamente permitido guiar estes protótipos.

Outra iniciativa da associação foi a apresentação do projecto Enhydra na III Semana das Novas Tecnologias, organizada pela Escola Tecnológica e Profissional de Sicó, em Avelar. De salientar nestas actividades um dos princípios norteadores da Associação Enhydra, a transposição da investigação e desenvolvimento para as camadas mais jovens da sociedade, por forma a motivar um interesse pelas questões da tecnologia e possibilitar um contacto abrangente, com o objectivo de abrir o trabalho de investigação à sociedade.

Em Paul Ricard estiveram cerca de 200 equipas, 14 das quais Portuguesas, numa prova que foi um memorável momento de convívio entre amantes do desporto automóvel e do ambiente. Foi também um desafio para a equipa Enhydra que enfrentou com coragem os momentos em que tudo parecia correr mal. No final, os dois carros da equipa (modelos de 1998 e de 1999) obtiveram classificações honrosas, apesar de um pouco abaixo das expectativas. O G98 fez 209 km com um litro de gasolina e o G2000 fez na melhor volta 279 Km com o mesmo volume de gasolina (Shell sem chumbo 98). João Paiva, técnico que fabrica as peças, comentou “que apesar de não ser espectacular, foi uma paticipação muito boa, tendo em conta o tempo disponível e a experiência que a equipa tem”. “Houve quem não saísse da box...” lembrou por fim. Permite perspectivar participações futuras com mais sucesso, e acima de tudo menos acidentadas.

Todo este trabalho é bastante interessante mas, para que se possa avançar com um projecto destes é necessário dinheiro. A Equipa Enhydra conta com alguns patrocinadores que lhe têm permitido sobreviver, embora se reconheça que para voos mais altos, como atingir os mais de 2000 Km com um litro de gasolina, resultado das equipas de topo em Paul Ricard, sejam necessários mais patrocínios. A Enhydra não quis deixar passar esta ocasião para agradecer aos seus patrocinadores que são: ICEP, Páginas Amarelas, NEWCAM / DELCAM, Ministério da Ciência e Tecnologia - Programa Ciência Viva, Sqedio – Solidworks, CEMUC - Centro de Engenharia Mecânica da Universidade de Coimbra, DEM UA - Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade de Aveiro, SRAM - Acessórios ciclisticos.

Paulo Chaparro/Jorge Antunes
(Docentes da EST Castelo Branco)

 


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