GENTE & LIVROS
Sartre
(...)”Há pessoas, creio eu, que perceberam isto. Somente, tentaram dominar essa contigência inventando um ser necessário e causa de si próprio. Ora, nenhum ser necessário pode explicar a existência: a contigência não é uma ilusão de óptica, uma aparência que se possa dissipar; é o absoluto, por conseguinte a gratuitidade perfeita. Tudo é gratuito, este jardim, esta cidade e eu mesmo. É o sentimento disso, quando acontece que ele entra em nós, que nos dá volta ao estômago, e então começa tudo a andar à roda como da outra vez no Rendez-vous dos Ferroviários: aí está a Náusea;”(...).
in A Náuse
Jean-Paul Sartre nasceu em Paris a 21 de Junho de 1905 e morre a 15 de Abril de 1980. O seu funeral transformou-se numa manifestação pública, com um cortejo de mais de 25 mil seguidores.
Seu pai, oficial da marinha, morre quando Sartre tem um ano de idade. A mãe, Anne-Marie, leva Sartre a viver com o avô materno, nos arredores de Paris. Desde criança que Jean-Paul escreve contos de aventuras cavalheirescas e de heroísmo e se auto-denomina génio. Quando ele tem doze anos, a mãe casa com Joseph Mancy, um homem rico, burguês e autoritário. Sartre possui uma mente excepcional, embora isso não se revele nos resultados escolares. Com 15 anos volta a viver com o avô e torna-se aluno interno do Liceu Henrique IV. Em 1924 entra na École Normale Supérieur. Aqui estudavam os melhores cérebros da época, nomeadamente Simone de Beauvoir que se tornaria sua companheira para a vida. Entre eles havia uma relação aberta, fora do casamento, convenção burguesa que ele abominava, bem como tudo o que era burguês.
Cumprido o serviço militar, regressa à tertúlia dos cafés na margem esquerda do Quartier Latin. Para além de escritor, Sartre é também filósofo, defende uma filosofia que tem por base o “indivíduo existente”, ou seja, o existencialismo. Corrente filosófica que teve origem no filósofo dinamarquês Kierkegaard, mas que será sempre identificada com Sartre.
Em 1931 é nomeado professor de filosofia no Havre. Em 1939 é chamado a servir numa estação meterológica, era o início da II Guerra Mundial É feito prisioneiro no ano seguinte. Em Março de 1941 consegue a sua libertação e regressa a Paris e à escrita. Adere ao marxismo em 1952. Em 64 é-lhe atribuído o Prémio Nobel da Literatura, que rejeita porque “o escritor deve recusar a deixar-se transformar por instituições”.
Da sua bibliografia destacamos: Filosofia: O Ser e o Nada, O Existencialismo é um Humanismo, Crítica da Razão Dialéctica; Ficção: A Náusea, A Engrenagem, As Palavras - obra auto-biográfica; Teatro: As Moscas, As Mãos Sujas e Mortos sem Sepultura.
O LIVRO. A Náusea é o diário de Antoine Roquetin na cidade provinciana de Bouville (cidade da lama). Aqui Roquetin escreve um livro acerca do Sr. de Rollebon um personagem que viveu no séc. XVIII Este livro é essencialmente um retrato da condição existencial, uma obra filosófica onde estão esboçadas as linhas do Existencialismo em
Sartre.
Eugénia Sousa
e Maria F. Baptista
Novidades
EUROPA-AMÉRICA.
As Publicações Europa-América editaram na colecção Aventura & Viagens, Os Sete Pilares da Sabedoria de T. E. Lawrence. Durante a 1ª Guerra Mundial, Thomas Edward Lawrence, jovem oficial Inglês é destacado para uma missão ao próximo oriente. Com excelentes conhecimentos da língua, etnografia e psicologia dos árabes, Lawrence terá um papel decisivo na reunificação e libertação política das tribos árabes contra o inimigo comum: os turcos. Em Lawrence nasce uma profunda admiração pela alma árabe (voluntariosa, livre, poética e corajosa) e uma desilusão acerca dos interesses imperialistas da Inglaterra. Este livro, «Equipara-se às maiores obras escritas em língua inglesa. Como narrativa de guerra e aventuras é inultrapassável.» - Sir Winston
Churchill.
PIAGET.
P. Charaudeau e R. Ghiglione escreveram A Palavra Confiscada - Um género televisivo: o talk show, publicado em Portugal pelo Instituto Piaget. A Palavra é Confiscada quando as televisões pretendem explorar as falhas para as quais a sociedade não tem resposta: pessoas desaparecidas, dramas familiares e sentimentais, crimes por resolver... onde falha a democracia directa entra o talk show. Este livro faz a análise e questiona o papel deste género televisivo. O estudo de três talk shows representativos, demonstra uma falsa e culturalmente marcada democracia directa, por eles proposta. Mais actual do que nunca, um livro absolutamente necessário.
Eugénia Sousa
BOCAS DO
GALINHEIRO
O
regresso de "O Lobo do Mar"
O Lobo do Mar está de volta ao grande écran. Em cópia nova pode-se, desde o passado dia 11, (re)ver esta versão do romance de Jack London, realizada em 1941 por Michael Curtiz, para nós a melhor das seis que a obra conheceu. A adaptação é de Robert Rossen, mais tarde realizador de sucesso, um dos mais sólidos argumentistas da época de ouro do cinema americano, que soube, com inteligência, construir e condensar com profundidade o carácter das personagens, com relevo para Lobo Larsen, eficazmente vivido por Edward G. Robinson, num dos muitos papéis de vulto que marcaram a sua longa e invejável carreira. Na pele deste tirano, cruel e paranóico, Robinson é secundado por actores não menos admiráveis, como John Garfield e Ida Lupino, ou Barry Fitzgerald, um eterno secundário, de luxo, diga-se, nesta obra prima sobre a ditadura e o abuso do poder, personificada no capitão do “The Ghost”, um navio de péssima reputação, onde, por agruras do destino, irão parar os “passageiros” errados. Um marco na filmografia de Curtiz, com a atracção adicional de o podermos saborear no sítio certo: a sala de cinema. Absolutamente imperdível.
Nascido em Budapeste a 24 de Dezembro de 1888, de seu nome Mihaly Kertesz, desde muito novo que tomou contacto com o cinema. Entre 1914 e 1926 realiza numerosos filmes na Hungria, Áustria, Alemanha e Suécia, onde se diz ter dirigido Greta Garbo, até conhecer Harry Warner em 1926, que o contrata como realizador de serviço para a Warner Bros., à qual ficará ligado até 1953, passando a assinar Michael Curtiz.
Da sua longa lista de filmes de produção americana, acima da centena, são abordados todos os géneros. Não admira que, perante tal profiquidade, Curtiz seja tido como um realizador “capaz do pior, muitas vezes, e do muito bom, às vezes”. Do grande espectáculo, como A Arca de Noé, que nada fica a dever às célebres produções de Cecil B. DeMille, ao policial, Anjos de Cara Negra; aventuras, na terra, no ar e no mar, de que são exemplo Capitão Blood, Robin dos Bosques, de longe a versão mais conseguida da história deste popular herói inglês, e Corsários das Nuvens, e westerns, como Vida Nova, A Caminho de Santa Fé ou Os Comancheros, o último filme que realizou, em 1961, mas este com George Sherman, que todavia não aparece creditado. Porém, o sentido de ritmo, sobretudo nas cenas de acção, não o havia perdido. Mas outros estilos não escaparam a este dinâmico e versátil director. Do melodrama, como Almas em Suplício, ao filme de terror, The Mystery of The Wax Museum e musicais, de que Natal Branco é exemplo.
Porém, Michael Curtiz será sempre lembrado por aquele que é hoje o clássico dos clássicos: Casablanca. O filme mais hollywoodiano de todos os tempos. Quando Ilsa entra no Rick s e pede a Sam para tocar As Time Goes By, ficamos, sem o saber, definitavamente rendidos. E, como o público fazia no Politeama, aquando da exibição da fita em Lisboa durante a guerra, apetece-nos levantar e cantar A Marselhesa com Paul Henreid e abafar o hino nazi! Mas, é sobretudo o encontro e os desencontros de Rick e Ilsa que fazem deste filme um dos mais míticos da filmografia de Curtiz, e de Humphrey Bogart numa das estrelas mais brilhantes do firmamento de Hollywood. Eles terão sempre Paris, nós Casablanca, o filme!
Dois anos depois, e aproveitando o êxito de Casablanca, a Warner produz Passagem para Marselha e encarrega Curtiz de dirigir este filme, claramente de propaganda antinazi, pela abordagem da acção da resistência francesa. Mais uma vez o trabalho de Curtiz é de uma segurança notável, com destaque para as cenas da Ilha do Diabo. Os actores são os mesmos: Peter Lorre, Claude Rains e Bogart, claro. Michael Curtiz foi dos cineastas que mais vezes dirigiu Bogart: além destes, actua em Veneno de Cobra, Duas Causas, Anjos de Cara Negra e O Mais Forte. Mais uma vez a dimensão romântica das personagens de Bogart vem ao de cima. Rick e Matrac, sob uma capa de individualismo, acabam por revelar o seu altruísmo. Neste Passagem para Marselha perde Ingrid Bergman, substituída pela francesa Michele Morgan. Dos actores de Curtiz temos obrigatoriamente que lembrar Errol Flynn que, com o seu protagonismo conferiu a imortalidade a alguns dos heróis mais emblemáticos da história do cinema, de Robin dos Bosques e Capitão Blood, a Geoffrey Thorpe de O Gavião dos Mares, bem como Olivia de Havilland, o lado romântico das aventuras de capa e espada encimadas por Flynn. E outros, muitos outros, que passaram pelos filmes de Curtiz.
O último grande filme do realizador para a Warner foi The Breaking Point, uma adaptação de To Have and Have Not de Ernest Hemingway, muito mais fiel ao texto que a versão de Hawks. Aqui, à precisão da realização, Curtiz alia a atmosfera melancólica do escritor, misturada com algum lirismo, principalmente nas cenas de amor.
Realizador dos jogos de sombra e luz, não se deu bem com a cor, a partir dos anos cinquenta de uso quase obrigatório. Era este agora o gosto popular que até então o realizador sempre respeitara e que fizera dele o produto privilegiado da Warner, também porque sempre soube rodear-se de excelentes decoradores e fotógrafos de génio que criaram o chamado estilo Warner Bros de que Curtiz tirou o melhor dos partidos. Um artesão. Muito. Mas que dizer de um cineasta que deixa uma boa dezena de obras primas? Seguramente um verdadeiro criador. Como escreveu Bénard da Costa a propósito de Casablanca, se isto não for o cinema é porque o cinema não existe!
Luís Dinis da Rosa
com Joaquim Cabeças
|